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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

On-line version ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.12 no.3 Florianópolis Dec. 2012

 

Preditores da decisão da aposentadoria por servidores públicos federais1

 

Retirement decision predictors for federal civil servants

 

 

Gustavo Silva MenezesI; Lucia Helena FrançaII

I(Instituto Nacional de Tecnologia - INT). É Mestre em Psicologia em 2011 pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO). Analista do Instituto Nacional de Tecnologia - INT. E-mail: gustavo.menezes@int.gov.br. Avenida Venezuela 82, 4º andar sala 416, Rio de Janeiro - RJ CEP 20081-312 Tel-fax.: (21) 2123-1060 http://lattes.cnpq.br/6184286169834097
II(Universidade Salgado de Oliveira - UNIVERSO). É doutora (PhD) em Psicologia em 2004 pela Universidade de Auckland - NZ Professor titular do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO) E-mail: luciafranca@luciafranca.com. Rua Marechal Deodoro 211, Bl. B - 2º Andar - Centro - Niterói - RJ - CEP 24030 060 - Tel-fax: (21) 2138 4926 http://lattes.cnpq.br/5241064205933556

 

 


RESUMO

O vertiginoso aumento no número de idosos tornou a aposentadoria um dos maiores desafios da atualidade para diversos países, incluindo o Brasil. Contudo, ainda são raros os estudos sobre a transição trabalho-aposentadoria e o que influencia a decisão dos trabalhadores quer pela adoção do bridge employment (trabalho após aposentadoria); adiamento da aposentadoria ou a permanência na organização; ou pela aposentadoria definitiva. Esta pesquisa investigou sete variáveis na decisão da aposentadoria de 148 servidores públicos federais no Rio de Janeiro. Essas variáveis foram: i) expectativa de vida subjetiva; ii) idade; iii) saúde percebida; iv) percepção do trabalho - envolvimento e satisfação; v) flexibilidade de horário; vi) comprometimento com a carreira; e vii) controle do trabalho. Regressões logísticas múltiplas indicam que a) a idade, a percepção do trabalho, a flexibilidade de horário e o controle do trabalho predizem a decisão de postergar a aposentadoria; b) a percepção do trabalho e a flexibilidade de horário predizem o bridge employment; c) a saúde percebida é o único preditor para a aposentadoria definitiva. São oferecidas sugestões para políticas de recursos humanos quer seja para manter os trabalhadores mais velhos, por meio da atualização permanente, controle do trabalho e flexibilidade de horário, ou pela adoção de programas de preparação para a aposentadoria, apoiando aqueles que desejam se aposentar.

Palavras-chave: Aposentadoria, Decisão, Retenção, Trabalho, Servidores Públicos Federais.


ABSTRACT

The sharp increase in the elderly population makes retirement one of the greatest challenges for various countries, including Brazil. However, there are still few studies about the work-retirement transition and what influences workers' decisions, whether to take up bridge employment (post-retirement work); postponing retirement to continue in the same organization; or full retirement. This research investigated the influence of seven variables on the retirement decision of 148 federal civil servants in Rio de Janeiro. These variables were i) subjective life expectancy; ii) age; iii) perceived health; iv) job perception - involvement and satisfaction; v) hours flexibility; vi) career commitment; and vii) job control. Multiple logistic regressions have shown that: a) age, job perception, hours flexibility, and job control predict the decision to postpone retirement; b) job perception and hours flexibility also predict bridge employment; c) health perception is the only predictor for full retirement. Suggestions are offered for the adoption of human resource policies for the retention of older workers by offering ongoing retraining, job control opportunities, and flexible hours, or by organizing retirement preparation programs to support workers who wish to retire.

Keywords: Retirement Decision, Full Retirement, Bridge Employment, Postpone Retirement, Federal Civil Servants.


 

 

Os últimos dados demográficos comprovam que não teremos trabalhadores em número suficiente para sustentar tantas crianças e idosos (ONU, 2002). Portanto, para manter os custos com pensões públicas os países terão de reter sua mão de obra mais velha por mais tempo no mercado.

No caso do Brasil, estudos do IPEA (2006) indicam que a população em idade ativa (PIA) não crescerá na mesma proporção que o número de idosos e esse cenário deverá se manter até 2030. Paralelo a isso, as aposentadorias antecipadas, que alcançaram o seu clímax durante a década de 1990 e ainda continuam ocorrendo em algumas organizações, provocaram o surgimento de duas situações ambivalentes. Por um lado, algumas organizações nos países periféricos vêm experimentando o brain drain - perda de talentos ou de trabalhadores especializados (Fibkins, 2012), perda da memória institucional e o desperdício da organização de não aproveitar o investimento na formação dos trabalhadores quanto ao conhecimento por eles acumulado (Kinsella & Phillips, 2005). Por outro, os trabalhadores mais velhos têm demonstrado desejo e necessidade de permanecer ativos profissionalmente por mais tempo (França, 2004).

Embora a aposentadoria no Brasil não implique necessariamente a retirada completa do trabalhador do mundo do trabalho, é fato também que a sua decisão pode representar para os trabalhadores um rompimento com a atividade profissional. Nesse sentido, diversos autores enfatizam a necessidade de uma preparação, dado que esse rompimento pode provocar um sentimento de exclusão do mundo produtivo e de perda das fontes principais de valorização e de identidade para os trabalhadores (França, 2004, 2008, 2009; Rodrigues, 2000; Zanelli, Silva & Soares, 2010).

