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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. v.6 n.2 Florianópolis dez. 2006

 

ARTIGOS

 

Gestão ambiental em organizações goianas: as representações dos trabalhadores

 

Environmental management in goianas organizations: the worker's representations

 

 

Kátia Barbosa MacêdoI; Elise Alves dos SantosII; Ana Tereza Elias SiqueiraIII; Daiany Georges de PaulaIV; Jamaile de Souza ReisV; Keila Mara de Oliveira FariasVI; Luiza Ferreira Rezende de MedeirosVII

IDoutora em Psicologia pela PUC-SP, Professora Titular da Universidade Católica de Goiás. Rua Sevilha, Q184, 1.17, Condomínio Sevilha, Casa 2, Jardim Europa, Goiânia - GO. Telefone; (062) 3532 7002; (katia.macedo@cultura.com.br)
IIUniversidade Católica de Goiás, psicóloga, Mestranda em Psicologia pela UCC. Avenida República do Líbano, n. 1135, Edificio Itaipu, Apto. 1402, Setor Aeroporto, Goiânia - GO. CEP: 74 045-070. Telefone (062) 3225 1432, (elise_ alves@yahoo.com.br)
IIIBolsista, aluna de graduação do curso de psicologia da Universidade Católica de Goiás. Rua 118, Qd. F-38, Lt 13 nº 111 Setor Sul, Goiânia, GO. Tdefone:(62) 3541 5228; (aninhates@yahoo.com.br)
IVBolsista, aluna de graduação do curso de Administração da Universidade Católica de Goiás Av. Brasília Qd 43 Lt 02 Vila Brasília, Goiânia GO. Telefone: (62) 3280 2643: (daianyg@hotmail.com)
VBolsista, aluna de graduação do curso de psicologia da Universidade Católica de Goiás. Rua GV12 Qd. 09 Lt. 03 Residencial Granville, Goiânia GO. Telefone: (62) 3246 2450; (jamaile@gmail.com)
VIMestre em Psicologia pela UCG e professora da Faculdades Alves Faria. Rua Coronel Serafim Agapito, n. 135, apt. 1103, Ed. Serra dos Cristais, Vila Maria José Goiânia GO CEP 74815470, Telefone (062) 3241 0406; (keila_mara@uol.com.br)
VIIMestre em Psicologia pela Universidade Católica de Goiás, professora da Faculdade Cambury. Avenida Universitária, 1440, Setor Universitário, Goiânia GO. Telefone - 062 3275 5863;. (luiza502@bol.com.br)

 

 


RESUMO

A presente pesquisa teve como objetivo levantar dados a respeito de organizações goianas que desenvolviam ações de Gestão Ambiental, enfocando a implantação dessas ações a partir das representações dos trabalhadores sobre os programas desenvolvidos pelas organizações onde atuavam. Para que o SGA (Sistema de Gestão Ambiental) seja efetivo, ele deve: estar integrado ao planejamento global da organização; ter envolvimento dos setores e pessoas responsáveis por sua implantação; refletir a política ambiental; e submeter-se a uma revisão periódica. Algumas organizações que implantam os SGA buscam apenas reconhecimento externo, e a questão ambiental assume papel secundário. Trata-se de um estudo de casos, de caráter descritivo e exploratório, realizado em parceria com a FIEG (Federação das Indústrias do Estado de Goiás) e a Agência Ambiental do Estado de Goiás. Foram coletados dados em 10 organizações goianas, e foram utilizadas a análise documental, a entrevista semi-estruturada e a análise gráfica do discurso. As representações dos trabalhadores indicaram motivos distintos para a implantação das ações e focalizaram as abordagens diferenciadas utilizadas para conscientizar ou sensibilizar os trabalhadores. Alguns afirmaram que conheciam o programa e que as atividades desenvolvidas eram adequadas; outros declararam que as ações priorizavam o cumprimento da legislação, com pouco investimento para a sensibilização ou para a implantação do programa, e que ele não gerou mudanças. Houve, ainda, declarações de desconhecimento do programa.

Palavras-chave: gestão ambiental; organizações; meio ambiente.


ABSTRACT

This research had as objectives obtain data concerning organizations which develop environmental management, focusing the implantation of the program and data concerning employees' perception about the environmental program. For the success of the program it is important that it is included into general planning of the organizations; and the worker's involvement in ali sectors of organization, and also developed a environmental policy to change behaviors and to be revised in some periods. Many organizations begin the implantation of environmental programs only looking for external benefits as develop a positive institutional image, and the environmental questions seems to take a secondary place. This research had been developed in 10 organizations, and used documental analysis and interview exploring five topics: involvement and policy; planning; implantation; evaluation and critical analysis and intervention. The discursive analysis had been used. Data indicates that some organizations had planned and invested in programs to implant and develop changes in process and workers involved, and others did not planned or developed actions to implant the programs, in these second ones, workers had declared that they did not know programs, actions or changes related to.

Keywords: environmental management; organizations; environment


 

 

1. Introdução

Com o aumento da conscientização dos consumidores sobre a questão ambiental e o fortalecimento de movimentos sociais, surgiram e se multiplicaram legislações específicas para o meio ambiente, que transferem para as organizações a responsabilidade de tratamento de resíduos, efluentes e de reciclagem de materiais. O mercado verde criou oportunidades de negócios em várias frentes diversificadas.

