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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.11 no.1 Florianópolis jun. 2011

 

ARTIGO

 

A Relação entre comprometimento organizacional e impacto do treinamento no trabalho

 

The relationship between organizational commitment and training impact at work

 

 

Graciliano Martins dos Santos FilhoI; Luciana MourãoII

IMestre em Psicologia (Universidade Salgado de Oliveira, 2010). Professor da Faculdade Adventista da Bahia. graciliano1@gmail.com. http://lattes.cnpq.br/6440086128583256
IIDoutora em Psicologia (UnB, 2004). Professora do Mestrado em Psicologia da Universidade Salgado de Oliveira - UNIVERSO. mourão.luciana@gmail.com. http://lattes.cnpq.br/2558400549506524

 

 


RESUMO

Este artigo aborda dois temas muito frequentes dentro do espaço reflexivo e prático de Gestão de Pessoas -Comprometimento e Treinamento -, que refletem dois campos temáticos pouco afeitos ao diálogo (o comportamental e o ferramental). A relevância do tema impacto do treinamento no trabalho tem sido ampliada pela crescente necessidade de qualificação e requalificação da mão-de-obra. O tema comprometimento no trabalho também vem sendo bastante estudado nas últimas décadas, com resultados claros sobre sua influência em variáveis como desempenho e satisfação no trabalho. Assim, esta pesquisa objetivou investigar se o comprometimento organizacional de base afetiva, normativa e de continuidade prediz o impacto do treinamento no nível do comportamento no cargo. A pesquisa foi realizada em 23 organizações públicas, privadas e do terceiro setor nos Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro. Participaram da pesquisa 403 pessoas, totalizando 377 questionários válidos. As análises iniciais dos dados apontaram alta correlação entre as bases de compromentimento e um comprometimento de ordem afetiva superior ao normativo e também ao comprometimento de continuidade. A regressão hierárquica mostrou que apenas o comprometimento afetivo prediz o impacto do treinamento no trabalho. Esse achado corrobora os argumentos de outros autores de que as pesquisas sobre comprometimento devem se concentrar, sobretudo, na base afetiva. Os resultados fortalecem a discussão sobre o fato de as bases normativa e de continuidade serem ou não consideradas dimensões do comprometimento. Tais resultados são discutidos tendo como referência os modelos teóricos e evidências empíricas que respaldaram a pesquisa.

Palavras-chave: comprometimento afetivo, comprometimento normativo, comprometimento de continuidade, impacto do treinamento no trabalho.


ABSTRACT

This article addresses two very common themes within the reflective and practical space of People Management -Commitment and Training - that frame two thematic areas little accustomed to dialogue (the behavioral and the instrumental).The relevance of the topic of training impact at work has broadened with the growing need for training and retraining of manpower. The subject of organizational commitment has been extensively studied in recent decades, with clear results about its influence on variables such as performance and job satisfaction. Thus this study aimed to investigate whether organizational commitment, on the basis of affective, normative, and continuance components, predicts the impact of training on the level of on-the-job behavior. The survey was conducted in a total of 23 public, private and third sector organizations in the states of Minas Gerais and Rio de Janeiro. In total, 403 people participated in the research, with 377 questionnaires considered valid. Initial analysis of the data indicated a high correlation among the components of commitment, and an affective commitment higher than the normative, and also higher than continuance commitment. Hierarchical regression showed that only affective commitment predicts training impact on work. This finding supports the arguments of other authors that studies on commitment should focus particularly on the affective basis. In addition, the results strengthen the discussion on whether the normative and continuance components should or should not be considered as dimensions of commitment. These results are discussed, using as reference the theoretical models and empirical evidence which backed up the research.

Keywords: affective commitment, normative commitment, continuance commitment, training impact at work.


 

 

Nos Estados Unidos os investimentos em ações de Treinamento, Desenvolvimento e Educação - TD&E variam anualmente entre 55,3 bilhões e 200 bilhões de dólares - algo correspondente a cerca de 1% do Produto Interno Bruto daquele país (Salas & Cannon-Bowers, 2001). Aguinis e Kraiger (2009) confirmam esse alto investimento quando relatam uma publicação da American Society for Training and Development (ASTD), que indica que as organizações nos Estados Unidos investem mais de 126 bilhões de dólares anualmente no treinamento e desenvolvimento de funcionários (Paradise, 2007). Na Europa, estudo apresentado por Bassanini e colaboradores (2005), mostra que dos 26 países europeus pesquisados, os que apresentam maior investimento por empregado são Dinamarca, Suécia, Holanda, França, Finlândia e Bélgica, com valores que variam de 41 (Romênia) a 1.132 euros anuais (Dinamarca). Raelin e Coghlan (2006) destacam, contudo, que apesar do grande investimento feito em treinamento, é crescente a preocupação com o baixo retorno dessas ações, estimando que menos de 5% da aprendizagem em treinamentos de executivos seja, de fato, transferida para o trabalho. Mas o que explica o impacto das ações de treinamento?

