SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.13 issue1The path is drawn between obstacles?: The professional career of a female managerInnovation management in difficult times author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Revista Psicologia Organizações e Trabalho

On-line version ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.13 no.1 Florianópolis Apr. 2013

 

Produção científica sobre fatores humanos no trabalho: análise a partir de periódicos brasileiros

 

Scientific production on human factors and work: analysis from brazilian scientific journals

 

 

Alexsandro Luiz de AndradeI; Vívian Louzada FrossardII

IUniversidade Federal do Espírito Santo
IICentro Universitário São Camilo

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A presente proposta de pesquisa trata do mapeamento do cenário científico brasileiro sobre a pesquisa de aspectos humanos no mundo do trabalho. O estudo foi realizado a partir de um levantamento de artigos publicados com temas ligados ao assunto dentro dos periódicos Brasileiros avaliados pela CAPES. Foram analisados no conjunto 178 artigos dentro de 15 revistas científicas nacionais ligadas ao campo da administração e psicologia indexadas à base de dados Scielo. A análise dos artigos considerou: avaliação das revistas, temas de estudo, metodologia e perfil dos autores. Os resultados mostram que a maior parte da publicação científica brasileira está concentrada em universidades e instituições públicas da região sul e sudeste, sob a responsabilidade de mestres e doutores. Os temas de maior ocorrência de estudos foram os seguintes: saúde mental, comportamento organizacional e identidade profissional.

Palavras-Chave: Psicologia Organizacional e do Trabalho, Gestão de Pessoas, Levantamento Bibliográfico.


ABSTRACT

This research proposal deals with the mapping of Brazilian scientific research on human aspects in the workplace. The study was conducted from a survey of articles published on topics related to the subject in the Brazilian journals evaluated by CAPES. A total of 178 articles in 15 national scientific journals related to the field of human factors in management and psychology were analyzed, all of which were indexed in the Scielo database. The analysis of the articles considered: evaluation of the journals, research themes, methodology, and author profiles. The results show that much of Brazilian scientific publication is concentrated in universities and public institutions in the South and Southeast regions, under the responsibility of masters and PhDs. The most frequent research topics were: mental health, organizational behavior, and professional identity.

Keywords: Organizational Psychology and Work, Managing People and Human Factors, Literature Review.


 

 

Os fatores humanos no trabalho contemplam uma diversidade de temas que envolvem um compromisso duplo enquanto área de conhecimento. O primeiro é dar base para práticas de gestão em organizações de trabalho, e o segundo reside em gerar conhecimento em prol do ser humano e da sociedade (Zanelli, Borges-Andrade & Bastos, 2004; Siqueira, 2002; Robbins, Judge & Sobral, 2010).

Este estudo tem por objetivo descrever o perfil das pesquisas que estão inseridas no campo da Administração e da Psicologia, as quais se encontram ligadas de alguma forma a temas vinculados aos aspectos humanos no mundo do trabalho. No levantamento de Yamamoto, Souza e Yamamoto (1999) sobre o campo da psicologia de maneira geral na década de 1990, é sinalizada a crescente preocupação com o monitoramento da produção científica nacional e internacional. Mapeamentos dessa natureza visam caracterizar a direção das pesquisas, questões de abrangência, dispersão, concentração da produção, entre outros aspectos. Segundo Teixeira, Lassance, Silva e Bargadi (2007), em periódicos de pesquisas internacionais, o mapeamento dos artigos de periódicos em uma determinada área é uma prática habitual e a pesquisa de um mesmo tema em diversos periódicos também é frequente. Essas pesquisas colaboram em futuros trabalhos e para a avaliação da produção científica (Oliveira, Cantalice, Joly & Santos, 2006).

Fatores humanos no trabalho: um campo de diversidades

O mundo do trabalho é um campo interdisciplinar de ampla abrangência e comumente considerado um plano de contradições e ambiguidades (Zanelli, Borges-Andrade & Bastos, 2004; Sato & Schmidt, 2004). Na busca pelo entendimento dos diversos aspectos das situações cotidianas do mundo do trabalho observa-se uma integração e interação de áreas distintas, tais como, psicologia, administração, antropologia, ciências sociais, economia, história, entre outras.