Ao implantarem Sistemas de Gestão Ambiental, as empresas podem modificar processos, fornecedores, desenho e embalagens dos produtos ou serviços, visando a alcançar seus objetivos. No entanto, a depender do setor de atuação, do porte ou de características de suas matérias-primas ou produtos e serviços, ou até mesmo da recusa a se desviar de seus objetivos-fins, algumas organizações podem optar por terceirizar alguns serviços relacionados à gestão ambiental.

Nas décadas de 1950 e 1960, houve um crescimento da preocupação com questões sociais, e autores europeus como Galbraith, Packard e Carson (apud Barbieri, 2004) se destacaram na apresentação de problemas sociais e suas possíveis soluções. A preocupação com os rumos do desenvolvimento e com a exaustão dos recursos naturais teve seu momento marcante na reunião do Clube de Roma em 1968, onde foi lançado o documento Crescimento Zero ou Relatório Meadows.

Passos (1999) afirma que, na década de 1970, a economia se debruçou de forma significativa sobre as relações entre desenvolvimento econômico e meio ambiente, tendo como resultado a publicação, em 1972, do Relatório do Clube de Roma, denominado Limites do Crescimento e da Declaração sobre o Meio Ambiente ou o Relatório Meadows, aprovado em 1972, na Conferência de Estocolmo, que criou o PNUMS - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Além dos eventos mencionados, deve-se destacar também o Relatório Crescimento Zero de 1972, o Seminário Internacional de Educação Ambiental de Belgrado, em 1975, e a Conferência Intergovernamental de Educação Ambiental Tibilisi, realizada na URSS, em 1977. Nessa época, o Brasil rejeitou firmemente o propósito de adoção de padrões internacionais para proteção ambiental, de acordo com Donaire (1999).

Em Abril de 1987, foi publicado o Relatório da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, denominado Relatório Brunddand, posteriormente denominado Nosso Futuro Comum, no qual se considera o conceito de desenvolvimento sustentável. A publicação desse documento, com o aval da ONU, teve o mérito de fazer com que todas as nações passassem a encarar o problema ecológico como de capital importância, tanto em âmbito interno, quanto no externo. Assim, os países começaram a entender que as medidas de proteção ambiental não foram inventadas para impedir o desenvolvimento económico.

A década de 1990 foi marcada pela ECO-92, realizada no Rio de Janeiro, e a promulgação da Agenda 21, documento que contém os princípios e diretrizes para a gestão ambiental. No que concerne às empresas, a preocupação com o meio ambiente se justifica, porque, além de punições legais que se intensificam, a questão pode representar um diferencial para a imagem institucional, com redução de custos, alem de influenciar positivamente as agências financiadoras e o consumidor. Nesta década, as organizações começaram a integrar o meio ambiente nas suas estratégias de negócios, surgindo um novo e estratégico paradigma ambiental.

É no contexto descrito que a presente pesquisa foi desenvolvida, com o objetivo levantar dados sobre as representações que os trabalhadores têm sobre os Sistemas de Gestão Ambiental ou Ações de Gestão Ambiental em organizações goianas, partindo de seu discurso. Para tal, teve como parceiros a Secretaria do Meio Ambiental e o Serviço Nacional de Aprendizagem Industriai SENAI, tendo em vista que ambos promovem o Prêmio de Gestão Ambiental em Goiás.

 

A repercussão dos movimentos sociais na América Latina e no Brasil

Para Donaire (1999), na América Latina, as prioridades dizem respeito às políticas de desenvolvimento e à luta contra o subdesenvolvimento e suas manifestações. Entre os problemas ambientais mais comuns, destaca-se o da poluição, em sua expressão mais tradicional, ligada à industrialização, à mecanização da agricultura e ao crescimento urbano.

O problema ambiental latino-americano não se reduz à deterioração dos recursos de ar e água, embora ela não deixe de ser substantiva. O problema prioritário é a depredação passada e presente dos recursos da região. Esses recursos têm sido sobreutilizados por uma exploração em beneficio de grupos poderosos. Nesse sentido, as ações dos países latino-americanas devem ser focalizadas em três aspectos: recuperação do meio ambiente degradado; avaliação da degradação futura do meio ambiente; potencialização de recursos ambientais.

Considerando os níveis de degradação ambiental, a recuperação dos recursos naturais é tarefa prioritária, devendo merecer destaque a degradação do solo em virtude de processos de erosão e desertificação, a derrubada de florestas, a poluiçao das águas e do solo com resíduos, fertilizantes, pesticidas e herbicidas, além de outras formas de poluição atmosférica, marinha, sonora, nuclear, etc.

Segundo Donaire (1999), no Brasil, a preocupação ecológica e sua interiorização organizacional é fruto de influências externas, da legislação ambiental e das pressões exercidas pela comunidade. Para Viola e outros (1998), o ambientalismo brasileiro emergiu na primeira metade de década de 1970, por meio de algumas poucas associações que realizavam campanhas de denúncia e conscientização pública de âmbito local. Tais campanhas obtiveram repercussão mínima na opinião pública. De acordo com Souza (2001), no Brasil, até o final da década de 1970, o número de dispositivos legais ambientais federais, incluindo leis, decretos e decretos-lei não passava de duas dezenas. O autor registra que, na década de 1980, foram adicionados 64 novos dispositivos legais e, na década de 1990 (até 1996), outros 159.

