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Revista Psicologia Organizações e Trabalho

versão On-line ISSN 1984-6657

Rev. Psicol., Organ. Trab. vol.19 no.3 Brasília jul./set. 2019

http://dx.doi.org/10.17652/rpot/2019.3.16469 

"Para além do arco-íris": trajetórias de carreira de casais homossexuais

 

"Somewhere over the rainbow": career trajectories of homosexual couples

 

"Más allá del arco iris": trayectorias de carrera de parejas homosexuales

 

 

Aline Mendonça Fraga;Vanessa Amaral Prestes; Sidinei Rocha-de-Oliveira; Igor Baptista de Oliveira Medeiros; Carla dos Santos Feijó

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este trabalho buscou compreender como se constrói a carreira de casais homossexuais, individual e conjuntamente, e como são negociadas as trajetórias frente às possibilidades existentes. Realizou-se uma pesquisa qualitativa com seis casais de diferentes idades, formações profissionais e tempo de relação. A coleta de dados ocorreu em dois momentos: entrevistas individuais e com o casal. Para análise dos relatos seguiu-se a análise de conteúdo. Os resultados apontaram que a construção do projeto coletivo evidencia a metamorfose dos projetos individuais e redirecionamentos de carreira com alternância na valorização das trajetórias individuais, permitindo explorar nuances e pontos de virada nas trajetórias de casais de dupla carreira. Se por um lado há maior liberdade para negociações das carreiras, por outro, no campo de possibilidades da trajetória de cada um, emerge um espaço de dilemas e conflitos, na forma como estes casais vivenciam papeis e status em uma sociedade pautada na heteronormatividade.

Palavras-chave: Carreira; Dupla Carreira; Homossexualidade.


ABSTRACT

This paper aimed to understand how homosexual couples build their careers, individually and jointly, and how trajectories are negotiated considering existing possibilities. Qualitative research was carried out with six homosexual couples of various ages, professional backgrounds, and relationship stages. The data collection had two moments: individual interviews and a joint interview. Analysis of the reports was based on content analysis. The results indicated that the construction of the collective project clearly shows the metamorphosis of the individual projects and career redirections with greater alternation in the valuation of the individual trajectories. This allows the exploration of nuances and turning points of the trajectories of dual career couples. While on the one hand there is greater freedom for negotiations regarding careers, on the other hand, in the field of possibilities for each trajectory, a space of dilemmas and conflicts emerges, in the way these couples experience roles and status in a society based on heteronormativity.

Keywords: Career; Dual Career; Homosexuality.


RESUMEN

Este trabajo buscó comprender cómo se construye la carrera de parejas homosexuales, individual y conjuntamente, y cómo se negocian las trayectorias frente a las posibilidades existentes. Se realizó una investigación cualitativa con seis parejas de diferentes edades, formaciones profesionales y tiempo de relación. La recolección de datos tuvo dos momentos: entrevista individual y entrevista con la pareja. Para la investigación de los datos se siguió el análisis de contenido. Los resultados apuntaron que la construcción del proyecto colectivo evidencia la metamorfosis de los proyectos individuales y redirecciones de carrera con mayor alternancia en la valorización de las trayectorias, permitiendo explorar matices y puntos de giro de trayectorias de parejas de doble carrera. Si, por un lado, hay mayor libertad para negociaciones de las carreras, por otro, en el campo de posibilidades de la trayectoria de cada uno, emerge un espacio de dilemas y conflictos, en la forma en que estas parejas vivencian papeles y status en una sociedad pautada en la heteronormatividad.

Palabras clave: Carrera; Doble Carrera; Homosexualidad.


 

 

O estudo de casais de dupla carreira tem ganhado destaque na literatura internacional (Domene et al., 2012; Masterson & Hoobler, 2015; Tzanakou, 2017; Unger, Sonnentag, Niessen, & Kuonath, 2015) e nacional (Berlato, 2015; Berlato & Correa, 2017; Castro, 2015; Santos & Casado, 2011). Estes estudos apontam para a reflexão sobre espaços de trabalho e vida pessoal e as negociações que constituem as carreiras conjuntas, na medida em que se acompanha a mudança no perfil da força de trabalho. Sobretudo, emerge a necessidade de analisar as singularidades da carreira das mulheres bem como a construção conjunta de carreira de casais.