Dentro desse conjunto interdisciplinar de conhecimento, podemos organizar o campo de saber, pesquisa e intervenção em dois grandes grupos: o primeiro de dimensão mais instrumental e técnica, sob tutela principal do campo de gestão de pessoas e processos organizacionais (Robbins, Judge & Sobral, 2010; Chiavenato, 2005). E o segundo com uma perspectiva mais crítica, reivindicante e focada no entendimento dos determinantes do processo de saúde no trabalho (Seligmann-Silva, 1994; Borges, Moulin, & Araújo, 2001; Dejours, 1987). Tais perspectivas norteiam um campo sem uma identidade única conforme considera Wachelke, Botomé, Andrade, Faggiani, Natividade e Chalfin (2005).

A perspectiva de estudo ligada ao campo da gestão de pessoas costuma focar suas questões de estudo e pesquisa em aspectos relativos à seleção de pessoas e avaliação psicológica (Pereira & Bandeira, 2009), treinamento e desenvolvimento (Mourão & Marins, 2009), avaliação de desempenho, remuneração e benefícios (Ribeiro & Bastos, 2010; Vazquez & Hutz, 2008), qualidade de vida e eficácia (Robbins, Judge & Sobral, 2010; Chiavenato, 2005). A segunda concepção, por sua vez, possui seus fundamentos nos questionamentos de Marx (1989) considerando a discussão sobre o papel exclusivista dos meios de produção e seus interesses na geração de lucro. Para Spink (1996), o papel das ciências sociais nesse contexto é o de gerar alternativas aos interesses do sistema produtivo, possuindo um viés menos tecnicista e mais participativo no entendimento e mudança dos efeitos do trabalho na subjetividade dos trabalhadores (Spilki, Jacques, Scopel & Oliveira, 2009). Entre as temáticas de estudo englobadas nessas perspectivas destacam-se pesquisa sobre aspectos de preconceito e discriminação (Garcia & Souza, 2010), questões sobre sofrimento, prazer e adoecimentos no trabalho (Mendes, Vieira & Morrone, 2009), práticas cooperativas, economia solidária e rede de trabalho (Santos & Deluiz, 2009).

No que diz respeito ao perfil da Psicologia Organizacional e do Trabalho (POT) no Brasil, Borges-Andrade e Pagotto (2010) analisam o estado da arte em pesquisa a partir de diferentes fontes de informação, como por exemplo: campo de atuação profissional, cursos de pós-graduação e periódicos nacionais e internacionais, segundo os autores a área de POT vivencia nos últimos anos um movimento de expansão, tanto em nível profissional como científico. No âmbito profissional, Bastos e Gondim (2010) corroboram essa afirmação em um estudo com mais de 4 mil psicólogos, no qual foi traçado o perfil da categoria de profissionais psicólogos. Segundo estes, o campo de POT aparece como segunda atividade de maior ocupação dos psicólogos, abrangendo 23% da amostra investigada. Esse crescimento é observado também no campo da pós-graduação stricto senso que, segundo dados da Associação Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho (Sbpot, 2012), conta na atualidade com 18 programas de pós formação que envolvem cursos de mestrado e doutorado em alguns casos. Da perspectiva dos jornais científicos da área de POT no Brasil, Tonetto, Amazarray, Koller e Gomes (2008) destacam o volume de publicação na área, que além de representarem uma porcentagem importante no total de artigos de principais revistas da psicologia (16%), também evidencia uma diversidade de temas de interesse e investigação.

Com o objetivo de compreender o cenário atual de publicações na área de fatores humanos no trabalho, dentro das diferentes perspectivas de investigação, a presente proposta de pesquisa desenvolve-se como um levantamento dos artigos publicados em revistas científicas dos últimos cinco anos.

 

MÉTODO

Seleção dos periódicos

O levantamento dos artigos avaliados neste estudo foi feito entre os periódicos brasileiros inclusos no sistema Qualis da CAPES, no período de 2005 a 2010. No total foram analisados 178 artigos, dentro de 15 revistas científicas brasileiras, com assuntos ligados ao campo de gestão de pessoas, psicologia organizacional e do trabalho (POT), indexadas na base de dados Scielo.

Como critério para inclusão da revista no presente levantamento, foram consideradas a avaliação da revista e a incidência regular de artigos publicados no periódico com temas na área de administração de pessoas, gestão de recursos humanos e POT. O Qualis avaliativo foi consultado tomando como base a área de administração, e foram adicionados ao estudo apenas as revistas com avaliação A2, B1 e B2. Uma consulta à revista A1 também foi realizada, não havendo, porém, nenhum periódico nacional com incidência de artigos na área e avaliação nessa categoria.

