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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.14 no.1 Florianópolis mar. 2014

 

Limpeza urbana: o contexto institucional e a atividade de varrição em belo horizonte

 

Urban cleaning: the institutional context and street sweeping activity in belo horizonte

 

 

Georgina Maria Véras MottaI; Livia de Oliveira BorgesII

IUniversidade Federal de Minas Gerais
IIUniversidade Federal de Minas Gerais

 

 


RESUMO

O artigo descreve, numa abordagem institucionalista, o processo de gestão da autarquia responsável pela limpeza urbana em Belo Horizonte (de 1973 a 2012), focalizando a atividade de varrição. Realizaram-se a pesquisa documental e as entrevistas semi estruturadas com pessoas chaves e garis de varrição e aplicou-se a análise de conteúdo. Os resultados indicaram que as políticas públicas promoveram mudanças nos marcos institucionais com impactos relevantes para a organização. Os garis as percebem como predominantemente problemáticas. A reflexão sobre os resultados aponta a necessidade de promover a participação dos trabalhadores na gestão da autarquia e valorizar suas experiências para o desenvolvimento e qualidade do serviço de limpeza urbana, e contribuir para o bem-estar social.

Palavras chaves: Limpeza urbana, contexto institucional, varrição, pesquisa documental.


ABSTRACT

The article describes, in an institutionalist approach, the management process of the municipal institution responsible for urban cleaning in Belo Horizonte (from 1973 to 2012), focusing on street sweeping activity. Documental research and semi-structured interviews with key people and street sweepers were conducted. Content analysis was used. The results indicated that municipal policies promoted changes in the institutional framework with significant impacts for the organization. The street sweepers perceive them as predominantly problematic. The article points out the need to promote workers' participation in the management of the municipal institution, and to benefit from their experience, toward improving operations and quality of the urban cleaning service, and to contribute to social welfare.

Keywords: Urban cleaning; institutional context; street sweeping activity; documental research.


 

 

A varrição de vias integra o conjunto de ações de limpeza urbana dos municípios. É a principal atividade de limpeza de logradouros públicos e consiste na remoção de resíduos sólidos acumulados, devido às causas naturais e ao descarte desses resíduos pela população. Impacta na promoção: da qualidade sanitária do ambiente, ao evitar acúmulo de resíduos e proliferação de vetores transmissores de doenças, contribuindo para a saúde pública; dos aspectos estéticos urbanos e da captação de receita nas atividades de comércio, serviços e turismo (Alvim Cunha & Santos, 2002; Damásio, 2007; M. E. Borges, 1985; Secretaria Municipal de Políticas Urbanas - SMURBE, 2010).

No entanto, a atividade dos trabalhadores da limpeza urbana é integrante dos trabalhos desvalorizados (Lhuilier, 2005): tarefas socialmente consideradas à parte, evitadas e ocultadas, como também o trabalhador que as executa pelo vínculo estabelecido entre ele e o seu objeto de trabalho. Entre os estudos sobre a temática, no tocante à varrição de ruas, não se observa um número expressivo. A maioria das publicações revisadas (p. ex. Bulcão & Albano, 2010; M. C. O. Santos, 2004; T. L. F. Santos, 1999) dirigem a atenção à coleta dos resíduos sólidos, a sua gestão técnica, a sua disposição final e aos trabalhadores - os garis1 da coleta domiciliar - e não aos garis de varrição.

As conclusões desses estudos nem sempre podem ser generalizadas para a varrição e suas análises, também não estão direcionadas ao todo da organização ou aos processos institucionais. Entretanto, Lapassade (1974/1983) já assinalara que a dimensão institucional é oculta, mas influente. Ela está presente na construção das políticas de gestão e afeta a concepção e execução da atividade (Baremblitt, 1992/2002; B. S. Santos,2000; Enriquez, 1992/1997; Srour, 2005). Assim, considera-se relevante desenvolver estudos contemplando a análise sobre a instituição/organização responsável pela atividade.

O presente artigo tem como objetivo, descrever, numa perspectiva institucionalista, o processo de gestão da limpeza urbana em Belo Horizonte, de 1973 (criação da Superintendência de Limpeza Urbana, SLU) a 2012, focalizando a atividade de varrição de logradouros. Indaga-se: quais impactos as políticas da prefeitura tiveram para o funcionamento e políticas de gestão da SLU, assim como para a atividade ocupacional e como foram percebidas pelos trabalhadores, em especial os da varrição?

 

Organizações e instituições: conceitos básicos

Além do uso coloquial do termo organização como sinônimo de instituição, as primeiras são objeto de estudo de diferentes abordagens teóricas, havendo consequentemente, uma diversidade conceitual (Bastos, Loiola, Queiroz & Silva, 2004; Srour, 2005). A distinção dos conceitos remete aos diferentes níveis de posição na realidade social. Instituição corresponde ao terceiro nível (segundo, as organizações e o primeiro, os grupos sociais). Tem a função de organizar a sociedade estabelecendo fundamentos (modelos morais e cognitivos) que contribuem para construir a estabilidade estrutural, sendo a expressão do Estado e operando nos níveis jurídico e político como mantenedora de uma ordem social (Baremblitt, 1992/2002; Lapassade, 1974/1983; Sour, 2005). As organizações são como segundo nível de realidade social, o espaço delimitado ao interior dos estabelecimentos. Mediam a sociedade civil e o Estado e são reguladas pelas instituições (Baremblitt, 1992/2002; Lapassade, 1974/1983).