O presente artigo buscou contribuir para essa indagação apresentando uma pesquisa quantitativa, com o uso de escalas previamente validadas, que permitiram investigar a relação entre comprometimento organizacional e o impacto do treinamento no trabalho no nível individual. Pesquisando um conjunto de mais de duas dezenas de organizações em dois estados brasileiros, a proposta foi verificar se um grau de comprometimento mais elevado em pessoas que participaram de ações de treinamento resultaria em uma percepção de maior impacto das ações de capacitação no desempenho no cargo. Paralelamente, também deseja-se investigar se cada uma das bases de comprometimento afetivo, normativo e de continuidade, conforme definidas por Meyer e Allen (1991), atua como preditor do impacto do treinamento no trabalho.

Embora já tenham sido realizadas muitas pesquisas sobre comprometimento organizacional, ainda há espaço para investigar sobretudo os seus consequentes (Mathieu e Zajac, 1990; Medeiros, Albuquerque, Siqueira e Marques, 2003; Rodrigues, 2009) em função do desbalanço das pesquisas na área, nas quais o comprometimento é predominantemente investigado como variável critério.

 

Avaliação do Impacto de Treinamento

Rodrigues (2000) apresenta detalhada definição de treinamento, a qual associa o treinamento a uma ação instrucional planejada que busca a melhoraria do desempenho: "Treinamento é um esforço intencional da organização, no sentido de promover eventos sistematicamente planejados, com o fim de facilitar a aprendizagem de comportamentos relacionados ao trabalho por parte de seus empregados, ou seja, é uma aquisição planejada e sistemática de conhecimentos, regras, atitudes, conceitos ou habilidades com o objetivo de melhorar o desempenho no trabalho" (Rodrigues, 2000, p. 4). Apesar da avaliação de treinamento, segundo Salas e Cannon-Bowers (2001), ser trabalhosa, cara e muitas vezes portadora de más notícias, tem havido crescimento das demandas de avaliação de treinamento (Aguinis e Kraiger, 2009), o que evidencia que também há maior consciência das organizações de que o treinamento não é infalível, de que as organizações têm muitos desafios e que as ações de capacitação não podem dar conta de resolver todos eles (Mourão e Borges-Andrade, 2005).

Esse crescimento das pesquisas na área permitiu aos pesquisadores testar os vários modelos de avaliação que a literatura ressalta, tendo alguns sido criados a partir de revisões teóricas e outros oriundos de pesquisas empíricas. O Modelo empírico de Alvarez, Salas e Garofano (2004) propõe variáveis preditoras para os resultados de treinamento nos níveis de reações (preditores características individuais); aprendizagem cognitiva (características individuais e do treinamento) e transferência e resultados (características individuais, do treinamento e da organização). Além disso, os autores também incluem no seu modelo o subsistema de análise de necessidades de treinamento (projeto e conteúdo do treinamento, mudanças nos treinandos e demandas organizacionais), além de variáveis como autoeficácia pós-treinamento e desempenho, as quais estariam associadas ao desempenho, às transferências e aos resultados. De acordo com esse modelo e também com os modelos de Borges-Andrade (2006) e de Abbad (1999), as características individuais podem influenciar o impacto do treinamento no trabalho. Assim, a hipótese central desse estudo é sustentada por tais modelos, uma vez que se pressupõe que pessoas com maior grau de comprometimento organizacional tenderiam a perceber também maior grau de impacto do treinamento no trabalho. Considerando o Modelo de Kirkpatrick (1976), que divide os resultados de treinamento em quatro níveis (Reação, Aprendizagem, Desempenho no cargo e Resultados), o presente estudo estaria voltado para o terceiro nível do modelo, ou seja, os efeitos das ações de treinamento sobre o desempenho no cargo.

Todavia, para Freitas, Borges-Andrade, Abbad e Pilati (2006), o impacto individual das ações de treinamento no trabalho pode ser mensurado a partir da transferência de treinamento e da influência causada pelos eventos instrucionais sob o desempenho dos participantes desses eventos. Segundo os autores, isso significa o mesmo que avaliar em que medida os objetivos ou efeitos esperados, muitas vezes previstos pelo planejamento instrucional, foram alcançados ou satisfatórios.

Uma importante revisão de literatura sobre impacto de treinamento foi iniciada por Mourão (2004) e complementada por Pereira (2009) e Silva (2010). Na versão mais atualizada dessa revisão, Silva (2010) apresenta um conjunto de 37 estudos que mensuraram variáveis critério relativas à transferência e impacto de treinamento em contextos de trabalho. O resultado foi um mapa com o resumo das pesquisas nacionais sobre transferência e impacto do treinamento em contextos de trabalho, no período de 1999 a 2009. Conforme sinalizado por Silva (2010), a análise desses 37 estudos mostra predomínio da autoavaliação de natureza perceptual, com poucos estudos utilizando heteroavaliações. Além disso, a maior parte dos pesquisadores mensurou impacto em amplitude, com predomínio do instrumento de avaliação utilizado por Abbad (1999) e adotando como referência o Modelo MAIS, proposto por Borges-Andrade (2006). Os resultados dessas pesquisas apontam para avanços nos achados sobre suporte psicossocial (gerencial e social) como importante variável explicativa, além de expressiva evolução da pesquisa nacional sobre impacto de TD&E.

