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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. v.8 n.1 Florianópolis jun. 2008

 

ARTIGOS

 

A socialização organizacional dos servidores da UFRN, segundo grupo ocupacional e tempo de serviço

 

The organizational socialization to civil servants on UFRN in conformity to occupational groups and to the work time

 

 

Samid Danielle Costa de Oliveira*; Marília Alanna Bezerra Lino; Livia de Oliveira Borges; Virgínia Donizete de Carvalho; Simone Lopes de Melo; Alda Karoline Lima da Silva; Flávia Ribeiro Alves Bahia; Nayra Cury Souza; Glauber Steven

Universidade Federal do Rio Grande do Norte

 

 


RESUMO

A presente pesquisa empírica foi realizada com o objetivo de analisar a percepção dos servidores de uma universidade acerca do processo de socialização organizacional, segundo os grupos ocupacionais (docentes e funcionários técnicoadministrativos) e o tempo de serviço global e na instituição. Foi desenvolvida com uma amostra de 524 servidores, aos quais foram aplicados o Inventário de Socialização Organizacional e uma ficha sociodemográfica. Os resultados indicaram a tendência a uma socialização organizacional bem sucedida, embora existam grupos com dificuldades relevantes. Entre essas, chamaram a atenção aquelas referentes ao acesso à informação e à percepção de menos competência e proatividade pelos funcionários técnico-administrativos, à medida que avançam no tempo de serviço. Os resultados reclamam ações institucionais de suporte ao servidor.

Palavras-chave: socialização, universidade, servidores, questionário, tempo de trabalho.


ABSTRACT

This empirical research was developed to analyze civil servants' perception on the university about the organizational socialization process in conformity to occupational groups (professors, and technical bureaucratic functionaries), and to global and institutional work time. The research was developed with a sample of 524 civil servitors, to whom the Organizational Socialization Inventory and a socio-demographic form were applied. The results indicate a tendency to well succeed organizational socialization; however there are groups with relevant difficulties. Among them, the access of information, and the perception of less competence and pro-activity by the older technical bureaucratic functionaries can be detached. The results claim institutional actions of support to servants.

Keywords: socialization, university, civil servants, questionnaire, work time.


 

 

Introdução

O artigo relata pesquisa empírica realizada com o objetivo de analisar as diferenças de percepção dos servidores - docentes e funcionários técnicoadministrativos -, admitidos até 2005 na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, quanto à própria socialização organizacional e à relação de tal fenômeno ao tempo de serviço na instituição e global. Perseguir tal objetivo é relevante como um caminho para se buscarem respostas sobre que aspectos devem ser focalizados pela instituição para promover a socialização de seus servidores, principalmente os recém-admitidos.

O processo de socialização organizacional: os antecedentes teóricos

A atenção ao tema da socialização organizacional tem crescido entre pesquisadores, administradores e outros profissionais. A atual ênfase em produtividade tem ampliado a importância de todos os fenômenos que a ela podem estar relacionados, seja no setor privado, norteados pela competitividade mercadológica, seja no setor público, em que tal ênfase ganha uma conotação ética de preocupação com a aplicação de recursos públicos e a melhoria da prestação de serviços ao cidadão.

Os primeiros estudos sobre socialização organizacional, a exemplo daqueles sobre socialização na Psicologia Social, apresentavam as marcas do funcionalismo, corrente teórica segundo a qual o processo de socialização é entendido como "o mecanismo principal de que se utiliza o sistema social para garantir sua manutenção." (Álvaro e col., 2007, p. 53). É o caso da publicação de Schein (1968), que focaliza como as organizações socializavam seus empregados e apresenta uma consideração secundária sobre a ação dos próprios indivíduos, resumindo-se a identificar suas formas de reação em relação às ações organizacionais.

Embora tal perspectiva tenha exercido influência nos estudos sobre socialização organizacional, sobretudo nas primeiras pesquisas e publicações, foram ganhando espaço as concepções interacionistas simbólicas e construtivistas, as quais entendem o processo de socialização como uma relação entre as partes que o desenvolvem, de forma recíproca, a partir de proposta estabelecida conjuntamente, subordinada ao reconhecimento contínuo por parte dos membros da comunidade (Álvaro e col., 2007; Joas, 1999). Dessa forma, atualmente, a quase totalidade dos estudos tem se pautado, predominantemente, nos últimos enfoques (Borges e Albuquerque, 2004).

Conforme enfatiza Taormina (1997), é necessário considerar a noção de aceitação do contexto social da organização por parte do indivíduo, pois suas escolhas também vão ajudar a determinar se ele vai se adaptar ou não, em consenso com o ideal de que ambas as partes vão agir reciprocamente, transformando a socialização organizacional num processo de mão dupla.

Borges e Albuquerque (2004) referem-se a três enfoques principais na orientação dos estudos no campo da socialização organizacional: táticas organizacionais, conteúdos e informação, e tendências integradoras. Nos estudos voltados para as táticas organizacionais, a herança funcionalista se faz mais presente. O foco de atenção são as ações da organização que visam a facilitar o processo de socialização dos indivíduos. Nessa perspectiva, destacam-se os estudos de Van Maanen e Schein (1979) e de Jones (1986). Os primeiros identificaram seis dimensões bipolares que permeiam as táticas organizacionais: coletiva versus individual; formal versus informal; seqüencial versus randômica; fixa versus variável; serial versus disjuntiva; investimento versus desinvestimento. Jones (1986) acrescentou que cada uma das dimensões identificadas consiste em um contínuo, no qual um pólo representa as táticas institucionalizadas e o outro as táticas individualizadas. Além disso, observou que as seis dimensões poderiam ser organizadas em três diferentes grupos, estabelecendo o sistema de classificação visualizado no Quadro 1.