As organizações são constituídas por uma coletividade fundada em torno de um propósito (missão) que direciona suas ações (visão estratégica), visando objetivos específicos (produção e distribuição de bens, formação de homens, etc.) que refletem suas crenças e princípios (Bohlander & Snell, 2007/2010; Lapassade, 1974/1983; Tanke, 2005). Diferenciam-se em relação à estabilidade e respeitabilidade social, bem como pelas relações sociais de trabalho e de propriedade (B.S.Santos,2000;Boon, Paauwe, Boselie & Hartog, 2009; Fin, Currie & Martin, 2010; Sour,2005).

No entanto, em alguns casos, os conceitos de instituição e organização se sobrepõem ou se intercalam: há organizações à semelhança das instituições, dotadas de certa estabilidade estrutural e de reconhecimento social, tornando-se referências simbólicas e de dupla significação, embora mantenha simultaneamente seu funcionamento como organizações (Srour, 2005). A SLU é um exemplo ao materializar a ação do Estado na limpeza urbana e pelo prestígio perante a sociedade e, ao mesmo tempo, ser a executora da gestão de serviços de utilidade pública.

Bastos et al. (2004) definem as organizações como fenômenos complexos constituído por diversos níveis: o plano dos indivíduos, o dos grupos e o organizacional propriamente dito (processos políticos e técnicos). Seu caráter social é definido em conformidade com as dimensões analíticas (econômica, política e simbólica) que demarcam o espaço social e se interpenetram. Portanto, ao estudá-las se deve contemplar as relações coletivas e societais, visto se tratarem de coletividades em ação (Bastos et al., 2004; Boon et al., 2009; Fin et al., 2010; Guirado, 2009; Lapassade, 1974/ 1983; Srour, 2005).

A presente pesquisa se referenda em uma abordagem psicossociológica de vertente institucionalista. A vertente institucionalista não se configura como uma disciplina ou uma ciência. É um movimento (Baremblitt, 1992/2002; Guirado, 2009; Pereira, 2007;) constituído por diversas tendências cujas propostas não se fixam, pois se constroem continuamente (Baremblitt, 1992/2002; Guirado, 2009; Pereira, 2007).

O Movimento Institucionalista, no entanto, compartilha os conceitos de sociedade - instituinte e instituído - bem como o objetivo "de propiciar, apoiar e de deflagrar nas comunidades, nos coletivos e conjunto de pessoas processos de autogestão e auto-análise" (Baremblitt, 1992/2002, p. 14). A sociedade é vista como uma rede de instituições, organizações e estabelecimentos que regulam as atividades humanas (Baremblitt, 1992/2002; Bastos et al., 2004; Lapassade, 1974/1983). O instituinte refere-se ao processo, resultante da ação de forças produtivas de regulações da atividade humana que transformam ou fundam instituições. Instituído é a sua cristalização, confundindo-se às vezes com a própria instituição (Baremblitt, 1992/2002; Lapassade, 1974/1983). A autoanálise consiste em levar as organizações a "enunciar, compreender, adquirir ou readquirir um pensamento e um vocabulário próprio que lhes permita saber acerca da sua vida" (Baremblitt, 1992/2002, p. 17). A autogestão é um sistema organizado pelo coletivo para gerir sua produção e vida a partir da autoanálise de modo que os quadros gestores executem suas decisões (Baremblitt, 1992/2002; Lapassade, 1974/1983).

O espaço de produção concreto é considerado um conjunto de relações sociais (entre produtores e a natureza e entre os atores nela envolvidos), originadas em torno da produção de valores econômicos (B. S. Santos, 2000; Srour, 2005) na sociedade contemporânea. Essas relações são afetadas pelas instituições, que organizam a ordem social a partir da cúpula, em um processo de institucionalização, promovendo interdição da palavra social, ao impedir a participação do indivíduo em decisões essenciais, separando-o dos sistemas de poder (B. S. Santos, 2000; Lapassade, 1974/1983). A vertente institucionalista compreende que os conceitos anteriormente citados, como autoanálise e autogestão, são ferramentas teóricas importantes para a recuperação de tais espaços em direção da sua democratização e valorização da autonomia humana.

