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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. v.6 n.2 Florianópolis dez. 2006

 

ARTIGOS

 

O trabalho dos operadores de produção de petróleo norte-riograndenses

 

Norte-riograndenses petrol production operators' work

 

 

Silvânia da Cruz BarbosaI; Livia de Oliveira BorgesII; Isabelle Silva do NascimentoIII; Angélica Andrade Ferreira de MeloIV; Alda Karoline Lima da SilvaV

IUEPB, Campina Grande, professora, Mestre em Psicologia (silv.barbosa@gmail.com)
IIUFRN, Natal, professora, Doutora (liviadeoliveira@gmail.com)
IIIUFRN, Natal, graduanda (isabelle852000@yahoo.com.br)
IVUFRN, Natal, graduanda (psi_angelika@yahoo.com.br)
VUFRN, Natal, graduanda (aldakarolinel@yahoo.com.br)

 

 


RESUMO

Esta pesquisa foi realizada com a finalidade de levantar informações ocupacionais sobre o tipo de trabalho e as condições ambientais em que os operadores de produção de petróleo norte-riograndenses realizam suas atividades diárias na Petrobrás. Os dados foram coletados por meio de análises documentais, oriundas de documentos de uso público, fornecidos pelo Sindipetro (RN)1. Os principais resultados encontrados revelam que a categoria pesquisada desenvolve um tipo de trabalho complexo, contínuo e perigoso, sob condições de riscos, ruídos e temperaturas elevadas e de confinamento em ambientes superisolados. Os dados levam a concluir que tais condições ambientais e de trabalho são potencialmente prejudiciais, podendo acarretar danos físicos e psicossociais aos petroleiros.

Palavras-chave: condições de trabalho; análise documental; operador de petróleo.


ABSTRACT

This research aims to identify occupational information about the kind of work and the environmental conditions petrol operators/workers have their activities performed daily at PETROBRAS. The data was collected through documental analysis, from documents of public use which were offered by SINDIPETRO (RN). The results reveal that the occupational category developed a kind of work that is complex, continuous and dangerous, under conditions that involve risk, noise, high temperatures and that are also executed in isolated spaces. The data indicated that such environmental and work conditions are potentially prejudicial and able to cause physical and psychosocial damage to petrol operators/workers.

Keywords: work condition; documental analysis; petrol operators.


 

 

Introdução

Atualmente, na Psicologia Organizacional e do Trabalho (POT), é bastante reconhecida a importância de se compreenderem diversos fenômenos psicossociais (por exemplo: comprometimento organizacional, significado do trabalho, bem-estar e estresse), considerando o contexto de trabalho e (ou) os seus aspectos sociohistóricos (por exemplo: Borges, 1998; Borges, Tamayo e Alves-Filho, 2005; Codo, Soratto e Vasquez-Menezes, 2006; Katzell, 1994; Lima, 2002; Maslach e Lelter, 1999; MartmBaró, 1990; Munduate, 1996; Peiró, Prieto e Roe, 2002; Zanelli, Borges-Andrade e Bastos, 2004). Tal tendência acompanha, por sua vez, a mesma tendência da Psicologia Social como um todo (ver, por exemplo: Álvaro, 1995; Álvaro e Garrido, 2003; Bruner, 1997; Fiske, 1992; Soczka, 2002) e é designada por psicossocial. Tal abordagem, além dos aspectos já mencionados - considerar os fenômenos de acordo com o contexto de inserção e (ou) os aspectos sociohistóricos - caracteriza-se por ter em conta aspectos como o caráter multifacetado e multideterminado dos fenômenos psicossociais, seu o caráter processual, a interdependência dialética entre teoria e prática, a viabilidade de uma análise probabilística do comportamento, a complexidade e diversidade da realidade social e seu caráter dinâmico, em permanente construção simbólica. Defende, ainda, o pluralismo metodológico.

A European Foundation for Improvement of Living and Work Conditions (2006) mantém um trabalho permanente de observação e mapeamento das condições de trabalho na União Européia. Justifica tal ação como necessária, para promover: a qualidade das carreiras profissionais e da segurança no emprego; a manutenção e promoção da saúde. e do bem-estar dos trabalhadores; o desenvolvimento de habilidades e competencias; e a reconciliação da vida no trabalho e fora dele. Por isso, é importante, para a POT, o conhecimento das especificidades das diferentes ocupações e (ou) profissões no Brasil, as quais tem recebido atenção diferencial da Psicologia. Sobre os petroleiros, oeu pação que tem forte destaque no cenário nacional - em função de vários aspectos, entre os quais está o significado da campanha popular O petróleo é nosso, a organização sindical e a imagem da Petrobrás como uma grande empresa bem sucedida -, há poucas publicações (Barbosa, 2001).

O destaque social de tal categoria ocupacional se manifesta de várias maneiras, entre as quais a ocorrência de concursos bastante concorridos, Tal destaque, entretanto, também assume faces de sofrimento: seus membros experimentaram, no governo de Fernando Henrique Cardoso, uma greve reprimida exemplarmente, para enfraquecer o movimento sindical como um todo, A tentativa governamental provavelmente encontrou ressonância popular, porque a imagem do petroleiro, como um funcionário público privilegiado, era compartilhada por muitos brasileiros, Na época, tinha ainda forte impacto a campanha moralizadora do combate "aos marajás". A imprensa fez uso de tal imagem dos petroleiros, fortalecendo a ação governamental (Barbosa, Borges, Cavalcante e Portela, no prelo). Fatos como esses indicam a existência de uma imagem do trabalho do petroleiro como objeto de desejo, por ser caracterizado como propiciador de uma qualidade de vida ideal.