De acordo com Jones (1986) e Van Maanen e Schein (1979), as formas mais institucionalizadas de socialização se relacionam com uma maior expressão de satisfação e compromisso, menor intenção de desligamento da organização e maior redução da ansiedade. Por outro lado, as práticas individualizadas tendem a incentivar a inovação. Cada uma delas tem suas peculiaridades, e a sua maior ou menor adequação irá variar em conformidade com a natureza do contexto.

Bauer, Bodner, Erdogan, Truxillo & Tucker (2007) salientam que é importante examinar se as pesquisas futuras devem estudar as táticas de socialização de forma separada ou agregada. Argumentam contra a agregação, questionando se há concordância na classificação das táticas institucionalizadas versus individualizadas. Mais especificamente, apontam que fica pouco claro se a dimensão investimento se comporta como as outras táticas institucionalizadas. Quanto a esse aspecto, Ashforth, Sluss e Saks (2007) também reconhecem que o papel da tática de investimento na socialização institucionalizada tem sido contestado.

Tais controvérsias apontam para o fato de que, não obstante o montante de trabalho produzido no estudo das táticas organizacionais, esse enfoque continua interessando aos pesquisadores.

Além das referidas controvérsias mais atuais, até meados da década de 1990, a literatura sobre socialização organizacional era criticada por ser muito descritiva, com ênfase na testagem empírica, metodologicamente fraca e inadequada, teórica e conceitualmente fragmentada (Feldman, 1976; Fisher, 1986; Wanous e Colella, 1989, citado por Saks e Ashforth, 1997). No entanto, esse quadro mudou, pois as pesquisas começaram a se voltar para os aspectos relacionados ao papel do indivíduo e suas diferenças, bem como para questões referentes ao conteúdo e à aprendizagem envolvidos nos processos de socialização organizacional.

Borges e Albuquerque (2004) designaram esse conjunto de estudos como o enfoque nos conteúdos e na informação. As pesquisas em tal enfoque consideram a proatividade dos indivíduos, entendendo que os iniciantes em uma organização são agentes ativos, que buscam as pessoas e os locais de aprendizado julgados como valiosos para facilitar o próprio ajustamento, sendo capazes de influenciar as normas do grupo e os resultados de desempenho.

No que diz respeito ao conteúdo da socialização, entende-se que consiste num conjunto de aspectos relacionados ao trabalho, os quais são considerados essenciais ao aprendizado de um indivíduo, para que possa se tornar um membro proficiente e se sentir confortável na organização (Ashforth, Sluss e Saks, 2007).

Algumas das tipologias propostas nesse enfoque incluíram escalas para mensurar a aquisição de conteúdo. Ostroff e Kozlowski (1992), por exemplo, apresentaram uma medida de socialização organizacional que envolve quatro domínios de conteúdo: tarefas do emprego, papéis de trabalho, processos de grupo e atributos organizacionais. Outra medida, proposta por Chao e col. (1994), abrange: proficiência de desempenho, pessoas, políticas, história, linguagem e objetivos e valores organizacionais. Por meio do estudo empírico longitudinal em que identificaram tais dimensões, Chao e col. (1994) observaram também que, geralmente, as pessoas bem socializadas em seus papéis organizacionais têm maiores rendimentos pessoais, são mais satisfeitas, mais envolvidas com suas carreiras, mais adaptáveis e têm um melhor senso de identidade pessoal do que as que são menos socializadas.

Sintetizando as pesquisas nesse campo, Griffin, Colella e Goparaju (2000) listaram as diversas táticas proativas empregadas pelos indivíduos, tendo em vista sua própria socialização, a saber: busca de informação e feedback, construção de relacionamentos, tutorização informal, negociação de mudanças no posto de serviço, estruturação positiva, envolvimento em atividades associadas, autogerenciamento, modelação e observação, e desenvolvimento de carreira.

Tais estudos representaram um definitivo afastamento da perspectiva funcionalista e uma aproximação do interacionismo simbólico e do construtivismo social, considerando a atividade do sujeito em processo de socialização. Tal caminhada, entretanto, consolida-se com o surgimento das pesquisas e publicações que apresentaram as tendências aqui denominadas integradoras. Essas partem do pressuposto de que os enfoques anteriores (das táticas organizacionais e dos conteúdos e informações) não são excludentes, uma vez que as ações organizacionais não eliminam necessariamente a proatividade dos indivíduos e vice-versa. Há vários modelos construídos nesse sentido (Saks e Ashforth, 1997; Bauer e col., 2007; Ashforth, Sluss e Saks, 2007, dentre muitos outros).

Saks e Ashforth (1997) propuseram o Modelo do Processo Multinível de Socialização Organizacional. Partem da concepção de que uma diversidade de variáveis contextuais (extra-organizacionais, organizacionais, grupais e do posto de trabalho) pode influenciar os fatores de socialização, que se dividem em três grupos: organizacionais (táticas de socialização, programas de orientação, treinamento e tutoria), grupais (táticas de socialização, suporte social e aprendizagem social) e individuais (táticas e comportamentos proativos dos iniciantes). Os fatores de socialização e as cognições sobre o modo de fazer, por sua vez, tendem a influenciar diretamente a aquisição de informação, promovendo a redução de incertezas e o aprendizado em vários domínios de conteúdo, além de gerar resultados imediatos (por exemplo: maior clareza do papel social, motivação e integração) e de longo prazo (por exemplo: baixo absenteísmo e rotatividade e melhoria do desempenho) nos níveis organizacional, grupal e individual. Ashforth, Sluss e Saks (2007), aprofundando o referido modelo, observaram que as táticas institucionalizadas de socialização e o comportamento proativo se mostraram associados ao aprendizado dos iniciantes, e que tanto o processo de socialização (por meio de táticas institucionalizadas e comportamento proativo) quanto o aprendizado se encontraram associados com várias formas de ajustamento. Além disso, controlando a variável de aprendizagem, as táticas institucionalizadas e o comportamento proativo se mostraram associados, de forma independente, ao ajustamento.