As relações estabelecidas pelos agentes sociais nas organizações são de dois tipos: relações estruturais e relações de consumo (B.S. Santos, 2000; Srour, 2005). Tais relações são permeadas pelo burocratismo, que assume o caráter de ferramenta do poder, sustentado na busca de uma uniformização da diversidade. Utiliza-se do conhecimento técnico, dentre outras coisas, para efetivar e cristalizar a divisão do poder entre os grupos - os que decidem e os que executam as atividades - no que diz respeito ao que deve e como deve ser feito (B. S. Santos,2000; Lapassade,1974/1983). Lapassade afirma sobre o burocratismo que "essa racionalidade é irracional" (1974/1983, p. 54), porque se detém no nível formal e esquece os níveis das informalidades e dos grupos. As previsões no nível formal não coincidem com os acontecimentos na prática cotidiana. O burocratismo não pode ser visto como um mal exclusivo das organizações, pois se encontra presente na sociedade de maneira ampla.

Segundo Bastos et al. (2004), quanto mais o ambiente é institucionalizado (com normas, valores, regulações incorporadas e legitimadas socialmente), mais as organizações tendem ao isomorfismo. No entanto, Boon et al. (2009) e Fin et al. (2010) evidenciaram que o contexto institucional é parcialmente determinista e as organizações apresentam diferentes perfis de respostas sustentadas por suas dinâmicas internas, em que o envolvimento institucional, o uso da liberdade de escolher caminhos e de agir diferenciam estilos de gestão de pessoas. A função do pesquisador configura-se, nessa perspectiva, em atuar para restituir a palavra às experiências sociais em uma ação que se aproxima dos movimentos políticos (Baremblitt, 1992/2002; Lapassade, 1974/1983; Rodrigues & Souza, 2002).

 

MÉTODO

Desenvolveu-se pesquisa de campo com a aplicação de duas técnicas de coleta de dados: entrevistas semiestruturadas e consulta a documentos disponíveis em uma tentativa de maior aproximação da realidade, tendo em vista a consecução do objetivo da pesquisa. As duas estratégias foram aplicadas de maneira sistêmica em que uma complementava a outra. Não se trata, portanto, de etapas subsequentes, senão de etapas concomitantes e interdependentes. Por uma questão de recurso expositivo, as subseções seguintes descreverão uma de cada vez.

Pesquisa documental

Os documentos consultados abrangeram legislações, editais, relatórios dos prefeitos, relatórios técnicos, manuais de serviço, documentos internos e jornais de notícia. Foram buscados por meio da inserção da primeira autora no campo de pesquisa - a SLU e seu Centro de Memória e Pesquisa - e os órgãos públicos: Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte e biblioteca pública estadual. Outros documentos foram localizados a partir das falas dos participantes (entrevistados), que os mencionavam servindo de ponto de partida para sua busca e/ou que apresentavam diretamente documentos de interesse da pesquisa.

Aos documentos reunidos, aplicou análise de conteúdo hermenêutico-dialética (Minayo, 2000), em que o material textual é compreendido como parte dos processos sociais e conforme o contexto em que foram produzidos. Para isso, seguiram-se as etapas recomendadas pela mesma autora. Assim, inicialmente o material recolhido foi selecionado tendo como critério básico abranger conteúdos que contribuíssem a consecução do objetivo de pesquisa. As leituras subsequentes foram permitindo sistematizar gradualmente os conteúdos encontrados e paulatinamente contribuindo para resgatar história da gestão da limpeza urbana segundo os marcos institucionais.

Entrevistas

Os 21 participantes compuseram dois grupos distintos: garis (seis em 1999/2000 e seis em 2012) e pessoas chaves - gestores e técnicos (quatro participantes em 1999/2000 e cinco em 2012) - responsáveis pela aplicação das políticas da prefeitura à limpeza urbana, relativas à atividade de varrição. As entrevistas de 1999/2000, com garis e gestores/técnicos (com mais de dez anos de trabalho na autarquia), recuperadas de pesquisa sobre limpeza urbana (Motta, 2000), contemplaram as condições de trabalho vivenciadas por esses. Utilizaram-se as respostas que captavam a percepção dos trabalhadores sobre a SLU quando a gestão da limpeza urbana era sua atribuição exclusiva. Portanto, parte das entrevistas abarcadas foi resgatada de um banco de dados (registro de transcrição de entrevistas) disponível, ou em outras palavras, houve recuperação de dados coletados pela primeira autora do artigo de pesquisa anterior.

O roteiro das entrevistas com as pessoas-chave, em 2012, foi organizado partindo do modelo proposto por Srour (2005) de análise tridimensional das organizações: dimensões econômica, política e simbólica. As questões, portanto, foram elaboradas visando cobrir as três dimensões. Essas entrevistas tiveram uma duração média de 65,6 minutos.

