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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.14 no.3 Florianópolis set. 2014

 

Efeitos de uma intervenção breve no planejamento para a aposentadoria

 

Effects of brief intervention in planning for retirement

 

 

Cristineide Leandro-FrançaI; Sheila Giardini MurtaII; Miriam Bratfisch VillaIII

IPsicóloga da Universidade de Brasília, Mestre e Doutoranda em Psicologia Clínica e Cultura pela Universidade de Brasília
IIProfa. Adjunta no Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília - UnB
IIIPsicóloga, Graduada pela Universidade Federal de São Carlos, com Mestrado e Doutorado pela Universidade de São Paulo - FFCLRP, Professora voluntária da Universidade Federal de São Carlos

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Intervenções breves no planejamento para a aposentadoria ainda não foram descritas e avaliadas na literatura. Este estudo avalia a eficácia de uma intervenção breve no planejamento para a aposentadoria e compara comportamentos adotados pelos sujeitos antes e depois da intervenção. Quarenta e um servidores públicos federais, de 22 a 60 anos, iniciaram a intervenção e dez completaram o follow-up 11 meses após a intervenção. Os dados foram coletados pela Escala de Mudança em Comportamento de Planejamento da Aposentadoria. Análises estatísticas pelo Método JT revelaram mudanças mais expressivas no fator investimento em autonomia e bem-estar, com alterações positivas confiáveis em cinco participantes, ausência de mudança em quatro e mudança negativa confiável em um deles. No fator investimento ocupacional social, um dos participantes apresentou mudança positiva confiável, seis permaneceram sem alteração e três apresentaram mudança negativa confiável. Recomenda-se a realização de novos estudos com indivíduos com melhores e piores desempenhos, para identificação de mecanismos mediadores e moderadores desses resultados.

Palavras-chave: Estudos de intervenção, avaliação de eficácia-efetividade de intervenções, aposentadoria.


ABSTRACT

Brief interventions in preparation for retirement have not yet been described and evaluated in the academic literature. This study evaluates the effectiveness of a brief intervention in planning for retirement and compares behaviors in planning for retirement, adopted by the subjects before and after the intervention. Forty-one federal civil servants, from 22 to 60 years of age, began the intervention, and ten completed the follow-up, eleven months after the intervention. Data collection was via the Behavior Change in Retirement Planning Scale. Statistical analyses, using the JT Method, revealed more pronounced changes in the factor pertaining to investment in the field of autonomy and well-being, with reliable positive changes in five participants, no change in four, and a reliable negative change in one participant. Regarding the occupational social investment factor, one of the participants showed reliable positive change, six remained unchanged, and three presented a reliable negative change. Further studies are recommended with individuals with better and worse performance, where the main objective is to identify mediators and moderators of these results.

Keywords: Intervention studies, assessment of efficacy-effectiveness of interventions, retirement.


 

 

O trabalho exerce papel central na vida social e psicológica do indivíduo, possibilitando o desenvolvimento e reconhecimento pessoal (Zanelli, Silva, & Soares, 2010). Mudanças na identidade profissional podem ocasionar sofrimento, principalmente em uma sociedade capitalista que supervaloriza a capacidade produtiva do indivíduo e estabelece ao aposentado estereótipos de "inutilidade, incapacidade, envelhecimento" e finitude (Soares & Costa, 2011, p. 36).

Nesse sentido, a aposentadoria, quando não planejada, pode causar forte impacto na vida das pessoas e tornar-se um período propício ao surgimento ou agravamento de problemas psicológicos (como depressão), físicos (como dores crônicas) e financeiros (como endividamento). Essa etapa pode ser marcada por sentimentos ambíguos de liberdade, com a perspectiva de realizar atividades prazerosas e concretizar planos, e de crise, pela dificuldade em aceitar a condição de aposentado, medo da aposentadoria e perda da identidade (Santos, 1990). A crise se instala como resultado da reestruturação da identidade, considerando que esta sofrerá alterações após o rompimento com o trabalho e exigirá o aprendizado de novas habilidades (Soares & Costa, 2011).

O planejamento para a aposentadoria, por envolver diferentes dimensões da vida que integram a identidade, pode ser considerado um conjunto de comportamentos complexos. Tal processo pode ser compreendido à luz do Modelo Transteórico de Mudança desenvolvido por Prochaska e DiClemente (1982), que explica, em estágios, como as mudanças ocorrem na adoção ou no abandono de comportamentos como aquisição de hábitos alimentares saudáveis ou abandono do fumo. O processo da mudança parece ser o mesmo, independente do comportamento-problema, seja relacionado ao abuso de bebida alcoólica, alimento, fumo, problemas em comunicação conjugal ou autoestima (Velásquez, Maurer, Crouch, & DiClement, 2001). Os estágios de mudança dividem-se em pré-contemplação, contemplação, preparação, ação e manutenção.