Como é possível observar pela breve descrição de sua estrutura, trata-se de um modelo abrangente e de elevada complexidade. Entretanto, outros modelos integradores têm sido propostos. Dentre esses, encontra-se um modelo baseado em revisão de meta-análise, que, como explicam Bauer et al. (2007), limita-se às relações que tenham sido consistentemente estudadas na literatura em questão. Numa busca de integrar os antecedentes e os resultados do ajustamento, esses autores propõem o denominado Modelo do Ajustamento de Iniciantes durante a Socialização.

Tal modelo trata a clareza do papel, a auto-eficácia e a aceitação social como indicadores-chave do ajustamento. A busca de informação e as táticas organizacionais são propostas como antecedentes do ajustamento; enquanto a satisfação no trabalho, o comprometimento organizacional, o desempenho no trabalho, as intenções de permanecer na empresa e a rotatividade são considerados como resultados do ajustamento. Também são observados os efeitos moderadores de diferentes estratégias metodológicas sobre os estudos em socialização. De um modo geral, os resultados da meta-análise propiciaram suporte para o modelo apresentado na Figura 1.

O modelo de Bauer et al. (2007) é mais parcimonioso que aquele de Saks e Asforth (1997), o que poderá influenciar sua divulgação. No entanto, é menos abrangente e não articula variáveis e (ou) fenômenos de diferentes níveis de análise.

Uma vez apresentado, em síntese, o curso dos estudos teóricos e empíricos que vêm sendo desenvolvidos acerca do fenômeno da socialização organizacional, considera-se relevante destacar uma das táticas empregadas nesse processo: a tutorização organizacional. Tal tática está sendo aplicada na UFRN, de forma que é um dos elementos do contexto de pesquisa, o qual será descrito adiante.

A definição comumente apresentada para o processo de tutorização organizacional é de uma relação interpessoal intensa entre um funcionário que detém mais experiência na organização (o tutor) e um iniciante (tutorado), por meio da qual o tutor oferece orientações, suporte e feedback, indicando oportunidades de desenvolvimento ao tutorando, de forma a auxiliá-lo na construção de suas experiências de carreira (Russel e Adams, 1997; Scandura, 1997). Assim, um tutor contribui, facilitando o processo de socialização do tutorando na organização (Chao, Walz e Gardner, 1992).

Hunt e Michael (1983) salientam que os resultados das tutorizações podem ser relevantes tanto para a organização quanto para os tutores e os tutorandos. O estudo empreendido por Fagenson (1989) demonstrou que indivíduos tutorados têm maior satisfação, oportunidade e mobilidade na carreira, reconhecimento e índices mais elevados de promoções do que os não-tutorados. Ostroff e Kozlowski (1993) verificaram que indivíduos tutorados mostraram melhor desempenho em termos de aprendizagem das questões e das práticas organizacionais, quando comparados aos não-tutorados. Scandura (1997) destaca, dentre os benefícios mais citados na literatura, o aumento do comprometimento organizacional, da satisfação no trabalho, das expectativas de progresso na carreira e a redução do estresse relacionado ao papel organizacional e da intenção de deixar o emprego.

Com respeito à forma como se estabelece o processo de tutorização, é possível distinguir duas alternativas: a tutorização informal, que se encontra baseada em relações espontâneas entre membros juniores e seniores no ambiente de trabalho (Chao, Walz e Gardner, 1992; Russel e Adams, 1997), portanto, tática proativa do sujeito em socialização, como já classificaram Griffin, Colella e Goparaju (2000); e a tutorização formal ou organizacional, na qual a iniciativa é da instituição, e tutores são designados no contexto de um programa administrado e sancionado pela organização (Noe, 1988).

Um estudo desenvolvido por Chao, Walz e Gardner (1992) comparou os escores nos fatores de socialização entre três grupos de pessoas, que experimentaram processos organizacionais distintos: tutorização informal, tutorização formal e sem tutorização. Observou-se que, na maioria dos casos, os tutorados informais relataram níveis ligeiramente maiores de socialização organizacional, satisfação no trabalho e salários do que os formais. Alem disso, ambos os grupos tutorados apresentaram resultados melhores do que o grupo não-tutorado.

Por outro lado, Ostroff e Kozlowski (1993) argumentam a necessidade de um programa de tutorização organizacional, principalmente para iniciantes, tendo em vista que: a tutorização tem maior impacto logo após a entrada dos iniciantes na organização e, que nesse período, são menos prováveis de ocorrer as tutorizações informais. Cabe acrescentar a esse argumento o fato de que a tutorização formal tende a ter um caráter mais democrático, uma vez que garante possibilidades iguais de acesso a esse processo.

Sabe-se que as condições de entrada numa empresa diferem significativamente de um indivíduo para outro. Em alguns casos, os recém-admitidos têm a possibilidade de atuar junto a pessoas que já pertenciam a sua rede de relacionamentos, havendo, inclusive, circunstâncias nas quais são indicados para o cargo pelos próprios funcionários da empresa. Naturalmente, tais condições favorecem o desenvolvimento de relações de tutorização informais.