O roteiro das entrevistas com os garis, em 2012, contemplou a percepção dos mesmos sobre a SLU, a identificação dos participantes com a função/emprego e com a instituição e sobre as condições de trabalho vivenciadas. Norteou-se pela taxonomia de condições de trabalho elaborada por Borges, Costa, Alves-Filho e da Rocha Falcão (2013) que estabelece quatro categorias: condições contratuais e jurídicas; condições físicas e materiais; processos e características da atividade; condições sociogerenciais. Essas entrevistas tiveram duração que variou de 52,8 minutos. As entrevistas em ambos os grupos foram gravadas, transcritas na íntegra e aplicadas à análise de conteúdo categórica (Bardin,1977/2011; Bauer & Aarts, 2002; Minayo, 2000; Turato, 2003). Envolveram-se em tal análise 11 juízes: três estudantes de pós-graduação e oito de iniciação científica em regime de duplas e trios. Todos eram participantes do grupo de pesquisa ao qual as autoras se vinculam e contam com treinamento em análise de conteúdo categórica, bem como o uso do Programa QDA MINER, um pacote estatístico específico para tal tipo de análise. As entrevistas foram analisadas na íntegra não havendo, portanto, seleção de parte do material. Os juízes participaram das etapas de leitura flutuante e categorização. A categorização foi realizada, portanto, a posteriori porque emergiram das leituras e discussões entre os juízes. A etapa de enxugamento e sistematização das categorias foi realizada pelas autoras e por um dos juízes de pós-graduação.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Organizou-se a análise dos resultados a partir de uma linha do tempo referente à prestação de serviço de limpeza urbana em Belo Horizonte (de 1973 a 2011), focalizando a atividade de varrição. Assim, distinguem-se três fases que refletem a função da SLU de materializar as políticas de limpeza urbana do município. Na primeira fase (Tabela 1), as ações técnicas e operacionais se fundamentaram no I Plano Diretor de Limpeza Urbana e foram incrementadas pela melhoria da prestação do serviço. Priorizaram os processos de trabalho e equipamentos dos serviços de coleta e a destinação final do lixo, para atender demandas sociais devido às tragédias pela destinação dos resíduos a céu aberto na Favela da Ventosa2.

A varrição de ruas permaneceu executada por empresas contratadas até 1981 quando a SLU absorveu o serviço e os trabalhadores e dela encarregou às gerências das unidades operacionais - sem planejamento técnico ou mudanças relevantes nas condições de trabalho oferecidas, segundo entrevistados, corroborando os dados encontrados por Estanislau (1981). O marco da formalização técnica da varrição foi o primeiro planejamento, iniciado em 1992 e concluído em 1995, segundo entrevista, que corrobora os registros de Silva, Mesquita & Chenna (1998). Concomitantemente algumas ações, como a regionalização da gestão operacional dos serviços e a criação de sedes de apoio, efetivaram-se.

As políticas internas da SLU, no início do período, visaram apenas apoio à atividade fim, e tiveram por meta, a criação da estrutura organizacional, o estabelecimento do gerenciamento autárquico vinculado ao CMLU e ao gestor municipal (relatórios anuais da SLU e de gestão dos prefeitos). A complexidade política ampliou-se pelo desenvolvimento econômico da autarquia.

O início da sistematização da política de gestão de pessoas foi observado a partir de ações em saúde e segurança e da criação do serviço de assistência social, que se refletiu, por exemplo, no processo de locação dos trabalhadores, nas unidades regionalizadas citadas (por proximidade com o local de residência), conforme entrevistas (gestores/técnicos - 1999 e garis - 2012). Observou-se, porém, a escassez de registros sobre a varrição, seus trabalhadores e suas condições de trabalho no Centro de Memória e Pesquisa da SLU. Nos relatórios oficiais, como os relatórios anuais de atividades da SLU de 1974 e 1981, as referências aos servidores são poucas, restringindo-se às despesas com o quadro de pessoal e ao número de acidentes. Tal escassez de registros documentais associada aos relatos dos trabalhadores sobre as condições de trabalho inadequadas da época, também constatada por Estanislau (1981) expressa, assim, a pouca relevância atribuída pela gestão municipal à autarquia e essa aos seus servidores.

A tardia formalização técnica da varrição dificultou a expansão da prestação de serviços e manteve os trabalhadores submetidos às sobrecargas de trabalho e a constrangimentos. Ocasionados pela inexistência ou precariedade de locais para alimentação e higiene (cuja construção iniciou-se nessa fase), a concessão de poucos benefícios trabalhistas e equipamentos de segurança (entrevistados) corroboram os relatos de Estanislau (1981) que também informou a rotatividade estimada da organização de 16% ao mês, à época.

Na segunda fase de gestão da SLU, de 1993 a 2000, efetivou-se o planejamento técnico da varrição e criou-se a nona Divisão de Limpeza, durante a implementação do Modelo de Gestão de Resíduos Sólidos de Belo Horizonte. Esse era constituído por três eixos: 1) consistência tecnológica para aprimoramento dos processos tecnológicos de manejo do lixo; 2) qualificação e valorização do trabalhador incluindo ações de capacitação dos servidores e criação de moderna infraestrutura operacional, projetos de comunicação interna, incentivo às atividades artísticas, ações prevencionistas em saúde e segurança no trabalho; 3) cidadania e participação social, voltada à educação ambiental da população, parcerias com setores públicos, privados e associações de catadores de materiais recicláveis (Motta, 2000; Silva, 2000).