Aprofundando este debate, nota-se que os trabalhos sobre casais de dupla carreira focam, predominantemente, em casais heterossexuais. A carreira conjunta de casais desafia os estereótipos de gênero, caracterizados na figura do homem provedor e da mulher responsável pelas tarefas domésticas e cuidado da vida familiar, no momento em que contribuem para a constituição de uma identidade da família (Masterson & Hoobler, 2015). Além disso, definições sobre o futuro profissional, como formação e planejamento de carreira, podem encontrar-se ancoradas no amadurecimento da relação e compor um panorama com outras decisões e negociações, como o equilibro lar-trabalho e a escolha de um lugar para morar (Domene et al., 2012). Para ampliar a discussão, torna-se relevante considerar a união de casais do mesmo sexo, que podem configurar uma formação conjugal que possibilite novos olhares a serem pesquisados.

Dessa forma, este trabalho buscou compreender como se constrói a carreira de casais homossexuais, individual e conjuntamente, e como se negociam as decisões acerca destas duas perspectivas. Vale destacar que o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, no Brasil, já é uma realidade desde 2013, todavia, assumir uma união homossexual permanece sendo uma questão delicada para muitas pessoas, em face dos preconceitos que ainda prevalecem socialmente e que também podem dificultar a trajetória profissional.

 

Uma Perspectiva Interacionista para Pensar Carreiras

Os estudos sobre carreira têm destacado a importância da análise das trajetórias construídas nos novos contextos (Khapova & Arthur, 2011; Lawrence, 2011). Nesse estudo, a carreira é compreendida como "uma trajetória retrospectiva e projetada, dinâmica e mutável, de um indivíduo ou coletividade, revelando negociações entre objetividades e subjetividades" (DeLuca, Rocha-de-Oliveira, & Chiesa, 2016, p. 15). Esta definição busca articular os conceitos de Hughes (1937; 1958) e de Velho (2003), explorando as noções de projeto, metamorfose e negociação da realidade deste na discussão sobre conflitos e dilemas, iniciada por aquele.

No horizonte conceitual dos estudos de carreira, Hughes (1937) difere consideravelmente de outros autores (Sullivan & Baruch, 2009) ao transcender a ótica funcionalista, em que carreiras aconteciam dentro de estruturas burocráticas, e supera a perspectiva calcada unicamente no indivíduo. A compreensão de carreira adotada por Hughes (1937; 1958) segue a corrente interacionista, possibilitando colocar em evidência a interdisciplinaridade necessária para compreensão de trajetórias. A abordagem interacionista leva ao fortalecimento das bases relacional e contextual dos conceitos. Para Hughes, uma carreira pode ser compreendida como "a sequência de papeis e status e cargos realizados pelo indivíduo" (Hughes, 1937, p. 404). Sua definição abrange, portanto, tanto atividades ligadas ao trabalho quanto os papeis sociais vivenciados ao longo da trajetória, considerando a interação dos indivíduos com a sociedade e os significados produzidos individualmente a partir dessa interação. Neste ponto de vista, a carreira é a sequência definida, objetiva e subjetivamente, pela qual as pessoas compreendem sua vida e interpretam suas ações, podendo vivenciar conflitos (Hughes, 1937) e dilemas (Hughes, 1958) no decorrer da sua trajetória.

Os conflitos surgem do contraste entre os aspectos objetivos e subjetivos (Hughes, 1937), enquanto o dilema é o choque entre dois elementos objetivos (Hughes, 1958). Como forma de discutir os momentos de conflito e de dilema vivenciados pelos sujeitos, DeLuca et al. (2016) abordaram os conceitos de metamorfose, projeto e campo de possibilidades de Velho (2003). Segundo os autores, os projetos representam condutas objetivas, direcionadas para alcançar propósitos objetivos. Projetos influenciam uns aos outros durante a construção de uma carreira, podendo ser individuais ou coletivos. A metamorfose é "o ajuste do indivíduo ao trânsito de diferentes mundos" (DeLuca et al., p. 11) que, assim como o conceito de carreira para Hughes (1937), transcende o universo de trabalho. O campo de possibilidades consiste no "rol de alternativas" apresentadas ao indivíduo com base em processos sócio-históricos, que ao ajustar a sua realidade, em razão de outros projetos individuais e em conjunto, evidencia o seu potencial de metamorfose (DeLuca et al., 2016; Velho, 2003).