Por outro lado, existem os casos em que iniciantes ingressam em organizações para trabalhar junto a pessoas com as quais nunca havia estabelecido anteriormente qualquer tipo de contato. Além disso, há de serem considerados os problemas decorrentes das diferenças culturais que ocorrem quando o indivíduo se desloca para outras regiões ou outros países. Para esses, a possibilidade de contar com o apoio de um tutor informal se torna mais restrita.

No caso das universidades federais, a admissão ocorre por meio de concursos públicos abertos à participação de brasileiros e estrangeiros, sendo comuns os casos em que os indivíduos se deslocam de diversas regiões do país para assumir um cargo em outra localidade. Portanto, diferenças culturais, distanciamento de familiares entre outros problemas podem dificultar o processo de integração dos novos servidores às universidades, exigindo uma ação planejada para que a integração esperada se torne realidade.

Contexto e relevância da pesquisa

A Universidade Federal do Rio Grande do Norte, federalizada em 1960, tem apresentado um acentuado crescimento. No período entre 1995 e 2006, por exemplo, o número de ingressantes nos cursos de graduação cresceu em 109,47%, e o número de matrículas aumentou 45%. Atualmente, a comunidade acadêmica está constituída por mais de 27.000 estudantes, 1.638 docentes (sendo 1.317 do seu quadro permanente) e 3.062 funcionários técnico-administrativos. Esses números, aliados ao fato de que poucos concursos têm sido realizados ultima-mente, e que, ainda, muitos servidores têm se aposentado freqüentemente, indicam certa disparidade entre o volume de trabalho demandado e a quantidade de profissionais para executá-lo. Assinala-se que, entre 1995 e 2002, o quadro docente foi reduzido em 10% e o de funcionários técnico-administrativos em 18,1% (UFRN, 2007).

No que se refere à formação de tais profissionais, tem-se que, dentre os funcionários técnico-administrativos da UFRN, a predominância é de pessoas que ocupam cargos que exigem educação secundária (58,3%). O quadro de docentes é constituído por 48,8% de profissionais que apresentam o título de doutor e 28,9%, o título de mestre, o que posiciona a UFRN no mesmo patamar das instituições federais de ensino superior brasileiras, cujo quadro é composto por 46,7% de doutores e 28,1% de mestres (INEP, 2006).

Os servidores estão submetidos ao regime de trabalho designado como estatutário e dispõem de estabilidade no emprego, conquistada ao final do estágio probatório (três anos de duração). Os professores contam com um plano de cargos e salários, considerado defasado, por contar com poucos níveis para a atualidade, pois que hoje já são contratados com titulação de doutor. Para amenizar o problema, em 2007, o governo federal implantou mais um nível em tal plano (professor associado, nível intermediário entre o Professor Adjunto IV e o professor Titular). Reajustes nos valores salariais de cada nível, considerados também defasados, foram negociados no mesmo ano. Há algum tempo, os funcionários técnico-administrativos reivindicavam um novo plano de carreira que incentivasse o desempenho. O referido plano se encontra em desenvolvimento (http://www.prh.ufrn.br/DDRH/conteudo/daa/plano.htm).

A despeito da história de crescimento da UFRN, já indicada, não faltam problemas referentes ao gerenciamento de pessoal. Um deles, comentado no diaa-dia da universidade, é a diferença de desempenho entre setores, centros e servidores. Outro problema é a evasão de servidores, fato que afeta mais visivelmente as IFES situadas em estados historicamente menos desenvolvidos. Pesquisa exploratória realizada anteriormente (Borges, Ros, Silva, Melo e Oliveira, submetido) constatou a existência de dificuldades com relação aos processos de socialização na UFRN. A análise de conteúdo de entrevistas revelou que os novos servidores enfrentavam problemas em suas vivências no trabalho, tais como: a omissão da instituição em estimular ou agir, para facilitar a integração dos novos servidores; o predomínio de aspectos proteladores do processo de integração sobre os aspectos facilitadores; a existência de problemas de ordem geral, como a limitação dos recursos existentes, atinentes à infra-estrutura básica; além das diferenças acentuadas no processo de socialização entre servidores da instituição. Tais problemas são mais significativos quando se considera que, na maioria dos casos, o poder público investiu no recrutamento e (ou) qualificação dos servidores.

Problemas como os referidos justificam as ações empreendidas pela Próreitoria de Recursos Humanos da instituição, que, em 2007, por exemplo, implantou novo sistema de avaliação de desempenho do servidor técnicoadministrativo (UFRN, 2007), além de dispensar maior atenção aos recémadmitidos, com vistas à otimização de desempenho e à retenção de profissionais na instituição. Por conseqüência, a UFRN tem levado a cabo a implantação de um programa de tutorização organizacional, com o objetivo de oferecer apoio institucional ao desempenho (e à proatividade) dos novos servidores, por meio da figura de um tutor (servidor que detém experiência na organização) que o acompanhará durante o período de estágio probatório, a partir da elaboração de um plano de trabalho (UFRN, 2006a; 2006b).

Rompendo com a classificação de Jones (1986) e resgatando as dimensões das táticas organizacionais de Van Maanen e Schein (1979), o programa de tutorização organizacional da UFRN, mesmo que institucionalizado na sua aplicação, consiste em uma tática individualizada, pois cada servidor é acompanhado individualmente pelo tutor. É predominantemente informal, porque ocorre em serviço. É variável, porque, apesar de ter o prazo final fixo coincidindo com o final do estágio probatório, cada díade (tutor e tutorando), no plano de trabalho, estabelece um ritmo próprio. As datas de registros do processo, entretanto, caracterizam o programa como uma tática seqüencial, embora seja variável o que é esperado a cada momento de registro. É moderadamente disjuntivo, porque se centra no desenvolvimento da autonomia do tutorando, apoiado na experiência do tutor. É, por fim, de investimento, porque busca aproveitar as experiências e qualificação anterior do novo servidor em direção à promoção do seu desempenho na UFRN, dimensão tática que se revela presente desde o processo de recrutamento e seleção (concurso).