Para Maimon (1999), o Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) para o período de 1975 a 79 definiu como prioridade o controle da poluição industrial por meio de normas anti-poluição e de uma política de localização ind ustrial nas regiões densamente urbanizadas. Privilegiando o combate à poluição industrial, o número de grupos de base cresceu de quarenta em 1980 para quatrocentos em 1985. Até esse ano, o ambientalismo brasileiro tinha um caráter bi-setorial - de um lado, grupos de base e, de outro, agências estatais ambientais - e sua luta orientava-se para o controle da poluição urbana e rural e para a preservação de ecossistemas naturais.

Em especial a partir dos anos 1980, com a generalização do conceito de cidadania, que valoriza o indivíduo não apenas pela sua consciência moral, mas também pela sua pessoa jurídica, a instituição particular ganhou uma outra dimensão como personagem do espaço comum.

Neder (1992), em uma pesquisa realizada no início da década de 1990, constatou que as ações ambientais das empresas brasileiras concentravam-se na modernização dos sistemas de controle da poluição, e eram fruto essencialmente das exigências crescentes das regulamentações ambientais.

Segundo Leite e Brito (2000), uma pesquisa realizada em 1995 com as 500 maiores indústrias brasileiras, relatada pela ABNT (1996), revelou a intenção de 43% delas se certificarem pela norma ISO 14000 e, ainda, que aproximadamente 75% delas já haviam sido certificadas ou estavam em vias de implantar sistemas de gestão ambiental.

Dentre os motivos que levam organizações a incorporarem a variável ambiental em sua gestão, geralmente ocorrem: necessidade de obedecer às leis; necessidade de tornarem-se mais eficazes, reduzindo custos com reciclagem, diminuição do consumo de matérias-primas e energia, evitando desperdícios; necessidade de serem mais competitivas, abrindo novos mercados; desejo de não comprometer sua imagem junto à opinião pública, pela associação à poluição e à degradação ambiental; e, finalmente, o propósito de assumir sua responsabilidade social e ética para com a sociedade no presente e no futuro.

 

Gestão ambiental nas organizações: sistema de gestão ambiental

Um sistema de gestão ambiental (SGA) é "a parte do Sistema de Gestão Global que inclui a estrutura organizacional, o planejamento de atividades, responsabilidades, práticas, procedimentos, processos e recursos para o desenvolvimento, implantação, alcance, revisão e manutenção da política ambiental", segundo normas da IS0 14000. A implantação do SGA ocorre em cinco etapas sucessivas e contínuas: (1) Política ambiental da organização; (2) Planejamento; (3) Implantação e operação; (4) Monitoramento e ações corretivas; e (5) Revisões gerenciais. O SGA distingue-se das ações descontínuas, pontuais e desintegradas de controle da poluição da empresa.

O sucesso do SGA vai depender: do comprometimento da alta direção; de estar integrado ao planejamento global da empresa; do envolvimento de todos os setores e pessoas responsáveis pela sua implantação; do fato de ele refletir a política ambiental; da garantia de uma mudança de comportamento; da consideração dos recursos humanos, fisicos e financeiros necessários; do seu dinamismo e da sua revisão periódica.

A adoção de um SGA representa uma mudança cultural que geralmente provoca conflitos. Se não houver uma firme e clara disposição da alta administração de apoiar as mudanças, as resistências à implantação podem se tornar insuperáveis.

As empresas comprometidas com a conquista da melhoria contínua do desempenho ambiental proporcionada pelo SGA buscam continuamente soluções para três questões fundamentais: avaliação inicial; política ambiental; planejamento e implantação.

Elkington e Burke (1989 apud Donaire, 1999) sugerem os dez passos necessários para a excelência ambiental: desenvolva e publique uma política ambiental; estabeleça metas e continue a avaliar os ganhos; defina claramente as responsabilidades ambientais de cada uma das áreas e do pessoal; divulgue interna e externamente a política, os objetivos e metas e as responsabilidades; obtenha recursos adequados; eduque e treine seu pessoal e informe aos consumidores e à comunidade; acompanhe a situação ambiental da empresa e faça auditorias e relatórios; acompanhe a evolução da discussão sobre a questão ambiental; contribua para os programas ambientais da comunidade e invista em pesquisa e desenvolvimento aplicados à área ambiental; e ajude a conciliar os diferentes interesses existentes entre todos os envolvidos.

Para a implantação, são necessárias algumas decisões anteriores: escolha de um responsável; formar o Comitê de coordenação e implantação; sensibilize e treine os envolvidos; e treine o comitê de coordenação e implantação.