A preparação para aposentadoria é hoje, no Brasil, matéria legal pressupondo a responsabilidade tanto do governo quanto das organizações de trabalho, em preparar e estruturar psicologicamente os trabalhadores para a transição para a aposentadoria (Brasil - Lei 8.842/94 art. 10 inciso IV alínea "c" também presente na Lei 10.741 art. 28 - Estatuto do idoso). Entretanto, nem todas as organizações, sejam elas públicas ou privadas, estão seguindo a legislação, que precisa ser levada em consideração pelos órgãos de Recursos Humanos.

Um aspecto importante a assinalar é que há trabalhadores que desejam continuar ativos e atuantes, tanto nas organizações de origem, quanto se lançando para novas oportunidades. As organizações precisam aproveitar esse potencial, não só em função dos conhecimentos, experiência e produtividade, mas tendo em vista o patrimônio institucional que esses trabalhadores representam. Mas o que exatamente influencia na permanência dos trabalhadores nas organizações, a sua aposentadoria e a adoção de um trabalho provisório (bridge employment) ou a sua aposentadoria definitiva?

Diversos autores analisaram os fatores que podem influenciar a decisão da aposentadoria (França, 2004; Kim & Feldman, 2000; Shultz, Morton & Weckerle, 1998; Wang, Zhan, Liu & Shultz, 2008). Alguns fatores podem ser mais influentes do que outros na decisão, se analisadas e comparadas as nacionalidades, os grupos profissionais ou a tipologia das organizações (públicas e privadas).

Da mesma forma, situações diferenciadas podem ser encontradas se focalizados profissionais que fazem parte de uma elite científica, ou seja, pessoas-chave e que detêm o conhecimento e o patrimônio de uma organização. Estes parecem desejar permanecer na organização, mesmo depois da idade regulamentar da aposentadoria. Nesse contexto, há de se ressaltar que o envelhecimento, a incapacidade e a aposentadoria nem sempre são sinônimos e não devem ser interpretados como condição ou requisito para se retirar ou não do mundo do trabalho. Há também o reverso da moeda, se considerarmos os trabalhadores que têm dificuldade de se desligar das organizações, por conta de um sentimento de possível perda do companheirismo dos colegas, perda de status social ou diminuição da autoestima, entre outros (Debetir & Monteiro, 1999).

A saída de trabalhadores de organizações de ciência e tecnologia - seja para trabalhar em outras empresas ou para se aposentar definitivamente - tem sido observada no Brasil e pode ocasionar a perda do conhecimento intelectual e tácito, a interrupção de pesquisas e o retrocesso em estudos científicos já iniciados. Observa-se ainda que essa prática também é notada em trabalhadores de outras empresas que detêm conhecimento e patrimônio técnico e organizacional.

Embora só seja possível conhecer a decisão tomada por alguém após o fato consumado, é papel da Psicologia ajudar no entendimento e na predição desse comportamento (decisão). Assim, por meio da investigação das atitudes dos trabalhadores mais velhos frente a um processo que eles já estejam passando - a transição da aposentadoria é possível prever as intenções quanto à decisão que provavelmente irão tomar.

As atitudes são disposições favoráveis ou desfavoráveis relativas a objetos, pessoas e acontecimentos ou em relação a alguns dos seus respectivos atributos (Fishbein & Ajzen, 1975). Como afirmam Neiva e Mauro (2011, p.169) "as atitudes exercem influência sobre o comportamento e sobre a maneira de ver o mundo. O conhecimento das atitudes de outras pessoas permite saber como elas pensam, sentem ou reagem a certos eventos".

O entendimento do processo de decisão dos trabalhadores e seus respectivos preditores poderão oferecer subsídios para os órgãos de Recursos Humanos se anteciparem no planejamento de medidas a serem adotadas, seja na retenção dos seus trabalhadores ou mesmo na organização dos programas de preparação para a aposentadoria para aqueles que desejam a saída. Assim, o objetivo deste estudo foi investigar os aspectos que poderiam influenciar a decisão da aposentadoria em 148 servidores públicos, que trabalhavam em uma instituição de ciência e tecnologia federal no estado do Rio de Janeiro.

 

A DECISÃO DA APOSENTADORIA

Como ressaltado por Ekerdt (2010), passamos muitos anos imaginando como os trabalhadores que nasceram logo após a segunda guerra mundial, ou boom workers, iriam se aposentar. Muitos trabalhadores não se planejaram para esse período e agora que estão envelhecendo terão de adotar uma decisão que inclui incerteza e situações de risco, principalmente porque estamos enfrentando uma crise econômica mundial. A decisão da aposentadoria pode envolver três situações: a saída definitiva da organização e do mercado de trabalho; a opção por se aposentar e trabalhar em outro tipo de emprego; ou adiar a aposentadoria e permanecer na mesma organização até se se sentir apto a se aposentar. Essas opções serão descritas a seguir.

Postergar a aposentadoria

Para Shultz, Morton e Werckerle (1998), a decisão de postergar a aposentadoria pode ser influenciada por vários fatores que "puxam" ou "empurram" - o chamado efeito pull (para dentro) e push (para fora) - esses trabalhadores para o mundo do trabalho. Os fatores pull abrangeriam os aspectos positivos, como lazer ou atividades de voluntariado, os fatores push seriam negativos, como saúde debilitada ou insatisfação com o trabalho. Os efeitos pull (positivo) e push (negativo) são importantes diferenciadores na decisão da aposentadoria, mas o efeito de push tende a ser mais relevante após a decisão.

