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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.17 no.1 Brasília mar. 2017

http://dx.doi.org/10.17652/rpot/2017.1.11032 

RESENHA

 

Programas de educação para aposentadoria: como planejar, implementar e avaliar

 

 

Marcos Henrique Antunes

Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil

Endereço para correspondência

 

 

Livro: Murta, S. G., Leandro-França, C., & Seidl, J. (2014). Programas de educação para aposentadoria: Como planejar, implementar e avaliar. Novo Hamburgo: Synopsis.

Esta obra foi organizada por Sheila Giardini Murta, Cristineide Leandro-França e Juliana Seidl, sendo que a primeira autora é professora do Departamento de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB), e as demais são doutorandas no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da mesma universidade. O livro contém fundamentos teóricos e técnicos essenciais para a execução de programas de educação para aposentadoria, principalmente no contexto das organizações de trabalho. Tais elementos estão dispostos ao longo de 16 capítulos, os quais foram escritos por diferentes autores com experiência prática e/ou de pesquisa no tema.

O livro está dividido em quatro partes que estão amplamente relacionadas: (a) Fundamentos, (b) Planejamento de programas de educação para aposentadoria, (c) Temas e estratégias para programas de educação para aposentadoria e (d) Pesquisa. A seguir, serão apresentados os capítulos que compõem cada uma dessas seções, bem como os principais aspectos neles abordados.

A primeira parte do livro integra três capítulos, nos quais são apresentados os conceitos nucleares e alguns dos aportes teóricos que balizam a prática da educação para aposentadoria. O capítulo 1, escrito por Cristineide Leandro-França, discorre sobre a relação entre aposentadoria e envelhecimento, enfatizando aspectos inerentes à saúde dos indivíduos no processo de transição para esse período de suas vidas e da população idosa em geral. A partir da conceituação de prevenção e promoção de saúde, é exposto um panorama das principais políticas públicas nos cenários nacional e internacional, as quais apresentam diretrizes e estratégias para a vivência de um envelhecimento com qualidade e da aposentadoria bem-sucedida.

O segundo capítulo, produzido por Isolda de Araújo Gunther e Lilian Maria Borges, apresenta três aportes teóricos para o embasamento das ações dos programas de educação para aposentadoria. São eles: a perspectiva do Curso de Vida/Life Span Perspective, o Modelo de Resiliência e o Modelo Transteórico de Mudança/Transtheoretical Model. As autoras discutem os conceitos nucleares que sustentam tais aportes e exploram algumas possibilidades de sua utilização na prática dos programas.

No Capítulo 3, a autora Cristineide Leandro-França problematiza aspectos que influenciam a vivência da aposentadoria, a partir dos resultados obtidos em diferentes pesquisas sobre o tema. Denota-se que tais aspectos são variados, levando-se em conta, especialmente, as condições pessoais de vida do indivíduo, bem como o contexto organizacional e social no qual está inserido. A autora finaliza o capítulo apresentando um quadro com estratégias que visam promover a adaptação e a qualidade de vida de aposentados, que podem ser utilizadas pelos profissionais que atuam com esse público. Este capítulo encerra a primeira parte do livro.

A parte 2, também composta por três capítulos, aborda o planejamento de programas de educação para aposentadoria, sendo debatidas questões relacionadas à estrutura e ao funcionamento de grupos com essa finalidade. O quarto capítulo, redigido por Sheila Giardini Murta, Lilian Maria Borges e Áderson Luiz Costa Junior, abre essa seção do livro. Esse texto discorre sobre questões teóricas e práticas que marcam o funcionamento e o manejo de grupos psicoeducativos, dentre as quais cita-se o planejamento de intervenções, o processo e os fatores terapêuticos no trabalho com grupos, as habilidades do facilitador e a ética. Trata-se, portanto, de um estudo que não está voltado unicamente para o trabalho em programas de educação para aposentadoria, mas que pode contribuir no planejamento e execução de intervenções com grupos em diferentes espaços e com diversas finalidades.

No quinto capítulo, as autoras Juliana Seidl, Cristineide Leandro-França e Sheila Giardini Murta analisam a relevância dos programas de educação para aposentadoria, considerando, especialmente, seu impacto positivo na saúde do trabalhador. É explicada a escolha do termo educação para aposentadoria, o qual se refere a uma ação abrangente e de caráter longitudinal que deve ocorrer de modo integrado ao longo de toda a trajetória profissional do indivíduo. Essa perspectiva propõe que os trabalhadores sejam educados para a aposentadoria por meio de um processo contínuo e permanente, contrapondo-se à lógica dos programas de preparação para aposentadoria, que usualmente são restritos ao final da carreira profissional.