Ao circular por diferentes esferas da vida social, o indivíduo constantemente se depara com situações de conflito e dilema em sua trajetória. Nesses momentos, projetos individuais e coletivos dialogam e os indivíduos negociam a realidade vivida metamorfoseando projetos. Desta forma, projetos individuais podem contrapor, integrar ou dar origem a projetos coletivos. Esta articulação entre projetos individuais e coletivos mostra-se como uma construção particularmente instigante para o estudo dos casais de dupla carreira, quando a realidade de dois indivíduos é negociada e se metamorfoseia na construção de um projeto conjunto. Desta forma, os conceitos articulados pelos autores permitem analisar as trajetórias construídas por casais, os momentos de dilema e conflitos vivenciados, e como estes foram negociados pelo casal e metamorfoseados em novos projetos.

Carreira Conjunta de Casais com Base na Orientação Sexual

Os modelos de carreira foram tradicionalmente construídos com base em amostras compostas por homens, mas com o posicionamento da mulher no mercado de trabalho, os casos de casais de dupla carreira foram tornando-se cada vez mais comuns (Coltrane, Miller, DeHaan, & Stewart, 2013; Sullivan & Mainiero, 2008). O conceito de "dupla carreira", originário do inglês, dual career, foi introduzido e lapidado na literatura por Rapoport e Rapoport (1969). Os autores indicaram, àquela época, o surgimento de outras configurações conjugais diferentes da norma tradicional em que o homem era o único provedor e em busca de uma carreira, enquanto a mulher tomava conta da casa e dos filhos. Assim sendo, as mudanças ocorridas no mercado de trabalho apontaram tanto para a necessidade de abordar a carreira das mulheres, como a dos casais, além de considerar as negociações que se apresentam ao longo da trajetória de ambos.

Estudos sobre casais de dupla carreira estão presentes na literatura internacional e abordam, principalmente, temas como equilíbrio trabalho-família e satisfação no trabalho (Haddock, Zimmerman, Current, & Harvey, 2003; Unger et al., 2015), formação da identidade familiar à parte dos estereótipos de gênero (Masterson & Hoobler, 2015) e efeitos relativos ao desenvolvimento da carreira para casais que trabalham na mesma área (Tzanakou, 2017). Embora no horizonte teórico a tendência seja pesquisar as carreiras conjuntas construídas por casais heterossexuais, também há estudos com casais homossexuais, como O'Ryan e McFarland (2010) que destacaram as dificuldades enfrentadas em situações de trabalho no momento de assumir a sua orientação sexual ou na forma de incluir o cônjuge socialmente, situações em que casais heterossexuais possivelmente nem se deparariam com questionamentos. Destaca-se, também, a pesquisa de Heaphy e Einarsdottir (2013), realizada com casais homossexuais, porém com foco voltado para a vida conjugal, abordando questões como casamento e filhos.

Ainda que não tratem de casais, há muitos trabalhos relacionando carreira e orientação sexual (Charles & Arndt, 2013; Ng, Schweitzer, & Lyons, 2012), ressaltando pontos sobre identidade sexual e sobreposição de identidade, principalmente destacando os desafios enfrentados por homossexuais no desenvolvimento de suas carreiras em razão de discriminação, preconceito e/ou homofobia (McFadden, 2015; Parnell, Lease, & Green, 2012). Por vezes, a orientação sexual se sobrepõe ao indivíduo, por pertencer a outra minoria, como ocorre com mulheres lésbicas, de origem étnica não-branca ou pertencentes a qualquer outro grupo de identidade marginalizada (Bieschke & Toepfer-Hendey, 2006; Patton & McMahon, 2014). Bieschke e Toepfer-Hendey (2006) destacam a tendência de mulheres homossexuais a não seguirem os modelos de estereótipos de gênero para escolha de suas profissões, bem como é menos comum que dependam de suas companheiras.

Outrossim, há também trabalhos visando entender a dinâmica de casais de dupla carreira no contexto nacional com foco nas reconfigurações à parte do modelo tradicional da formação do núcleo familiar (Berlato & Correa, 2017; Castro, 2015; Santos & Casado, 2011), incluindo o caso dos casais homossexuais de dupla carreira (Castro, 2015). Berlato & Correa (2017) entendem que casais em dual career correspondem a um homem e uma mulher que ao se unirem, com intenção de construir família, não desejam abrir mão de suas carreiras. Ainda que originalmente as pesquisas tenham sido baseadas em uniões estritamente heterossexuais, no contexto atual é limitado não considerar casais homossexuais.