Razões como essas motivaram a realização da presente pesquisa, cujo objetivo é o de levantar informações ocupacionais sobre o tipo de trabalho e as condições ambientais em que os operadores de produção de petróleo norte-riograndenses realizam suas atividades diárias na Petrobrás.

 

Situando a pesquisa frente à literatura especializada

Os objetivos da presente pesquisa situam-na nos estudos sobre condições de trabalho. Esse termo é usado predominantemente na POT de maneira genérica e inespecífica e, comumente, nas pesquisas, constituem variáveis antecedentes (Ramos, Peiró e Ripoll, 2002). Mas as condições de trabalho têm uma ampla história nas ciências sociais, como assinala Álvaro e Garrido (2006) e, por conseqüência, não tem faltado recentemente quem se preocupe em sistematizá-las como um construto (por exemplo, Álvaro e Garrido, 2006; Blanch, Espuny, Gala e Martín, 2003; European Foudation for improvement ofliving and work conditions, 2006; Jódar e Benach, 2004; Muchinsky, 1994; Leplat e Cuny 1977; Ramos, Peiró e Ripoll, 2002).

Ramos, Peiró e Ripoll (2002) conceituam as condições de trabalho como "qualquer aspecto circunstancial em que se produzem as atividades de trabalho, considerando tanto os fatores do entorno físico em que o trabalho se realiza, quanto as circunstâncias temporais em que se dá e as condições sob as quais os trabalhadores desempenham seu trabalho." (p. 35). E, mais sucintamente, afirmam que essas condições são constituídas por "todos os elementos que se situam em torno ao trabalho sem ser ele mesmo, o conjunto de fatores que o envolvem." (p. 35). Apontam que, na POT, há uma tendência em diferenciar as dimensões do conteúdo do trabalho das condições de trabalho. Entretanto, os estudos sociológicos reúnem o que os psicólogos separam, tratando como condições de trabalho tanto o seu conteúdo quanto o seu entorno (Pietro apud Ramos, Peiró e Ripoll, 2002).

Blanch et al. (2003) entendem como condições de trabalho "o conjunto de circunstâncias no marco das quais se desenvolve a atividade laboral e que incide significativamente tanto na experiência de trabalho quanto na dinâmica das relações de trabalho." (p. 43). Leplat e Cuny (1977) acentuam o caráter sistêmico do conceito, chamando a atenção para as interações entre as diversas variáveis que se costuma abarcar, bem como para o fato de que o homem e o seu trabalho constituem um sistema integrado, de forma que as condições de trabalho dependem do perfil desse homem.

Outros autores definem as condições de trabalho em função das variáveis conseqüentes. Jódar e Benach (2004) citam algumas dessas definições, como a de Spayropoulos (apud Jódar e Benach, 2004), segundo o qual as condições de trabalho "abarcam o conjunto de fatores que influem sobre o bem-estar físico dos trabalhadores." (p. 17).

Outra definição, presente na lei espanhola sobre prevenção dos riscos laborais, assume uma conotação mais negativa, afirmando que essas condições são constituídas por "quaisquer características do trabalho que possam ter influência significativa na geração de riscos para segurança e saúde do trabalhador". Portanto, trata-se de uma definição mais restrita, porque não leva em conta que as condições de trabalho podem produzir efeitos benéficos, por exemplo, sobre a saúde do trabalhador (auto-estima, satisfação, etc), sobre seu desempenho, etc. Todos os autores citados, de alguma maneira, apontam o caráter multidisciplinar do estudo das condições de trabalho, embora alguns o acentuem mais fortemente. É o caso de Munchinsky (1994), que torna a interdisciplinaridade o norte de sua taxonomia acerca dos elementos das condições de trabalho, considerando a existência de estressores físicos, aspectos antropométricos, biomecânicos, fisiológicos, etc. Jódar e Benach (2004) chamam a atenção para os marcos jurídico-normativos, bem como para o vínculo histórico entre condições de trabalho e de vida, enquanto Blanch et al. (2003) destacam o seu caráter sociohistórico, uma vez que a definição de seus elementos constituintes e a daqueles que são aceitáveis e (ou) ideais varia com a evolução das sociedades.

Todos os autores convergem também em assinalar que, sob a designação de condições de trabalho, consideram-se muitas variáveis, São tantas, que revisar todas as publicações que considerem algumas delas seria uma atividade extremamente intensa e extensa, Em conseqüência, alguns autores têm elaborado taxonomias que abarcam essas variáveis. Três delas estão resumidas no Quadro 1. Os autores, principalmente Ramos, Peiró e Ripoll (2002), asseveram que as categorias mais amplas que compõem as taxonomias não são claramente excludentes, mas, antes, as variáveis que as compõem são interrelacionadas.