A partir disso, são apresentadas três possíveis maneiras de organizar e executar as atividades de um programa nessa perspectiva, as quais se encontram descritas em relatos de experiências e na literatura especializada sobre o tema. São elas: a intervenção continuada, a intervenção breve e a intervenção intensiva. As principais diferenças entre esses formatos estão em seus objetivos e no modo como as atividades são desenvolvidas, devido à estruturação do tempo e do percurso a ser trilhado com o grupo. As autoras enriquecem essa apresentação trazendo, ainda, reflexões sobre alguns dos procedimentos comuns a cada tipo de intervenção, bem como os desafios de implantação no contexto das organizações.

O sexto capítulo, de autoria de José Carlos Zanelli e Carla Antloga, encerra a segunda parte do livro. Nele, é possível encontrar uma proposta de como estruturar as ações de um programa, em suas diferentes etapas, desde o levantamento de demandas da organização em questão e a elaboração de um projeto, passando pela qualificação dos profissionais que atuarão no processo, até a execução do programa e, posteriormente, sua avaliação. Os autores analisam que os programas, per si, podem não dar conta de trabalhar a variedade de demandas e interesses de todos os participantes e/ou da organização, sendo pertinente que as ações sejam pensadas de forma articulada e incluindo um acompanhamento, na perspectiva de suporte psicológico aos egressos.

Na terceira parte do livro estão integrados oito capítulos, que tratam dos temas e das estratégias que podem compor um programa propriamente dito. Destaca-se que, nesses capítulos, os autores sugerem e apresentam diferentes técnicas que podem ser utilizadas no trabalho de educação para aposentadoria.

O Capítulo 7, assinado por Juliana Seidl e Inês Gandolfo Conceição, traz como discussão central a relação do ser humano com o trabalho. Assim, são apresentados os conceitos de identidade e valores, a partir dos quais são problematizadas a diferença entre trabalho e emprego. As autoras abordam ainda a potencialidade de oportunidades e experiências profissionais que a aposentadoria pode conferir, seja ao realizar uma nova atividade ou iniciar uma nova carreira. Isso, evidentemente, levando-se em conta os interesses e desejos de cada indivíduo.

O oitavo capítulo, produzido por Isabelle Patriciá Freitas Chariglione e Gerson Américo Janczura, discorre sobre o processo de envelhecimento, evidenciando como, em alguns casos, o sujeito pode apresentar alterações em capacidades cognitivas específicas, por exemplo, declínio na memória. Diante disso, os autores apresentam estratégias que podem ser ensinadas aos sujeitos que necessitam de uma melhoria em seu desempenho de memória.

O pensar saudável na aposentadoria é o título do capítulo 9, escrito por Lia Silvia Kunzler. Nele, é apresentada uma técnica de intervenção baseada na abordagem cognitiva, cujo ponto de partida é a identificação das emoções em desequilíbrio mediante uma determinada situação. A autora chama a atenção dos profissionais que atuam em práticas de educação para aposentadoria para a forma como os aposentados pensam, sentem e se comportam frente às diferentes questões que se impõem nesse processo. Considera-se que o exercício proposto nesse capítulo pode promover o reconhecimento tanto de dificuldades quanto de recursos que influenciam a adaptação do indivíduo a este período.

O décimo capítulo, escrito por Lucia Helena de Freitas Pinho França e Larissa de Almeida Nobre Sandoval, trata dos relacionamentos familiares e conjugais na aposentadoria. A partir da discussão de resultados obtidos em pesquisas nacionais e internacionais, as autoras evidenciam a importância das relações familiares, afetivas e sociais no processo de aposentadoria. Além disso, apontam algumas das características e condições que estão envolvidas na dinâmica dessas relações nesse momento da vida. Por fim, mencionam ações possíveis para trabalhar a temática nos grupos de educação para aposentadoria, dentre as quais destaca-se a inclusão e participação de membros da família do aposentado nos encontros.

O capítulo 11, assinado por Liana Fortunato Costa e Jéssica Vaz Malaquias, trata de rede social e aposentadoria. A perspectiva apresentada convida a pensar em um trabalho abrangente com os aposentados, considerando-se a dinamicidade dos vínculos que compõem a vida desses sujeitos. Tais vínculos envolvem, por exemplo, a família nuclear e extensa, a comunidade e outros espaços de vida social. As autoras incentivam que a educação para aposentadoria seja um processo que estimule a reflexão sobre como se constitui a rede de apoio social do sujeito que está em vias de aposentadoria e/ou já aposentado, e como é mantido o vínculo com essas relações que existem em seu universo. Nessa análise, é fundamental observar como os fatores socioeconômicos, de gênero, relação com o trabalho e com a família afetam o cenário.