No contexto do planejamento para a aposentadoria, na fase de pré-contemplação o indivíduo ainda apresenta desconhecimento, resistência ou desinteresse em relação ao processo, por isso não possui a intenção de mudar de comportamento. Exemplos desse estágio referem-se aos indivíduos que estão próximos da aposentadoria, mas não se interessariam por ações focadas nesse tema. Após tomar consciência das dificuldades psicológicas, sociais e financeiras que poderá enfrentar, o indivíduo entra no estágio da contemplação. Esse é um período de ambivalência, ou seja, o desejo de mudar coexiste com o desejo de permanecer da forma como se encontra. As pessoas podem ficar um longo período nessa fase, utilizando muito esforço e energia para superá-la, mas sem planos para mudar (Rapp-Paglicci & Savon, 2009). Indivíduos no estágio de preparação mostram-se preocupados em mudar, possuem planos para um futuro próximo, aproximadamente um mês, mas ainda não os colocam em prática (Armitage & Arden, 2008; Segatto, Pinsky, Laranjeira, Rezende, & Vilela, 2007). Comportamentos que caracterizam essa fase podem estar associados à busca de consultoria financeira e de informações sobre programas de preparação para aposentadoria nos órgãos onde trabalham. O estágio da ação exige comprometimento do indivíduo, pois nessa fase os planos são colocados em prática e as mudanças acontecem. Há engajamento em ações específicas, como participação em ações de promoção da saúde, programas de preparação para aposentadoria, realização de consultas médicas, atividades físicas e lazer e fazer economias. A manutenção é um estágio no qual as pessoas trabalham para prevenir recaídas e solidificar os ganhos conseguidos no estágio da ação. São considerados pertencentes a esse estágio os indivíduos que permanecem no estágio de ação por, no mínimo, seis meses (Armitage & Arden, 2008).

Durante o processo de mudança pode acontecer retrocesso ou recaída em atitudes já adquiridas. Tal comportamento é considerado normal e faz parte do processo de mudança. Embora a evolução das pessoas nos estágios aconteça, em geral, de forma linear, é possível progredir, regredir ou permanecer sem alterações (Armitage & Arden, 2008). Também é considerado comum o fato de as pessoas passarem pelos estágios diversas vezes até alcançarem a mudança desejada (Miller & Rollnick, 2001).

O Modelo Transteórico apresenta conceitos relevantes para clínicos, pesquisadores e clientes, pois retrata como o processo de mudança acontece (Velásquez et al., 2001). Conhecer em que estágio de mudança o indivíduo se encontra pode ser importante para profissionais que atuam na preparação para a aposentadoria. Essas informações podem subsidiar a tomada de decisão acerca de procedimentos mais apropriados para a intervenção, quando devem ser utilizados e quais comportamentos precisam ser promovidos.

As intervenções breves - IBs, como modelos de intervenção, são estratégias a serem consideradas por profissionais que atuam com trabalhadores em processo de aposentadoria. A intervenção breve, usualmente utilizada em contextos de saúde, é uma modalidade terapêutica curta, com aplicação individual ou em grupo, com duração aproximada de 5 a 30 minutos, de uma a três sessões, e tem como proposta principal promover a motivação para a mudança (Bien, Miller, & Tonigan, 1993; Marques & Furtado, 2004; Miller & Rollnick, 2001). Além de ser uma estratégia útil para promover a motivação, a IB é recomendada como sessão pré-tratamento no desenvolvimento de programas preventivos tendo em vista que a motivação ocasiona adesão ao tratamento (Rapp-Paglicci & Savon, 2009).

Os princípios ativos da intervenção breve são caracterizados conforme o acróstico FRAMES (do inglês Feedback, Responsability, Advice, Menu of Option, Empathy, Self-eficacy): feedback, retroalimentação por meio de uma avaliação prévia, responsabilidade, autonomia e compromisso com as mudanças desejadas, aconselhamento, orientações fornecidas pelo terapeuta ou facilitador, menu de opções, catálogo de estratégias que estimulem à ação, empatia, postura empática do terapeuta ou facilitador e autoeficácia, confiança nos recursos pessoais (Marques & Furtado, 2004; Miller & Rollnick, 2001). O baixo custo da implementação de intervenções breves as tornam uma opção atrativa e viável (Miller & Rollnick, 2001) como estratégia para uso em diversos contextos de prevenção e promoção à saúde. A IB pode consistir em uma alternativa positiva de sensibilização, motivação e adesão aos programas de longa duração, como os Programas de Preparação para Aposentadoria - PPA. Nesse contexto, podem favorecer a inclusão dos indivíduos que não têm disponibilidade de tempo para investir em intervenções extensas.

Estudos sobre essa modalidade em ações voltadas à preparação para a aposentadoria não foram encontrados. Todavia, a literatura nacional e internacional demonstra evidências sobre o impacto de intervenções breves aplicadas a contextos de prevenção e promoção da saúde, como prevenção de sintomas de ansiedade e depressão em pacientes com câncer (Pitceathly et al., 2009), no desenvolvimento de competências de enfrentamento em pessoas de meia e terceira idade (Bode, Ridder, Kuijer, & Benzin, 2007), na prevenção de suicídio (Kato et al., 2010), no tratamento de jogadores compulsivos (Hodgins, Currie, el-Guebaly, & Peden, 2004), na avaliação de atitudes raciais em estudantes universitários (Soble, Spanierman, & Liao, 2011) e na redução da violência em adolescentes abusadores de álcool (Walton et al., 2010).