 

Comprometimento Organizacional

Segundo Souza (2006), a etimologia da palavra comprometimento está associada a comprommitere, do latim, cujo significado aponta para "engajamento, agregamento, se colocar junto, envolvimento. Está associada à ideia de compromissos ou responsabilidade frente a algo ou alguém" (Souza, 2006, p.4). Ainda na discussão desse conceito, destaca-se que o comprometimento é caracterizado por múltiplos focos (valores, organização, carreira, trabalho e sindicato) e múltiplas bases (afetiva, normativa, de continuidade, comportamental e sociológica) (Bastos, 1993; Pilati, 2004). Porém, duas dessas bases não se sustentaram com o avanço dos estudos na área: a base comportamental (na qual existiria um conjunto de cognições que guiariam os comportamentos que fortalecem o vínculo com a organização) e a base sociológica (vínculo presente por meio da relação de autoridade com o empregador). O próprio Bastos (1994) passou a considerar que a estrutura do comprometimento não comportaria intenções de comportamento, ou seja, seria uma estrutura formada por crenças e afeto, rompendo com a visão tripartite que incluía também as intenções.

Meyer e Allen (1997) consideram que o comprometimento organizacional tem evoluído conceitualmente a partir da década de 1960 e provocado muita controvérsia a respeito da natureza dos vínculos empregado-organização, o que o torna um conceito ainda em construção. Apesar de passados mais de dez anos, o comentário dos autores parece válido, pois Pilati (2004) apresenta uma leitura crítica do conceito de comprometimento, apontando suas fragilidades e Rodrigues (2009) e Silva e Bastos (2010) fazem uma rica discussão acerca do conceito de comprometimento, questionando o modelo tridimensional de Meyer e Allen (1991), no qual o comprometimento estaria dividido em bases afetiva, normativa e de continuidade.

Apresentadas as principais questões conceituais, será relatada a seguir uma revisão dos estudos empíricos sobre o tema. Antes da apresentação desses estudos, contudo, vale citar a importante metanálise apresentada por Mathieu e Zajac (1990), que analisaram mais de 200 artigos de comprometimento organizacional publicados durante duas décadas (1967 e 1987). Os autores encontraram diferentes consequentes para os níveis de análise individual, grupal e organizacional e concluem que o comprometimento é um fenômeno multidimensional. Entre os antecedentes positivos do comprometimento organizacional, foram apontados: idade, tempo de trabalho na organização, competência pessoal percebida, ética protestante, variedade de habilidades, desafio, escopo do trabalho, estrutura de gestão, consideração e comunicação do líder e liderança participativa. Já os antecedentes que têm relação negativa com o comprometimento foram: ambiguidade do papel ocupacional, conflito de papéis e sobrecarga de funções. Essa metanálise, embora antiga, continua tendo parte dos seus resultados confirmados por estudos mais atuais.

 

Estudos Empíricos sobre Treinamento e Comprometimento

Na pesquisa feita na literatura, há escassez de estudos empíricos que relacionem comprometimento organizacional e impacto do treinamento no trabalho. Foram encontrados apenas dois estudos com tais relações: o de Rodrigues (2000), que abordou a influência do comprometimento organizacional e do comprometimento com a carreira sobre a efetividade do treinamento; e o de Pilati (2004), que focou apenas a influência do comprometimento organizacional de base afetiva. Para ampliar a compreensão do tema, foram considerados não apenas estudos com a variável impacto do treinamento, mas também com as variáveis treinamento, práticas de inovação e melhoria de desempenho.

Rodrigues (2000) realizou um estudo com o objetivo de verificar as interações de variáveis situacionais e individuais no Impacto do Treinamento no Trabalho no nível do comportamento no cargo. Entre as variáveis individuais a autora incluiu o comprometimento com a organização, o comprometimento com a carreira e variáveis demográficas e funcionais. A pesquisa foi realizada com 602 servidores públicos, englobando cursos destinados à área gerencial e às atividades administrativas de uma organização. A autora utilizou a escala de Abbad (1999) para mensurar impacto do treinamento no trabalho (a mesma utilizada no presente estudo). Já para a mensuração do comprometimento, Rodrigues (2000) adotou a escala de Bastos (1994), com 16 itens e que se divide nos fatores: comprometimento com a organização, com a carreira e com o sindicato. Os resultados mostraram relação negativa entre o comprometimento com a carreira e a efetividade do treinamento, ou seja, quanto maior o comprometimento com a carreira, menor o impacto do treinamento no trabalho. O comprometimento organizacional não figurou no modelo final de explicação do impacto do treinamento, porém, indicou uma favorabilidade à participação obrigatória em ações de capacitação, enquanto os que apresentaram maior comprometimento com a carreira indicaram uma favorabilidade à participação espontânea. Em outras palavras, pode-se dizer que os funcionários que têm maior comprometimento com a carreira acreditam que a participação em ações de educação corporativa devem ser de livre escolha dos funcionários, enquanto aqueles que apresentam valores mais altos de comprometimento organizacional pensam o contrário, que a participação em treinamentos deve ser imposta pela organização.