A distribuição dos artigos por revista, número de publicações e avaliação do periódico segundo o Qualis da CAPES utilizado é apresentada na Tabela 1:

Categorias de análise

Com objetivo de traçar um perfil do campo de pesquisa e publicação da área, uma análise de vários indicadores foi realizada. Nesse processo, o software estatístico SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) versão 13.0 foi utilizado para registro e análise dos dados. Para análise dos principais temas de pesquisa, os artigos foram categorizados em 14 categorias elaboradas pelos autores a partir dos conteúdos mais recorrentes.

As categorias foram as seguintes:

1. Saúde mental: envolvendo em sua maioria pesquisas sobre saúde no trabalho, sofrimento mental no trabalho, psicodinâmica, adoecimento no trabalho, estresse e coping.

2. Gênero, discriminação e exclusão: categoria que engloba estudos sobre trabalho feminino, discriminação por gênero e cor, além de pesquisas com desempregados.

3. Identidade profissional: englobou estudos com temáticas de identidade profissional; ideologias de uma profissão; subjetividade de um cargo e escolha profissional.

4. Desenvolvimento e mudança organizacional: envolve o estudo sobre ações de melhoria organizacional, trabalho em equipe e desenvolvimento de cultura.

5. Avaliação psicológica: categoria com estudos sobre desenvolvimento de instrumentos, estudos preditivos de seleção de pessoal com base em medidas psicológicas; testes psicológicos; e escalas de avaliação de construtos psicológicos.

6. Cooperativismo: nesta categoria estão inseridos temas como a participação de organizações gerenciadas por trabalhadores, atividades de trabalho realizadas por ONGs, organização de assentamentos rurais e cooperação.

7. Comportamento organizacional: envolve pesquisas sobre comportamento de grupos dentro de uma organização, atitudes de colaboradores, clima, valores, comprometimento e justiça organizacional.

8. Competências: compreende as pesquisas sobre os perfis profissionais, capital intelectual, inteligência organizacional e aptidões para o trabalho.

9. Gestão de pessoas: enquadra artigos sobre administração de recursos humanos, modelos de excelência em gestão, políticas de RH; comunicação corporativa e gestão estratégica de pessoas.

10. Aprendizagem: essa categoria faz menção a fatores de aquisição de conhecimentos no trabalho, treinamento e avaliação de necessidades.

11. Relacionamento interpessoal: essa categoria está relacionada com as interações entre pessoas dentro de uma instituição, suas consequências e dificuldades.

12. Competitividade: compreende as questões relacionadas à concorrência ou à competitividade dentro e fora de uma empresa, bem como estudos sobre estratégia de vantagem organizacional.

13. Responsabilidade social e ambiental - RSA: envolve pesquisas que apreciam o tema de responsabilidade social e responsabilidade ambiental das organizações, bem como as consequências micro, meso e macro dessas ações.

14. Outros: a última categoria associa-se com pesquisas de temas diversos, como a relação da família dentro da organização, julgamento moral, tecnologia da informação, consumismo, espiritualidade e análise institucional.

Além da análise dos temas, os artigos foram também analisados nas categorias de metodologia utilizada, titulação acadêmica dos autores, estado de origem da publicação e tamanho da amostra.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados encontrados no levantamento são apresentados a seguir traçando um perfil geral das publicações, considerando as variáveis: quantidade de publicações, temáticas das publicações, características metodológica dos artigos e perfil dos autores.

Quantidade de publicações

O número total de publicações foi analisado segundo três aspectos: revista, área e ano de publicação.

Dentro do aspecto revista, se observa um maior número de publicações no periódico Revista de Administração Mackenzie (16,5%), sendo seguido pela Revista de Administração Contemporânea (10,2%) e Psicologia & Sociedade (10,2%); na sequência temos os periódicos, Psicologia Ciência e Profissão (9,7%), Revista de Administração da Universidade de São Paulo (8%), Estudos de Psicologia - Campinas (8%), Revista de Administração de Empresas (7,5%).

Esses periódicos no seu conjunto totalizaram 70% das publicações nacionais sobre o assunto.