Ao utilizar o modelo breve em intervenções com foco na preparação para a aposentadoria, tornam-se necessárias adaptações quanto à duração e o formato da sessão, em comparação às intervenções breves habitualmente realizadas em unidades básicas de saúde, que costumam ser individuais, ao contrário das ações de preparação para a aposentadoria que, usualmente, ocorrem no formato grupal. Sendo assim, semelhantes às intervenções psicológicas grupais, as intervenções de preparação para a aposentadoria, mesmo no formato breve, por exemplo, de apenas uma sessão, necessitam de um tempo mais prolongado para promoção dos fatores terapêuticos geradores da mudança como os especificados por Yalom e Leszcz (2006). Esses fatores, quando manejados adequadamente, potencializam mudanças cognitivas (acesso a novas informações), motivacionais (confiança no grupo, sentimentos de esperança, otimismo e desejo de mudar) e comportamentais (mudança de padrões inadequados ou alcance do comportamento desejado) (Murta, 2008). Além disso, para Adams e Rau (2011), ações gerais aplicadas ao contexto da aposentadoria devem motivar o engajamento em múltiplas metas de mudança, relativas à saúde, ocupação, relacionamentos, habitação e finanças, em oposição a intervenções breves aplicadas à saúde, que se ocupam de meta única, como no tratamento da dependência de álcool (Bien et al., 1993; Marques & Furtado, 2004).

Para que as mudanças no processo da aposentadoria aconteçam de forma bem-sucedida, as intervenções devem motivar os participantes a adquirir ou manter comportamentos saudáveis. A literatura especializada enfatiza como preditores de uma aposentadoria bem-sucedida dimensões como: saúde física, psicológica e planejamento em saúde (Donaldson, Earl, & Muratore, 2010; Wang, Henkens, & van Solinge, 2011), segurança financeira (Pinquart & Schindler, 2007; Price & Joo, 2005), mudança no estilo de vida e realização de atividade física (Oliveira, Torres, & Albuquerque, 2009; van Solinge & Henkens, 2008). Além disso, contribuem para adaptação a esse estágio da vida: ter uma rede social positiva, laços familiares (França, 2009; França & Vaughan, 2008; Pinquart & Schindler, 2007), realizar atividade voluntária e de lazer (Duarte & Melo-Silva, 2009; van Solinge & Henkens, 2008) e planejar a aposentadoria (França & Carneiro, 2009; Oliveira et al., 2009).

Nesse contexto, o objetivo geral deste estudo foi avaliar a eficácia de um modelo de intervenção breve no planejamento para a aposentadoria, tendo como base teórica o Modelo Transteórico de Mudança. Especificamente, buscou-se comparar mudanças em comportamentos de planejamento para aposentadoria relativas às atividades ocupacionais, sociais, saúde, convivência familiar e conjugal, finanças e lazer.

 

MÉTODO

Participantes

A amostra foi constituída por servidores efetivos da administração pública federal, 33 mulheres e 8 homens com idade entre 22 e 60 anos (M = 46,32; DP = 11,65). Dentre os respondentes, 39,5% eram casados, 39,5% solteiros, 15,7,% divorciados e 5,3% possuíam união estável . Quanto à escolaridade, 2,4% possuíam ensino médio incompleto; 29,3% ensino médio completo; 2,4% ensino superior incompleto; 31,7% ensino superior completo e 34,2 % pós-graduação. Com relação à aquisição do tempo de contribuição para aposentadoria, 14% dos respondentes possuíam tempo suficiente para se aposentar, para 5% deles faltava até um ano, para 22% até 5 anos, para 9% até 10 anos, para 2% até 20 anos, para 9% até 30 anos, para 9% mais de 30 anos e 30% não responderam. Os servidores relataram trabalhar aproximadamente há 15 anos no órgão onde a intervenção foi efetuada (M=15,1) e realizar em média 39 horas de trabalho por semana (M=38,8). Ademais, 95% dos participantes possuíam faixa salarial acima de R$1.700,00.

Delineamento

O delineamento foi longitudinal e consistiu nas etapas de avaliação pré-intervenção, intervenção, monitoramento 1, monitoramento 2 e monitoramento 3. Participaram da avaliação pré-intervenção e da intervenção 41 indivíduos, 19 compareceram ao monitoramento 1, 14 participaram do monitoramento 2 e 10 do monitoramento 3. A Figura 1 apresenta o delineamento do estudo.

 

 

Instrumentos

Questionário sociodemográfico

Composto por onze questões fechadas, incluindo idade, sexo, estado civil, profissão, escolaridade, tipo de vínculo com o órgão, tempo que trabalha no órgão, tempo para aposentadoria, horas trabalhadas semanalmente, condições de saúde, condições salariais e uma questão aberta sobre benefícios existentes no órgão.

Escala de Mudança em Comportamento de Planejamento da Aposentadoria - EMCPA

Elaborado por Leandro-França, Murta e Iglesias (2014), trata-se de um instrumento autoaplicável que tem como objetivo avaliar o estágio de mudança em comportamentos de planejamento para a aposentadoria no qual o respondente se encontra, baseado no Modelo Transteórico de Mudança (Prochaska & DiClemente, 1982). A EMCPA é composta por 15 itens organizados em dois fatores. O Fator 1, investimento ocupacional-social, compreende os seguintes itens: participar de grupos na comunidade; investir em projetos que podem ser adaptados/executados a partir da aposentadoria; fazer cursos de aprimoramento em outra área visando uma segunda carreira; realizar trabalhos voluntários na comunidade; dedicar-se a práticas espirituais ou religiosas; ter um hobby; fazer cursos de aperfeiçoamento em sua área; cultivar amizades. O Fator 2, investimento em autonomia e bem-estar, engloba os seguintes itens: praticar atividade física regularmente; investir tempo na convivência familiar; ter investimentos financeiros para o futuro; praticar atividades de lazer; dedicar-se à relação com o/a parceiro(a); ter uma alimentação mais saudável; fazer consultas e exames médicos de check-up.