Ao refletir que a trajetória de um casal é concebida pela união de duas trajetórias individuais, e as concessões que são feitas nesse pensar são o que formulam a "nossa carreira" ao invés da "sua" e da "minha" (Domene et al., 2012), vale destacar que o desenvolvimento de carreira de homens e mulheres não ocorre da mesma forma. Isto se deve ao fato de que as mulheres, ainda hoje, enfrentam obstáculos e preconceitos no mercado de trabalho e são minoria em posições gerenciais, mesmo com alto nível educacional (Sullivan & Mainiero, 2008). Contudo, pode-se considerar que os desafios da união de trajetórias são comuns para qualquer casal, que já são considerados famílias independentemente da existência de filhos e da orientação sexual.

 

Método

Participantes

As pessoas participantes da pesquisa são casais homossexuais brasileiros residentes no país ou no exterior, com idade e formação distintas, totalizando seis casais. O acesso se deu por meio de indicação do círculo de convivência dos autores e autoras. Ao mencionar os casais, optou-se por chamá-los de companheiros (as), uma vez que o significado da palavra traz consigo a ideia de quem acompanha e convive na mesma casa, o que se mostrou comum aos entrevistados. O tempo de relacionamento variava, à época da pesquisa, entre dois e oito anos, e todos coabitavam a residência. Foram atribuídos nomes fictícios, a fim de preservar o anonimato das pessoas entrevistadas. Elas foram incentivadas pelos pesquisadores a escolherem nomes de preferência.

Dentre os casais entrevistados, apenas dois não mudaram de cidade (Lucas e Maurício e Laura e Sofia) após o início da relação. Apresenta-se, abaixo, a tabela com a caracterização dos participantes, com as informações correspondentes ao momento da pesquisa:

 

 

Instrumentos

A coleta de dados ocorreu por meio de entrevistas, baseadas em um roteiro semiestruturado, seguindo a abordagem metodológica utilizada por Heaphy e Einarsdottir (2013) na qual são realizadas entrevistas em dois momentos: individuais e com o casal. Nos dois momentos da entrevista foi solicitado que contassem a trajetória profissional do casal e os pontos de intersecção com a história conjunta. O roteiro da entrevista individual focou na trajetória de cada participante e na construção do relacionamento. O roteiro da entrevista conjunta seguiu a partir de questões que surgiram das entrevistas individuais e foram retomados temas ligados à construção de uma trajetória conjunta como as finanças, os compromissos advindos do papel que cada cônjuge ocupa na relação, as tomadas de decisão e o planejamento do casal.

Procedimentos de Coleta de Dados e Cuidados Éticos

O estudo realizado foi uma pesquisa qualitativa. Neste estudo, para dar destaque à construção, na ordem do individual para o coletivo, buscou-se realizar primeiro a entrevista com cada cônjuge e, após, com o casal. Tal sequência foi adotada também no intuito de minimizar a interferência da entrevista com o casal nas entrevistas individuais. Somente um dos casais, João e Rodrigo, pediram para serem entrevistados primeiramente juntos, em razão de compromissos pessoais. Por ser escolha do casal, optou-se por mantê-los no conjunto de entrevistados ainda que a coleta tenha seguido ordem diversa.

As entrevistas foram realizadas tanto presencialmente como por Skype, com imagem, conforme a disponibilidade dos entrevistados e sua localização geográfica. Todos os participantes assinaram termo de consentimento que indicava o objetivo da pesquisa e seu compromisso com a manutenção do anonimato. Cabe ressaltar que as entrevistas e as transcrições foram realizadas pelos próprios autores e autoras da pesquisa e que tanto para a entrevista individual como para a conjunta, o contato foi estabelecido com o mesmo pesquisador ou pesquisadora, o que facilitou a interação e sensação de proximidade, conforme indicado por Domene et al. (2012).