Nessa fase, observa-se a proximidade da autarquia aos servidores, ao gestor municipal e à comunidade (relatórios anuais de atividade da SLU e Prefeitura), apesar do reinício da terceirização das atividades. A aplicação do modelo propiciou a ampliação da prestação de serviços, melhorou as condições de trabalho e as políticas internas, especialmente a de pessoas, concorrendo para a aceitação da gestão pelos trabalhadores. Constatou-se nas entrevistas, em ambos os grupos de participantes (gestores/técnicos e garis), falas que indicavam a identificação com a atividade realizada e valorização de seus resultados, como nos exemplos: "Sou gari, a minha função é fazer [...] com paz, amor e carinho, dedicando aquilo que eu faço." (Gari I); e "[...] a gente percebe que é muito mais efetivo o contato que a gente tem." (Gestor/técnico C). Nota-se ainda, que os gestores/técnicos (Tabela 2) aprovavam as medidas gerenciais adotadas (f=4) internamente - sobre a valorização dos trabalhadores e das atividades - e junto à comunidade - sobre educação ambiental - , indicando que promoveram a participação dos garis na gestão da atividade e o posicionamento assertivo frente às situações de discriminação, como expressam as falas: "[...] pessoal tem mais coragem de chegar para cobrar de você, questionar você, fazer perguntas". (Gestor/técnico B); e "[...] no momento que ele é valorizado que ele consegue perceber o valor dele, ele se impõe mais." (Gestor/técnico C).

Os resultados encontrados entre os garis foram semelhantes (Tabela 2), acrescidos outros aspectos como: clima de apoio social, melhores vantagens oferecidas que as de empresas terceirizadas, melhorias da infraestrutura operacional, aumento de benefícios sociais, embora alguns (f=2) não considerassem a remuneração adequada. Esses aspectos expressavam, para eles, valorização profissional, como ilustram as falas a seguir: "[...] se a gente não estiver bem, coloca a gente em outra atividade. Só por isso aí é um sinal de que está preocupado com a gente." (Gari B) e "[...] aqui, por exemplo, as portas estão abertas para qualquer dúvida, conversa com qualquer um. Estão disponível." (Gari D). A falta de apoio à tarefa foi relatada por um participante. Observa-se ainda, que em relação à sociedade, as frequências encontradas assinalam a ambiguidade no trato, porém as falas demonstraram que os garis percebiam melhorias e creditavam à organização uma interferência positiva, como no relato: "SLU também teve uma influência muito grande nessa parte aí [...] não sei te explicar, foi feita alguma coisa, foi feita sim." (Gari D).

Da primeira fase a segunda, pode-se considerar que o processo instituinte foi crescente, obviamente não linear. Observando-se no que se sumariou até aqui, que a partir dos documentos e das entrevistas, houve uma incorporação por todos os atores (garis, gestores intermediários, técnicos e os gestores principais) da missão, das funções, dos propósitos e valores (por exemplo, a qualidade da limpeza urbana, o impacto da limpeza urbana no bem-estar social, etc.) da SLU. Todos esses aspectos passaram a ser tomados como seus pelos diferentes atores. Fortaleceu-se a SLU como organização e a limpeza urbana como instituição.

A terceira fase de gestão iniciou-se com a reforma administrativa da prefeitura (2001) que implementou o sistema de gerenciamento regionalizado de seus serviços (Tabela 3) e algumas mudanças nas funções da SLU. Durante a primeira gestão compartilhada, segundo entrevistados, ocorreram dificuldades de operacionalização da limpeza urbana, em especial na atividade de varrição devido à alocação da gestão de pessoas (no tocante aos encargos trabalhistas e benefícios), do planejamento da atividade de varrição e da sua execução em órgãos distintos, apesar dos garis de varrição permanecerem nas sedes operacionais da SLU, sob a gestão dos gerentes operacionais absorvidos pelas Secretarias Municipais da Coordenação de Gestão Regional.

Em 2005, com a reintegração do planejamento técnico da SLU, revisou-se o planejamento de varrição e estabeleceram-se parâmetros de produtividade distintos para contratação de empresas terceirizadas e para os garis da SLU, cujo menor rendimento foi atribuído à idade desses. Há, no entanto, dúvidas sobre a adequação de tal avaliação comparativa em decorrência de críticas ao método de apuração baseado na demonstração da variabilidade do peso dos resíduos recolhidos pelos garis em conformidade a fatores como mudanças climáticas, trechos e horários (conforme os documentos analisados, como: Damásio & Abrahão, 2003; Silva, Mesquita & Chenna, 1998). Desenvolveu-se planejamento específico para a área de abrangência de cada Secretaria Regional, sem inter-relação entre elas, conforme entrevistados em 2012. Os garis de varrição foram realocados em algumas unidades e posteriormente transferidos para a limpeza dos parques municipais, conforme entrevistas. Nesse período ocorreram investimentos tecnológicos na Divisão de Projetos de Limpeza de Vias, considerada de excelente qualidade técnica, o que não aconteceu em relação às ferramentas da varrição que continuaram semelhantes às descritas no Relatório Anual de Atividades da SLU de 1974 (vassouras, pás, enxadas, carrinhos, etc.), conforme observado durante o acompanhamento das atividades.