O instrumento apresentou características psicométricas satisfatórias e seus dois fatores revelaram diferentes tipos de evidência de validade. A fatorabilidade da matriz encontrou-se em um nível aceitável (KMO = 0,73) e o teste de esfericidade de Bartlett significativo, = 454,34, p< 0,001. Os alfas de Cronbach dos fatores foram de 0,71 para o Fator 1 (investimento ocupacional-social) e 0,63 para o Fator 2 (investimento em autonomia e bem-estar). A escala de resposta do instrumento é ancorada nos estágios de mudança, variando de 1 a 5: (1) não estou interessado nisso (pré-contemplação); (2) venho pensando em fazer algo sobre isso (contemplação); estou decidido a fazer algo nesse sentido (preparação); (3) comecei a fazer, mas parei (recaída), (4) comecei a fazer há pouco tempo (ação); (5) já faço isso há bastante tempo (manutenção). No presente estudo, essa escala também compõe a intervenção breve como técnica de feedback.

Procedimentos

Recrutamento e Seleção da amostra

O estudo ocorreu em um órgão público federal, após aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Instituto de Ciências Humanas da Universidade de Brasília (Protocolo 06 - 04/2011). Os sujeitos foram convidados a participar da intervenção breve via e-mail enviado pelo órgão no qual trabalhavam. Sessenta e dois servidores manifestaram interesse em participar da intervenção. Para compor os grupos, optou-se por realizar um sorteio entre os interessados e um novo e-mail foi enviado informando dia e local da intervenção. Dos 62 servidores interessados, 41 compareceram às intervenções breves. Quanto à seleção dos participantes, não houve critério de exclusão. Tendo em vista que a modalidade de intervenção aplicada no presente estudo é uma ação de promoção de comportamentos de autocuidado na preparação para a aposentadoria, quanto mais cedo os participantes se prepararem, mais benefícios poderão adquirir ao longo da vida. Sendo assim, todos os servidores, independente da idade e tempo de serviço, foram convidados a participar.

Coleta de dados

Os encontros ocorreram na sala de grupo do órgão onde a pesquisa foi realizada seguindo o delineamento proposto neste estudo:

Pré-intervenção - Composta de aplicação do Questionário sociodemográfico, da Escala de Mudança em Comportamento de Planejamento da Aposentadoria - EMCPA, discussão de aspectos éticos e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - TCLE. A avaliação Pré-intervenção ocorreu 40 minutos antes da Intervenção.

Intervenção - Foram realizadas, na mesma semana, quatro intervenções breves no órgão. Os 41 servidores interessados em participar da ação foram distribuídos em quatro grupos com aproximadamente dez pessoas. Cada intervenção durou cerca de três horas e foi coordenada por dois facilitadores e um observador, com formação em psicologia e experiência em condução de grupos de preparação para a aposentadoria. A intervenção breve utilizou procedimentos psicoeducativos e teve como base o modelo FRAMES (Feedback, Responsability, Advice, Menu de Option, Empathy, Self-eficacy) conforme apresentado por Miller e Rollnick (2001). As intervenções psicoeducativas em grupo têm foco específico, duração pré-determinada e buscam promover informação, reflexão e suporte. Almejam a reconstrução de crenças e o fortalecimento da autoeficácia para a mudança de comportamento e habilidades de enfrentamento em relação ao tema abordado (Murta, 2008).

A Tabela 1 indica características do modelo FRAMES e a sequência de atividades realizadas na intervenção breve.

Após a intervenção breve foram realizados três monitoramentos. Estes não são considerados parte da IB.

Monitoramento 1 - Dois meses após a intervenção breve, realizou-se o monitoramento 1, no formato grupal, que teve como objetivo investigar as mudanças ocorridas na vida dos participantes, com base nos investimentos propícios à aposentadoria bem-sucedida, abordados no decorrer da intervenção. Participaram do primeiro monitoramento 19 sujeitos que realizaram a IB, sendo 17 mulheres e 2 homens, com idade entre 47 e 60 anos (M = 55,16). O instrumento EMCPA foi reaplicado nesse encontro, que ocorreu forma coletiva e teve a duração de aproximadamente duas horas. Ademais, os participantes construíram, em conjunto, um plano de ação, como descrito na Tabela 1 na etapa Aconselhamento, e avaliaram o monitoramento utilizando uma palavra que representasse a percepção deles sobre o encontro (França, 2012).

Monitoramento 2 - Quatro meses após a intervenção, o monitoramento 2 foi realizado também em formato grupal. Esta fase durou aproximadamente duas horas e tinha como propósito saber como os participantes estavam com relação aos estágios de mudança e planejamento para a aposentadoria e aplicar novamente a EMCPA. Participaram dessa etapa 14 sujeitos, 12 mulheres e 2 homens, com idade entre 47 e 60 anos (M = 55,21), que integraram a IB e o primeiro monitoramento. Além disso, foi realizado o plano de ação, como no monitoramento 1, e discutidas estratégias de prevenção à recaída por meio de uma atividade escrita na qual os participantes identificaram fatores externos e internos que pudessem aumentar esse risco (França, 2012).