Procedimentos de Análise de Dados

A análise dos dados foi realizada através da análise de conteúdo, técnica comum de pesquisas em ciências sociais, sobretudo por analisar textos de forma aberta quanto à construção das categorias (Gaskell, 2002), que nesta pesquisa foram definidas a posteriori. De acordo com Bauer (2002), ainda que a análise de conteúdo clássica se concentre na contagem e descrição de elementos codificados do corpus textual, maior atenção está sendo dada a uma análise mais aberta, que possibilite ao pesquisador considerar sutilezas como "cosmovisões, valores, atitudes, opiniões, preconceitos e estereótipos" (Bauer, 2002, p. 192), no lugar de concentrar-se na frequência e ordenação de palavras.

Ainda, as entrevistas qualitativas, de acordo com Gaskell (2002, p. 65), fornecem "os dados básicos para o desenvolvimento e compreensão das relações entre os atores sociais e sua situação" e objetivam a compreensão de "crenças, atitudes, valores e motivações". Assim, como sugere o estudo de Heaphy e Einarsdottir (2013), o foco da análise não esteve nas contradições entre as histórias que contaram os parceiros e as parceiras nos dois momentos da entrevista (individual e conjunta), embora se admita que essas contradições possam existir e serem sociologicamente interessantes como pontos de análise. O objetivo, portanto, centrou-se na análise das questões relacionadas às trajetórias profissionais individuais até a construção conjunta da trajetória do casal.

 

Resultados e Discussão

As histórias dos casais que compõe a pesquisa são singulares, bem como suas trajetórias individuais e coletivas. Assim, foi possível observar pontos em consonância, e as análises dos resultados evidenciaram que o quadro teórico elaborado por Hughes (1937; 1958) e de DeLuca et al. (2016) pode contribuir para o entendimento da constituição de carreira entre casais homossexuais. Previamente às análises, julgou-se pertinente apresentar brevemente cada um dos casais, visto que o quadro de identificação apenas os caracteriza, sem responder às expectativas e eventual curiosidade do leitor quanto às histórias destes.

O casal Clara e Marina se conheceu pela Internet, em chat de relacionamentos. Clara, natural de Santa Catarina, contou que sempre trabalhou em setores ou em empresas ligados à área de tecnologia, o que considera ser "o seu mundo". Marina, gaúcha, iniciou a faculdade de Ciências Contábeis e optou por suspender o curso por falta de afinidades com a área. Migrou, então, para o curso de Estética e Cosmetologia. Atualmente, já formada, Marina se diz realizada com a área que escolheu e segura de que foi a melhor opção para a sua vida, embora ainda planeje mudanças. Marina mudou-se do interior do Rio Grande do Sul para viver com Clara, na Capital, há mais de dois anos. À época da pesquisa, estavam com a data do casamento marcada e com planos de mudança para uma casa maior e a adoção de filhos.

Arthur e Ricardo são da região metropolitana de Porto Alegre e passaram toda juventude na cidade. Conheceram-se em um bar e após alguns meses decidiram começar um relacionamento. Tendo passado dois anos e meio juntos, Ricardo foi aprovado em um concurso público em outro estado e mudou de cidade. Depois de alguns meses longe, resolveram separar-se devido à distância, situação que logo se alterou com o retorno de Ricardo para o Sul. Com sua volta, o casal decidiu morar junto e assim permanecem desde então. Ambos são concursados em suas áreas de formação e "concurseiros" (indivíduos que se dedicam continuamente a estudar para concursos públicos), apoiando e incentivando o progresso na carreira pública de cada um.

Já Lucas e Maurício são cariocas, cresceram morando no mesmo bairro, estudando na mesma escola, mas se conheceram somente na época da faculdade, quando amigos em comum os aproximaram. Moram juntos há dois anos, dos oito de convivência como casal, em um apartamento comprado por Maurício com a ajuda dos pais e têm uma cachorrinha adotada. Ambos são estudantes de pós-graduação em suas áreas de atuação, sendo Lucas, doutorando, e Maurício, mestrando. Entretanto, somente o último tem intenção de seguir na carreira acadêmica, como professor, e revelou o incentivo para que o companheiro siga no campo do ensino e da pesquisa.