Atualmente a autarquia atende a 95% da população: as empresas contratadas realizam 91,6% da coleta domiciliar e 97,9% da varrição (Relatório Anual de Atividades da SLU, 2011), e quarenta garis de varrição da SLU trabalham em áreas do hipercentro de Belo Horizonte. A prestação de serviços é descentralizada em nove sedes operacionais da SLU (Norte, Nordeste, Leste, Oeste, Noroeste, Centro-Sul, Pampulha, Venda Nova e Barreiro) com a coleta gerenciada pela SLU e a execução da varrição pelas Secretarias Municipais da Coordenação de Gestão Regional.

As reformas administrativas da prefeitura repercutiram também nas políticas internas da autarquia e em suas relações com a administração municipal (Tabela 3). A vinculação ao prefeito tornou-se indireta sendo percebida pelos trabalhadores como perda do poder decisório e econômico, conforme relato: "Nós não temos mais (autonomia) [...] nós pertencemos a uma outra secretaria que está entre a gente e o prefeito" (Gestor/técnico E). Embora mantida a natureza autárquica observa-se que as políticas de limpeza urbana estão sob a responsabilidade da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos, e as de pessoal são desenvolvidas conforme a Secretaria Municipal Adjunta de Recursos Humanos e, ainda, que as ações buscando a padronização dos órgãos, desconsideraram as peculiaridades e geraram dificuldades gerenciais e insatisfações na autarquia conforme relato: "[...] acabou a SLU ficando a cara da SUDECAP3 (Superintendência de Desenvolvimento da Capital) e nós temos diferenças muito grandes." (Gestor/técnico E). O Plano de Carreira da autarquia (2007) criou níveis diferentes para cargos anteriormente de mesmo nível hierárquico reformulou o cálculo de benefícios, promoções, criou um grupo de transição para quem não aderiu ao Plano de Carreira e extinguiu os cargos de garis. As unidades técnicas e administrativas de apoio à gestão, apesar de extintas no organograma, mantiveram suas funções realizadas sem a nomeação de chefia direta. Constatou-se também a crescente terceirização operacional a partir de 1990 (Tabela 4). Essa terceirização, conforme entrevistas, ampliou-se também para as atividades técnicas e administrativas.

Os gestores/técnicos de 2012 (N=5) avaliaram que tais mudanças, no tocante a estrutura organizacional (organograma, fluxos e quadro de pessoal) dificultam o desenvolvimento das atividades em geral (f=5) como também a atual estrutura física da organização encontra-se inadequada à prestação de serviço (f=4). No entanto, um entrevistado declarou não observar dificuldades relativas à estrutura organizacional de sua unidade e avaliou adequada a estrutura física da mesma para desenvolvimento das atividades.

Em relação ao ambiente sociogerencial (Tabela 5), os gestores/técnicos (2012) assinalaram que o atual estilo de gestão (compartilhado) ocasiona sobreposição/indefinições de funções das instituições responsáveis, gera atritos entre as áreas e dificulta o alcance dos objetivos, conforme relatos a seguir: "[...] está um pouco conturbado, né. [...] tem serviços ligados à Gerência de Limpeza Urbana que não estão ligados à Regional." (Gestor/técnico I) e, ainda, "Quem é o verdadeiro gerente? [...], com quem que esse serviço está? Com a SLU? Com... com... a Secretaria? Então a gente fica meio perdido." (Gestor/técnico H). Assim, visando minimizar tais dificuldades, constroem-se fluxos informais sustentados nos vínculos sociais construídos anteriormente. Ressaltaram ampliação da terceirização (f=3).

Relataram a alteração da missão da SLU e a definição externa dos objetivos da organização como reflexos da perda de poder decisório e econômico, e que socialmente a imagem da organização está preservada, porém há insatisfação entre os trabalhadores em decorrência das poucas possibilidades de participação, como na fala a seguir: "A gente quer o lugar da gente de volta, [...] na administração [...]. É poder de novo opinar, é poder ser ouvido, é poder fazer o próprio trabalho." (Gestor/técnico E).

Expressaram, ainda, alguns posicionamentos adicionais em relação à atividade de varrição: consideram de elevado custo (f=1), com tecnologia avançada para o planejamento técnico (f=1), porém assinalam a ausência de novas tecnologias para execução da atividade (f=2), a desvalorização do profissional pela organização (f=2) e a desvalorização social do gari de varrição (f=1). Alguns entrevistados avaliam que a menor atenção à varrição decorreria do aspecto sanitário: a coleta de lixo apresenta maior risco à saúde pública pelo volume de resíduos e a rápida decomposição, devido à acentuada presença de componentes orgânicos, não esperados no lixo público.

As respostas dos garis entrevistados em 2012 foram semelhantes as dos gestores/técnicos (Tabela 5). Apontam dificuldades no atual gerenciamento da SLU, fazem frequentes referências às gestões anteriores (valorizando as ações de melhorias e superação das situações de constrangimentos vivenciadas) como na fala: "Foram as mudanças que foram tendo, né? Teve os alojamentos, os uniformes, equipamento direitinho, né? Protetor solares, sabonete, papel higiênico" (Gari Q). Valorizam e apoiam as chefias imediatas, porém percebem a pouca cobrança como indiferença, assinalando a indefinição de funções e falta de apoio na execução da tarefa referente à melhoria das ferramentas de trabalho.