Monitoramento 3 - Realizou-se uma entrevista individual com dez indivíduos, todos do sexo feminino, com idade entre 47 e 60 anos (M = 54,40), que participaram da IB e dos monitoramentos 1 e 2. A entrevista durou aproximadamente 40 minutos, após onze meses da IB, com o intuito de investigar avanços e recaídas ocorridos desde então, cumprimento dos planos de ação elaborados na IB e objetivos futuros. Na ocasião, foi aplicada a EMCPA (Leandro-França, et al., 2014) como medida pós-intervenção.

Análise de dados

Para análise estatística dos dados, utilizou-se o Método JT proposto por Jacobson e Truax (1991). Este método tem como objetivo investigar a confiabilidade das mudanças entre os escores pré e pós-intervenção representada pelo Índice de Mudança Confiável - IMC e a Significância Clínica dessas mudanças - SC. A análise do IMC é útil como medida de validade interna para determinar se as mudanças ocorridas entre o pré e pós-intervenção podem ser atribuídas à intervenção ou erros de medidas. Por meio da análise de significância clínica, verifica-se se a intervenção produziu mudanças efetivas na vida dos participantes a ponto de eles alcançarem os resultados esperados de melhora (Aguiar, Aguiar, & Del Prette, 2009; Sás, Coser, Villa, Aguiar, & Almeida, 2012).

Ao analisar os resultados pelo Método JT, foi considerado o escore fatorial médio da amostra normativa funcional da EMCPA, no Fator 1, investimento ocupacional-social (M=22,03; DP=1,5), e no Fator 2, investimento em autonomia e bem-estar (M= 25,62;DP= 1,4). Para o cálculo de ponto de corte da significância clínica empregou-se o critério B, tendo em vista que se dispõe de dados normativos da população funcional (Aguiar et al., 2009).

Para a ilustração dos dados estatísticos obtidos com o Método JT foi utilizada uma representação gráfica das mudanças pré e pós-intervenção de acordo como os dois fatores da EMCPA. Observou-se no gráfico o traçado diagonal e a posição dos pontos que simbolizam os sujeitos (S). Os dados acima da linha diagonal ou do intervalo de confiança demonstram melhoras confiáveis no planejamento da aposentadoria como consequência da intervenção. Os dados abaixo da linha diagonal indicam redução nos comportamentos de planejamento da aposentadoria e os dados localizados em cima da linha diagonal ou dentro do intervalo de confiança revelam que os sujeitos permaneceram sem alterações na pós-intervenção em comparação à pré-intervenção.

A significância clínica foi analisada observando-se, no gráfico, a interseção do traçado vertical e horizontal em quatro quadrantes que representam mudança clinicamente significante. Os quadrantes são analisados comparando-se resultados pré e pós-intervenção como: amostra que era funcional e se manteve funcional (quadrante superior à direita), amostra que era funcional e passou para disfuncional (quadrante inferior à direita), amostra disfuncional que passou para funcional (quadrante superior à esquerda) e amostra que era disfuncional e se manteve disfuncional (quadrante inferior à esquerda) (Aguiar et al., 2009). A funcionalidade é analisada, neste estudo, como a realização de atividades de planejamento para a aposentadoria e a disfuncionalidade, como o déficit na realização de atividades de planejamento para a aposentadoria. Para tratamento dos dados, empregou-se o programa SPSS (Statistical Package for the Social Science), versão 18.0, o Microsoft Office Excel e o software online - PSICOINFO (Villa, Aguiar, & Del Prette, 2011).

 

RESULTADOS

Para análise de pré e pós-intervenção dos fatores investimento ocupacional-social e investimento em autonomia e bem-estar, conforme o Método JT, foram considerados os resultados de dez sujeitos (S1, S2, S3, S4, S5, S6, S7, S8, S9 e S10) que responderam a EMCPA antes da intervenção e no último monitoramento. A Tabela 2 apresenta o número de sujeitos e os resultados analisados.

Em seguida, as Figuras 2 e 3 demonstram graficamente os resultados pré e pós-intervenção dos dez participantes que responderam a EMCPA, antes da intervenção e no último monitoramento, considerando os fatores investimento ocupacional-social e investimento em autonomia e bem-estar.

 

 

 

 

Observa-se que no fator investimento ocupacional-social houve mudança positiva confiável apenas para o sujeito S3, o qual apresentou mudança de comportamento em planejamento para a aposentadoria, que pode ser atribuída à intervenção, como ter um hobby, investir em projetos que podem ser adaptados/executados a partir da aposentadoria e fazer cursos de aprimoramento em outra área visando uma segunda carreira. Os sujeitos S1, S2, S4, S5, S6 e S9 não apresentaram mudança confiável após a intervenção, nesse fator, permanecendo dentro do intervalo de confiança. Os participantes S7, S8 e S10 demonstraram mudança negativa confiável. Quanto à significância clínica, percebe-se que o S10 iniciou a intervenção com um escore funcional (realização de atividades de planejamento para a aposentadoria), no que se refere ao investimento ocupacional-social, e apresentou redução na medida pós-intervenção, a ponto de mudar o status clínico, passando a fazer parte da população disfuncional (déficit na realização de atividades de planejamento para aposentadoria) nesse fator. Todos os demais, com exceção do S9, já iniciaram a intervenção apresentando escores elevados nesse fator, situados na faixa da população funcional.