No que diz respeito à área de origem, do volume de artigos levantados, 120 (68,2%) foram publicados em revistas oriundas da administração e, 56 (31,8%) em periódicos ligados à psicologia. No que diz respeito ao número de publicações por ano, se observa uma expansão no número de publicações nos últimos anos: o número de artigos por ano foi o seguinte: 2005 (16 artigos - 9,1%), 2006 (14 artigos - 8%), 2007 (30 artigos - 17%), 2008 (20 artigos - 11,4%), 2009 (45 artigos - 25,6%) e 2010 (51 artigos - 29%).

O primeiro aspecto a ser comentado desses resultados diz respeito à expansão de publicações na área; os últimos dois anos do levantamento apresentam uma concentração de mais de 50% das publicações. Como destaca Zanelli e Bastos (2004), Tonetto e colaboradores (2008) e Borges-Andrade e Pagotto (2010), o crescimento da área é uma realidade ascendente, envolvendo como consequência direta o aumento das ações de pesquisa e inserção de profissionais nas áreas de recursos humanos e POT. A expansão da área também se associa com ações de desenvolvimento dos programas de pós-graduação, linhas de pesquisa e o aumento de teses e dissertações com temas na área (Féres-Carneiro, Bastos, Feitosa, Seidl-de-Moura & Yamamoto, 2010; Borges-Andrade, 2010).

Temática de publicações

As 14 categorias de tema de artigo foram distribuídas num gráfico de porcentagem, conforme Figura 1.

 

 

A partir dos resultados, observa-se acentuado interesse pela temática de saúde mental (35 artigos - 20%), destacando nessa categoria assuntos ligados a psicodinâmica do trabalho e estresse. Outras categorias de maior interesse de pesquisa na área são fenômenos no campo de comportamento organizacional (16 artigos - 9%), marcado por assuntos como liderança, comprometimento e satisfação. Na sequência, temos as temáticas de identidade profissional (14 artigos - 8%), onde se destacam assuntos como formação profissional e práticas profissionais; gestão de pessoas (11 artigos - 6%), marcada por pesquisa na área de avaliação de desempenho e políticas de gestão; e a categoria gênero, exclusão e discriminação veio na sequência (13 artigos - 7%), na qual se destacam os estudos sobre o trabalho feminino.

Dentro da categoria de temas, é importante destacar ainda os aspectos da diversidade de assuntos estudados. A categoria Outras, composta por assuntos não englobados em nenhuma das categorias anteriores representou 12% dos artigos (20 artigos), os quais versavam sobre aspectos como gestão do conhecimento, regulação emocional, representação social, etc. Outros temas de relevância para área apresentam baixa incidência de pesquisa, com um total de produção igual ou superior a 4 artigos, sendo eles: relacionamento interpessoal (4 artigos - 2,3%), desenvolvimento e mudança organizacional (5 artigos - 2,8%), cooperativismo (5 artigos - 2,8%) e responsabilidade social e ambiental (11 artigos - 6,8%).

Essa quantidade de assuntos pode ser entendida como produto de um campo interdisciplinar. As pesquisas em questões do mundo do trabalho abarcam disciplinas da psicologia, administração, economia, sociologia, história e outras; desta forma, a formação e o foco de estudo dos pesquisadores torna-se um retrato de diversidade e múltiplos olhares. Esses aspectos são considerados por diversos autores como uma característica do trabalho, marcado por contradições, ambiguidades e diversidades (Guimarães, 2009; Souza & Lisboa, 2006).

No entanto, o maior interesse de pesquisa pelos tópicos em saúde mental e comportamento organizacional demonstra de forma clara a perspectiva dualística do campo apontada no início deste artigo e comentado em outros estudos sobre o campo (Tonetto & Cols. 2008; Borges-Andrade & Pagotto, 2010). O campo de estudo dos fatores humanos foca tanto uma dimensão de compreensão e desenvolvimento dos aspectos de saúde e qualidade de vida, como também ações de pesquisa e intervenção em dimensões da organização com interesse em assuntos ligados a eficácia organizacional e lucro.

Observou-se no conjunto de pesquisas que trabalhos sobre funções tradicionais e práticas de recursos humanos, tais como recrutamento, seleção, desenvolvimento de competências e avaliação de desempenho ainda são raros, consideração semelhante foi apresentada por Tonetto e colaboradores (2008). Observa-se, como na pesquisa de Borges-Andrade e Pagotto (2010), poucos estudos sobre aspectos meso organizacionais (equipes e grupos), objeto também comum na prática de profissionais de gestão e recursos humanos. Esse fato retrata que, apesar do campo apresentar um crescimento substancial de publicações, ainda não se produz conhecimento suficiente para dar suporte aos profissionais e pesquisadores da área nos seus diferentes contextos.