Shultz et al. (1998) argumentam que a percepção dos fatores push e pull acontece dentro de um contexto individual. Por exemplo, os programas de incentivo à aposentadoria (chamados no Brasil de Plano de Demissão Voluntaria - PDV ou Plano de Demissão Incentivada - PDI) podem ser vistos como uma influência positiva (pull) ou negativa (push) na decisão da aposentadoria, dependendo das condições individuais e familiares, aspirações de carreira, percepção de oportunidades e o contexto social vivenciado pelos trabalhadores ao longo da vida.

Wang, Adams, Beehr e Shultz (2009) argumentam que a manutenção da saúde emocional como preditor de decisão da aposentadoria deixou de receber a devida atenção dos estudiosos e das organizações. Por certo, as melhores condições de saúde possibilitam aos trabalhadores permanecerem por mais tempo ativos, na própria área de atuação ou em outra área na qual poderão desenvolver outras habilidades. Sobretudo, o aumento da expectativa de vida (Solinge & Henkens, 2009) é um fator decisivo para a permanência ou saída dos trabalhadores do mercado de trabalho.

É preciso considerar ainda, a influência das políticas dos governos, da estrutura das organizações e da situação econômica dos futuros aposentados na tomada de decisão (Kim & Feldman, 2000; Solinge & Henkens, 2009; Wang, Adams, Beehr & Shultz, 2009), que podem favorecer a permanência ou não do trabalhador em atividade, mesmo após a idade legal da aposentadoria.

Bridge employment

O bridge employment é um termo ainda sem tradução para a língua portuguesa, que se caracteriza por uma tendência internacional observada nos últimos 20 anos, no tocante à continuidade da realização da atividade profissional. Pesquisadores como Kim e Feldman (2000), Rhum (1990) e Ulrich e Brott (2005) apontaram que o bridge employment é uma forma diferenciada de exercer atividades remuneradas após a aposentadoria, seja em tempo parcial, no modelo autoemprego ou de trabalho temporário.

Rhum (1990) utilizou o termo bridge employment para categorizar qualquer trabalho remunerado após a aposentadoria, ou a partir de quando o trabalhador começa a receber uma pensão. Para Kim e Feldman (2000), o bridge employment pode ser caracterizado por uma posição, mesmo antes da retirada definitiva do trabalhador da força de trabalho, envolvendo uma combinação de carga horária reduzida, menos estresse ou responsabilidade, maior flexibilidade e menos demanda física, mesmo sem ter o recebimento de uma pensão além do salário. O bridge employment pode representar um novo começo, uma possibilidade de se relacionar mais equilibradamente na família, ter mais tempo para o companheiro e para o lazer (Ulrich & Brott, 2005).

O bridge employment permite novas formas de trabalho e pode ser visto como uma redefinição da aposentadoria, uma oportunidade dada aos trabalhadores que desejam se manter por mais tempo no mercado. Um novo começo gera expectativas, enquanto na transição para a aposentadoria o trabalhador volta à sua casa e não estabelece nova ligação com o trabalho, remunerado ou voluntário (França, 2004).

Aposentadoria definitiva

Atchley (1989) enfatiza que é fundamental planejar o momento da aposentadoria definitiva para que ela seja satisfatória. A preparação pode permitir a manutenção dos contatos sociais e a adoção de um estilo de vida que resulte em uma aposentadoria mais positiva (Wang et al., 2008). Atchley sugere ainda que a ausência do trabalho pode ser psicologicamente desgastante para o trabalhador, pois os indivíduos experimentam a perda de função e passam a sentir a inutilidade.

Os resultados encontrados por Shultz et al. (1998) ressaltam que tanto os fatores negativos quanto os positivos influenciam na decisão pela aposentadoria definitiva. A classe social na qual o trabalhador se encontra pode influenciar nessa decisão, uma vez que o trabalho é tido como algo insatisfatório para pessoas de classes de menor status social e a aposentadoria poderá trazer satisfação pessoal.

 

PREDITORES DA DECISÃO DA APOSENTADORIA

Diversos estudos vêm demonstrando a relevância dos vínculos dos trabalhadores com o trabalho (Bastos, 1997; Rowe, 2008). Outros estudos se dedicaram a analisar como esses vínculos poderão influenciar na decisão da aposentadoria (Kim & Feldman, 2000; Wang et al., 2008). A análise desses estudos nos levou a pressupor que a decisão da aposentadoria pode envolver três possibilidades ou variáveis dependentes excludentes, que vão desde a postergação da aposentadoria, se aposentar e continuar no mercado de trabalho - bridge employment - e se aposentar definitivamente.

Tomando-se por base os estudos anteriores sobre a decisão da aposentadoria, foram selecionados dois grupos de preditores ou variáveis independentes: os atributos pessoais - idade, saúde percebida e expectativa subjetiva de vida; e os aspectos do trabalho - comprometimento com a carreira, percepção no trabalho, flexibilidade de horário e controle do trabalho. Esses atributos e os aspectos do trabalho são variáveis que podem exercer influência na decisão da aposentadoria e serão analisados a seguir.