A Figura 3 revela a existência de mudança positiva confiável no fator investimento em autonomia e bem-estar para os sujeitos S3, S4, S7, S9 e S10, ou seja, apresentaram mudança de comportamento em planejamento para a aposentadoria, que pode ser atribuída à intervenção, como: praticar atividade física regularmente, investir tempo na convivência familiar, ter investimentos financeiros para o futuro, praticar atividades de lazer, dedicar-se à relação com o(a) parceiro(a), ter alimentação mais saudável e fazer consultas e exames médicos de check-up. Os sujeitos S1, S5, S6 e S8 não apresentaram mudança após a intervenção nesse fator, permanecendo dentro do intervalo de confiança. Mudança negativa confiável foi observada apenas no S2, mas sem mudança no status clínico. Quanto à significância clínica, percebe-se, no fator investimento em autonomia e bem-estar, que a amostra que era funcional na pré-intervenção se manteve funcional na pós-intervenção, sem alterações clínicas de melhora ou piora significativas. Entretanto, destaca-se uma exceção nesse fator, tendo em vista que o S3 apresentou mudança clinicamente significativa, ou seja, mudou do status disfuncional (déficit na realização de atividades de planejamento para aposentadoria) para funcional (postura ativa na realização de atividades de planejamento para aposentadoria).

 

DISCUSSÃO

Avalia-se que a intervenção mostrou-se eficaz na promoção de mudanças positivas confiáveis em comportamentos de autonomia e bem-estar em metade da amostra. Os resultados positivos no fator investimento em autonomia e bem-estar são promissores ao se considerar que a literatura na área aponta a importância de as pessoas adquirirem recursos que promovam uma aposentadoria bem-sucedida, como: saúde física, psicológica e planejamento em saúde (Donaldson et al., 2010; Wang et al., 2011), segurança financeira (Pinquart & Schindler, 2007; Price & Joo, 2005), mudança no estilo de vida e realização de atividade física antes da aposentadoria (França, & Vaughan, 2008; Oliveira et al., 2009). Adicionalmente, também são fatores protetivos os vínculos familiares (Duarte & Melo-Silva, 2009; França, & Vaughan, 2008) e as atividades de lazer, que servem como fonte de contato social e influenciam positivamente a qualidade de vida dos aposentados (Oliveira et al., 2009).

Em relação aos dados da significância clínica, estes são analisados com ressalvas, considerando que grande parte da amostra era funcional, ou seja, já realizava atividades de planejamento para a aposentadoria antes da intervenção. Entretanto, destaca-se que um sujeito (S3), considerado disfuncional, além de obter uma mudança positiva confiável, teve uma mudança clinicamente significativa ou proativa (Del Prette & Del Prette, 2008) em autonomia e bem-estar, trocando do status disfuncional para funcional.

Verifica-se nos resultados do fator investimento ocupacional-social que a maioria dos participantes não apresentou mudança de comportamento, permanecendo igual do início ao final da intervenção. Apenas um sujeito (S3) indicou mudança positiva confiável proveniente da intervenção, nesse fator. A ausência de mudança indica que o tempo decorrido entre a intervenção e o último monitoramento pode ter sido insuficiente para verificar modificações de comportamentos significativas na vida dos sujeitos quanto às variáveis desse fator. Investimento ocupacional-social inclui mudanças que demandam um tempo mais longo para se concretizarem. Além disso, são mudanças comportamentais que requerem um custo financeiro mais alto como, por exemplo, montar um negócio e realizar cursos de aprimoramento visando uma segunda carreira.

É possível que tal fato também decorra de um fenômeno sociológico comum em grandes cidades, particularmente em Brasília e entorno, que envolve: a redução nos contatos sociais, a sobrecarga de trabalho, as longas distâncias entre casa e trabalho, a precariedade do transporte público, o tempo consumido no trânsito e os tipos de estruturas habitacionais (p. ex. moradia em apartamentos) que causam a segregação residencial (Kaztman & Ribeiro, 2008) e afetam o tempo disponível para o engajamento em interações sociais. Essas questões favorecem a realização de práticas individuais em detrimento das coletivas, ou até o isolamento social. Essa é uma condição de risco para uma boa adaptação à aposentadoria, tendo em vista que a literatura da área evidencia a importância das condições de convivência como fator protetivo na adaptação à aposentadoria, com destaque para uma rede social positiva, laços familiares (França, 2009; França, & Carneiro, 2009; Pinquart & Schindler, 2007) e engajamento em atividades na comunidade (Duarte & Melo-Silva, 2009; van Solinge & Henkens, 2008). Isso se torna mais relevante considerando a redução dos vínculos sociais oferecidos pelo contexto de trabalho, normalmente presente em situação de aposentadoria.

A prática espiritual e religiosa também está inserida no fator investimento ocupacional-social. Essa variável, como as demais avaliadas nesse fator (cultivo de amizades, participação de grupos na comunidade, atividade voluntária, projetos profissionais para o futuro, cursos de aprimoramento e hobby) demonstrou menos engajamento dos participantes. É provável que as decisões comportamentais dos sujeitos quanto a essa prática (espiritual e religiosa) tenham sido influenciadas pela cultura de consumo da sociedade atual que pode reforçar, no planejamento para aposentadoria, a importância da aquisição de benefícios financeiros em detrimento do bem-estar espiritual. Ao pesquisar sobre espiritualidade, religiosidade e psicoterapia, Peres, Simão e Nasello (2007) ressaltaram que a crença religiosa/espiritual promove comportamentos resilientes e age como fator de proteção no enfrentamento das adversidades. Nesse sentido, crenças e práticas religiosas/espirituais podem atuar como recursos favoráveis ao ajustamento à aposentadoria.