Os garis percebem apoio social no grupo apesar da existência de alguns atritos e da terceirização ser percebida como uma desvalorização do trabalhador. Relataram insatisfação pelo término de ações de valorização bem como o distanciamento do gerenciamento da SLU. A fala a seguir exemplifica a percepção dos trabalhadores: [...] "mas porquê ês tirou os, o pessoal da, da SLU e pôs empreitera? Empreitera não faz o serviço da... a SLU faz." (Gari P) e " [...] tinha mais apoio, a gente tinha palestra, prá podê... tipo assim... mostrá prá gente o que era certo o que era errado... "(Gari R).

Em relação às expectativas sobre o futuro da autarquia, as avaliações dos dois grupos (gestores/técnicos e garis) diferem: os garis percebem a valorização social da autarquia, mas apontam um processo de desestruturação gerencial e operacional. Os gestores/técnicos acreditam na possibilidade de construção de gerenciamento por meio do diálogo entre gestores e trabalhadores, de ações de valorização do trabalhador, de educação ambiental e, alguns, na possibilidade de gestão unificada. Levanta-se a hipótese que os posicionamentos diferentes decorrem das vivências dos garis de desvalorização em relação à autarquia e de exclusão/inclusão em relação à sociedade (Tabela 5).

Durante as entrevistas, porém, ambos expressaram gosto pela atividade realizada como nas falas a seguir: "[...] mais me agrada é a satisfação das pessoas, de ver fazendo as coisas com amor" (Gari N), e também: "É preciso de envolver e de gostar" (Gestor/técnico H). No entanto, demonstraram valorizar os resultados obtidos em conformidade com as funções anteriores da autarquia "[...] tenho orgulho do trabalho que eu fiz." (Gestor/técnico E).

Pelo exposto, observa-se que as mudanças de gestão e marcos institucionais da prefeitura repercutiram na SLU e que os trabalhadores em 2012 percebem a organização de forma diversa dos trabalhadores entrevistados em 1999/2000, assinalando aspectos predominantemente problemáticos em relação às mudanças econômicas e políticas.

Todos os conteúdos referidos anteriormente sobre a terceira fase dos documentos e das entrevistas apontaram na direção de que houve mudanças nos marcos institucionais (normas, reestruturações organizacionais, distribuição de atribuições e responsabilidades, inserção na gestão municipal, etc.). Entretanto, as falas dos entrevistados (garis, gestores intermediários e técnicos) revelaram, em síntese, rejeição a elas, saudosismo em relação à segunda fase e o sentimento de perda de reconhecimento social. Implícito a fala dos entrevistados, há um sentimento de ruptura com os valores incorporados na segunda fase. Há, portanto, compreensões conflitantes sobre a concepção da SLU e suas funções.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os resultados das análises realizadas identificaram fases distintas da gestão da SLU. Na primeira e segunda fase o processo instituinte foi marcante na direção de legitimar a limpeza urbana como papel do Estado e o compromisso dos atores organizacionais com a missão, funções e valores da SLU.

Na terceira fase, atual, o processo instituinte vive um ciclo de conflito em relação à concepção da SLU e da limpeza urbana e pode se considerar que o novo modelo de gestão da limpeza urbana em Belo Horizonte, estabelecidas pelas últimas reformas administrativas, apresenta frágil institucionalização à medida que não lhe é atribuída legitimização por parte de todos os atores, o que se manifesta entre outros aspectos na confusão dos papeis dos ocupantes de cargos da organização.

Observou-se ainda perda de poder econômico e decisório da organização ocasionado pelo distanciamento da autarquia da gestão central e pelas limitações em suas atribuições, que minimizaram as competências relativas à sua natureza jurídica. Notou-se, ainda, que a busca de padronização da gestão dos órgãos municipais (administração indireta e direta) gerou dificuldades administrativas, que os trabalhadores buscaram superar construindo caminhos informais.

As entrevistas ressaltaram a fragilização da relação dos servidores (gestores/técnicos e garis) com a SLU. Evidenciaram a insatisfação gerada pela não participação na gestão do desempenho da atividade, pela perda de benefícios com o término das políticas de gestão anteriores e pela crescente terceirização. Tenta-se justificar essa como decorrente da menor produtividade dos garis da SLU e do elevado custo da varrição. A terceirização expandiu-se para as demais atividades, gerando clima de insegurança entre os trabalhadores e pode ser preocupante em relação à saúde psíquica dos mesmos como considerado pela literatura consultada (Borges, 2002; Druck & Franco, 2008; Jacques, 2007).