Em suma, assinala-se que a carência de publicações sobre as condições de trabalho dos petroleiros no Brasil, a atenção que a literatura internacional tem concedido atualmente ao tema condições de trabalho e o fato de as pesquisas tomarem freqüentemente tal tema ou seus componentes como associados a vários fenômenos psicossociais motivaram o desenvolvimento desta pesquisa. Ela tem um caráter exploratório e poderá ser importante para apoiar uma maior sistematização nas pesquisas futuras, no campo de saúde mental e trabalho, que focalizem os petroleiros.

 

Os petroleiros

O primeiro poço de petróleo foi oficialmente descoberto no dia 27 de agosto de 1859 em Titusville, Estados Unidos, por coronel Edwin L. Drake (Bey, 1935; Neiva, 1974; Thomas, 2004; Vaitsman, 2001). Segundo Victor (1993), há pelo menos dois anos antes dessa descoberta, pequenas refinarias de petróleo já vinham funcionando na Romênia, na Rússia, na Birmânia e no Canadá. Porém a descoberta nos Estados Unidos constitui um marco importante, porque foi nesse país que começou o processo de modernização das técnicas de exploração, de transporte (oleoduto) e de comercialização do produto, as quais, mais tarde, alastram-se em muitos países.

Para realizar o trabalho de perfuração do solo em busca do óleo, o coronel Drake empregou a sondagem de perfuração a cabo, uma técnica muito antiga, inventada pelos chineses desde o ano de 221 a.C., e que, a partir de então, se tornou a base para os processos subseqüentes de perfuração, até os dias atuais. De um modo geral, a tecnologia da época era bastante rudimentar, e o trabalho de perfuração era feito quase exclusivamente de forma manual, exigindo grande esforço muscular (Bey, 1935; Corrêa, 2003; Marinho Jr., 1970).

Contudo, ao longo do tempo, as técnicas de perfuração foram se aperfeiçoando, passando pelo célebre processo rotary (espéciede mecanismo formado por peças giratórias que agilizam a perfuração e permitem atingir profundidades maiores), até o emprego de tecnologias altamente complexas para perfuração em águas profundas, como é o caso das que são usadas atualmente (Corrêa, 2003). No momento, esse novo tipo de tecnologia constitui o grande desafio da perfuração em todo mundo e consiste em atravessar, com segurança, as espessas rochas salinas localizadas no fundo do mar, para atingir as camadas de óleo. No Brasil essa nova tecnologia começou a ser aplicada com sucesso desde 2003, em blocos da Bacia de Campos, no Rio de Janeiro, e já conta com três poços perfurados de até 750 metros de espessura. Hoje, essa tecnologia continua sendo empregada na bacia de Santos, em São Paulo (Revista Petrobrás, 2005).

As condições e o ambiente de trabalho do operador também mudaram muito. Para se ter uma idéia, em princípios do século XIX, já havia muitas torres de petróleo espalhadas em diversas regiões do mundo, gerando uma larga oferta de emprego que animava os jovens da época a deixarem, desde cedo, a casa dos pais em busca da liberdade financeira. De acordo com Bey (1935), a jornada de trabalho desses jovens durava pelo menos 12 horas diárias, começando às seis da manhã e terminando às seis da tarde. Durante todo esse tempo, o operador executava seu trabalho de pé, sob altas temperaturas, respirando gases saturados de petróleo e mantendo a máxima atenção no serviço, a fim de evitar que um acidente viesse a destruir o poço. Nessa época, como o trabalho do operador ainda não era mecanizado, a técnica usada para extrair as areias acumuladas no interior dos poços era feita com o auxílio de uma corda, por meio da qual o operário descia dependurado até o fundo, ficando mergulhado no óleo até os ombros. Durante esse procedimento, freqüentemente a corda arrebentava, ou o operário morria asfixiado pelos gases.

Acidentes desse tipo acarretavam prejuízos irreparáveis aos proprietários, já que o cadáver obstruía o poço2. Outro grande terror nos campos de petróleo eram os desastres ocasionados por incêndios. Para evitá-los, as torres e acampamentos eram iluminados por luz elétrica (apesar de muito dispendiosa), e era terminantemente proibido o uso de fogo nas proximidades das torres, até mesmo para acender cigarros, As origens dos acidentes dessa ordem eram quase sempre misteriosas e, no entanto, eram cada vez mais freqüentes. Conforme assinala Bey (1935), em 1912, por exemplo, registrou-se uma média diária de doze desastres fatais dessa natureza nos campos petrolíferos da Pérsia (Irã), chamando a atenção do governo local para o elevado índice de mortandade. O governo chegou mesmo a intervir, mas os donos dos poços, estrategicamente, passaram a exigir que os operários assinassem documentos se auto-responsabilizando pelos riscos no trabalho e, com isso, minaram o poder de ação do governo.

As péssimas condições de trabalho e de vida dos operadores dessa época concorreram para que eclodissem grandes ondas de revoltas operárias, sendo a maioria delas insuflada por líderes bolchevistas. Por sua vez, a deflagração dessas greves contribuiu para que os petroleiros conquistassem melhores condições de trabalho, educação e saúde. Contudo tais melhorias ocorreram desigualmente e dependiam da força de mobilização política dos petroleiros em cada região.