Atributos pessoais

No grupo atributos pessoais foram inseridas as variáveis idade, saúde percebida e expectativa subjetiva de vida. A inserção das variáveis idade e saúde percebida tomou por base o estudo de Kim e Feldman (2000) que demonstraram que a percepção de saúde foi positivamente associada ao bridge employment, enquanto a idade foi negativamente associada à opção do bridge employment. Corroborando com Kim e Feldman (2000) foram considerados ainda os autores Ulrich e Brott (2005) e Wang et al. (2008) que ressaltaram que o baixo nível de saúde percebida e a idade avançada apresentam uma relação positiva com a opção da aposentadoria definitiva.

A inserção da variável expectativa subjetiva de vida nesse modelo segue o que foi apontado por Solinge e Henkens (2009) que argumentam que a expectativa de vida subjetiva pode afetar a intenção da decisão da aposentadoria dos trabalhadores. Isto é, aqueles que esperam viver mais teriam um desejo maior em permanecer ativos no mercado de trabalho.

De Lannoy (2008) acrescenta que a expectativa subjetiva de vida não deve ser influenciada pela ameaça incontrolável de morte acidental, mas pelo nível educacional, percepção de saúde e pelo controle da própria vida. Solinge e Henkens (2009) apontam ainda que a expectativa subjetiva de vida e a longevidade de uma população têm sido tratadas em relação a vários aspectos do interesse humano, entre eles o investimento em capital, a realização de poupança, o consumo e o comportamento relativo à saúde. Contudo, poucos estudos relacionaram essa questão em função da decisão da aposentadoria.

Aspectos do trabalho

Neste grupo de variáveis estão inseridos o comprometimento com a carreira, a percepção do trabalho, a flexibilidade de horário e o controle do trabalho. Essas variáveis foram estudadas por outros autores - descritos a seguir - e foram relevantes para a sua inclusão no modelo que testou a influência dos aspectos do trabalho na decisão frente à aposentadoria.

Blau (1985) define o comprometimento com a carreira como sendo parte das atitudes dos trabalhadores frente à profissão desempenhada. Bastos (1997) afirma que se comprometer significa se sentir vinculado a uma determinada coisa e se empenhar para permanecer em determinada trajetória. Já Rowe (2008) ressalta que o comprometimento com a carreira está associado à motivação do indivíduo para desempenhar o trabalho escolhido e que construtos teóricos afetivos como: satisfação com a carreira, satisfação com promoções e motivação na carreira são considerados componentes do comprometimento. O compromisso do trabalhador com a carreira pode dar significado e continuidade ao trabalho, sendo a carreira o foco da vida de muitos indivíduos (Bastos, 1997; Rowe, 2008). Apesar de esses autores não terem analisado a influência do comprometimento da carreira na decisão da aposentadoria, supomos que a decisão pode ser influenciada pelo maior ou menor comprometimento dos trabalhadores à medida que estes avançam na carreira.

Ainda em relação à importância dos aspectos do trabalho para a decisão da aposentadoria, França (2009) aponta que o comprometimento pode ser avaliado pelo grau de identificação psicológica ou compromisso de alguém em relação ao trabalho, significando mais do que a autorrealização e pode levar ao adiamento da aposentadoria. A satisfação com o trabalho parece direcionar o trabalhador a ser mais comprometido com a carreira e, se associado a forte identificação profissional e pessoal com o trabalho, pode incentivar a permanência do trabalhador na organização (Kim & Feldman, 2000, França, 2009). Ekerdt e DeViney (1993) reforçam a influência da proximidade da aposentadoria na percepção da carreira, quando assinalam que os trabalhadores mais velhos veem seu trabalho como menos satisfatório quando se aproximam da idade planejada para se aposentar.

Vários autores assinalam que a satisfação no trabalho influencia diretamente a saída dos trabalhadores das organizações (Siqueira, 2008; Siqueira & Gomide Jr., 2004; Tamayo, 1998). França (2004, 2009) apontou que a percepção do trabalho (satisfação e envolvimento) não prediz atitudes negativas ou positivas acerca da aposentadoria tanto para os executivos jovens ou velhos. Contudo, quando observadas as diferenças entre as nacionalidades (brasileiros e neozelandeses), essa percepção parece influenciar apenas os executivos brasileiros. Assim, aqueles que tinham uma percepção positiva dos seus trabalhos tendiam a ter também uma atitude positiva acerca do tempo para os relacionamentos, para as atividades culturais e para o lazer na aposentadoria.

Muitos trabalhadores não tiveram oportunidade para escolher, pois sequer conheceram suas verdadeiras vocações profissionais. Ou seja, foram influenciados por seus pais ou parentes na escolha da profissão, ou por um determinado tipo de trabalho que garantia uma independência financeira mais rápida (França, 2009). Ainda assim, ao longo da vida profissional, essas pessoas acabaram se tornando envolvidas e satisfeitas com o trabalho.

O equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal dentro das organizações vem sendo largamente difundido no mundo inteiro, frente à necessidade de os indivíduos terem um tempo para si. Charles e Decicca (2007) ressaltam que os trabalhadores mais velhos que usufruíram de horários de trabalho menos rígidos estão mais suscetíveis a permanecer no mundo do trabalho do que aqueles que tiveram horários mais rígidos. A flexibilização do horário de trabalho pode não resultar na maior inserção dos trabalhadores mais velhos no mundo do trabalho, mas pode postergar a saída destes do mercado. Gielen (2007) aponta que no Reino Unido a flexibilização de horário, principalmente para os trabalhadores mais velhos, tem sido muito incentivada, de forma a atuar até mesmo como uma política para manutenção dos trabalhadores ativos.