 

Barreiras à implantação do SGA

Para Maimon (1999), os empresários e gestores encontram algumas dificuldades ou barreiras no processo de implantação de um Programa de Gestão Ambiental nas organizações. As principais delas são organizacionais, sistêmicas, comportamentais, técnicas, econômicas e governamentais, como se apresenta a seguir:

- Barreiras organizacionais. Entre elas, podem-se identificar a ênfase na sobrevivência, o poder de decisão, que muitas vezes é centralizado, a alta rotatividade da equipe técnica e a falta de envolvimento dos empregados que, apesar de serem sensibilizados, podem não participar das atividades, a não ser por determinação dos gerentes ou donos. As organizações mais vulneráveis a atribuir ênfase à sobrevivência são as pequenas e médias, que priorizam a produção para pagamento de suas contas. Para Donaire (1999) e Barbieri (2004), muitos dirigentes de organizações consideram a implantação da gestão ambiental como custos de produção que podem onerar seus caixas e, por esse motivo, a qualquer momento questionam a implantação do programa. Segundo Reis e Queiroz (2002), o comprometimento de todos os empregados é um aspecto absolutamente necessário para a implantação efetiva de qualquer programa. A grande rotatividade da equipe e a falta de envolvimento dos empregados podem gerar desinteresse pelo o programa.

- Barreiras sistêmicas. A falta ou a ausência de informações técnicas limita o Programa de Gestão Ambiental - que deve estar voltado para a real necessidade da organização -, dificultando a definição de políticas, objetivos e metas imprescindíveis à sua implantação e desenvolvendo, assim, um sistema de gestão inadequado que, por falta de planejamento, prejudica a capacitação dos empregados.

- Barreiras comportamentais. A dificuldade na implantação do Programa pode decorrer mais da falta de cultura organizacional do que da falta de técnicas. Com a falta de liderança, a ausência de uma supervisão efetiva e a insegurança no trabalho, as pessoas tendem a resistir às mudanças necessárias para a implantação do Programa. O conhecimento da cultura organizacional é um facilitador no processo de mudanças. Maimon (1999) afirmou que a implantação de Programas de Gestão Ambiental representa uma mudança cultural, provocando conflitos e resistências à sua implantação. Para Motta e Caldas (1997), as diferenças culturais causam resistência na aplicação de modelos desenvolvidos em países com realidade diferente da do Brasil, o que dificulta, muitas vezes, a sua aplicação. Isso se deve à falta de adaptação dos modelos à cultura da organização.

- Barreiras técnicas. Algumas das barreiras técnicas são a falta de infra-estrutura, o treinamento limitado ou indisponível, o acesso limitado às informações técnicas e a defasagem tecnológica. Para Reis e Queiroz (2002) e Maimon (1999), todos os trabalha dores devem ser submetidos a treinamentos e à sensibilização, de acordo com o nível e com a tarefa a ser desempenhada por eles. A dificuldade de contar com pessoas capacitadas, na própria organização, para treinar e sensibilizar os empregados e desenvolver toda infra-estrutura do Programa, faz com que sejam contratadas consultorias especializadas.

- Barreiras econômicas. Os benefícios da redução da poluição não são contabilizados como ativo, mas como custo adicional. Como, para as organizações, o custo do financiamento para projetos ambientais é relativamente alto, a implantação do Programa desfavorece os ganhos financeiros de médio prazo.

- Barreiras governamentais. Segundo Donaire (1999), as organizações estão situadas em um ambiente mutável e imprevisível, no qual a responsabilidade socioambiental é uma realidade. Um dos problemas enfrentados, ao implantar os Programas de Gestão Ambiental, é a falta de incentivos governamentais para a redução dos impactos ambientais e para a compatibilização da política industrial com a segurança dos investimentos realizados. Qualquer alteração na política industrial pode inviabilizar os Programas de Gestão Ambiental.

No desenvolvimento de um Programa de Gestão Ambiental, faz-se necessária uma análise minuciosa dos pontos fracos, fortes, ameaças e oportunidades, ou seja, um estudo do posicionamento da organização em relação às questões ambientais.

Para Maimon (1999), Donaire (1999) e Reis e Queiroz (2002), algumas variáveis são importantes no processo de transformação da questão ambiental em valor organizacional, tais como: disponibilidade de fundos para investimentos de cunho ambiental; consciência ambiental da alta administração; flexibilidade de empresários, administradores e trabalhadores; apoio da sociedade para as melhorias em prol do meio ambiente; importância dos produtos e serviços da organização para a proteção ambiental; conhecimento sistemático da legislação ambiental, das atividades dos concorrentes, da consciência dos clientes, bem como desenvolvimento científico e tecnológico.

Com o objetivo de atender a algumas dessas motivações, organizações passaram a desenvolver mudanças para a implantação do sistema de gestão ambiental. Os trabalhadores da organização são afetados de formas diferentes pela implantação desse novo sistema de gestão, o qual, muitas vezes, modifica completamente as atividades exercidas por eles na organização. A forma como o trabalhador da organização percebe, vivencia e representa a implantação de um sistema de gestão ambiental depende do impacto que ele causa nos processos organizacionais de que participa. Dessa forma, as percepções, vivências e representações nas quais o trabalhador do nível operacional se baseia para construir seu discurso sobre o tema podem ser completamente diferentes das de seus colegas que atuam no nível estratégico ou tático.

Compreender (via uma análise discursiva) as cognições dos trabalhadores quanto à gestão dos programas ambientais pode tanto contribuir para a ampliação do conhecimento científico sobre o assunto, quanto para a elaboração de propostas de melhoria nas organizações. Desse modo, essa compreensão pode auxiliar na conscientização e sensibilização dos trabalhadores para os impactos ambientais causados pelas atividades que desenvolve, bem como esclarecer os administradores sobre a importância da implantação de um sistema de gestão ambiental.