Daquele período até os dias de hoje, há um lapso de tempo em que a importância do petróleo na sociedade se ampliou muito, o que implicou grandes investimentos na mudança de tecnologia e no aumento de produtividade e lucratividade. Hoje, a exploração e a produção de petróleo, bem como sua transformação em produtos de largo uso, são reconhecidas como atividades tecnologicamente avançadas. Um dos destaques tecnológicos nesse setor é a exploração e produção do petróleo em mar, utilizando-se as chamadas plataformas marítimas. Segundo Côrrea (2003), as plataformas podem ser de três tipos: plataformas fixas, estruturas feitas de aço ou de concreto; plataformas semi-submersíveis, estruturas flutuantes que suportam um deque (espécie de convés), onde são instaladas a sonda, os equipamentos e o alojamento de pessoal; e navio-sonda, construídos ou adaptados para perfurar em águas muito profundas.

Da mesma forma, as empresas que atuam no setor modernizaram seu modelo de gestão, e a Petrobrás se inclui nessa tendência (Barbosa, 2001). Entre vários aspectos, registram-se, nas duas últimas décadas, como ações da referida empresa, a implantação de uma nova estrutura organizacional mais enxuta, o trebelho dos oberadores de produção de petróleo norte-riograndense são com níveis hierárquicos mais próximos. o que permite agilizar o intercâmbio das comunicações. Essa nova estrutura, que passou a funcionar em novembro de 2000, é composta por quatro Areas de Negócio - Exploração & Produção (Upstream), Abastecimento (Downstream), Gás & Energia e Internacional - duas áreas de apoio - Financeira e Serviços - e várias áreas corporativas, ligadas diretamente à presidência da companhia (Barbosa et al., no prelo). Para descentralizar as decisões administrativas previstas na sua nova estrutura, a Petrobrás criou as chamadas "Unidades de Negócio" (UNs), o que tem permitido à empresa ter uma visão mais nítida dos seus pontos fracos e fortes. Paralelamente a essas ações, a empresa implementou vários projetos, terceirizou tarefas, flexibilizou o processo decisório, etc.

Tantas mudanças implicaram significativas alterações no trabalho dos operadores de produção de petróleo. Tais alterações são preocupantes, e apreendê-las é de grande relevância científica, especialmente para os grupos que investigam questões sobre a saúde mental do trabalhador. Por sua vez, o exame dessas alterações por meio de levantamentos de informações documentais constitui um dos caminhos possíveis.

 

Método

Tendo em vista iluminar os caminhos a serem percorridos em direção à consecução dos objetivos já anunciados, foram elaboradas duas questões de pesquisa que funcionaram como ponto de partida: Como se caracterizam as atividades do operador de produção de petróleo? Sob que condições essas atividades são executadas?

Os dados foram coletados por meio de levantamento e análises documentais, bem como por registros de observação do ambiente laboral, com ligeiro predomínio do primeiro sobre o segundo. Todos os documentos são de uso público, sendo parte deles de autoria da Petrobrás - empresa onde os sujeitos da pesquisa trabalham - e outra parte de autoria do SINDIPETRO/RN - sindicato que representa a categoria ocupacional pesquisada. Tais documentos foram disponibilizados à equipe de pesquisa pelo referido sindicato: revistas, jornais e boletins de comunicação interna da empresa, revistas de produção local, boletins sindicais, manual vigente de acordo coletivo trabalhista, ficha de descrição do cargo do operador e lista de empregados da carreira de operação.

Exceto a ficha de descrição do cargo, que é um documento antigo da Petrobrás, todo o material disponibilizado é datado a partir do ano 2000, momento que coincide com a implementação mais incisiva de reformas organizacionais, tecnológicas e gerenciais da empresa, para alcançar o chamado Plano Estratégico 2010. Os últimos documentos disponibilizados datam de 2006, ano em que a Petrobrás alcança a auto-suficiência sustentável na produção de petróleo, prevista no Plano Estratégico acima mencionado. Como não se tratava de um material volumoso ou extensivo, ficou estabelecido que ele seria integralmente contemplado na pesquisa. Tornou-se, então, o ano de 2000 a 2006 corno corte de tempo para se proceder à leitura e exploração do material, o que possibilitou recolher informações mais atualizadas sobre a empresa, sobre os regimes de trabalho e sobre a natureza do cargo dos operadores.

Para descrever o ambiente de trabalho, realizaram-se visitas in loco às estações produtivas (terrestres e marítimas), a fim de se obter uma visão mais apropriada do local de trabalho dos operadores de petróleo e da realidade cotidiana por eles vivenciada. Tais visitas foram realizadas após prévio consentimento da Petrobrás, sendo sempre acompanhadas por profissionais da própria empresa e diretores sindicais, os quais prestavam informações e esclarecimentos à equipe de pesquisa sobre a rotina de trabalho dos operadores. Por sua vez, o registro dessas informações e das observações realizadas foi organizado em forma de diário.

Para o tratamento dos dados, aplicou-se a técnica de análise descritiva, a qual consistiu em extrair e sistematizar os principais conteúdos informativos dos documentos e dos diários que davam suporte ao objetivo central da pesquisa. Os resultados encontrados a partir desses procedimentos foram analisados à luz da literatura revisada e, em seguida, relatados e discutidos.