O modelo de Demanda-Controle de Karasek (1979) sugere que a falta do controle está geralmente associada ao estresse no trabalho, o que pode ser considerado um motivo para a aposentadoria. O modelo apresenta duas dimensões que englobam aspectos do processo de trabalho - as demandas psicológicas e o controle do trabalhador sobre o próprio trabalho. De acordo com Karasek, esse controle abrange o uso de habilidades e autoridade de decisão, a influência do grupo de trabalho e a influência na política gerencial.

Nesta pesquisa optou-se por explorar apenas os aspectos referentes à autoridade de decisão sobre o próprio trabalho, uma vez que o objetivo foi investigar a influência do controle do trabalho na decisão da aposentadoria. Como apontado por Gielen (2007) e Charles e Decicca (2007) as pessoas que ao longo da vida trabalharam em empregos com maior controle sobre suas rotinas estão mais propensas a permanecer trabalhando, mesmo já tendo idade suficiente para reivindicar seu direito à aposentadoria.

 

MÉTODO

Participantes

A pesquisa foi realizada com servidores públicos federais da área de ciência e tecnologia, lotados em um órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), situado no Rio de Janeiro. Foram convidados 196 servidores com idade superior a 45 anos e que estavam há pelo menos 15 anos da idade legal da aposentadoria, obedecendo os parâmetros legais do serviço público brasileiro. A amostra final foi composta por 148 participantes de ambos os sexos, que preencheram todo o questionário distribuído.

A amostra foi composta por 64,5% de homens e 35,5% de mulheres, com média de idade de 52,5 anos, variando entre 45 e 67 anos. Os participantes tinham em média 28,7 anos de trabalho (com registro em carteira). A idade desejada para a aposentadoria variou de 50 a 70 anos, sendo a média de 62 anos e a média de tempo para aposentadoria foi 9,5 anos (M = 9,5 e SD = 7,1).

A maioria dos participantes (78%) residia com parceiro, e grande parte destes (74%) declarou manter um relacionamento afetivo satisfatório. Outra informação considerada relevante foi o número reduzido de filhos por participante, cuja média foi M = 1,65 e o desvio padrão foi SD = 1,07.

Conforme esperado em uma instituição de Ciência e Tecnologia, a escolaridade dos participantes é alta, sendo a maioria (75%) pós-graduada. Todos os participantes eram ocupantes das carreiras referentes à ciência e tecnologia: a) Carreira de Pesquisa em Ciência e Tecnologia (pesquisadores); b) Carreira de Desenvolvimento Tecnológico (tecnologistas e técnicos) e c) Carreira de Gestão, Planejamento e Infraestrutura em Ciência e Tecnologia (C&T), como analistas e assistentes em C&T. Metade dos participantes era da carreira de Desenvolvimento Tecnológico ocupante do cargo Tecnologista, um quarto era Assistente em C&T e os demais ficaram distribuídos em igual proporção entre Técnicos, Analistas em C&T e Pesquisadores.

Quando questionados acerca da concordância frente à legislação que determina a compulsoriedade da aposentadoria aos 70 anos, grande parte dos participantes concordou ou concordou plenamente com esse limite, um terço discordou ou discordou plenamente e um quarto restante afirmou não ter opinião formada.

Instrumento

O questionário utilizado na coleta de dados foi composto por questões contendo variáveis sociodemográficas e também por quatro escalas, tais como: expectativa subjetiva de vida; comprometimento com a carreira; percepção no trabalho; flexibilidade no horário e controle do trabalho.

Optou-se por trabalhar apenas com escalas já validadas e que apresentaram bons índices de consistência interna (α > 0,70). Para medir o comprometimento com a carreira foi utilizada a escala de Blau (1985), traduzida e validada por Bastos (1997). Essa escala foi composta por sete itens e apresentou alto nível de consistência interna quando aplicada por Blau. A Escala de Percepção do Trabalho (França, 2004) foi elaborada em pesquisa transcultural realizada com top executivos do Brasil e da Nova Zelândia. Essa escala foi composta por dez itens e apresentou duas dimensões tais como: envolvimento com o trabalho e satisfação com o trabalho. A medida de Expectativa de Vida Subjetiva (Solinge & Henkens, 2009) foi composta por dois itens, onde foi efetuada a média aritmética simples, cujos valores mais altos representariam a expectativa subjetiva de vida mais alta. A Flexibilidade de Horário (Charles & Decicca, 2007) e o Controle do Trabalho (Gielen, 2007), foram medidas respectivamente por três itens. Em todas as escalas obtivemos bons índices de consistência (Alfa de Cronbach α > 0,70).