Rafael e Pedro são casados por regime de união estável, há três anos e um mês. Pedro é paulista, cursou parte da faculdade em São Paulo e parte em Paris, até que se mudou para Brasília, concursado como Diplomata. Rafael é gaúcho e quando conheceu o companheiro, em uma festa, havia há pouco se mudado para assumir o cargo Gerente de Reservas de um complexo hoteleiro na capital brasileira. Após um ano de relação, Rafael foi demitido do hotel em que trabalhava e a partir de então a sua trajetória teve ainda mais mudanças. Primeiro, foi trabalhar em São Paulo e, após nove meses, em razão da pouca perspectiva financeira e da saudade de Pedro, retornou para Brasília. Nessa época, o casal passou a morar junto e Pedro assumiu totalmente o sustento de ambos. Quando da entrevista, o casal residia em Nova Iorque há mais de dois anos e Rafael trabalhava como Gerente de Plantão de um hotel, após um período de dois anos e oito meses sem renda própria.

João e Rodrigo formam o único casal que se conheceu por motivos profissionais e atuam em áreas próximas. João foi realizar um curso ministrado por Rodrigo e logo em seguida já engataram a relação amorosa. O interesse comum pela área tributária aproximou os dois, mas, ao mesmo tempo, ocasionou alguns ajustes na vida de João que, naquele momento, não conseguia desligar mentalmente do trabalho e tinha uma rotina exaustiva, pois trabalhava na capital de Santa Catarina, estudava em outra cidade e morava com a família no interior do Estado. Rodrigo o fez perceber que era importante dispensar mais tempo para seu bem-estar físico e para a relação. Dentre os participantes, são o casal com menos tempo de relação, mas já moram juntos há alguns meses.

O último casal é formado por Laura e Sofia, que nasceram e cresceram em Porto Alegre e moram juntas há aproximadamente dois anos. Assim como outros participantes da pesquisa, se aproximaram em uma festa, por meio de amigos em comum. Laura relatou que, antes da relação com Sofia, não costumava discutir sobre escolhas de carreira com ninguém. Ao optar pelo curso de Direito, depois de ter cursado Engenharia e Publicidade e Propaganda, os pais a incentivaram a prestar concurso público, intenção que está cada vez mais distante dos seus planos. Sofia também passou por mais de uma graduação e, embora não tenha concluído nenhuma, e isso não esteja momentaneamente afetando seu desenvolvimento profissional, cogita concluir nível superior ou adquirir alguma certificação da área em que atua. A seguir, apresentam-se as categorias coletivas que emergiram das análises dos relatos dos casais entrevistados.

Surgimento do Projeto Coletivo: Construção Conjunta de Carreira, Projeto e Metamorfose

Na leitura das entrevistas emergiu como primeiro ponto de atenção o processo de construção de um projeto de carreira do casal. Este processo iniciou-se aos poucos e consolidou-se como parte marcante das conversas e encaminhamentos dos casais. Desta forma, as carreiras dos casais participantes foram construídas apoiadas na opinião e assentimento em parceria, "eu peço a opinião dela bastante, em tudo, [...] eu chego em casa e peço a opinião dela 'ah, o que tu acha, se eu fizer isso, ou fizer aquilo?'" (Clara - companheira de Marina); "Sempre peço pra ela opinião em qualquer coisa. É muito importante" (Marina - companheira de Clara). "Sempre que eu tenho alguma questão, alguma dúvida, eu acabo consultando, perguntando, vendo a opinião dele, o que ele acha, né? Dificilmente alguma coisa que é pra eu decidir eu vou decidir sozinho, porque a gente vive junto" (Lucas - companheiro de Maurício). Essas atitudes revelam um suporte que beneficia o conforto pessoal e esteve presente em todos os casais, "na verdade é um apoio emocional. Acho que essa é a chave de tudo" (Sofia - companheira de Laura).

Na medida em que se desenvolveram as relações, foram sendo estabelecidas ligações entre projetos individuais, passando a existir um projeto coletivo, do casal. Esse projeto do casal aparece a partir de sucessivas negociações que emergiram em cada momento de possível mudança. Mesmo nos questionamentos profissionais pessoais, é compreendido que as decisões de um afetam a vida e, notadamente, a carreira do outro. Desta forma, constitui-se um canal aberto de debate sobre as mudanças profissionais e as implicações para o projeto do casal. Ao passo que surgiam necessidades de decisões significativas, como após uma demissão ou troca de emprego, a construção do relacionamento se fortalecia: "Eu fui demitida da empresa, tá? Em 2011. E ela me apoiou muito, assim, foi um momento bem ruim, eu não tava esperando, não tava programado e a Laura foi extremamente importante, me apoiou muito" (Sofia - companheira de Laura).