 

Resultados

De acordo com informações publicadas nos boletins empresariais de circulação interna (por exemplo, Agenda de Mudança, 2000, outubro/novembro), atualmente a Petrobrás é formada por várias Unidades de Negócio (UNs): ao todo, são 40 UNs espalhadas no Brasil. Uma delas, denominada de Bacia Potiguar, é composta pelos estados do Rio Grande do Norte e do Ceará (RN/CE). Essa Unidade está situada quase totalmente no Rio Grande do Norte, cobrindo um área de 48 mil km quadrados mar adentro e uma profundidade de 2 mil metros. Em cada uma dessas Uns, estão inseridos os chamados ativos de produção de petróleo - espécies de células produtivas" que contam com autonomia gerencial e com custos e receitas propnas. No caso especifico do Rio Grande do Norte, onde essa pesquisa foi realizada, existem três ativos de produção, com sedes geograficamente localizadas nos municípios de Alto do Rodrigues (ATP-ARG), responsável pela produção em terra da área leste da bacia potiguar, Mossoró (ATP-MO), responsável pela produção em terra de oleo,e gas da área oeste da bacia potiguar, Guamaré (ATP-M), responsavel pela produção da área marítima do RN/CE, sendo esse, último ativo formado por um pólo industrial e plataformas marítimas. Atualmente, a bacia potiguar responde pela maior produçao terrestre de petróleo do país, detendo quinze concessões exploratórias. A maioria dos poços em produção está situada no município de Mossoró, sendo que boa parte dessa produção advém de Canto do Amaro (CAM), hoje o principal campo produtivo terrestre do país. Desde a descoberta desse campo, em 1985, o Rio Grande do Norte passou a ocupar a primeira posição no ranking de produção, respondendo por 35,4% de todo petróleo terrestre produzido nacionalmente. Essa cifra corresponde a aproximadamente 5% da produção geral (terra e mar) do pais, o que coloca o estado do Rio Grande do Norte como o segundo maior produtor, antecedido apenas pela bacia de Campos, localizada no Rio de Janeiro (Agenda de Mudança, 2000, outubro/novembro; Rocha, 2005).

Os dados referentes ao quantitativo de operadores de produção de petróleo lotados nos ativos de Alto do Rodrigues, Mossoró e Guamaré, foram extraídos de uma lista de empregados da carreira de operação por lotação, fornecida pelo Sindipetro. De acordo com essa lista, atualmente existem 536 operadores que trabalham nesses ativos. Tais operadores encontram-se distribuídos da seguinte forma: 138 estão lotados em Alto do Rodrigues; 266 em Mossoró e 132 em Guamaré. Nesse último ativo, 80 operadores estao lotados no Pólo Industrial e 52 nas plataformas marítimas. Para se ter uma idéia mais precisa dessa realidade, os operadores foram agrupados por ativo de produção, de modo que se obteve a distribuição apresentada na Tabela 1.

 

 

As estações terrestres e as plataformas marítimas (off-shore) constituem o campo onde os operadores exercem suas atividades diárias. Durante as visitas in loco a esses campos, observou-se que as estações em terra ficam localizadas em áreas muito isoladas e distanciadas entre si. As estradas que ligam essas estaçoes sao formadas por caminhos emaranhados, esburacados e dispersos no meio da caatinga. Também se observou que, nas estradas, venfica-se a presença de animais e que o risco de assalto constitui um tema comum nas conversas dos petroleiros. Durante a Jornada de trabalho, um operador sozinho é responsável, no mínimo, por três estações petrolíferas, fato esse que demanda deslocamentos constantes por essas estradas em viaturas da empresa, dirigidas pelo próprio operador. Durante as visitas a equipe de pesquisa chegou a percorrer longas distâncias de uma estaçao terrestre a outra, podendo observar que há casos de operadores que trabalham em estações com distâncias de até 100 km da sede em que estão lotados e que, todos os dias, após o término do expediente, precisam retornar às cidades onde residem. De fato, essa situação é comum entre os que trabalham em Alto do Rodrigues e moram em cidades como Açu, Mossoró, Pendências, Macau, conforme demonstra um dos resultados de pesquisa de Almondes (2004).

As atribuições de um operador de produção constam no Relatório de Descrição de Cargos da empresa. Com base nesse documento, pode-se dizer que, de um modo geral, os operadores realizam atividades de operação e testagem de poços, efetuam limpezas e inspecionam equipamentos, peças e instalações, fazendo a manutenção preventiva e corretiva, quando necessário. Foi observado que, durante todo o expediente, eles efetuam leituras de painéis e instrumentos, medem e controlam as diversas variáveis do sistema (pressão, temperatura, níveis de líquidos, etc.) e coletam amostras de óleo, gás e água para análise. Como atualmente a Petrobrás conta com serviços automatizados, parte dessas atividades é realizada com o auxílio de computadores. Na prática, isso implica o acompanhamento de irregularidades do sistema produtivo por meio da tela do computador. Dependendo da gravidade do problema, as irregularidades não podem ser corrigidas pelo programa, implicando a necessidade de corrigi-las em campo. Na hipótese de impossibilidade de solucioná-las, o operador deve comunicar as situações pendentes aos órgãos competentes da empresa, para que sejam tomadas providências.