Procedimentos

O projeto de pesquisa e seus instrumentos foram submetidos e aprovados pelo Comitê de Ética da universidade da qual os pesquisadores estavam filiados, sob o parecer nº 35/2012. A pesquisa foi apresentada, publicamente a todos os servidores da organização, porém os questionários foram distribuídos apenas aos participantes que atendiam aos critérios de inclusão de participantes (conforme subitem Participantes). Para garantir o retorno de no mínimo 70% dos questionários, a direção da organização apresentou o projeto ao corpo gerencial da instituição, e o pesquisador realizou seis follow up. Contudo, eles poderiam preenchê-los no trabalho ou em qualquer outro local ao seu critério, desde que fossem posteriormente depositados em uma urna, disponível em local de livre acesso na organização. Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Análise dos dados

Os dados obtidos foram inseridos e analisados com o software SPSS, versão 15.0 e as seguintes etapas foram seguidas: i) a digitação; ii) limpeza do banco de dados; iii) análise de confiabilidade das escalas; iv) análise descritiva; v) regressão logística múltipla.

A distribuição dos participantes pela decisão da aposentadoria levou em conta inicialmente cinco possibilidades, como pode ser observado na Tabela 1. Posteriormente, três delas - se aposentar e trabalhar em outro tipo de trabalho, se aposentar e trabalhar em outra organização e trabalhar por conta própria - foram agrupadas em apenas uma: bridge employment.

A regressão logística múltipla foi realizada tanto para as correlações, quanto para o teste das variáveis independentes (preditores) do modelo e cada uma das possibilidades da decisão ou variáveis dependentes excludentes, quais sejam: i) continuar trabalhando no emprego atual; ii) adotar o bridge employment e iii) se aposentar. Para permitir a regressão, foi criada uma coluna para cada uma dessas opções excludentes, denominadas variáveis dependentes, onde a resposta positiva era igual a "1", e a resposta negativa era igual a "0".

 

RESULTADOS

A maioria dos participantes desta pesquisa apresentou a pretensão de optar pelo bridge employment (47%), seguido por postergar a aposentadoria e continuar trabalhando na mesma organização (32%) e, por último, se aposentar definitivamente (21%). É importante ressaltar que, para esses participantes a opção por trabalhar na aposentadoria nem sempre é motivada pela complementação de renda, já que apenas um quarto dos participantes declarou que continuaria trabalhando por razões econômicas e ainda porque a maioria (75%) afirmou ter recursos financeiros suficientes para a aposentadoria.

No sentido de verificar o poder preditivo de sete variáveis entre atributos pessoais (idade, saúde percebida, expectativa subjetiva de vida) e aspectos do trabalho (comprometimento com a carreira, percepção no trabalho, flexibilidade no horário, controle do trabalho) frente à decisão da aposentadoria foi utilizada a regressão logística múltipla. A regressão logística múltipla é o modelo adequado quando se pretende comprovar um evento que possua uma variável aleatória dependente, com natureza dicotômica e mais de uma variável independente (Cabrera, 1994; Figueira, 2006).

Primeiramente, foram analisadas as correlações das variáveis (procedimento realizado automaticamente no SPSS quando comandada a regressão) para a opção postergar a aposentadoria. A regressão das variáveis independentes que apresentaram significância (p < 0,05) como idade, percepção do trabalho, flexibilidade no horário e a variável postergar a aposentadoria no emprego atual foi realizada em três estágios considerando: no primeiro a percepção do trabalho, no segundo a percepção do trabalho e flexibilidade de horário e no terceiro a idade, a percepção do trabalho e a flexibilidade de horário. Vale ressaltar que a variável controle do trabalho (a última a ser adicionada ao modelo) foi utilizada como referência para a equação.

Conforme apontado na Tabela 2, o modelo confirmou o poder preditivo das variáveis em todos os estágios - estágio 1: percepção do trabalho (β = 0,73; p < 0,05); estágio 2: percepção do trabalho (β = 0,40; p < 0,05) e flexibilidade de horário (β = 0,42; p < 0,05); estágio 3: idade (β = 0,09; p < 0,05), percepção do trabalho (β = 0,72; p < 0,05) e flexibilidade de horário (β = 0,48; p < 0,05). A percepção do trabalho apresentou maior efeito preditivo para postergar a aposentadoria nos três estágios da regressão, ou seja, quando realizada a regressão sozinha ou associada às demais variáveis, seguido da flexibilidade de horário e da idade. Assim, o indivíduo que perceber mais positivamente seu trabalho, tiver maior flexibilidade no horário e tiver mais idade, estará mais predisposto a postergar sua aposentadoria e continuar trabalhando na mesma organização.

Em seguida, foi realizado procedimento igual para analisar a influência das variáveis para a opção bridge employment (aposentar e continuar trabalhando). A regressão das variáveis independentes significativas, tais como a percepção do trabalho e flexibilidade no horário e a variável bridge employment, foi realizada em dois estágios considerando no primeiro as variáveis da percepção do trabalho; e no segundo as varáveis de percepção e flexibilidade de horário. Para a realização da equação, o modelo considerou a variável de controle do trabalho como a referência.

Conforme apontado na Tabela 3, o modelo confirmou o poder preditivo das variáveis em todos os estágios. Estágio 1: percepção do trabalho (β = -0,59; p < 0,05); estágio 2: percepção do trabalho (β = -0,62; p < 0,05) e flexibilidade de horário (β = -0,37; p < 0,05). A percepção do trabalho foi a variável que apresentou maior efeito preditivo para o bridge employment nos dois estágios da regressão, seguida da flexibilidade de horário, sendo importante ressaltar que em ambos os casos o beta obteve sinal negativo. Assim, os resultados indicam que quanto menos positiva for a percepção do trabalho do indivíduo e menor for a sua flexibilidade de horário, mais predisposto ele estará em adotar o bridge employment.