Característica metodológica dos artigos

No que diz respeito à característica metodológica dos estudos, o primeiro aspecto considerado neste mapeamento de artigo é o tipo de delineamento empregado. Neste quesito, observa-se uma prevalência de artigos com um desenho do tipo survey (33,5% - 59 artigos), sendo seguido por pesquisa com delineamento documental (28,4% - 50 artigos) e entrevista (19,3% - 34 artigos). O emprego de estudos de caso aparece como quarto delineamento de maior ocorrência (11,4% - 20 artigos) e, como delineamentos de menor ocorrência têm-se: as pesquisas de metodologia mista (5,7% - 10 artigos), observacional (0,6% - 1 artigo), etnográfica (0,6% - 1 artigo) e experimental (0,6% - 1 artigo).

Ao se comparar o tipo de delineamento por área de origem da revista, se observa nos periódicos da administração uma prevalência de pesquisas com delineamento do tipo survey (38,3% - 46 artigos), sendo seguido por pesquisas do tipo documental (25% - 30 artigos) e entrevista (15% - 18 artigos). No caso dos periódicos de psicologia, a situação se inverte, o tipo de desenho metodológico predominante é o documental (35,7% - 20 artigos), seguido por entrevista (28,6% - 16 artigos) e survey (23,2% - 13 artigos).

No que tange à composição amostral dos estudos em termos da quantidade de sujeitos, observa-se uma diversidade no número amostral. A maioria dos estudos apresenta um total de 21 a 100 participantes (18,2%), seguido por estudos com 101 a 300 participantes (15,3%), com até 5 participantes (14,2%), mais de 300 participantes (11,4%) e de 6 a 20 participantes (10,8%).

Em relação à característica metodológica dos trabalhos, podemos observar uma ausência de perfil dominante. Tal fato é em parte associado à característica do campo, no qual pesquisadores de formação e interesses diferentes publicam seus artigos. A predominância de estudos documentais e com delineamento de entrevista nos periódicos de psicologia associa-se com estudos com número reduzido de participantes, característico de estudo com foco qualitativo. Por sua vez os artigos oriundos de revistas da administração apresentam uma situação contrária, com uma predominância do delineamento do tipo survey, com desenhos amostrais maiores, sendo pesquisas predominantemente quantitativas.

Tais perspectivas metodológicas, como destaca Gunther (2006), não são passíveis de uma análise em termos de vantagens e desvantagens, mas sim pontos positivos que refletem a natureza interdisciplinar e plurimetodológica de investigação do campo. O aspecto negativo a se destacar nesse tópico é a baixa ocorrência de pesquisas com metodologias mistas e triangulares, aspectos que emergem em estudos internacionais dentro desse campo (Bendassolli, Borges-Andrade & Malvezzi, 2010). Como sugere a agenda estratégica proposta por Borges-Andrade e Pagotto (2010) os pesquisadores da área, especialmente os ligados à área de psicologia ainda investem pouco em recursos metodológicos de abordagem multinível, desenhos metodológicos longitudinais e estudo com características experimentais, aspectos que aparecem com frequência em artigos internacionais e são sugeridos com finalidade de crescimento da área, mas pouco explorados nos estudos brasileiros.

Perfil dos autores

O último aspecto considerado na descrição dos artigos publicados com temática de fatores humanos no trabalho relaciona-se ao perfil dos autores dos artigos. Nesse aspecto, em termos de titulação acadêmica, a maioria dos artigos possui autoria de pesquisadores com grau de doutor (40,9%), sendo seguido por mestres (33%) e graduados (5,7%), sendo que nessa categoria 20,5% dos artigos não apresentavam indicação da titulação dos autores.

Quando se compara publicações em revistas da psicologia e da administração, um dado divergente do grupo de origem se apresenta. Em periódicos da psicologia, se observa uma prevalência de autores com titulação de mestre (42,9%), em relação ao número de doutores (28,6%). Nas revistas de administração por sua vez a situação é inversa, um maior número de publicações de doutores (46,7%), comparado a mestres (28,3%).