Observou-se, ainda, que a quantidade de operações executadas por cada operador, ao longo dajornada de trabalho, varia de acordo com as circunstâncias diárias do sistema produtivo. Algumas atividades, como a inspeção e o ajuste de equipamentos, o acompanhamento e o tratamento do óleo, demandam maior número de operações, enquanto outras atividades, como o levantamento de dados, as leituras de cartas, a confecção de boletins e a Passagem de Serviço (OS)3 exigem menor número de operações. Para auxiliar na execução dessas atividades, o operador dispõe de vários instrumentos, tais como ferramentas gerais (por exemplo, martelos e chaves), planímetros (para leitura do gás), instrumentos de laboratório (por exemplo, centrífuga e banhomarial e termómetro ótico (para medir temperatura).

Como a produção de petróleo4 é uma atividade altamente arriscada, os operadores dispõem de vários equipamentos de proteção individual contra os riscos (EPls), a exemplo de cintos, luvas, capacetes, protetores auriculares, óculos de segurança e máscaras respiratórias. Dispõem ainda de vários equipamentos de segurança indicados por técnicos e recomendados pelas normas de segurança da empresa, tais como extintores e tanques de água, para casos de incêndio, produtos de primeiros socorros e manuais com instruções para medidas urgentes. Também em casos de acidentes, a cor da farda (laranja) serve como sinalizador para identificá-los. Além disso, como a atividade do operador envolve a manipulação de substâncias químicas e explosivas, também estão disponibilizados, nos laboratórios da empresa e em locais de fácil acesso, alguns equipamentos coletivos de segurança, como lavadores de olhos e chuveiros, embora a equipe de pesquisa tenha observado que muitos deles apresentem sinais evidentes de deterioração. Como as turmas escaladas a cumprir o horário diurno trabalham sob altas temperaturas solares, a empresa oferece protetores de sol e, para casos de exposição às chuvas, fornece capas. Para se proteger contra os animais peçonhentos, existem as botas, conforme já foi mencionado, mas contra os insetos - muito presentes no campo - não se observou nenhuma medida adotada.

Quanto à exploração e à produção de petróleo em campos marítimos no estado do Rio Grande do Norte, não há plataformas do tipo navio-sonda, mencionadas por Córrea (2003). Existem, atualmente, os seguintes campos marítimos em atividade: Ubarana, Pescada-arabaiana, Agulha e Aratum. O maior deles é o campo de Ubarana, localizado em águas rasas, no município de Guamaré, que possui 83 poços produtores, interligados a 14 plataformas, sendo 2 centrais de concreto e 12 jaquetas não habitadas (Revista Marcas que Marcam, setembro/2006). As plataformas operam em locais distantes da costa marítima e, por isso, precisam funcionar com certo grau de autonomia. Por sua vez, isso implica um conjunto de ações coordenadas para manter os serviços de alimentação e alojamento da tripulação embarcada, bem como o fornecimento de água, energia, transportes (barcos ou helicópteros), serviços médicos e de comunicação, entre outros.

De acordo com as observações registradas e com a literatura revisada (por exemplo, Freitas et al., 2001), embora não existam grandes diferenças no que se refere à natureza do trabalho dos que operam em terra ou em mar, é significativo o fato de que as várias atividades dos operadores plataformistas - tais como manutenção preventiva, trabalhos de reparo e operações de levantamento de cargas - se conjuguem com as múltiplas partes do sistema tecnológico. Assim, por exemplo, válvulas devem estar fechadas e o isolamento de cada flange5 deve ser devidamente controlado, para evitar que hidrocarbonetos vazem à alta pressão e causem acidentes. Como as condições ambientais e de trabalho no mar são altamente arriscadas, o tipo de mão-de-obra requerida para atuar nas plataformas é superespecializada.

De acordo com informações extraídas do manual de Acordo Coletivo de Trabalho (2005), constata-se que o período de dias de trabalho e de folga dos operadores norte-riograndenses sofre variações. Para os que exercem atividades em terra, ou seja, para os que trabalham em Alto do Rodrigues e em Mossoró, existem três tipos de regime de trabalho:

- Turno Ininterrupto de Revezamento (TIR). O pessoal engajado nesse esquema cumpre jornada diária de oito horas e carga semanal de 33,6 horas. Para o esquema funcionar, são formados cinco grupos que se revezam em turnos, cumprindo 14 dias de trabalho e 21 dias de folgas. Na prática, o revezamento está distribuído da seguinte forma: após 7 dias confinados, os grupos têm 7 dias de folga; em seguida, ficam mais 7 dias confinados e têm 14 dias de folga. Em geral, a turma que trabalhou a semana durante a noite, na semana seguinte trabalhará durante o dia.

- Regime Administrativo de Campo (ADM). Trata-se de um expediente corrido de 8 horas diárias, perfazendo um total de 40 horas semanais, com folgas nos finais de semana (sábado e domingo).

- Regime Especial de Campo (REC). Como a própria nomenclatura sugere, esse é um tipo de regime criado para atender a necessidades especiais da empresa (como faltas de empregados, licenças, férias, etc.). Os empregados engajados nesse esquema trabalham 10 horas diárias, com carga semanal de 33,6 horas. Na prática, isso significa que, após uma semana de trabalho, folgam6 12 dias. Esse tipo de regime é aplicado somente aos empregados que exercem atividades operacionais ou administrativas (não enquadradas como Turno Ininterrupto de Revezamento), exercidas em locais confinados em áreas terrestres ou em equipes sísmicas7

No caso dos que trabalham em mar, no Pólo Guamaré, existe apenas o Turno Ininterrupto de Revezamento - TIR. Nesse regime, os embarcados ficam confinados no local de trabalho e se revezam dentro do esquema de horário já explicitado. Contudo, independentemente da modalidade de horário esta-belecido pela companhia, existem trabalhadores que permanecem em estado de prontidão, sob o chamado regime de sobreaviso, com jornada diária de 12 horas. Nesse esquema, para cada dia de trabalho, o operário tem 1,5 dias de folga. A Tabela 2 apresenta uma síntese da jornada de trabalho específica de cada regime, conforme anteriormente mencionado.