Pilati (2004) desenvolveu e testou um modelo de efetividade do treinamento no trabalho, validando uma taxonomia para classificação de eventos de treinamento nas organizações. Para a testagem do modelo de efetividade do treinamento no trabalho, o autor investigou comprometimento organizacional de base afetiva, motivação para aprender, motivação para aplicar e estratégias para aplicação do aprendido além de variáveis do contexto pós-treinamento (suporte à transferência de treinamento) e do tipo de treinamento (de acordo com a taxonomia de treinamento). Participaram do estudo do autor 1.241 treinados de 14 diferentes treinamentos de uma instituição bancária de abrangência nacional. A coleta de dados ocorreu em quatro diferentes momentos e com tal estratégia o autor testou a direção da relação entre comprometimento o impacto do treinamento no trabalho, sendo que a primeira figura como antecedente e a segunda como consequente. Os resultados de Pilati (2004) apontam, portanto, que o comprometimento organizacional afetivo atua como preditor de indicadores de efetividade de treinamento.

Em relação aos estudos que não se dedicaram diretamente à relação entre comprometimento e impacto do treinamento no trabalho, optou-se por apresentar uma síntese do conjunto das pesquisas revisadas, apontando as variáveis de comprometimento (COA = Comprometimento Afetivo, COC = Comprometimento de Continuidade, CON = Comprometimento Normativo ou UNI = Comprometimento como construto unifatorial), pesquisadas por cada autor, as dimensões do comprometimento organizacional investigadas por cada um, a identificação das relações encontradas, se positivas (+), negativas (-), sem relação significativa (SRS) ou se não foi pesquisado (NP), bem como a posição ocupada pela variável comportamento organizacional em cada um dos estudos (variável antecedente, moderadora ou consequente), bem como o país no qual foi realizada a pesquisa (Figura 1).

Considerando os resultados dos estudos empíricos na área, vale retomar os resultados das pesquisas sobre o impacto do treinamento que mostram que tal variável está relacionada tanto a variáveis individuais como a variáveis relativas ao treinamento e ao contexto (Aguinis e Kraiger, 2009; Alvarez et al., 2004; Freitas et al., 2006; Pilati e Abbad, 2005; Salas e Cannon-Bowers, 2001; Velada et al., 2007). Portanto, considerando que características individuais predizem a efetividade do treinamento e sendo o comprometimento uma das variáveis mais utilizadas no estudo do comportamento organizacional, seria adequado supor que o mesmo tivesse alguma relação com o impacto do treinamento no trabalho.

Além disso, Pilati (2004) já havia apontado para essa relação entre comprometimento organizacional e impacto do treinamento, porém, o autor trabalhou exclusivamente com o comprometimento de base afetiva. Por outro lado, Medeiros e colaboradores (2003) alertavam que nos anos de 1990 houve predominância conceitual de três bases: afetiva, de continuidade e normativa, as quais foram consideradas nas pesquisas de Meyer e Allen (1991) e muitos que os seguiram (Souza, 2006; Al-Emadi, 2006; Kumar, Bakhshi e Rani, 2009; SamGnanakka, 2010; Hunton e Norman, 2010).

De fato, diversas pesquisas apontam para o comprometimento organizacional como um construto multidimensional, buscando entender a relação do indivíduo com a organização de forma ampla e complexa. Meyer e Allen (1997) observam que o comprometimento organizacional tem evoluído conceitualmente nas últimas quatro décadas e provocado muita controvérsia a respeito da natureza dos vínculos empregado-organização e isso torna o comprometimento um conceito ainda em construção. Meyer e Allen (1991) conceituam o comprometimento organizacional em três componentes: comprometimento como um apego à organização (affective commitment), ou afetivo; comprometimento percebido como custos associados a deixar a organização, que os autores chamam de continuance commitment; comprometimento como uma obrigação de permanecer na organização, que os autores denominam obligation e depois reconceituam como normative commitment (Meyer, Allen e Smith, 1993).

A respeito da adoção do comprometimento organizacional como variável independente, a decisão é válida devido à escassez de estudos dessa natureza e também à forte influência do comprometimento sobre variáveis como produtividade, rotatividade e desempenho (Medeiros et al., 2003). Assim, o objetivo deste estudo foi compreender melhor em que medida o comprometimento afeta a percepção de transferência positiva para o ambiente de trabalho de competências desenvolvidas em ações de treinamento. As definições constitutiva e operacional das variáveis do modelo de pesquisa são apresentadas na Figura 2.

 

MÉTODO

Participantes

A pesquisa foi realizada em 23 organizações, nos Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro; sendo 3 indústrias e as demais da área de serviços; 15 privadas, 5 públicas e 3 do terceiro setor. Em relação ao porte, predominaram organizações de grande porte (14), seguidas pelas de pequeno porte (6), com ramos de atuação diversificados: agropecuário, metalúrgico, bancário, construção civil, comércio, contábil, educacional, de informática, de segurança pública, sindical e do transporte.