É nesse contexto que os objetivos da presente pesquisa têm um sentido de produção de conhecimento aplicado. Ter informações sistemáticas acerca da percepção do servidor sobre sua própria integração à UFRN e seu trabalho certamente poderá funcionar como orientação a tutores e dirigentes no relacionamento com os tutorandos e (ou) subordinados, auxiliando a centralizar suas ações ou orientações nos pontos mais relevantes.

Analisar o nível de socialização organizacional por grupo ocupacional é estratégico para poder apreciar suas especificidades, pois que os docentes exercem atribuições relacionadas diretamente às funções fins da universidade - ensino, pesquisa e extensão -, enquanto os servidores técnico-administrativos exercem atribuições referentes ao provimento dos meios necessários ao desenvolvimento daquelas funções, realizando registros, cuidando da infra-estrutura básica e (ou) contribuindo para a manutenção e continuidade da prestação de serviços.

Levar em conta o tempo de trabalho na instituição e na vida do indivíduo significa ter em conta a experiência da pessoa com a organização e na vida em geral. Será importante para obter uma avaliação do impacto do seu contato com a mesma e da efetividade das medidas institucionais ao longo do tempo.

 

Método

Questões de pesquisa

Tendo em vista a consecução do objetivo anunciado no início deste artigo, a pesquisa se orientou pelas seguintes questões:

• Em que funcionários técnico-administrativos e docentes diferem na percepção do seu processo de socialização organizacional?

• A percepção do processo de socialização organizacional varia com o tempo de serviço?

• As diferenças e semelhanças de percepção do processo de socialização organizacional por tempo de serviço se mantêm, controlado o grupo ocupacional?

Participantes

A população da pesquisa são os servidores admitidos na UFRN até 2005 e que tinham ao menos um ano de serviço na instituição antes da implantação do programa de tutorização organizacional (2006). Aamostra (acidental) foi constituída por 358 (68,3%) funcionários técnico-administrativos e 166 (31,7%) docentes, totalizando 524 participantes. As proporções entre funcionários técnico-administrativos e docentes, e entre os tipos de cargos dos funcionários técnico-administrativos reproduzem aproximadamente a mesma proporção do quadro de pessoal da UFRN, o que é um bom indicador de representatividade.

Os participantes têm, em média, 41,3 anos de idade (desvio-padrão = 9,66) e são 40,8% do sexo masculino e 59,2% do sexo feminino. Amaioria deles é católica (58,6%), casada (56,7%) e possui filhos (68,7%). Quanto à instrução, entre os docentes predomina o grau de doutor (65%), seguido do grau de mestre (27,4%) e, entre os funcionários técnico-administrativos, predomina a formação superior (30,8%), seguida da formação média (29,4%) e do grau de especialista (25,5%). Tal composição da amostra por nível de instrução indica que há muitos ocupantes de cargos técnicos de nível médio com formação superior e (ou) de especialista. Tal característica da amostra corresponde ao que se sabe na universidade sobre a freqüência dos chamados desvios de função, fato que demonstra que os cargos universitários seguem atrativos.

Instrumentos

Utilizou-se o Inventário de Socialização Organizacional (ISO), que é um instrumento de mensuração do nível de socialização organizacional adaptado e validado para os servidores da UFRN e que foi elaborado a partir do Inventário de Socialização Organizacional de autoria de Chao e col. (1994). Tal questionário fora adaptado anteriormente com uma amostra de trabalhadores brasilienses (Borges, Ros e Tamayo, 2001). Aquela versão foi revista com base em entrevistas com docentes e funcionários técnico-administrativos na UFRN e na revisão da literatura especializada publicada entre 1994 e 2004. Reconstruíram-se e criaram-se itens. Submeteram-se os mesmos a um teste de especialistas, com seis participantes (três professores da UFRN e três professores da Universidade Complutense de Madri). O novo inventário conta com 54 itens, com respostas em uma escala que varia gradualmente entre -2 (forte discordância) e 2 (forte concordância), passando por -1 (discordância), 0 (neutro) e 1 (concordância).

O ISO foi submetido à análise fatorial (principal axis factoring), mostrandose capaz de mensurar sete fatores, cujos coeficientes alfa de Cronbach (indicadores de consistência) variam de 0,70 a 0,83 (Quadro 2). Portanto, todos os fatores apresentam aceitável consistência.

Além do ISO, utilizou-se uma ficha sociodemográfica e ocupacional para obter uma descrição da amostra e para coletar os dados referentes a variáveis como: grupos ocupacionais e tempo de serviço.

Procedimentos de coleta de dados

Escolheu-se uma amostra aleatória dos servidores da UFRN, admitidos até 2005, com mil participantes, a partir do número de matrícula desses servidores. Aos selecionados se enviou mala direta com o protocolo de coleta de dados (ISO e ficha sociodemográfica), uma carta do Pró-reitor de Recursos Humanos que discorria sobre a importância da pesquisa, uma carta do próprio grupo de pesquisa que solicitava o preenchimento dos questionários e um envelope previamente endereçado para a devolução desse material. Utilizou-se o serviço de malote interno da própria universidade.