 

Método

Visando à consecução do objetivo da presente pesquisa, optou-se por coletar dados em organizações onde havia Programas de Gestão Ambiental implantados há mais de um ano. Observando-se esse critério, a escolha das organizações ocorreu em função de elas possuírem um Programa de Gestão Ambiental, estarem localizadas na região da Grande Goiânia, serem de fácil acesso e seus gestores aceitarem participar da investigação.

Trata-se de uma pesquisa de caráter exploratório, realizada por meio de estudos de caso. O estudo foi realizado em parceria com o SEMARH (Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos), bem como o FIEG (Federação das Indústrias do Estado de Goiás) e contou com a participação de 10 organizações localizadas na região metropolitana de Goiânia. Tais organizações, todas privadas e com atuação na indústria e no comércio, foram selecionadas a partir do critério de possuírem alguma ação voltada para o meio ambiente.

Participaram da pesquisa 61 trabalhadores de ambos os sexos, 67% do sexo masculino e 33% do sexo feminino, com idade que variava entre 18 a 56 anos, com média de 47 anos. A escolaridade predominante era de nível médio incompleto (43% dos participantes). Deles, 37 atuavam no nível operacional e 24 em níveis de gerencia e chefias.

Utilizaram-se entrevistas semi-estruturadas, realizadas individualmente e com consentimento expresso dos sujeitos. Também foi desenvolvida uma análise de documentos específicos sobre gestão ambiental de todas as organizações que os possuíam.

Utilizou-se um roteiro de entrevista previamente elaborado, com base em princípios para implantação do SGA fundamentados em Donaire (1999), Maimon (1999), Reis e Queiroz (2002) e Barbieri (2004), com cinco categorias: comprometimento e política ambiental; planejamento; implementação; medição e avaliação; e análise crítica e melhoria.

A técnica escolhida para a análise de dados foi a análise gráfica do discurso de Lane (1985), que tem como proposta: "procurar graficamente os núcleos do pensamento, através das palavras que se repetem (ou dos sinõnimos), mas seguindo a continuidade do discurso e utilizando a seqüência dos números para cada unidade de significação, sujeito ou predicado. Ela permite levantar os núcleos e categorias que emergem do discurso e indicar a composição do pensamento e a formação das representações acerca do assunto abordado" (p. 8).

Segundo Macêdo (2001), o procedimento da análise gráfica do discurso permite tratar os dados discursivos e levantar os núcleos de pensamento emergentes e as categorias compostas por eles, de forma a se obterem as representações presentes na elaboração do discurso, o que permite, assim, a compreensão do que o autor do discurso "pensa ou representa" sobre determinado assunto.

 

Resultados

Os resultados serão apresentados considerando-se os núcleos e categorias que emergiram do discurso dos participantes, bem como as categorias do roteiro:

 

Categoria 1 - Comprometimento e política

Com relação à pergunta "A organização possui algum sistema de gestão ambiental?", observaram-se diferentes respostas para os níveis gerencial e operacional. Ficou claro que os trabalhadores, de uma maneira geral, não tinham esclarecimentos maiores quanto aos programas e ações desenvolvidas nas organizações e que, muitas vezes, apenas a área administrativa envolvia-se no processo. Dessa forma, é possível afirmar que nem sempre o objetivo da organização está voltado para a sensibilização dos funcionários acerca da importância da questão ambiental.

Ao responderem sobre o motivo que levou a organização a buscar a implementação do SGA, percebe-se uma clara diferenciação entre o discurso dos trabalhadores da área operacional e da administrativa, já que, muitas vezes, as informações ficam restntas à área administrativa. Isso ocorre quando os trabalhadores não sabem relatar os motivos de implantação, tampouco descrever o que é o próprio Sistema de Gestão Ambiental. Dados referentes à implementação do SGA e à questão da inclusã.o do SGA no planejamento estratégico também ficam restntos tao somente ao departamento responsável pela Gestão Ambiental.

Alguns trechos de entrevistas ilustram a percepção dos trabalhadores:

A nossa empresa ela não tem uma política ambiental, ela tem uma política integrada que é de qualidade, meio ambiente, e responsabilidade social. (S2E3G1)1

Existe uma política e uma política que tende a cada dia mais estar mais intensa em cima dessa preocupação, né? que é a preservação do meio ambiente. (S4EIG1)

Qual é a política agora eu não sei te dizer. (S21E7G2)

De fato, seria necessário que houvesse uma maior participa çãode todos os trabalhadores das organizações, independentemente do departamento em que atuam, para que não houvesse apenas a "implementação de um programa", mas também a sensibilização e a adesão dos trabalhadores da própria organização que implanta um SGA.