Os cursos realizados por esses participantes foram diversificados, totalizando 59 cursos distintos, com predomínio de treinamentos de natureza técnica, com poucos cursos voltados para habilidades psicomotoras e também poucos visando o desenvolvimento de atitudes. A maior parte se destinava à produção de competências cognitivas, com relação direta com as atividades desempenhadas pelos trabalhadores pesquisados. O tempo médio de duração desses treinamentos variou de 4 a 480 horas, com média de 69,2 horas (DP=141,4). A maior parte dos treinamentos (57,3%) foram realizados dentro da empresa, sendo menos comuns as ações educacionais realizadas fora da empresa (35,7%) e alguns casos de cursos com partes dentro e fora da empresa (7%). Quanto ao tipo de adesão ao treinamento, predominou a imposição da chefia (54,3%), ficando a adesão voluntária com 39,8% casos.

A percepção de adesão na qual houve imposição da chefia e também adesão voluntária do participante foi de apenas 5,9%.Participaram da pesquisa 403 pessoas. Como critério de inclusão na amostra foi considerada a participação em pelo menos uma ação de capacitação no período entre 3 e 6 meses antes da pesquisa e a concordância em assinar o termo de consentimento livre e esclarecido. Como critério de exclusão da amostra, adotaram-se três critérios simultâneos: (a) questionários com informações em branco em todos os itens da variável dependente; (b) questionários com 30% ou mais de respostas em branco mesmo que distribuídas nas diferentes escalas; (c) trabalhadores com menos de três meses de trabalho na organização.

 

Instrumentos

Os instrumentos utilizados eram previamente validados (Pilati e Abbad, 2005; Siqueira, 1995), com informações complementares para caracterização da amostra (tempo de duração dos eventos de treinamento avaliados, tipo de treinamento (interno ou externo à empresa) e tipo de adesão à capacitação (voluntária ou compulsória).

A escala de impacto do treinamento no trabalho, criada por Abbad (1999) era inicialmente composta por 12 itens associados a uma escala tipo Likert de cinco pontos, variando de 1 para "discordo fortemente" a 5 "concordo fortemente". Porém, Pilati e Abbad (2005) realizaram uma análise confirmatória da escala e sugeriram a supressão de dois itens, com conteúdos redundantes. Assim, a escala de impacto sugerida pelos autores contém 10 itens e estrutura unifatorial. O coeficiente de fidedignidade (Alfa de Cronbach) reportado para a escala foi de 0,90.

Já para a mensuração do comprometimento organizacional, utilizaram-se três escalas validadas por Siqueira (1995) e apresentadas por Bastos, Siqueira, Medeiros e Menezes (2008), a saber: (a) Escala de Comprometimento Organizacional Afetivo - ECOA, em sua versão reduzida, que têm cinco itens associados a uma escala tipo Likert de cinco pontos, onde 1 = Nada e 5 = Extremamente; com grau de precisão elevado (Alpha de Cronbach = 0,93); (b) Escala de Comprometimento Organizacional Normativo - ECON, com sete itens associados a uma escala tipo Likert de cinco pontos, onde 1 = Nada e 5 = Extremamente; com grau de precisão elevado (Alpha de Cronbach = 0,86); (c) Escala de Comprometimento Organizacional de Continuidade - ECOC, com 15 itens associados a uma escala tipo Likert de cinco pontos, onde 1 = discordo totalmente e 5 = concordo totalmente; com retenção de fatores com grau de precisão adequados em todos eles (Fator 1 - Perdas Sociais no Trabalho - 4 itens e α = 0,72; Fator 2 - Perdas de investimentos feitos na organização - 3 itens e α = 0,71; Fator 3 - Perdas de Retribuições Organizacionais - 3 itens e α = 0,71; e Fator 4 - Perdas Profissionais - 5 itens e α = 0,78).

 

Procedimentos de Coleta e Análise de Dados

Como o objetivo é mensurar o impacto do treinamento no trabalho, a aplicação dessa escala foi feita cerca de quatro meses após a realização da capacitação, para que fosse possível medir seu efeito. O instrumento tem natureza autoaplicável e foi entregue aos participantes individualmente e recolhido após preenchimento. O projeto desta pesquisa foi aprovado por um comitê de ética.

Em relação aos procedimentos de análise de dados, foi utilizado o software Statistical Package for the Social Sciences - SPSS, versão 15.0. Após a limpeza do banco de dados, as análises estatísticas realizadas foram: a análise de grau de confiabilidade das escalas; análises descritivas das escalas; correlação entre as variáveis dependente e independentes; testagem dos pressupostos para realização da regressão (normalidade, linearidade, homocedasticidade, heterogeneidade dos resíduos, multicolinearidade); e a regressão múltipla hierárquica.

 

RESULTADOS

O presente estudo objetivou investigar a possível relação entre comprometimento organizacional de base afetiva, normativa e de continuidade e o impacto do treinamento no trabalho, focando o terceiro nível de resultados do Modelo de Kirkpatrick (1976).