Chama atenção a mudança negativa confiável apresentada por três participantes no fator investimento ocupacional-social. Pode-se questionar se a intervenção desencorajou o engajamento em atividades deste fator. Estudos recentes sobre efeitos de intervenções psicológicas e psicoterapia (Barlow; 2010; Castonguay, Boswell, Constantino, Goldfried, & Hill, 2010; Dimidjian & Hollon, 2010) têm investigado os impactos nocivos de diferentes abordagens, relacionando esses efeitos negativos às técnicas utilizadas, às variáveis do cliente e às variáveis do terapeuta. A carência de treinamentos e de habilidades interpessoais dos profissionais, de flexibilidade no uso das técnicas e a dificuldade no manejo de componentes transferenciais e contratransferenciais estão entre as prováveis causas dos danos (Castonguay et al., 2010). Dimidjian e Hollon (2010) propõem que as normas para definir e identificar o dano e prevenir efeitos negativos de uma intervenção sejam discutidas, principalmente em novas modalidades. Sendo assim, como recomendado por pesquisadores nesse campo (Barlow, 2010; Castonguay et al., 2010; Dimidjian & Hollon, 2010), no presente estudo foram tomadas medidas para prevenir potenciais efeitos prejudiciais oriundos da intervenção, sobretudo por ela ser inovadora. Ressaltam-se cuidados com a condução e avaliação da intervenção. No que se refere aos cuidados com a condução, estão incluídas a revisão de literatura que antecedeu o planejamento da intervenção (Leandro-França & Murta, no prelo), a seleção de técnicas embasadas teoricamente, o treinamento da equipe com formação em psicologia no uso da técnica, no manejo do grupo e da relação terapêutica, a realização de estudos piloto para refinamento dos procedimentos e a avaliação de processo da intervenção, para monitoramento da qualidade da implementação da intervenção. Quanto aos cuidados com a avaliação, incluem-se a análise de satisfação para com a intervenção (França, Murta, Negreiros, Pedralho, & Carvalhedo, 2013) e o uso de três monitoramentos pós-intervenção, aos dois, quatro e onze meses após o término da intervenção, com avaliação qualitativa (França, 2012) e quantitativa (Villa et al., 2011) dos efeitos produzidos. Este conjunto de cuidados enfraquece a hipótese de que a redução em investimento ocupacional-social, observada em três participantes, se deva ao uso indevido de técnicas ou do manejo inadequado da relação terapêutica durante a intervenção.

A mudança negativa confiável também pode ser analisada como comportamentos de recaídas ou retrocessos que fazem parte do processo de mudança e são consideradas normais conforme previsto no Modelo Transteórico de Mudança de Prochaska e DiClemente (1982). De acordo Armitage e Arden (2008), embora a evolução das pessoas nos estágios aconteça, em geral, de forma linear, é possível progredir, regredir ou permanecer sem alterações.

Ademais, pode-se levantar a hipótese de que tanto a mudança negativa confiável quanto a mudança positiva confiável possa ser explicada por meio de características da história do indivíduo no decorrer do estudo. Isto é especialmente relevante em estudos longitudinais (Mednick, Harway, & Finello, 1984). Com o passar do tempo podem surgir situações ou eventos específicos na vida do sujeito, ocorridos entre os intervalos do experimento, que influenciam o resultado (Kazdin, 2010). Desse modo, a falta de um grupo de comparação impossibilita conclusões claras acerca dessas mudanças, o que poderá ser melhor elucidado em estudos posteriores com delineamentos experimentais ou quase-experimentais. Assim, a ausência de grupo controle, uma limitação desse estudo, impossibilita a obtenção de conclusões mais robustas acerca da relação entre as mudanças observadas, positivas e negativas, e a intervenção (Kazdin, 2010).

Como limitação deste estudo, ressalta-se também a redução da amostra ou perda dos sujeitos durante os monitoramentos. Tal fato afeta a validade externa da pesquisa, mas é previsível em pesquisas longitudinais tendo em vista o custo de participação ao longo do tempo e as mudanças que podem ocorrer no decorrer do tempo (Kazdin, 2010). Neste estudo, algumas desistências foram explicadas pela ocorrência de aposentadoria, sobrecarga de trabalho, mudança de cidade, licença decorrente de problemas de saúde, férias e incompatibilidade com o horário da intervenção. Essas informações são provenientes dos resultados obtidos por meio de uma Escala de Satisfação (França, et al., 2013), enviada por e-mail aos participantes da pesquisa, ao mesmo tempo em que acontecia o terceiro monitoramento. Adicionalmente, com relação à desistência dos participantes nos monitoramentos, deve-se considerar a adoção de um delineamento com uso de medidas repetidas como possível desmotivador. Segundo Mednick et al. (1984), avaliações repetidas, comum em estudos longitudinais, podem interferir no comportamento e resultado dos participantes. Há de se notar, contudo, que quando indagados sobre as razões para desistência, eles não citaram a aplicação repetida de instrumentos, o que enfraquece essa hipótese explicativa para o abandono da intervenção por parte de alguns participantes.

Outra limitação, relacionada às respostas à intervenção, é que elas podem ter sido influenciadas por efeitos dos monitoramentos e não serem produzidas apenas pela intervenção breve. Não se sabe em que medida as trocas entre os participantes e destes com os facilitadores nos monitoramentos, assim como o fortalecimento do plano de ação e orientações para recaída contribuíram para os resultados finais. Sendo assim, para esclarecimento dessa questão, sugere-se que pesquisas futuras comparem efeitos da intervenção breve seguida e não seguida por monitoramentos feitos coletivamente com espaço para interação entre os participantes. Nesse caso, para avaliação longitudinal dos resultados, podem ser adotados cuidados como a aplicação de escalas via e-mail.