 

Categoria 2 -Planejamento

No que se refere à Categoria 2, sobre o planejamento acerca do Sistema de Gestão Ambiental, observou-se que, para a questao "se foi realizado algum estudo para verificar a viabilidade da implementação do SGA", emergiram respostas que indicam ter sido tal levantamento realizado a partir de estudos, e que, quando surgiam dúvidas acerca da implementação, novos estudos eram realizados. Ao serem perguntados sobre o EINRIMA, os trabalhadores, muitas vezes, não sabiam o que estava sendo perguntado. Os trabalhadores da área administrativa afirmaram que tinham conhecimento acerca do Estudo e do Relatório de Impacto Ambiental, mas que tais estudos não eram a base para a Implantação dos programas. Esses entrevistados comentam a respeito da cúpula administrativa; no que se refere ao planejamento:

O primeiro passo é o conhecimento, como é uma decisão corporativa e estratégica é quem decide acaba não conhecendo muito, sabe os benefícios em linha gerais, igual SGA isso é legal é muito bom aí depois a gente foi, corre atrás para descobrir o quê que faz. (G1)

Na realidade este estudo é progressivo. À medida que você tem as necessidades, você estuda as viabilidades nê? E pra você fazer... pra você implantar, é lógico que você tem igual eu falei inicialmente de fazer pesquisa, de fazer estudo, procurar literatura pra ver as viabilidades e a onde você vai conseguir parceria pra fazer acontecer. (G2)

Os principais motivos para a implantação do SGA estão vinculados a exigências externas dos consumidores. Observou-se que um dos motivos de as organizações buscarem a implementaçao de tais ações e constituído por exigências externas à empresa, uma vez que tanto os fornecedores, quanto os consumidores cobram das organizações uma postura de maior comprometimento com o meio ambiente.

Dessa forma, observa-se que as organizações, com o intuito de atender a uma exigência externa, muitas vezes optam por implantar um sistema de gestão ambiental ou ações de gestão ambiental como meio de responder a exigências de mercado, consumidores e fornecedores, descuidando do objetivo de sensibilização das pessoas envolvidas, já que os próprios trabalhadores não conhecem o programa implantado.

Quanto à área responsável pela Gestão Ambiental, a maioria das organizações não possui um departamento especificamente responsável por ela, que é geralmente gerencida por algum departamento ligado à área administrativa, ou por pessoas responsáveis que não constituem um departamento específico para tal objetivo.

Assim, deve-se ter claro que a disseminação da prática da gestão ambiental certamente contribui para a maior sensibilização e envolvimento da sociedade com relação ao tema ambiental, gerando efeitos positivos no comportamento dos dirigentes das organizações e estimulando atitudes pró-ativas em favor da qualidade ambiental. Assim, o planejamento deve abranger tanto questões políticas, quanto questões que visem à conscientização interna e externa da organização.

 

Categoria 3 -Implantação

Uma categoria que reflete bem a questão das informações fornecidas à área operacional é a Categoria 3, que se refere à implantação do programa. Observa-se que os trabalhadores da área, muitas vezes, declaram não conhecer o programa e seus dados básicos, ainda que esses programas estejam em andamento, ou mesmo que as organizações já tenham obtido alguma certificação de gestão ambiental, como a ISO 14000 ou similares. Fica clara, assim, a contradição entre o discurso da área administrativa e o da área operacional, pois os trabalhadores que atuam em âmbito gerencial ou na área administrativa têm mais acesso às informações do programa, mas não as repassam de forma coerente às demais áreas da organização.

Ao serem inquiridos sobre as atividades de divulgação dos programas para os trabalhadores, do discurso dos trabalhadores da área administrativa emergiram respostas relacionadas à realização de palestras e treinamentos com vistas à sensibilização dos trabalhadores sobre o programa, Observa-se haver uma incoerência entre tais informações, já que as respostas dos trabalhadores da área operacional indicam desconhecimento de dados básicos dos programas e das ações desenvolvidas nas organizações onde atuam, Ao se questionar se a organização modificou algum processo após a implantação do SGA, o que se percebe é que não foram relatadas mudanças relacionadas à forma de os trabalhadores desenvolverem suas atividades rotineiras. Assim, não há uma adequação do sistemajunto aos trabalhadores, o que remete, mais uma vez, a um questionamento mais aprofundado acerca do motivo que leva as organizações a buscarem um SGA. A partir disso, indaga-se Se as organizações o fazem visando a utilizar o programa como marketing, para atender a exigências externas, ou se realmente objetivam desenvolver uma sensibilização dos trabalhadores em relação a questões ambientais e a ações que visem a prevenir e diminuir impactos negativos no meio ambiente.

De acordo com Reis e Queiroz (2002), um treinamento que vise a sensibilizar os trabalhadores para questão ambiental deve envolver aspectos de sensibilização ambiental, motivação e comunicação extensiva a todos os trabalhadores da organização. Um processo de treinamento e desenvolvimento eficaz deve envolver várias etapas e elementos essenciais, a saber:

- identificação das necessidades específicas de treinamento e desenvolvimento da organização;

- desenvolvimento de planos dirigidos de treinamento;

- verificação e avaliação da conformidade do programa de treinamento previsto com os requisitos legais ou organizacionais;

- treinamento de grupos específicos de trabalhadores de nível gerencial e operacional de todas as áreas da organização;

- documentação do treinamento realizado;

- avaliação dos resultados do treinamento recebido.