Outra consideração sobre esse levantamento é a concentração de produções científicas em instituições públicas, incluindo maioria de cunho federal e estadual. Estas concentram 66,5% das produções da área, sendo as instituições privadas responsáveis por 33,5% das publicações do campo. Quando se compreende essa categoria por origem do periódico verifica-se que na revista de psicologia a concentração é de 73,2% das publicações de autores de instituições públicas e, no caso dos periódicos de administração a situação se torna mais homogênea com 63,3% da produção em instituições não privadas.

Por fim, em relação à origem geográfica da publicação, dimensão ligada à instituição vínculo do autor principal, observa-se uma concentração de publicações na região sul e sudeste, sendo que o estado de São Paulo responde com a maioria das publicações nacionais (26,7%), sendo seguido por Rio Grande do Sul (13,6%), Minas Gerais (9,1%), Rio de Janeiro (8,5%), Paraná (6,3)%, Brasília (6,3%), Santa Catarina (4,5%) e Bahia (4,5%), outros estados também apresentam artigos publicados, porém numa quantidade reduzida.

A primeira consideração a se fazer sobre o perfil dos autores trata da concentração de publicações na região sul e sudeste. Tal fato possui como causa direta a concentração dos principais e mais antigos programas de pós-graduação do país. Como destaca o site da Sociedade Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho (Sbpot), são encontrados no país 18 programas Strictu Sensu com linhas de formação em temas de trabalho e psicologia, destes 13 estão na região sul e sudeste. Tal fato torna a região um local de formação dos pesquisadores residentes em outros locais e, também acaba por consolidar linhas de pesquisas de maior duração e tradição de pesquisa nos assuntos relacionados.

No que confere a concentração das publicações com autores de instituições públicas, tal fato pode estar relacionado ao perfil dessas instituições em dispor carga horária para seus professores com horas específicas para pesquisa, aspecto nem sempre presente valorizado nas instituições privadas. Quanto à prevalência de mestres na autoria dos artigos publicados nos periódicos de psicologia, este é um dado curioso, mas explicado pelo fato da recente formação de doutores nessa área (Borges-Andrade, 2010), e também pela concentração de publicação de pesquisadores da psicologia em revista da administração, aspecto observado principalmente entre pesquisadores e grupos de pesquisa já estabelecidos (Borges-Andrade & Pagotto, 2010).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A natureza geral dos resultados apresentados neste estudo demonstra a diversidade do campo de produção científica sobre fatores humanos no trabalho. Observa-se um campo, a partir dos periódicos analisados, com predomínio de estudos exploratórios e descritivos, amostras com número reduzido de participantes e concentração de autores de poucas regiões do território nacional. No que diz respeito às temáticas de estudo, verifica-se uma preocupação dos pesquisadores com temas e demandas da realidade social do trabalho em nosso país, destacando-se os estudos sobre saúde no trabalho em suas diferentes concepções teóricas, identidade e temas da área de comportamento organizacional, tais como liderança e comprometimento.

Sobre as diferenças entre as revistas de psicologia e administração, podemos concluir que apesar de versarem sobre temas comuns sobre os fatores humanos no trabalho, a natureza dos artigos e o perfil dos pesquisadores que nessas revistas publicam assume características diferentes. Em revistas de administração é mais comum a publicação de pesquisas do tipo survey, amostras de maior tamanho e procedimentos estatísticos como base para interpretação dos resultados. Nas revistas de psicologia, por sua vez, o perfil dos estudos são de base qualitativa, englobando delineamentos documentais, recursos de entrevista e amostras com número reduzido de participantes. Outra particularidade sobre perfil, é que as revistas de administração publicam com maior frequência artigos de autores com origem em programas de pós-graduação e formação em psicologia, o mesmo não ocorre nas revistas da psicologia, nas quais o predomínio de autoria é de pesquisadores da própria área.

Compreender como as publicações e os conhecimentos produzidos na área de administração de pessoas e POT estão sendo desenvolvidas possibilita identificar onde existem conexões entre as duas disciplinas, o que é de grande importância a ambas as áreas do conhecimento científico. O processo de avaliação dos periódicos da área de administração e psicologia fornece subsídios capazes para a compreensão das tendências da produção em ambas as áreas, bem como sustentam num nível empírico e científico as ações de profissionais que nesse campo atuam. Conforme Teixeira, Lassance, Silva e Bargadi (2007), o acompanhamento do desenvolvimento das pesquisas de uma determinada área do conhecimento e a sua análise constitui-se em uma excelente forma de reconhecer a importância de seus avanços e temas investigados.