O capítulo 12, escrito por Marcos Pimenta, apresenta questões importantes para a gestão financeira individual e familiar direcionadas, especialmente, a este período da vida. O autor oferece aos leitores um modelo de orçamento que pode auxiliar na organização econômica tanto no momento presente quanto no futuro, de acordo com os interesses e projetos de cada pessoa. Destaca-se, ainda, que ao final do capítulo são elencados 10 procedimentos para o manejo desse tema em grupos de educação para aposentadoria.

O décimo terceiro capítulo, escrito por Juliana Seidl, introduz a temática do lazer na aposentadoria a partir das histórias de Joana e Sofia, duas personagens criadas pela autora que, apesar do laço de amizade existente entre elas, compartilham de experiências e significações distintas em suas vidas no tocante ao lazer. Esse tema é problematizado à luz de aspectos de ordem individual, histórica, cultural e social, visando chamar a atenção para a importância da educação para o lazer ao longo de toda a vida. Assim, a autora questiona a usual compreensão da aposentadoria associada à falta de perspectivas e provoca os facilitadores dos programas a conferir mais ênfase ao tema, de modo que as atividades realizadas possam contribuir, efetivamente, na identificação e desenvolvimento de potenciais fontes de lazer.

O capítulo 14, cujo autor é Maurício Neubern, aborda a espiritualidade como um recurso para o trabalho terapêutico de promoção de saúde, estabelecendo correlações com a aposentadoria. A partir do relato de alguns casos de atendimento, o autor apresenta possibilidades para abordar este tema junto aos aposentados e suas redes de relações.

O décimo quinto capítulo, escrito por Lucia Helena de Freitas Pinho França, Leonardo Martins Barbosa e Sheila Giardini Murta, encerra a parte 3 do livro. Nele, os autores discutem o conceito de projeto de vida e como ele se constitui por meio dos valores de cada pessoa. A partir disso, são apresentadas técnicas que possibilitam trabalhar o planejamento de vida nos programas. Os autores recomendam que este seja o último tema a ser desenvolvido nas práticas de educação para aposentadoria, a fim de provocar a elaboração de uma síntese a partir da realidade de vida de cada participante e das reflexões geradas ao longo das atividades.

Na parte 4, constituída pelo capítulo 16, são analisados aspectos pertinentes à pesquisa em avaliação de programas de educação para aposentadoria. Os autores, Sheila Giardini Murta, Cristineide Leandro-França e Leonardo Martins Barbosa, chamam a atenção para a escassez de produções científicas que tratem de avaliações sistemáticas de programas de educação para aposentadoria no Brasil. Entende-se que o processo de avaliar sistematicamente a intervenção é uma parte fundamental do processo, pois oferece uma base para compreender e analisar a ação realizada, subsídios para o aperfeiçoamento das políticas e práticas organizacionais em torno da aposentadoria e, especialmente, dos programas propriamente ditos. Diante disso, os autores apresentam um panorama de indicações, formatos e procedimentos de investigações que podem ser realizadas de acordo com o contexto e os propósitos de um programa de educação para aposentadoria.

Pode-se perceber que o livro apresenta a multiplicidade de elementos que estão envolvidos na apreensão do fenômeno da aposentadoria, destacando, sobretudo, os diversos temas e possibilidades para a prática nesse campo. Considera-se que a natureza heterogênea desta discussão pode introduzir o leitor às diferentes temáticas e, com isso, subsidiar o planejamento e execução de intervenções que atendam às demandas com as quais se defronta na sua atuação com pessoas aposentadas. Portanto, trata-se de uma obra importante que fomenta a disseminação de conhecimento acerca dos fundamentos, métodos e procedimentos que podem compor ações direcionadas à educação para aposentadoria.

Ademais, entende-se que o livro contribui ao provocar reflexões sobre questões atuais como, por exemplo, o envelhecimento populacional, o qual tensiona distintas esferas sociais e desafia as organizações a pensarem acerca do bem-estar dos trabalhadores ao longo de toda a sua trajetória profissional. Dessa forma, evidencia possibilidades de desenvolvimento e atuação para profissionais de diferentes campos do conhecimento que tenham interesse no tema da aposentadoria. Acredita-se que isso poderá incentivar outros profissionais a pesquisarem e colaborarem por meio de seus saberes, enriquecendo, assim, o debate sobre esta área no contexto brasileiro.

 

 

Endereço para correspondência:
Marcos Henrique Antunes
Rua Capitão Romualdo de Barros, 611, Carvoeira
Florianópolis, SC, Brasil 88040-600
Email: marcos.antunes@live.com

Recebida em: 28/05/2015
Aceita em: 13/05/2016

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