Com o mesmo sentimento de apoio, mas envolvendo outro tipo de dilema, o casal Rafael e Pedro, em dado momento, tomou a decisão de que Rafael poderia "abrir mão da" (Rafael) e "sacrificar a" (Pedro) carreira em prol de um projeto de vida em comum. Após a demissão do hotel em que trabalhava, a decepção financeira com o emprego encontrado em São Paulo e a carência afetiva por estar longe do namorado, a relação do casal e a trajetória profissional de Rafael tomaram outro rumo: "A partir desse momento, a gente se deu conta que a nossa relação tinha virado meio que uma família" (Pedro - companheiro de Rafael). Tal entendimento de família e casamento, contradiz o conceito tradicional de dual career (Berlato & Correa, 2017), retomando sua limitação. Assim, o namoro virou casamento, e Pedro passou a assumir o sustento do casal. Outros casais também demonstraram a sensação de conforto afetivo e financeiro proporcionada pela relação, ocorrida antes de coabitarem uma residência.

Evidencia-se que a decisão de habitação conjunta pode ser considera um passo importante para a relação, acompanhada das primeiras influências na vida e na carreira, acarretadas pelo relacionamento afetivo. A negociação da realidade (Velho, 2003) surgiu como ponto importante de análise, pois os casais, ao buscarem uma construção de carreira conjunta, demonstraram manter uma estrutura objetiva semelhante à do casal heterossexual, ainda que por vezes com papeis diferentes. Os papeis sociais de quem provê sustento e quem cuida do lar são rompidos nas relações estudadas, sendo divididos entre os dois ou negociados nos períodos em que algum entrevistado abandonou o trabalho temporariamente.

Corroborando o apontado no estudo de Domene et al. (2012) com casais heterossexuais, observou-se a sequência de ações e encaminhamentos da construção da trajetória conjunta, como exemplificado na fala de Lucas (companheiro de Maurício): "a gente já se considera família, tem perspectiva assim, tem interesse, de poder ter filho, não sei como, não sei se adoção, as outras técnicas possíveis, não sei. Mas é interesse que os dois têm". E de Marina (companheira de Clara): "Aí vai ter essa meta do casamento, depois o apartamento, então vai se fechando o quebra-cabeça, sabe? Parece que é uma sequência, vai faltar, a gente vai ter necessidade de ter um filho, eu quero ter um filho, a Clara também". Nota-se que os projetos individuais já se mostram integrados no projeto coletivo, do casal. Na emergência desse projeto percebem-se similaridades e diferenças da construção conjunta de carreiras de casais heterossexuais. Por um lado, há uma repetição dos passos de construção da trajetória do casal com a habitação conjunta, compra de imóvel e ter filhos como etapas deste projeto. Por outro lado, há uma alternância dos papeis e status quanto à responsabilidade pelo sustento da casa e a valorização da carreira de ambos que será discutido com maior profundidade na próxima seção.

(Re)Direcionamentos de Carreira dos Casais: Campo de Possibilidades, Papel e Status

O segundo eixo de análise evidenciou a maior possibilidade de alternância de papeis entre casa e trabalho nos momentos de direcionamento profissional. Destaca-se a ênfase à instabilidade/estabilidade, especialmente quando relacionada ao trabalho na iniciativa pública ou privada. Pelo menos um dos participantes de cada casal mencionou, junto ou individualmente, durante a entrevista, a possibilidade de carreira em órgão público, exceto pelo casal Clara e Marina. Conquanto, os demais nem sempre demonstrassem certeza que essa seria uma escolha provável: "ser concurseiro ou passar num concurso público também nunca foi muito a minha" (Mauricio - companheiro de Lucas); "eu ainda tô na dúvida entre uma carreira pública ou seguir na carreira privada" (Laura - companheira de Sofia).

Na perspectiva de estabilidade, buscada por todos os casais, o trabalho na iniciativa privada é chamado de uma "dança das cadeiras", até mesmo para quem não objetiva o direcionamento para concursos: "A dúvida é sempre: vou para...? Mudo? Mudo de emprego? Recebo um convite ou outro, um colega que mudou, pode ser que ele te leve [...] nessa questão de empresas, a 'minha' empresa tá bem, mas a outra empresa tá melhor" (Sofia - companheira de Laura). Arthur e Ricardo formam um casal que se assume como "concurseiro". Ambos são concursados e projetam seu avanço na vida e na carreira de acordo com os níveis e status de diferentes cargos públicos. Ricardo havia sido aprovado em um concurso das forças armadas e, em menos de um ano foi nomeado para uma reconhecida empresa pública federal, percebendo como um avanço o status social de ser funcionário público dessa instituição. O mesmo ocorreu com Arthur, que após aprovado para um cargo operacional em um concurso de banco público da União, migrou para uma instituição federal de ensino, com prestígio e reconhecimento na região.