Por fim, realizou-se procedimento igual para analisar a influência das variáveis na opção aposentadoria definitiva. A regressão das variáveis independentes, baseadas na significância encontrada para saúde percebida e a aposentadoria definitiva, foi realizada considerando a variável controle do trabalho como a referência. Conforme pode ser observado na Tabela 4, o modelo confirmou o poder preditivo da variável saúde percebida (β = -0,65; p < 0,05), sendo importante ressaltar que o beta tem sinal negativo. Assim, quanto pior for a saúde percebida pelos trabalhadores mais propensos eles estarão em solicitar sua aposentadoria definitiva.

A Figura 1 apresenta o modelo resultante dos resultados das regressões com os preditores e as suas influências em cada possibilidade.

 

 

DISCUSSÃO

A presente pesquisa teve por objetivo analisar os preditores, ou seja, os aspectos que podem influenciar o comportamento de um grupo de servidores públicos federais em função de uma provável decisão na aposentadoria. Neste caso, buscamos conhecer a influência na tomada de decisão em um grupo de trabalhadores mais velhos que estavam próximos da aposentadoria, ou seja, entre aqueles que tinham 45 anos ou mais e estavam de 0 a 15 anos do momento em que seriam preenchidos todos os pré-requisitos legais. Esse processo de decisão envolvia três opções: postergar a aposentadoria; pelo bridge employment, ou pela aposentadoria definitiva, no momento que forem preenchidos todos os pré-requisitos para tal. Os preditores foram testados mediante regressão logística múltipla em dois grupos: atributos pessoais - idade, saúde percebida e expectativa subjetiva de vida; aspectos do trabalho - comprometimento com a carreira, percepção do trabalho, flexibilidade no horário e controle do trabalho, a fim de comprovar o poder preditivo de cada uma das variáveis frente à decisão da aposentadoria.

Três variáveis comprovaram seus poderes preditivos para postergar a aposentadoria, a partir da realização da equação de regressão logística múltipla. A percepção do trabalho (β = 0,72; p < 0,05), flexibilidade de horário (β = 0,48; p < 0,05) e idade (β = 0,09; p < 0,05) indicaram que exercem influência nessa decisão por parte dos servidores públicos federais. Contudo, no que se refere à idade (β = 0,09; p < 0,05), cujo poder preditivo foi muito baixo, recomendamos que seu resultado seja interpretado com alguma parcimônia.

O primeiro resultado - quanto mais positiva for a percepção do indivíduo sobre o seu trabalho, mais propenso ele estará em postergar a aposentadoria e continuar trabalhando na mesma organização - não corroborou a pesquisa de França (2004) onde os executivos que percebiam o trabalho mais positivamente estavam igualmente positivos frente à aposentadoria. Contudo, o intuito daquela autora era conhecer as atitudes de executivos frente aos ganhos e às perdas na aposentadoria, ou seja, uma etapa anterior à decisão.

Assim, apesar de os executivos estarem satisfeitos e envolvidos em seu trabalho, isso não os impedia de reconhecer os ganhos na aposentadoria. Como recomendado por França, a presente pesquisa testou a escala de percepção do trabalho com outra categoria profissional e tipo de trabalho. Neste caso, a percepção do trabalho positiva influencia o desejo de não se aposentar e continuar na organização mesmo tendo esse direito, e a percepção positiva poderá influenciar a busca pelo bridge employment, ou seja, se aposentam, mas buscam outras oportunidades de trabalho.

As variáveis idade, maior flexibilidade de horário e maior controle sobre o trabalho influenciam o trabalhador a postergar a aposentadoria e a continuar trabalhando na mesma organização. Entretanto, se o trabalhador perceber seu trabalho negativamente e ao mesmo tempo tiver menor flexibilidade de horário, estará mais predisposto a adotar o bridge employment. E, finalmente, se o trabalhador perceber sua saúde debilitada, mais propenso ele estará a solicitar sua aposentadoria definitiva, independente de qualquer outro fator.

A variável comprometimento com a carreira obteve média elevada na escala total (M = 5,23 - escala Likert de sete pontos; SD = 0,98). Observou-se ainda uma alta expectativa subjetiva de vida (M = 3,58; SD = 0,78) destacada pelos participantes. Contudo, essas variáveis não foram significativas na regressão logística múltipla realizada. O primeiro resultado contrariou nossa previsão de que o comprometimento com a carreira pudesse manter o trabalhador mais velho por mais tempo no mercado.

O segundo resultado não confirmou os achados de Solinge e Henkens (2009) que ressaltaram que a expectativa de vida subjetiva afeta a intenção da decisão da aposentadoria dos trabalhadores. Vale lembrar, como foi ressaltado no início deste artigo, que os participantes estavam há menos 15 anos da aposentadoria e as respostas representam as intenções que poderão se modificar na época da decisão propriamente dita. Solinge e Henkens (2009) afirmaram que a intenção ou a atitude do trabalhador pode ser diferente no momento da decisão pela aposentadoria. Esses autores sugerem ainda que alguns trabalhadores mais velhos têm pouco controle sobre o momento em que vão se aposentar e nem sempre a aposentadoria é voluntária, especialmente se os trabalhadores forem acometidos por alguma doença incapacitante, obrigados a cuidar do parceiro ou outro familiar, ou forçados a se aposentar por algum outro motivo. Em outras palavras, este estudo requer um acompanhamento para verificar se as intenções de decisão apontadas poderão de fato se transformar em comportamento à época aposentadoria.