A seguir, apresentam-se alguns trechos de discurso dos trabalhadores sobre a categona de lmplantaçao:

Pela empresa é um grupo que define, um grupo que conhece mais a fundo a norma, que vai trabalhar para a certificação, aí faz uma proposta em que a norma define já mais ou menos, ela define as palavras que tem que consta na política, é ela meio que já dá o que tem que ter, ela fala que tem que constar várias palavras-chave ja. (G1)

Na realidade, nós fizemos algumas palestras aqui em horários diferentes pra tentar atingir todo mundo, porém é ... é difícil você conscientizar todo mundo é ... porque muitos não vendo fins lucrativos pro bolso dele, ele não participam muito. Então pode ser que você pergunte pra alguém e 'não, eu nao lembro'. (G1)

Não sei te dizer como foi feito, mas isso é um processo contínuo. (G2)

 

Categoria 4 - Medição e avaliação

Na maioria das entrevistas realizadas, constatou-se que não existem indicadores e monitoramento, nem produção de relatórios periódicos para se avaliar o desempenho ambiental das organizações. Alguns trabalhadores do grupo administrativo até reconhecem a necessidade de implantá-los, enquanto que os trabalhadores da área operacional não sabem do que se trata ou têm apenas uma vaga noção. Quando isso ocorre, atribui-se o conhecimento a outro departamento que não o seu.

Estes trechos de entrevista demonstram o desconhecimento sobre o monitoramento e ações periódicas:

Na verdade isso não tem assim, como tá muito no início até da estruturação não tem muito... ainda não tem monitoramento fiel, mensal, periódico que a gente tem de relatório das coisas que acontece, não. Tem alguns procedimentos descritos, alguns e... tem essa parte do treinamento que nós fizemos. Agora, monitoramento de algo que, né? de todas as práticas, isso não tem não. (G1)

Eu não acompanho essa parte. Se for só sobre Gestão Ambiental eu realmente não tenho, eu não acompanho. (G2)

 

Categoria 5 - Análise crítica e melhoria

Quanto a consumo de energia e de água, redução na produção de resíduos e níveis de poluição liberados, o grupo gerencial afirma que houve uma redução considerável, porém sem dados quantitativos sistematizados, enquanto o grupo de trabalhadores que atua na área operacional afirma que "acham que houve" uma redução, ou ainda que desconhece qualquer informação a esse respeito.

Foram considerados pontos positivos para a organização, após a implantação de ações de gestão ambiental: a divulgação de uma imagem institucional externa positiva; o sentimento de gratificação de algumas pessoas envolvidas com o programa, por contribuírem para a preservação do meio ambiente e a limpeza das ruas; o aumento da lucratividade, a partir do início da venda de materiais recicláveis; a economia na compra de produtos; e redução das faturas de pagamento de energia e água.

Mais do que aspectos negativos relacionados ao programa, podem-se detectar falhas relacionadas com a concepção, a falta de um planejamento que garanta a implantação de forma adequada e a falta de envolvimento da cúpula. Acrescentem-se ainda aspectos como a falta de indicadores claros e objetivos e a falta de acompanhamento e avaliação do programa. Todos esses fatores contribuíram para o comprometimento dos resultados.

Ficou clara a dificuldade marcante de entendimento e conhecimento do programa por parte dos trabalhadores, o que dificultou sobremaneira a emissão de respostas a algumas perguntas da entrevista. Registre-se ainda a constatação de que houve falhas na comunicação sobre o programa e as ações desenvolvidas, tendo em vista a inexistência quase generalizada de trabalhadores sensibilizados para a questão ambiental e sua importância. Infere-se que houve pouco investimento e envolvimento da cúpula para a implantação do programa, tendo em vista que os trabalhadores de ambos os grupos declararam que houve falta de divulgação, comunicação, execução, andamento e controle das práticas de gestão ambiental. Observou-se ainda certo constrangimento por parte de alguns trabalhadores da área operacional para responder, devido ao desconhecimento, apesar de alguns deles lamentarem desconhecer o assunto para responder as perguntas.

Sobre as análises críticas periódicas do SGA, quase todas as organizações pesquisadas não realizam tais análises e, quando as realizam, não o fazem periodicamente.

Para ilustrar esta categoria, seguem alguns trechos dos discursos dos participantes dos dois grupos:

Bom, a análise crítica periódica do sistema ela é efetuada é... através das, dos cargos hierárquicos superiores, né? (G1)

Então, de acordo com os acontecimentos, com a necessidadee... anualmente nós temos o programa é de... planejamento estratégico que é feito anualmente também. (G2)

Olha, eu não participei de nenhuma... palestra sobre gestão ambiental. Mas eu creio que a gente aprende muito, nê? Porque sendo bem divulgada... aí, acho que ajuda muito. (G2)

 

Conclusões

No que se refere à sensibilização sobre a questão ambiental, essa emerge em um momento em que cada trabalhador, consciente de suas responsabilidades com relação ao meio ambiente e às gerações futuras, age localmente, pensando de forma global. Essa sensibilização não ocorre simplesmente a partir da implantação de ações por parte das organizações, como meio de obter determinadas certificações, mas surge através da implantação de programas educativos, com troca de experiências, num respeito ao "saber fazer" existente em todas as culturas.