Para reforçar o interesse em responder aos questionários, a equipe de pesquisa desenvolveu campanha de incentivo à devolução dos inventários nos diversos setores da UFRN, visitando setor a setor. E, em alguns setores onde se constatou morosidade do serviço de malote, a equipe também auxiliou tal entrega.

A devolução dos questionários devidamente preenchidos dependeu da acessibilidade e do interesse dos servidores em cooperar com a pesquisa, fato que determinou que a amostra, inicialmente aleatória, se tornasse não-probabilística do tipo acidental.

Procedimentos de análise de dados

As respostas dos participantes foram registradas na forma de banco de dados do SPSS (Statistical Package of Social Science) e, em seguida, recodificaram-se aquelas referentes ao ISO, inicialmente na escala de -2 a 2, para a escala de 1 a 5. Os escores nos fatores foram estimados pela média dos pontos atribuídos pelos participantes, ponderados pelas cargas do item no fator. Com as rotinas disponíveis no SPSS, desenvolveram-se as análises estatísticas que serão descritas na seção subseqüente.

 

Resultados

Os escores nos fatores de socialização organizacional e o grupo ocupacional

Os escores por fator dos participantes são sintetizados aqui pelas médias e medidas de dispersão (desvio-padrão, mínimo e máximo) conforme Tabela 1. A escala utilizada tinha, na pontuação 3, o ponto neutro (nem discordo, nem concordo); portanto, a primeira observação a ser feita é que, em média, os servidores se percebem como bem socializados em todos os fatores mensurados, embora existam diferenças significativas entre as médias (F=56.512,03 para p<0,001). Destacam-se positivamente os escores médios em Qualificação Profissional (M=4,52), Competência e Proatividade (M=4,32) e Integração às Pessoas (M=4,19). Os desvios-padrão também moderadamente pequenos indicam acentuada concentração dos participantes em torno da média.

Porém é preciso observar que há um fator cujo escore médio está bem próximo do ponto neutro (1,68), o fator de Não-integração à Organização, cujos itens são de conteúdo negativo. Se tal escore fosse invertido, para se considerar a Integração à Organização, a média seria 3,32. Com isso, fica evidente uma tendência à percepção de dificuldade de integração com a instituição como um todo. Compete observar que as médias de Acesso à Informação (3,67) e de Linguagem e Tradição (3,87) estão abaixo de 4,00. Há, portanto, uma tendência a escores que variam entre o ponto neutro e 'concordo', que deve ser apreciada ao menos como um sinal de alerta, principalmente ao se observar que o desvio-padrão dos escores no fator de Acesso às Informações é o mais elevado. Considerando-se a mediana, nota-se que 50% dos participantes apresentam escores menores que 3,78, corroborando as observações anteriores. No fator Linguagem e Tradição, cuja dispersão é um pouco menor, 50% da amostra apresenta escores até 3,91.

A média do fator Objetivos e Valores Organizacionais coincide com o escore 4,00; contudo, o desvio-padrão é tão elevado quanto do primeiro fator. Observando-se a mediana, constata-se que 50% dos participantes apresentam escore abaixo da média. Portanto, há, nesse caso, também sinal de alerta.

Observados tais resultados, aplicou-se o teste t, comparando os funcionários técnico-administrativos aos docentes (Tabela 2). Percebeu-se que há diferenças significativas (p<0,05) entre as médias apresentadas nos fatores designados por Acesso às Informações, Competência e Proatividade, Integração às Pessoas e Objetivos e Valores Organizacionais. O mesmo não se observa entre as médias nos demais fatores: Não-integração à Organização, Qualificação Profissional e Linguagem e Tradição.

Percebeu-se que os professores de nível superior tendem a perceber mais acesso à informação, a se considerarem mais competentes e proativos, mais integrados às pessoas e com mais clareza quanto aos objetivos e valores organizacionais. Isso indica que os professores percebem-se mais aptos para criar, ser eficaz, produtivo e ativo na busca de informações dentro do contexto de trabalho. Mas as médias apontam que ambos os grupos se avaliam positivamente em tais fatores.

A partir da idéia de que o grupo ocupacional de funcionários técnicoadministrativos é muito heterogêneo, foram analisados os fatores também dentro desse grupo de servidores, comparando-se aqueles que exercem cargos de nível superior com aqueles de nível médio.

Percebe-se, a partir da análise da Tabela 2, que as diferenças encontradas entre docentes e funcionários técnico-administrativos não se mantêm quando se comparam técnicos de nível superior aos de nível médio (Tabela 3). Em compensação, emerge outra diferença: os técnicos de nível superior se percebem mais qualificados para os cargos que ocupam que os técnicos de nível médio.

Os escores nos fatores de socialização organizacional e o tempo de serviço

O tempo médio de serviço da amostra na instituição é de 9,95 anos, com desvio-padrão de 8,68, variando de um ano de serviço a 44 anos. A mediana da amostra em tal variável é 5,29. Portanto, apesar da amplitude da variação do tempo de serviço na instituição, há muito mais participantes com pouco tempo de instituição, já que a mediana é muito baixa. O tempo de serviço total das pessoas (desde que começaram a trabalhar, independentemente da atividade) apresenta uma média de 19,9 anos com desvio-padrão de 5,25. Considerando a diferença entre essas duas médias e também a idade média, já referida na descrição da amostra (M=41,23), está claro que o emprego na UFRN não é o primeiro trabalho para muitos servidores.