As conclusões do presente trabalho revelam uma grande expansão do campo nos últimos anos dentro do cenário nacional. No entanto, tal constatação não representa uma hegemonia no que concerne os grupos de pesquisadores e suas produções acadêmicas, aspecto considerado ainda muito escasso quanto ao número de trabalhos de autores das regiões do norte e nordeste de nosso país. Sobre a investigação de temáticas inerentes às práticas de profissionais presentes em atividades de recursos humanos em organizações de trabalho, a falta de estudos que atestem um rigor científico às suas ações ainda é observada, com especial destaque para estudos sobre práticas e políticas de recursos humanos, envolvendo principalmente estudos de predição sobre seleção e desempenho laboral.

Concluímos considerando importante mapear periodicamente o campo de estudo dos fatores humanos no trabalho, presentes nos artigos científicos inseridos nos periódicos de Administração e de Psicologia, bem como livros específicos sobre a área e anais de trabalhos apresentados em congressos. Sugerimos novos estudos como este para melhor entendimento e delineamento das ações futuras de pesquisa.

 

REFERÊNCIAS

Associação Brasileira de Psicologia Organizacional e do Trabalho - Sbpot (2012). Pós-graduação stricto sensu. Retirado em 31/03/2012, de http://www.sbpot.org.br/.         [ Links ]

Bastos, A. V. B. & Gondim, S. M. G .(2010). O trabalho do psicólogo no Brasil. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Bendassolli, P. F., Borges-Andrade, J. E. & Malvezzi, S. (2010) Paradigmas, eixos temáticos e tensões na PTO no Brasil. Estudos de Psicologia. (Natal), 15(3),281-289.         [ Links ]

Borges, L. H., Moulin, M. G. & Araújo, M. D. (2001). (Orgs.). Organização do trabalho e saúde: múltiplas dimensões. Vitória: Editora UFES.         [ Links ]

Borges-Andrade, J. E. & Pagotto, C. P. (2010). O estado da arte da pesquisa brasileira em Psicologia do Trabalho e Organizacional. Psicologia.: Teoria e Pesquisa, 26(número especial),37-50 .         [ Links ]

Borges-Andrade, J. E. (2010). O estado da arte da pesquisa em psicologia organizacional e do trabalho no Brasil. Em. Anais do IV Congresso Brasileiro de Psicologia Organizacional e do Trabalho - IV CBPOT, Resumos do congresso [CD]. São Paulo: SBPOT.         [ Links ]

Chiavenato, I. (2005). Gestão de Pessoas. São Paulo: Campus.         [ Links ]

Dejours, C. (1987). A loucura do trabalho: estudo de psicopatologia do Trabalho. São Paulo: Oboré         [ Links ].

Féres-Carneiro, T., Bastos, A. V., Feitosa, M. A. G., Seidl-de-Moura, M. L. & Yamamoto, O. H. (2010). Lacunas, Metas e Condições parava Expansão da Pós-Graduação em Psicologia no País. Psicologia: Reflexão e Crítica, 23(1),11-24.         [ Links ]

Garcia, A. & Souza, E. M. (2010). Sexualidade e trabalho: estudo sobre a discriminação de homossexuais masculinos no setor bancário. Revista de Administração Pública, 44(6),1353-1377.         [ Links ]

Guimarães, M. C.(2009). Transformações do trabalho e violência psicológica no serviço público brasileiro. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, 34(120),163-171.         [ Links ]

Gunther, H. (2006). Pesquisa qualitativa versus pesquisa quantitativa: esta é a questão? Psicologia: Teoria e Pesquisa, 22(2),201-209.         [ Links ]

Marx, K. (1989). O capital. São Paulo: Bertrand Brasil.         [ Links ]

Mendes, A. M. B., Vieira, A. P. & Morrone, C. F. (2009). Prazer, Sofrimento e Saúde Mental no Trabalho de Teleatendimento. RECADM, 8(2),151-158.         [ Links ]

Mourão, L. & Marins, J. (2009). Avaliação de treinamento e desenvolvimento nas organizações: resultados relativos ao nível de aprendizagem. Revista Psicologia Organizações e Trabalho, 9(2),72-85.         [ Links ]

Oliveira, K. L., Cantalice, L. M., Joly, M. C. R. A. & Santos, A. A. (2006). Produção científica de 10 anos da Revista Psicologia Escolar e Educacional (1996/2005). Revista Psicologia Escolar e Educacional, 10(2),283-292.         [ Links ]