Na primeira etapa da análise foi identificada a presença de dados omissos (missing values) e examinadas as distribuições univariadas e bivariadas por meio de métodos gráficos (diagrama de ramo e folha, boxplot) e numéricos (medidas de simetria) com o objetivo de avaliar normalidade, homogeneidade de variância e a presença de dados extremos univariados. Para a análise de outliers multivariados, adotou-se os parâmetros da Distância Mahalanobis. O critério numérico utilizado para avaliar a necessidade de transformações nas variáveis foi ancorado na simetria, não havendo necessidade de transformações nas variáveis. Foram identificados sete casos de valores extremos univariados e 22 casos multivariados, ficando-se com 377 questionários válidos.

Para a regressão foram avaliadas, além da normalidade, a homogeneidade de variância, a multicolinearidade e a análise de resíduos. Em relação à multicolinearidade, encontrou-se alta correlação entre o comprometimento afetivo e o de continuidade (r=0,51; p<0,00) e compromentimento normativo e de continuidade (r=0,56; p<0,00). Os fatores de comprometimento também apresentaram correlações altas e positivas (coeficientes de Pearson de 0,55 a 0,74). Porém, no teste de multicolinearidade os indicadores foram satisfatórios, sem necessidade de testar modelos separados na regressão.

As análises iniciais dos dados apontaram para um comprometimento de ordem afetiva (M=3,5; e DP=0,87) superior ao comprometimento normativo (M=2,8; e DP=0,73) e ao de continuidade (M=2,7; e DP=0,83). As correlações de Pearson apontaram relações positivas e significativas entre as variáveis independentes com a variável dependente, com coeficientes entre 0,30 (comprometimento normativo e impacto do treinamento) e 0,42 (comprometimento afetivo e impacto do treinamento). Entre as variáveis antecedentes - as três bases de comprometimento - as correlações variaram de 0,47 (comprometimento afetivo com comprometimento normativo) e 0,56 (comprometimento afetivo com comprometimento normativo). Essas correlações tiveram magnitudes que, segundo a classificação de Miles e Shevlin (2001), podem ser classificadas como de moderadas (0,30 a 0,49) a elevadas (acima de 0,50), como mostra a Tabela 1.

Foram realizadas duas regressões para a obtenção do modelo final de pesquisa. A primeira incluiu as bases de comprometimento como preditores do impacto do treinamento no trabalho. Os resultados mostraram que apenas as bases afetiva e de continuidade como preditoras do impacto do treinamento (Tabela 2).

 

 

Com base no resultado dessa regressão, optou-se por realizar uma regressão hierárquica que identificasse se o comprometimento de continuidade de fato têm alguma contribuição quando isolado do comprometimento afetivo.

Assim, considerou-se como bloco 1, o comprometimento afetivo (maior valor de Beta) e como bloco 2 o comprometimento de continuidade. A análise desses resultados mostrou que a entrada da variável comprometimento de continuidade no segundo modelo representou um acréscimo mínimo de 2% do poder explicativo do modelo (R2Δ= 0,02; F = 46,85; p < 0,00), como pode ser visto na Tabela 3.

 

 

Assim, observa-se que o comprometimento de continuidade figura na regressão padrão como preditor do impacto do treinamento, sobretudo em função da sua alta correlação com o comprometimento afetivo (r=0,51; p<0,00), pois sua contribuição como preditor quando o comprometimento afetivo já foi incluído se torna residual, pelo menos no caso da variável dependente impacto do treinamento no trabalho. A Figura 3 representa o modelo resultante da presente pesquisa.

 

 

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Em relação ao impacto do treinamento no trabalho, os resultados apontam para uma percepção positiva, pois os respondentes da pesquisa tendem a concordar com as afirmativas que retratam tal impacto. Esse resultado também corrobora estudos anteriores como os de Abbad (1999), Mourão (2004) e Gonçalves (2008), nos quais os valores do impacto do treinamento no trabalho obtiveram escores semelhantes.

Os resultados da pesquisa mostraram um predomínio do comprometimento afetivo sobre as bases de compromentimento de continuidade e normativo. Os escores evidenciam que, em relação ao comprometimento afetivo, o valor médio obtido sinaliza para um comprometimento moderado dos trabalhadores para com as suas organizações, uma vez que as respostas às assertivas da escala se situaram, em termos de média, entre os pontos "3 = não concordo e nem discordo" e "4 = concordo", sinalizando para uma tendência de concordância com o comprometimento afetivo. Porém, em relação às bases de continuidade e normativo, esses escores ficaram abaixo do ponto médio da escala (3,0), sinalizando uma tendência dos trabalhadores a discordarem tanto do comprometimento normativo quanto do de continuidade.