Estimaram-se, então, os coeficientes de correlação de Pearson entre os escores nos fatores de socialização organizacional e os tempos de serviço na instituição e total (Tabela 4). Encontrou-se, então, que três fatores apresentam correlações estatisticamente significativas (p<0,05) e positivas com o tempo de serviço na instituição, embora com magnitudes modestas, sendo eles: Acesso às Informações (r=0,12); Objetivos e Valores Organizacionais (r=0,17) e Linguagem e Tradição (r=0,21). Tais correlações indicam que, quanto mais tempo na instituição, maior é o acesso às informações, o conhecimento e identificação dos objetivos e valores organizacionais e o domínio da linguagem e tradição organizacionais. Entretanto, também se observam correlações positivas e significativas dos mesmos fatores com o tempo total de serviço, inclusive com semelhantes magnitudes dos coeficientes de Pearson. Isso indica que tanto o contato continuado com a organização na condição de servidor quanto o fato de seguir trabalhando promove a socialização das pessoas nos aspectos abrangidos pelos referidos fatores. Controlando tais correlações por grupo ocupacional, constata-se que a correlação do tempo de serviço na instituição com os escores no fator Acesso às Informações se mantém significativa apenas para os docentes (r=0,25, p=0,001). As correlações com os fatores Objetivos e Valores Organizacionais e Linguagem e Tradição se mantêm para ambos os grupos, sendo que crescem de magnitude para os docentes (respectivamente r=0,23 para p=0,003; r=0,42 para p<0,001).

O fator Competência e Proatividade, entretanto, apresentou correlação negativa e significativa com o tempo de serviço na instituição (r=-0,21 para p<0,001). A mesma correlação não existe com o tempo total de serviço. Isso indica que é a experiência com a instituição, e não com o trabalho, que provavelmente conduz o servidor a se perceber como menos competente e proativo. Controlando tal correlação por grupo ocupacional, constata-se que ela se mantém significativa e negativa apenas para os funcionários técnico-administrativos (r=-0,21 para p<0,001).

O tempo de serviço total dos participantes ainda se correlaciona positivamente e significativamente (r=0,14, p=0,002) com o fator Qualificação Profissional, apesar de o tempo de serviço na instituição não apresentar correlação significativa com o referido fator. Isso significa que o servidor já ingressa na UFRN com a percepção de que possui a qualificação necessária. Tal correlação, quando controlada por grupo ocupacional, mantém-se para ambos os grupos.

Até aqui, as análises realizadas focalizaram os fatores de socialização organizacional em separado, nas suas relações com grupos ocupacionais e tempo de serviço. Na tentativa de uma apreensão do fenômeno em sua globalidade ou poder delimitar perfis de socialização organizacional, aplicaram-se análises de clusters no conjunto dos escores nos sete fatores de socialização, identificando sete perfis.

Na Tabela 5, observa-se que o perfil que corresponde a uma socialização mais bem sucedida, Perfil da Plena Socialização, é o majoritário, o que corrobora a observação geral da Tabela 1. O segundo perfil por freqüência de participantes é o designado como Perfil da Socialização Amistosa, no qual, embora seus participantes não se percebam como tão bem sucedidos quanto aqueles do perfil anterior, estão seguros que estão bem integrados aos pares.

O terceiro perfil é o designado como Centrado na Tarefa e nas Pessoas e apresenta suas maiores médias em Qualificação Profissional, Competência e Proatividade e Integração às Pessoas. Compartilha com o grupo majoritário a concordância de que têm Acesso às Informações (M=4,04). O quinto perfil, designado de Distante da Organização, apresenta média inferior ao ponto neutro no fator Acesso às Informações (M=2,76) e ponto neutro em dois fatores Linguagem e Tradição (M=3,00) e Objetivos e Valores Organizacionais (M=3,11). Portanto, os participantes com esse perfil têm dúvida sobre a sua socialização em tais aspectos; todos referentes à organização. O sexto perfil, designado por Socialização Moderada Competente, apresenta semelhanças com relação ao Perfil da Socialização Amistosa sendo que, só nos fatores de Competência e Proatividade e Qualificação Profissional, os participantes ultrapassam a média 4 (concordo). O grupo minoritário (N=21), o Não-socializado, não atinge média quatro em nenhum dos fatores.

Explorou-se se há variação de freqüência de tais perfis por grupo ocupacional, mas o teste Qui-quadrado aplicado não rejeitou a possibilidade de a variação encontrada ser casual. Investigou-se também se as médias de tempo de serviço apresentam diferenças significativas por perfil de socialização organizacional, aplicando-se a ANOVA (Tabela 5). O teste aplicado confirmou a existência de diferenças significativas tanto para as médias referentes ao tempo de serviço na instituição quanto para aquelas referentes ao tempo de serviço total. Observa-se, então, que os perfis mais problemáticos - Perfil Distante da Organização e Perfil Não-Socializado - são exatamente apresentados pelos servidores com menos tempo de serviço. Mas os perfis nos quais os participantes apresentam mais tempo de serviço, em média, não são aqueles correspondentes a uma percepção de melhor socialização, mas o Perfil Moderado Competente e o Perfil Indiferente. Portanto, conclui-se que existe uma relação curvilinear da socialização organizacional global com o tempo de serviço, o que corrobora o fato de as magnitudes das correlações (Tabela 4) serem modestas.

Sobre a relação dos perfis com o tempo de serviço, é importante destacar que nenhum perfil apresentou um tempo muito baixo de serviço na instituição a despeito de a amostra apresentar uma concentração maior de pessoas com poucos anos de serviço. Isso significa que, mesmo entre aqueles que apresentam os perfis mais problemáticos, há pessoas com bastante tempo anterior de trabalho, o que corrobora a observação já feita anteriormente de que a experiência com a organização tem impactado pouco na promoção da socialização dos servidores.