Pereira, D. F. & Bandeira, D. R. (Orgs.). (2009). Aspectos práticos da avaliação psicológica nas organizações. São Paulo: Vetor.         [ Links ]

Ribeiro, J. A. & Bastos, A. V. B. (2010). Comprometimento e justiça organizacional: um estudo de suas relações com recompensas assimétricas. Psicologia Ciência e profissão, Brasília, 30(1),4-21.         [ Links ]

Robbins,S.P., Judge,T.A. & Sobral, F. (2010). Comportamento Organizacional: teoria e prática no contexto brasileiro. São Paulo: Pearson Prentice Hall.         [ Links ]

Santos, A. M. M & Deluiz, N. (2009). Economia popular e educação: a experiência de uma cooperativa de reciclagem de lixo no Rio de Janeiro. Revista Portuguesa de Educação, 22(2),159-190.         [ Links ]

Sato, L., & Schmidt, M. L. S. (2004). Psicologia do Trabalho e Psicologia Clínica: um ensaio de articulação focalizando o desemprego. Estudos de Psicologia (Natal), 9(2),365-371.         [ Links ]

Seligmann-Silva, E. (1994). Desgaste mental no trabalho dominado. Rio de Janeiro: Editora UFRJ/Cortez.         [ Links ]

Siqueira, M. M. M. (2002). Medidas do comportamento organizacional. Estudos de Psicologia (Natal), 7(número especial),11-28.         [ Links ]

Souza, N. V. D. O. & Lisboa, M. T. L. (2006). Os múltiplos e contraditórios sentidos do trabalho para as enfermeiras: repercussões da organização e do processo laboral. Ciência, Cuidado e Saúde,5(3),326-334.         [ Links ]

Spilki, A., Jacques, M.G. C., Scopel, M & Oliveira, S. (2009). O trabalho na contemporaneidade e suas implicações na subjetividade dos trabalhadores. Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, EDUFSC, 43(1),165-179.         [ Links ]

Spink, P (1996). Organização como fenômeno psicossocial: notas para uma definição da psicologia do trabalho. Psicologia e Sociedade, 8(1),174-192.         [ Links ]

Teixeira, M. A. P., Lassance, M. C. P., Silva, B. M. B. & Bardagi, M. P. (2007). Produção Científica em Orientação Profissional: Uma Análise da Revista Brasileira de Orientação Profissional. Revista Brasileira de Orientação Profissional, 8(2),25 - 40.         [ Links ]

Tonetto, A. M., Amazarray, M. R. Koller, S. H. & Gomes, W. B. (2008). Psicologia organizacional e do trabalho no Brasil: desenvolvimento científico contemporâneo. Psicologia & Sociedade, 20(2),165-173.         [ Links ]

Vazquez, A. C. & Hutz, C. S. (2008). Escala Vazquez Hutz de Avaliação de Desempenho. São Paulo: Casa do Psicólogo.         [ Links ]

Wachelke, J. F. R., Botomé, S. S., Andrade, A. L., Faggiani, R. B., Natividade, J.C. & Chalfin, M. C. (2005). Conceitos e práticas adotados por pesquisadores em psicologia organizacional e do trabalho. Aletheia, 21,7-19.         [ Links ]

Yamamoto, O. H., Souza, C. C., & Yamamoto, M. E.(1999). A produção científica na psicologia: Uma análise dos periódicos brasileiros de 1990 - 1997. Psicologia Reflexão e Crítica, 12,549- 565.         [ Links ]

Zanelli, J. C. & Bastos, A. V. B. (2004). Inserção profissional do psicólogo em organizações e no trabalho. In Zanelli, J. C., Borges-Andrade, J. E & Bastos, A. V. B. (Eds.) Psicologia, organizações e trabalho (pp. 466-491). Porto Alegre: Artes Médicas.         [ Links ]

Zanelli, J. C., Borges-Andrade, J. E & Bastos, A. V. B. (2004). Psicologia, organizações e trabalho. Porto Alegre: Artes Médicas.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Alexsandro Luiz de Andrade
Universidade Federal do Espírito Santo
AV. Francisco Generoso da Fonseca, 415
Vitória - ES. CEP: 29.060-140
Tel.: (27) 9236-5970
E-mail: alexsandro.deandrade@yahoo.com

Recebido em: 26.07.2011
Aprovado em: 06.09.2012