O comprometimento afetivo se relacionou positivamente com impacto do treinamento no trabalho. Inicialmente, a correlação de Pearson apontou uma relação significativa e positiva, de intensidade moderada, entre o comprometimento afetivo e o impacto no comportamento no cargo. Além disso também foi realizada uma regressão múltipla padrão e uma regressão hierárquica, as quais confirmaram a relação entre o comprometimento afetivo e o impacto do treinamento. A regressão padrão explicou 20% do impacto do treinamento, tendo figurado como preditores o comprometimento afetivo e o comprometimento de continuidade. Na regressão hierárquica, confirmou-se essa predição, sendo que o comprometimento afetivo figurou no primeiro modelo e também no segundo.

Os resultados encontrados já eram esperados uma vez que o fato de a pessoa se comprometer afetivamente com a organização indicaria uma disposição dessa pessoa em atuar de maneira favorável para com a mesma, engajando-se e comprometendo-se com os resultados organizacionais. Assim, a transferência para o trabalho das competências aprendidas nas ações de TD&E seria um comportamento que confirmaria essa disposição favorável (identificada pelo comprometimento organizacional) de atuar em prol da organização com a qual a pessoa mantém vínculo.

Esses resultados corroboram os estudos de Pilati (2004) que também encontrou relação positiva entre impacto do treinamento no trabalho e o comprometimento de base afetiva. Contudo, vale dizer que no estudo de Rodrigues (2000) apenas o comprometimento com a carreira foi relacionado ao impacto do treinamento, sendo que o comprometimento organizacional não constou do modelo da autora.

De maneira indireta, os resultados da presente pesquisa também vão ao encontro dos achados das seguintes pesquisas: (a) Hawkins (2005), que encontrou relação positiva entre o comprometimento de base afetiva e a cultura de aprendizagem na organização; (b) Al-Emadi (2006) que confirmou uma relação entre o compromentimento afetivo e as crenças dos benefícios do treinamento; (c) Fu e colaboradores (2009) que encontraram relação positiva entre o comprometimento afetivo e a percepção de suporte organizacional, que é a principal variável preditora do impacto do treinamento no trabalho; (d) Rose e colaboradores (2009), cujo estudo evidencia que o comprometimento afetivo se relaciona à aprendizagem organizacional e ao desempenho no trabalho; e (e) SamGnanakkan (2010) que encontrou relação significativa entre os efeitos do comprometimento afetivo nas práticas de RH, incluindo as práticas relativas a treinamento.

Com base nesses resultados, pode-se concluir que o investimento em aumentar o comprometimento organizacional afetivo pode trazer resultados positivos para a organização, não só relacionados à produtividade, à redução do absenteísmo e à satisfação com o trabalho, que são apontados como consequentes mais comuns do comprometimento organizacional, mas também há ganhos no impacto do treinamento no trabalho. Considerando-se que os valores investidos em TD&E tem sido elevados e crescentes, os achados dessa pesquisa apontam, portanto, para uma importante contribuição do comprometimento afetivo para os resultados das organizações de trabalho. Nesse sentido, quando a organização investe em estratégias para ampliar o comprometimento afetivo de seus empregados, entre os inúmeros benefícios decorrentes do aumento desse comprometimento, estaria também a tendência de que o impacto do treinamento no trabalho viesse a ser ampliado.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo aborda dois temas muito frequentes dentro do espaço reflexivo e prático de Gestão de Pessoas - Comprometimento e Treinamento -, que inclusive refletem dois campos temáticos pouco afeitos ao diálogo (o comportamental e o ferramental). Essa é uma das contribuições que a pesquisa relatada traz para o debate. Além disso, a contribuição do estudo se dá também pelo avanço no debate proposto ao tema, tendo em vista a escassez de estudos empíricos que considerem o comprometimento organizacional como variável antecedente e também que compare os resultados da influência de suas diferentes bases.

Assim, este artigo teve como principal finalidade, investigar a possível relação entre as bases de comprometimento organizacional (afetiva, normativa e de continuidade) e o impacto do treinamento no trabalho. A proposta de investigar diferentes bases do comprometimento organizacional é apoiada por Medeiros e colaboradores, (2003) e Siqueira (1995), os quais defendem a investigação do comprometimento com base afetiva, normativa e de continuidade, com base no modelo tridimensional de comprometimento organizacional desenvolvido por Meyer e Allen (1991). Porém, merece destaque o fato de que nos últimos anos críticas têm sido apontadas a esse modelo tridimensional de comprometimento, o que sinaliza para a realização de estudos que confirmem ou questionem essa configuração tripartite do construto.

Em relação ao estudo de TD&E, é importante considerar que o mesmo não se limita a um aprendizado para atender a uma habilidade específica da atividade profissional, mas possibilita o desenvolvimento continuado que acompanha a pessoa durante toda a vida (Vargas e Abbad, 2006). Ou seja, o desenvolvimento profissional está associado à educação continuada devendo perdurar por toda a existência do indivíduo. Esse é um dos motivos pelos quais é importante que se estude os resultados das ações de TD&E, pois embora sejam mensurados impactos específicos, as ações de TD&E não se limitam ao ambiente da sala de aula e às experiências adquiridas com a socialização no contexto de trabalho.