 

 

Os dados ocupacionais levantados revelam diversos aspectos sobre o tipo de trabalho, sobre o ambiente e as condições de trabalho do operador de produção de petróleo cuja discussão consideramos importante.

 

Discussão

Tomando por base os dados levantados e anteriormente apresentados, pode-se dizer que pelo menos quatro aspectos interrelacionados caracterizam o trabalho do operador de produção de petróleo: em primeiro lugar, sua atividade é complexa; em segundo lugar, é contínua; em terceiro lugar, é perigosa; em quarto, exige atuar em regime de trabalho distinto da maior parte da população.

A complexidade da tarefa do operador advém do fato de que ela se conjuga às diversas partes interligadas do sistema tecnológico, o que impossibilita que o petroleiro tenha um controle total do sistema. Esse sistema, por sua vez, está sempre sujeito às imprevisibilidades, podendo desencadear problemas diversos em efeito cascata. O trabalho do operador consiste, então, em prevenir e solucionar as falhas freqüentes que ocorrem no sistema produtivo, de modo a mantê-lo em boas condições de funcionamento. Trata-se, portanto, de uma atividade que envolve amplas e diversificadas tarefas que exigem, ao mesmo tempo, muita habilidade, atenção, capacidade intuitiva e de tomada de decisões acertadas, razão pela qual requer pessoal qualificado para realizá-la.

O trabalho do operador é contínuo, porque o processo produtivo da empresa funciona durante 24 horas por dia, o que demanda o revezamento de turmas de trabalhadores para acompanhá-la. Na prática do dia-a-dia, a PS constitui um dos mais claros exemplos dessa lógica de continuidade, já que se caracteriza como o momento em que os operadores se revezam e trocam informações sobre os problemas e pendências que transcorreram durante a jornada laboral.

Também se pode dizer que o trabalho do operador é perigoso, porque lida diretamente com vapores inflamáveis - que podem produzir incêndio e (ou) explosão -, com o manuseio de produtos químicos tóxicos e com uma variedade de máquinas e equipamentos que podem causar acidentes pessoais (ocasionando lesões ou mortes), danos ambientais (como poluição por derramamento de óleo) e prejuízos empresariais (por quebra de equipamentos, perdas e desperdício de produção). Além disso, o operador trabalha em cima de linhas pressurizadas, que promovem pressão sobre o corpo, podendo alterar suas vias respiratórias e circulatórias.

Quanto às condições e ao ambiente de trabalho, seja em terra ou em mar, pode-se dizer que ele é bastante arriscado. Como os campos petrolíferos terrestres do Rio Grande do Norte são muito visados por assaltantes, os operadores convivem diariamente com esse risco. Já que percorrem longas distâncias de uma estação para a outra, estão sempre sujeitos a acidentes automobilísticos. Trabalhando em condições de isolamento, podem ser surpreendidos, no meio da caatinga, por situações adversas, como ataques de animais peçonhentas, picadas de insetos e chuvas. Essa última condição, no entanto, é menos freqüente, já que o Rio Grande do Norte está situado no Nordeste, uma das regiões mais quentes do país e, em geral, o operador trabalha em condições de alta temperatura climática. Contudo, essa situação pode concorrer para um desgaste fisico ainda maior. Também as condições de ruídos elevados concorrem para tornar as condições de trabalho desagradáveis.

No caso dos petroleiros que atuam no mar, os riscos de acidentes e incidentes se multiplicam, e as condições de isolamento são ainda piores. Confinada em alto mar, a tripulação convive sempre com as possibilidades de mau tempo do mar e também com o risco de não poder ser evacuada com segurança em casos de acidente.

Quanto aos regimes de trabalho adotados, dissemos que os operadores da Petrobrás trabalham em sistema de turnos. A literatura especializada (por exemplo, Costa, Monta e Martmez, 2000; Fischer, Moreno e Rotenberg, 2003; Oliveira, Berthoud, Beglimini, coppola e Rangel, 2006; Régis Filho, 1998; Rutenfranz, Knauth e Fischer, 1989) aponta que trabalhar em turno noturno e em regimes alternados é altamente prejudicial para a saúde fisica, psíquica e social do trabalhador. Do ponto de vista físico, os principais prejuízos se referem aos distúrbios de sono, gastrintestinais e cardiovasculares (Almondes, 2004; Rosa e Colhgan, 2002). Do ponto de vista psicossocial, os prejuízos se refletem diretamente na vida social e familiar (Barbosa, 2001; Borges e Barbosa, no prelo). De um modo geral, os trabalhadores que cumprem expedientes noturnos e regimes alternados de trabalho têm sérias dificuldades de participar de atividades culturais, esportivas e de lazer fora do seu ambiente de trabalho. Também sentem dificuldade de acompanhar a dinâmica funcional do lar, de modo que, em muitos casos, embora sejam os principais provedores financeiros da família, como é o caso dos petroleiros, nem sempre conseguem participar ativamente no lar ou fazer valer suas decisões.