Em relação à atividade de varrição, as gestões compartilhadas promoveram aumento da burocracia interna da limpeza urbana, com a separação dos setores de planejamento técnico, execução da atividade e gestão de pessoas. Esse modelo propiciou fragmentações entre o planejar e o executar, distanciou o órgão executor do processo (SARMU) da concepção da atividade e as unidades planejadoras (SMSU/SLU) do resultado de suas intervenções. Geraram unidades autônomas de prestação de serviço que dificultam a visão global, o estabelecimento de parâmetros e, acrescidas às indefinições e sobreposições de funções dos órgãos responsáveis, ocasionam transtornos à gestão da atividade.

Observou-se, ainda, que historicamente o governo municipal não aplica à varrição a mesma atenção que à coleta e à destinação final dos resíduos. As frequentes terceirizações, os escassos registros sobre a atividade, o pouco desenvolvimento tecnológico e o tardio planejamento técnico, são aspectos que não podem ser atribuídos apenas ao maior risco à saúde pública ocasionado pelo volume e pela rápida decomposição do lixo recolhido pela coleta domiciliar, conforme entrevistas. Tal avaliação se contrapõe às informações da mídia4, que aponta o volume e a diversidade do lixo nas ruas como uma das causas das repetidas inundações ocorridas em Belo Horizonte e que geram riscos à saúde e segurança social.

Outros aspectos, portanto, merecem ser considerados como a desvalorização da atividade pelas semelhanças, guardadas as singularidades da atividade, entre a varrição de ruas e o trabalho doméstico, apontadas por Estanislau (1981, p. 15): "o trabalho da formiguinha5 se caracteriza por um saber que é aprendido no próprio espaço doméstico ou no local de trabalho", e, por Lhulier (2005) que assinala maior dificuldade de reconhecimento social desse trabalhador pela via do aprimoramento técnico, quase inexistente na atividade. Assim se supõe que isso, também, decorra da não valorização de outras formas de saber, da hegemonia do conhecimento científico na modernidade, de seu poder de dominação e exploração (B. S. Santos,2000; Lapassade,1974/1983). E, também são possíveis outros questionamentos, como as implicações da feminização, da pouca escolaridade, que rotineiramente se encontra entre esses trabalhadores, para a atividade e sua precarização. Tais questões e a escassez de pesquisas na área ressaltam as várias possibilidades de estudos sobre a varrição e de seus trabalhadores.

No entanto, os resultados apresentados sinalizam a premência de medidas que:

• minimizem as dificuldades da gestão de pessoas, elaborando políticas que viabilizem a participação dos trabalhadores na gestão da autarquia, com diferentes funções e experiências, propiciando o desenvolvimento da instituição e a qualidade do serviço de limpeza urbana, a fim de contribuir para o bem-estar social;

• definam as atribuições e responsabilidades dos diferentes órgãos que compõem a limpeza urbana, criando fluxos para desenvolvimento das atividades, evitando indefinições e sobreposições de funções;

• criem espaços para compartilhamento das ações de planejamento, execução e discussão dos resultados, possibilitando a visão global sobre a prestação de serviço;

• desenvolvam diagnósticos das condições de trabalho e suas repercussões para os trabalhadores.

Em outras palavras, a aplicação da perspectiva de análise assumida neste artigo, leva a sugerir que o fortalecimento da organização como uma instituição e espaço instituinte requer: a autoanálise da SLU; valorização dos espaços de participação, reconstruindo as possibilidades de autogestão e revalorizando os vínculos de compromisso dos atores sociais com as funções e valores da organização. Espera-se, por fim, que os resultados contribuam para melhor compreensão do processo de gestão da limpeza urbana em Belo Horizonte.

Adicionalmente, registram-se alguns limites da presente pesquisa. Houve a impossibilidade de se realizarem as entrevistas com os mesmos trabalhadores em 1999/2000 e em 2012, devido à mudança dos gestores e/ou desligamento dos trabalhadores da organização, bem como pela garantia de anonimato aos participantes em ambos os períodos de realização de entrevistas. Além disso, o recorte adotado focalizou o processo de gestão da limpeza urbana de Belo Horizonte no que diz respeito ao serviço de varrição de vias. A análise realizada pode ser ampliada em outras pesquisas pela focalização de outros serviços como a coleta domiciliar e destinação final de lixo.

 

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Recebido em: 11.06.2013
Aprovado em: 17.11.2013

 

 

1 O nome gari originou-se no Rio de Janeiro, quando Aleixo Gary para a limpeza da cidade (1876). Os habitantes repetiam: "chama o Gary". O nome do empreiteiro batizou a ocupação. (Diniz & Verly, 2000).
2 "Cem caminhões despejam ali, diariamente, 300 toneladas de lixo. Bandos de urubus disputam com os 'catadores' os restos da cidade, [...]. Mais de mil famílias vivem daquele lixo, mas morrem alguns também no lixo, que já soterrou várias pessoas em desabamentos repetidos." (Jornal Estado de Minas, 1973).
3 Autarquia municipal responsável pela área de infraestrutura do município.
4 Lixo jogado nas ruas de BH ou em bota-foras reaparece depois das primeiras chuvas, Jornal Estado de Minas (2012).
5 Denominação popular das garis na década de 1980 em Belo Horizonte (Estanislau,1981).