Discussão e outras considerações

Com o objetivo de analisar as diferenças de percepção dos servidores da UFRN quanto à própria socialização organizacional e a relação de tal fenômeno ao tempo de serviço, o estudo empreendido possibilitou algumas observações relevantes. A primeira delas refere-se ao fato de que há uma tendência geral a uma socialização bem sucedida, não obstante haja as diferenças significativas entre as médias obtidas para os fatores mensurados e diferentes perfis.

Um ponto crítico identificado foi a percepção de dificuldade de Acesso à Informação, que se mostrou mais acentuada em determinados grupos, chegando mesmo a uma apreciação negativa por parte daqueles cujos perfis foram identificados como Distante da Organização e Não-Socializado. Nesses mesmos perfis, verificou-se, ainda, uma tendência de avaliação neutra quanto ao fator de Linguagem e Tradição. Além disso, o Perfil Não-Socializado indicou discordância quanto à apreensão dos Objetivos e Valores Organizacionais e à Integração às Pessoas na Organização, denotando expressiva dificuldade por parte dos componentes desse grupo em se adaptarem ao ambiente organizacional. O Perfil Distante da Organização, por sua vez, apresentou, ainda, uma apreciação neutra quanto aos Objetivos e Valores Organizacionais, sendo que a limitação desse grupo, no processo de socialização, parece estar mais relacionada aos aspectos referentes ao entendimento da organização e de suas políticas.

No que se refere à correlação entre o tempo de serviço e os fatores de socialização organizacional, uma constatação preocupante foi a de que, entre os servidores técnico-administrativos, a percepção de Competência e Proatividade diminui à medida que aumenta o tempo de permanência na instituição. As razões para tal ocorrência podem estar relacionadas à natureza do trabalho desenvolvido, que se constitui como atividade-meio e tende a ser menos valorizada no ambiente acadêmico. Mas pode estar associado também a problemas com o plano de carreira funcional, que não oferece suficiente perspectiva de crescimento profissional e reconhecimento, desencorajando os esforços no sentido de se manter proativo. É possível ainda que haja uma associação com aspectos da cultura organizacional que não valorizem a experiência do funcionário técnicoadministrativo. Modelos que articulam fenômenos e (ou) variáveis de diferentes níveis de análise - como o Modelo do Processo Multinível de Socialização Organizacional, anteriormente citado - sustentam pensar que as explicações levantadas aqui podem ser complementares e não alternativas uma à outra. A verificação da adequação de tais explicações, entretanto, pode ficar como sugestão para novos estudos.

Apesar do avanço internacional das pesquisas sobre socialização organizacional, no Brasil, as pesquisas sobre o assunto ainda são poucas, o que dificulta a comparação de resultados empíricos. No entanto, é preciso assinalar que Borges, Ros e Tamayo (2001), apesar de não aplicarem exatamente o mesmo questionário aqui utilizado, contavam em sua pesquisa com um fator de Competência, e os resultados apontaram variação significativa de escores nesse fator, entre diferentes ocupações (operários da construção civil e trabalhadores de redes de supermercados), mas não relataram nenhuma variação por tempo de serviço. Esse fato corrobora a idéia de que tal relação, inversamente proporcional entre a percepção da Competência e Proatividade e tempo de serviço é uma singularidade dos funcionários técnico-administrativos. É preciso pensar, portanto, como tal relação está sendo construída nas práticas organizacionais.

As relações encontradas entre o tempo de serviço na instituição e a qualidade da socialização apontam, ora para um baixo impacto da experiência organizacional na promoção da socialização, ora para um impacto em direção indesejada. Esse fato enfatiza a necessidade de ações institucionais, tais como as que vêm sendo empreendidas pelo Programa de Tutorização, recentemente implantado na instituição.

Tendo sido identificada, por exemplo, a dificuldade de acesso à informação como um ponto crítico na socialização, entende-se que os tutores podem atuar como facilitadores nesse processo. Não se pode negar a existência de importantes ações voltadas à socialização da informação na instituição, como a atualização freqüente da página da UFRN na internet e a qualidade da rede interna. Entretanto, provavelmente algumas informações relevantes circulam apenas pelos canais informais e presenciais, espaço interpessoal no qual, a contribuição do tutor é valiosa. E, ainda, dirigindo a atenção a outros aspectos da socialização, ações oportunas por parte do tutor são necessárias, especialmente no que concerne ao desenvolvimento da proatividade.

Os resultados alertam, principalmente quanto ao tutor, para a necessidade de dispensar diferentes atenções, considerando a experiência anterior à UFRN dos diferentes recém-admitidos, apoiando-os para o aproveitamento adequado das experiências, ou oferecendo mais apoio para entenderem o funcionamento do serviço público, quando a experiência anterior é escassa.

Areflexão sobre os resultados também gerou novas indagações que podem ser objeto de outras pesquisas, tais como: a percepção dos servidores de que são bem qualificados desde seu ingresso na instituição pode está associada à baixa receptividade a ações organizacionais, como a oferta de treinamentos, e à própria tutorização? O discurso de senso comum, que circula na UFRN, quanto à falta de infra-estrutura e de apoio em geral ao trabalho de cada um, além de seus aspectos reais, tem também uma função de evidenciar o mérito do servidor, baseado na sua própria qualificação, como se existisse uma intenção de mostrar que não precisa da estrutura da Universidade? O fato de haver muitos servidores em cargos técnico-administrativos, com formação superior ou maior, estaria afetando a percepção de redução da Competência e Proatividade com o avanço da experiência na instituição?

 

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