Por fim, cabe assinalar que as duas questões norteadoras da pesquisa - Como se caracterizam as atividades do operador de produção de petróleo? Sob que condições essas atividades são executadas? - foram respondidas à medida que os resulta dos foram sendo analisados. Eles indicam, sumariamente, que a categoria ocupacional pesquisada exerce um tipo de atividade complexa, contínua e perigosa; trabalha sob condições de riscos, ruídos e temperaturas elevadas e também em ambientes super isolados, em situações de confinamento e sob vários regimes de revezamento, o que implica maiores dificuldades em conciliar as esferas de vida (família e trabalho), quando comparados com empregos mais comuns. Os operadores de petróleo trabalham dispersos nos vários ativos e subsetores. Tal dispersão, somando se à diversidade de regimes de trabalho, implica condições de trabalho heterogêneas.

 

Considerações finais

As sofisticadas técnicas de exploração de petróleo adotadas na atualidade contrastam nitidamente com a tecnologia rudimentar que era usada no começo do século XIX. Enquanto, no passado, predominava um tipo de trabalho braçal, praticamente inexistindo instrumentos ou ferramentas para auxiliar a tarefa do operador de petróleo, atualmente a produção e exploração de petróleo, em terra ou em mar, conta com métodos muito avançados. Hoje, as empresas fazem grandes investimentos em tecnologia para a exploração em águas profundas. Particularmente na Petrobrás, tais investimentos a tem tornado detentora da tecnologia para esse tipo de exploração e, a cada ano, torna-se recordista da própria produção.

Também muitas empresas petrolíferas, incluindo a Petrobrás, têm implementado reformas em sua estrutura organizacional e renovado seus modelos de gestão empresarial, a fim de se tornarem mais ágeis e competitivas. Conjuntamente, essas reformas tecnológicas, gerenciais e produtivas originaram um novo e complexo ambiente de trabalho, com sérias implicações para a vida do trabalhador. No entanto, não foi intenção aqui analisar tais implicações; os dados levantados ajudaram tão somente a caracterizar o ambiente de trabalho e o tipo de atividade do operador de produção de petróleo. Tais dados levam a concluir que eles exercem atividades complexas, contínuas e periculosas, realizando-as sob condições ambientais adversas, potencialmente prejudiciais ao seu bem-estar fisico e psicossocial. Cabe, então, indagar; Afinal, que implicações as condições ambientais e de trabalho trazem para vida do operador de petróleo dentro e fora dos portões da empresa? E para a sua saúde fisica e mental? Questões como essas suscitam novos debates e investigações futuras, com foco na melhoria da saúde e qualidade de vida do trabalhador.

Esse artigo intentou contribuir para elucidar as condições de trabalho dos operadores de petróleo do Rio Grande do Norte, a fim de que outros estudos possam nele se apoiar. Alerta-se, no entanto, pàra o fato de que as informações aqui fornecidas apresentam limitações. Uma delas deriva do fato de que os dados levantados se referem a uma realidade específica e, por isso, possuem reduzido poder de generalização. Isso significa que se deve evitar transferir seus achados para outras realidades. Por fim, chama-se a atenção para a importância de se utilizar, cada vez mais, abordagens que suplantem as várias formas de investigação e de intervenção que ainda permanecem centradas na culpabilização do trabalhador. Chama-se também a atenção das organizações que adotam regimes de trabalho alternados para a importância de investir maciçamente em políticas de prevenção e de assistência à saúde do trabalhador.

 

Registro de agradecimentos

Esta pesquisa foi realizada com apoio do Programa Integrado de Pós-graduação em Psicologia Social (UFRN/UFPB) e, conseqüentemente, com apoio da CAPES. Contou também com apoio do CNPq, por meio da bolsa de produtividade da segunda autora e do Programa PIBIC, e do Sindicato dos Petroleiros, que proveu a logística necessária para o processo de coleta de dados.

 

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1 Sindicato dos Trabalhadores na Exploração, Produção, Perfuração, Refino, Armazenamento e Transporte de Petróleo e dos Trabalhadores de Empresas Interpostas no Estado do Rio Grande do Norte.
2 Na época, ocorriam muitas mortes em virtude de brigas e disputas entre vizinhos, e o poço logo se tornou um lugar de desova de cadáveres.
3 PS é uma prática que ocorre entre turmas que revezam horários. Trata-se do momento no qual o operador que está iniciando a jornada de trabalho recebe informações (orais ou escritas) do colega que está saindo, sobre os problemas e pendências que transcorrem durante o expediente.
4 Tipo de atividade que consiste em extrair óleo, após a perfuração dos poços.
5 Flanges são espécies de abas existentes em cada extremidade de uma canalização, eixo ou tubo, por meio das quais as diferentes seções que formam a rede de canalização se prendem umas às outras.
6 A relação de dias de trabalho para dias de folga é de 1x1, 5.
7 A atividade sísmica é parte integrante da sondagem. Consiste em produzir abalos sísmicos no interior da terra (tremores de terra) com uso de explosivos, preparando, assim, o terreno a ser perfurado, por meio de aparelhos e processos técnicos especiais de sondagem.

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