Quanto à decisão de postergar a aposentadoria e continuar trabalhando na organização, os resultados destacaram que os servidores públicos são fortemente influenciados pelos aspectos do trabalho, especialmente pelo controle do trabalho, que, por sua vez, caracterizam a autonomia do trabalhador sobre aquele. Esses resultados corroboram com Gielen (2007) e Charles e Decicca (2007) quando ressaltam que flexibilidade de horário e o controle do trabalho podem exercer influência na manutenção dos trabalhadores ativos na organização.

 

CONCLUSÕES

A importância evidenciada pelo controle do trabalho, da flexibilidade de horário e da percepção do trabalho pelos trabalhadores mais velhos apontam algumas direções para as organizações. A flexibilidade representa a liberdade para os trabalhadores administrarem seu tempo, ajustando-o às suas necessidades, mesmo que precisem trabalhar em horários não tão convencionais, porém com maior satisfação e controle. Por conseguinte, as empresas que desejarem reter "seus talentos" deverão oferecer alternativas de flexibilidade de horário e maior controle sobre o trabalho para seus trabalhadores e estimular percepções mais positivas do trabalho, adiando a aposentadoria. Novas rotinas devem ser criadas com os trabalhadores, pois eles têm a consciência da importância do seu trabalho e saberão como melhor aproveitá-las, sem prejuízo de tempo para lazer, convívio familiar e outras atividades.

Algumas limitações e recomendações advindas desta pesquisa devem ser registradas. A primeira limitação é que o modelo deve ser testado com outras categorias profissionais, em outros estados do território nacional e comparado com o setor privado, considerando as diferenças organizacionais, culturais e níveis de expectativa de vida. É recomendável ainda que o modelo seja testado em uma amostra mais robusta com a possível inserção de outras variáveis, como, por exemplo, testar se a condição econômica (Kim & Feldman, 2000, Wang et al., 2009), as relações familiares e as atividades de lazer (França, 2004, 2009) exercem influência na decisão da aposentadoria dos brasileiros. Desse modo, poderiam ser confirmados alguns resultados no que diz respeito aos preditores que influenciam essa decisão, bem como suas generalizações e especificidades no modelo apresentado.

A segunda limitação se refere à especificidade desse tipo de serviço público (ciência e tecnologia) e o que se esperava em função do comprometimento de carreira, que nesse caso não influenciou na decisão de postergar a aposentadoria. Para poder ter uma confirmação desses resultados, seria recomendável a extensão dessa pesquisa a outros grupos profissionais do serviço público, onde se espera maior comprometimento com o trabalho, como por exemplo, militares, professores, médicos e juízes. Cabe ainda um estudo qualitativo complementar entre trabalhadores e gestores, a fim de serem identificadas as medidas e políticas que possam facilitar a permanência daqueles que ainda desejam continuar contribuindo para a organização, mesmo que estejam na idade da aposentadoria. Recomenda-se uma pesquisa complementar com os trabalhadores que participaram dessa pesquisa e já se aposentaram de forma a verificar se os resultados se mantêm ou se modificaram, no que diz respeito a essa decisão. Quanto às recomendações para o governo e as organizações, é fundamental que façam cumprir a Política Nacional do Idoso e o Estatuto do Idoso frente ao apoio necessário aos trabalhadores mais velhos que desejam se aposentar, bem como aqueles que precisam e desejam continuar trabalhando. Da mesma forma, é preciso incentivar a adesão dos trabalhadores na contribuição ao INSS e as empresas na formação de um fundo de pensão, para gerir maior receita para o pagamento das aposentadorias que estão aumentando. Não se deve esquecer que os trabalhadores atualizados podem continuar por mais tempo no mercado, e isso poderá minimizar o risco de uma escassez de mão de obra. Assim, a indicação deste estudo é a implantação de programas de preparação para aposentadoria que permitam "educar" os trabalhadores que queiram se aposentar, mas também capacitar, atualizar e oferecer novas opções àqueles que pretendam continuar trabalhando.

A aposentadoria pode ser uma oportunidade para o trabalhador realizar o que não conseguiu enquanto trabalhava em horário integral. Deve ser um tempo para aproveitar mais a vida, mas é necessário estabelecer novas metas, novos ideais e rotinas. Deve ser ainda uma chance para desenvolver um trabalho mais prazeroso para aqueles que estejam saudáveis e desejam continuar no mercado de trabalho. A guisa de conclusão, é fundamental salientar que tão importante quanto preparar os trabalhadores mais velhos e as organizações para a sua continuidade no mercado ou aposentadoria é a incorporação da flexibilização dos horários de trabalho nas políticas de Recursos Humanos das organizações, medida já adotada por diversos países desenvolvidos.

 

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Recebido em: 22.12.2011
Aprovado em: 27.10.2012

 

 

1 Este artigo é parte da dissertação de mestrado defendida em 2011 por Gustavo Silva Menezes sob orientação da Prof. Lucia França no Programa de Pos-Graduaçao em Psicologia da UNIVERSO, Niterói.