Embora o estudo apresente limitações a serem consideradas, foram atendidos alguns critérios metodológicos que asseguram a confiabilidade dos resultados. Destacam-se a utilização de um instrumento validado (EMCPA), com parâmetros normativos psicométricos da população em planejamento da aposentadoria, como recomendado por especialistas no Método JT (Aguiar et al., 2009; Del Prette & Del Prette, 2008; Jacobson & Truax, 1991) e avaliações de follow-up. O follow-up é um tipo de avaliação importante para examinar a eficácia da intervenção (Kazdin, 2010), sobretudo embasadas no Modelo Transteórico, que supõe a passagem do tempo para avaliação da evolução da mudança.

O uso do Método JT, como em outros achados clínicos (Aguiar et al., 2009, Pereira, Silvares, & Del Prette, 2008; Sás et al., 2012), favoreceu a avaliação individual dos participantes, em comparação aos métodos estatísticos tradicionais como, por exemplo, ANOVA de Friedman e teste Wilcoxon, que permitem apenas análise geral do grupo e mostram-se mais frágeis de serem analisados em amostras reduzidas (Sás et al., 2012). Assim, o Método JT demonstra eficiência nos casos de avaliações de intervenção psicológica em amostras pequenas, sem grupo controle (Del Prette & Del Prette, 2008) e apresenta-se como uma ferramenta estatística útil no contexto clínico com uso de práticas preventivas.

Dessa forma, os cuidados metodológicos adotados estão entre as principais contribuições deste estudo. Em geral, a literatura nacional (Murta, Caixeta, Souza, & Ribeiro, 2008; Soares & Costa, 2011; Zanelli et al., 2010) sobre a avaliação de programas de preparação para a aposentadoria tem focado em avaliações qualitativas, sem follow-up. Por isso, para aprimorar a qualidade metodológica destas avaliações, o uso de técnicas estatísticas inovadoras como o Método JT, escalas com evidências de validade de acordo com parâmetros normativos psicométricos da população em planejamento da aposentadoria e avaliação de follow-up são relevantes para esta área de pesquisa.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo teve como objetivo avaliar a eficácia de um modelo de intervenção breve no planejamento para a aposentadoria, tendo como base teórica o Modelo Transteórico de Mudança. Especificamente, buscou-se comparar mudanças em comportamentos de planejamento para a aposentadoria adotados pelos participantes antes e depois da intervenção.

Conclui-se que a IB pode ter proporcionado mudanças na adoção de comportamentos de planejamento para a aposentadoria, propiciando o alcance do estágio de ação em metade dos participantes. Portanto, estes finalizaram o estudo engajados na prática de atividade física, alimentação mais saudável, realização de consultas e exames médicos de check-up, investimento na convivência familiar e na relação conjugal, atividades de lazer e investimentos financeiros. Estes resultados são satisfatórios, considerando o desenvolvimento de uma intervenção inovadora, sua curta duração, o pequeno número de encontros e o longo espaço de tempo entre eles.

Em vista destes resultados, a IB apresenta-se como técnica de alta viabilidade, baixo custo econômico e que poderá beneficiar um maior número de pessoas, principalmente aquelas que não têm tempo de participar dos programas de longa duração. Também poderá ser útil como sessão motivacional pré-tratamento, como sugerem especialistas em implantação de programas preventivos (Rapp-Paglicci & Savon, 2009), podendo despertar a motivação para adesão a programas de longa duração (Bien et al., 1993).

Dessa forma, sugere-se que futuras pesquisas, com essa modalidade de intervenção, sejam aplicadas em amostras maiores, com delineamentos experimentais ou quase-experimentais, e em culturas diversificadas, como em setores privados e outros Estados brasileiros. Além disso, recomenda-se a realização de estudos com indivíduos que tiverem melhores e piores resultados, para identificação de mecanismos mediadores e moderadores da mudança, incluindo variáveis individuais como idade, gênero, tempo para a aposentadoria, autoeficácia, rede social e barreiras para engajamento em autocuidado; variáveis organizacionais, como apoio da chefia para participação na intervenção e comprometimento no trabalho; e variáveis da intervenção, como habilidades sociais do facilitador, aliança terapêutica e fatores terapêuticos do grupo (Yalom & Leszcz, 2006).

Por fim, espera-se que este estudo possa contribuir para a Política de Atenção à Saúde do Servidor - PASS (Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, 2010) como, na diversificação de procedimentos adotados por profissionais que realizam ações de promoção da saúde do servidor, especialmente no desenvolvimento de programas de preparação para a aposentadoria.

 

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Endereço para correspondência:
Cristineide Leandro-frança
Departamento de Psicologia Clínica, Instituto de Psicologia, Universidade de Brasília, Campus Darcy Ribeiro
Brasília, DF, CEP 70910-900
E-mail: giardini@unb.br

Miriam Bratfisch Villa
Via Prefeito Jurandyr Paixão, 500, Condominio B, bloco 6, apto 23 A. Bairro Campo Belo
CEP 13481901. Limeira-SP
E-mail: miriambrat@hotmail.com

Recebido em: 24.09.2012
Aprovado em: 04.11.2013