Verificou-se que tanto os trabalhadores de nível gerencial e quanto operacional das organizações pesquisadas desconhecem informações importantes sobre o SGA implantado onde atuam. Os resultados obtidos na pesquisa indicam que as organizações desenvolvem um envolvimento instrumental com o Sistema de Gestão Ambiental, visando a responder a pressões externas e a obter acesso à liberação de verbas e financiamentos, ou seja, são movidas por interesses econômicos. Dessa forma, como foi constatado na pesquisa realizada, as organizações optam por manipular os processos de gestão ambiental, de modo a apresentar uma política ambiental, ter algumas pessoas designadas para gerenciar o programa ou as ações, e até desenvolver algumas ações para divulgação interna para alguns trabalhadores. No entanto, o pouco que realizam serve para a construção de uma imagem institucional desenvolvida pela área de marketing, que divulga uma imagem de socialmente responsável, nem sempre condizente com as reais prioridades organizacionais.

Não se trata, como mencionado, de uma questão de sensibilização e conscientização dos membros da cúpula organizacional, ou mesmo seu envolvimento com a questão ambiental, mas de uma priorização de aspectos que visem à manutenção do sistema econômico capitalista e garantam lucro.

Nas organizações estudadas, perceberam-se muitas contradições, no que se refere à implantação do sistema de gestão ambiental. Os trabalhadores relataram que desconheciam a política de gestão ambiental. Compreende-se que as organizações ou não definiram sua política ambiental, ou a definiram apenas "no papel", mas não a divulgaram internamente para seus trabalhadores, o que indica que elas não assumiram compromissos efetivos relacionados com o meio ambiente ou com um processo de melhoria contínua. Outro aspecto que corrobora essa constatação são os poucos relatos de mudanças reais tanto na cultura organizacional quanto nos processos de adequação às exigências do sistema de gestão ambiental. Assim, pode,se afirmar que existe um discurso oficial que inclui uma política de gestão integrada, mas que nem sempre é divulgada para os trabalhadores, que quase sempre a desconhecem.

Ao iniciar a implantação do SGA, as organizações deveriam promover momentos de sensibilização e conscientização para todos os trabalhadores. Os resultados desta pesquisa não indicam que essas ações foram realizadas com tal extensão; aliás, foi relatado pelos trabalhadores que essas ações não ocorreram, deixando claro que a prioridade era enfocar interesses econômicos.

A incorporação dos conceitos de um SGA no cotidiano dos trabalhadores requer uma mudança de cultura em todos os níveis. A inserção desses novos conceitos na cultura da organização exige um sistema de sensibilização eficiente nos seus vários níveis hierárquicos, por meio do estabelecimento de um sistema de educação ambiental que mobilize todos os seus integrantes. Como as organizações atuavam com o sistema de gestão ambiental para atender a pressões externas, a preocupação em desenvolver ações de educação ambiental não era prioridade. Quando não há um envolvimento real da cúpula com o projeto, ele fica prejudicado, pois ocorre uma adoção de forma temporária e (ou) parcial da tecnologia em questão, para aplacar as pressões, sem, no entanto, serem realizadas mudanças consistentes naquilo que se considera intocável no status quo.

No que se refere ao item planejamento, percebeu-se, na pesquisa, que as organizações pesquisadas não consideraram as atividades e tarefas do proesso produtivo nem avaliaram seus respectivos impactos ambientais. Na análise feita, muitos núcleos se repetiram de forma expressiva. As repetições indicam de que não houve percepção da real necessidade da implantação do SGA. Houve falta de compromisso dos diretores das organizações, cujas ações não condizem com o discurso apresentado, aspectos esses considerados por Ackerman e Bauer (1976) como fundamentais para a inserção da questão ambiental na organização.

Autores como Leis et al. (1998). Donaire (1999) e Valle (2000) afirmam que, ao implantar o SGA, a organização deverá estabelecer quais são suas metas e objetivos, e eles devem estar coerentes com a política de gestão ambiental. Sua implementação deve levar em consideração a avaliação inicial e os aspectos ambientais mais significativos. Percebeu-se, na análise feita dos discursos apresentados, que essa categoria não estava clara nem para os gestores nem para os trabalhadores.

Com base nos dados apresentados, pode-se afirmar que os trabalhadores percebem o sistema de gestão ambiental das organizações onde atuam como uma incógnita, tendo em vista a falta de informações sobre ele. Como pôde ser observado pelos resultados da pesquisa, a questão ambiental, sistematizada ou não, já faz parte do ambiente das organizações estudadas, ainda que, na maioria delas, a prioridade não seja a preocupação direta com o meio ambiente, mas sim com fatores ligados a interesses econômicos. Mesmo que a questão ambiental se configure como uma variável secundária nos planos e ações das organizações, ainda que indiretamente se beneficiem dela, as pessoas envolvidas também podem ser beneficiadas, uma vez que, ao serem sensibilizadas e conscientizadas sobre a importância da questão ambiental, passam a desenvolver ações de caráter preventivo não apenas no ambiente laboral, mas também em outros contextos onde podem desenvolver práticas transformadoras de uma realidade social.

Assim, a questão ambiental se configura como um desafio para as organizações, que se vêem pressionadas a incluí-la em seu planejamento, mas que ainda não conseguiram dedicar-lhe a prioridade que merece. Mesmo assim, trata-se de um avanço em relação a um tempo em que "esses assuntos de meio ambiente" eram coisas só de naturalistas.

 

Referências

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1 Compõem a legenda: S para sujeito, seguido do número a ele correspondente; E para empresa, seguido do número a ela correspondente; e G para grupo, seguido de 1 para o nivel gerencia e 2 para o operacional.

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