Um resultado que merece ser mencionado consiste no fato de entre as bases de comprometimento apenas a afetiva ter figurado como preditora do impacto do treinamento no trabalho. As análises iniciais dos dados apontaram para um comprometimento de ordem afetiva com escores superiores ao comprometimento normativo e de continuidade e evidenciou-se alta correlação entre o comprometimento afetivo e o de continuidade e entre o compromentimento normativo e o de continuidade. Entretanto, a análise dos resultados da regressão hierárquica mostra que a entrada da variável comprometimento de continuidade no segundo modelo representou um acréscimo irrisório do poder explicativo do modelo. Tal resultado reforça a ideia de que o comprometimento organizacional seja estudado a partir da base afetiva, que não só é o que apresenta escores mais altos, mas também é o mais presente nas pesquisas da área.

Essa proposta de concentrar os próximos estudos sobre o tema no comprometimento afetivo é reforçada por Demo (2003), que sinaliza que as pesquisas sobre comprometimento têm se concentrado no foco organizacional e na base afetiva tanto no Brasil como no exterior. Conforme discutido por Silva e Bastos (2010), o conceito do construto comprometimento organizacional recebeu excessiva ampliação, necessitando que modelos multidimensionais de comprometimento organizacional sejam apreendidos como construtos distintos. Nessa linha, os autores propõe uma escala para medir o consentimento organizacional que poderia ser um substituto - com muitas vantagens em termos conceituais - da dimensão de comprometimento normativo. Da mesma forma, Rodrigues (2009) propõe que o entrincheiramento seja estudado em substituição ao comprometimento base calculativa/de continuidade. Assim, diferentes pesquisadores vêm contribuindo para delimitar o conceito de comprometimento organizacional à base afetiva.

Nesse sentido, foi válida a utilização neste estudo do modelo tridimensional de comprometimento organizacional desenvolvido por Meyer e Allen (1991), uma vez que foi possível confirmar os achados de outros pesquisadores no que diz respeito à excessiva extensão desse conceito e a prevalência do comprometimento afetivo, associado a um questionamento da pertinência ou não de se considerar as demais bases (normativa e de continuidade) como dimensões de comprometimento organizacional.

Com base nesses resultados, pode-se indagar qual seria a recomendação para os profissionais que atuam em gestão de pessoas. Uma primeira recomendação seria a de buscar ampliar o comprometimento organizacional de base afetiva, a partir do conhecimento de seus antecedentes, uma vez que tal comprometimento contribui para ampliar o impacto do treinamento no desempenho no trabalho. Uma outra recomendação seria a de investigar possíveis outras variáveis que possam explicar os resultados das ações de treinamento, uma vez que são muitos os estudos na área e que já se sabe que características individuais, características do treinamento e o suporte organizacional (material e psicossocial) são relevantes para explicar os resultados de treinamento. Porém, apesar de tal conhecimento, em diferentes contextos de pesquisa, têm se encontrado diferentes preditores, o que sugere a importância de conhecer no contexto de cada organização, o que realmente contribui para aumentar o impacto do treinamento sobre o trabalho.

Como contribuições do trabalho, destacase o fato de realizar uma pesquisa relacionando as diferentes bases do comprometimento organizacional ao impacto do treinamento no trabalho, uma vez que a única pesquisa relacionando os temas foi realizada por Pilati (2004) e com foco apenas no comprometimento organizacional de base afetiva. Embora tenha-se confirmado que esta é realmente a base prevalente e capaz de contribuir para a explicação do impacto do treinamento, antes da realização desta pesquisa não se poderia ter essa confirmação. Além disso, o fato de ter realizado um estudo com uma amostra de sujeitos de diferentes organizações, permite ampliar o contexto de pesquisa e confirmar que os resultados encontrados por Pilati (2004) que havia estudado o comprometimento em apenas uma organização.

Uma outra contribuição deste estudo se refere ao fato de apontar para uma atitude mais global do empregado em relação à organização como variável explicativa do impacto do treinamento no trabalho, uma vez que predominam na área estudos com variáveis mais diretamente relacionadas ao indivíduo, tais como características demográficas e funcionais, autoeficácia, motivação para aprender e estratégias de aprendizagem no trabalho.

Em relação às novas pesquisas na área, sugerese que sejam incluídas variáveis relativas à aprendizagem em ambiente organizacional e sua relação com o comprometimento de base afetiva, tais como: percepção das práticas de TD&E, percepção do autodesenvolvimento profissional na organização e percepção de aprendizagem em treinamentos. Também seria interessante realizar novos estudos sobre entrincheiramento e consentimento organizacional, ampliando a compreensão de seus antecedentes e consequentes. Da mesma forma, seria interessante que novas pesquisas investigassem a influência de outras variáveis de atitude geral do empregado para com a organização - como a cidadania organizacional - em relação ao impacto do treinamento no trabalho, uma vez que tais atitudes podem influenciar na transferência positiva do foi aprendido em ações de TD&E para o dia a dia no trabalho. Enfim, espera-se que este estudo sugira inquietações em outros pesquisadores e profissionais interessados nesses temas.

 

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Recebido em: 08.02.2011
Aprovado em: 21.09.2011
Publicado em: 31.10.2011

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