Nesse sentido, por trás da estabilidade para com cargos públicos, o status conferido também pesa na hora de escolha do projeto de carreira a seguir, visto que se trata de galgar cargos em instituições públicas reconhecidas, corroborando com a compreensão de Hughes (1937) sobre a carreira como sequência de papeis e status e cargos realizados pelo indivíduo ao longo da vida. Observa-se que a construção do projeto do casal passa por uma similaridade no tipo de trajetória profissional almejada. Esse direcionamento para concursos foi construído e reforçado pelo convívio dos dois, indicando que campos profissionais podem aproximar casais ou criar uma carreira similar, ponto ainda pouco explorado nos estudos com casais dual career.

A carreira de Pedro (companheiro de Rafael), outro concursado entre os casais, foi retratada como relacionada a uma ordem vertical, dada por um emprego público estável em que os status e os cargos são definidos institucionalmente e a ascensão profissional vai acontecendo na medida em que são atingidos níveis hierárquicos. O cônjuge de Pedro, Rafael, na lógica do trabalho ligado ao ambiente privado, e tendo sua instabilidade intensificada pela necessidade de mobilidade do companheiro, seguiria uma ordem horizontal e não-linear, podendo ascender e descender profissionalmente, independentemente de status e cargos alcançados anteriormente.

Nesse ponto, cabe mencionar que, ao voltar no tempo mentalmente e relembrar sua trajetória profissional, Pedro (companheiro de Rafael) disse que a escolha pela diplomacia se deu "mais por status do que pela diplomacia em si", resgatando novamente a abordagem de Hughes (1937), focando na questão do status como uma forma elementar do cargo, que concede ao indivíduo deveres e privilégios, não sendo peculiar ao indivíduo, mas histórico. O status, nesse caso, é apenas uma parte do papel social com definição padrão de acordo com os costumes ou as leis (Hughes, 1937). Por outro lado, a ideia de instável/estável também se relaciona com momentos em que a carreira de um deve ser priorizada, especialmente por ser considerada mais estável. Esse tipo de situação, versada como uma situação possível para os casais, foi refletida na trajetória de Rafael (companheiro de Pedro), quando renunciou ao seu projeto individual, transitoriamente, e passou a organizar a vida do casal, a rotina doméstica e os preparativos para a mudança de país. O projeto individual se metamorfoseou a partir do campo de possibilidades (Velho, 2003) que surge em virtude da construção do projeto do casal. Aqui encontramos aspectos objetivos (expressa na busca por estabilidade em uma profissão pública e a vida doméstica) e subjetivos (reinterpretações daquilo que é estabelecido para o campo de trabalho e atuação em casa) na discussão sobre o campo de possibilidades do casal (DeLuca et al., 2016).

Ao ajustar a sua realidade em razão de outros projetos, no caso, o da carreira do companheiro e o da vida a dois, evidencia-se o potencial de metamorfose (DeLuca et al., 2016; Velho, 2003). Rafael (companheiro de Pedro) também torna visível esse aspecto: "a nossa ideia de ficar juntos, no momento que eu larguei o meu último emprego, pra ficar dez meses sem trabalhar, foi não pensando em carreira [...] a lógica seria dar uma chance pra pessoa que tá do meu lado, que é a pessoa que eu amo e ver o que poderia acontecer". Assim como João (companheiro de Rodrigo): "a gente ainda não sabe o que que pode vir a acontecer, mas a gente sempre tende à 'ah, se eu precisar fazer o meu mestrado, beleza', a gente falou, se ele tiver na carreira pública, uma vez no mês ele pega o aviãozinho e vai me visitar".

Pode-se observar um espaço de negociação e de abertura para discutir as possibilidades sem que os papeis heteronormativos predominem - nos quais a mulher costuma ceder e abdicar de sua carreira mais que o homem (Bieschke & Toepfer-Hendey, 2006) - na medida em que pareceu possível que ambos pudessem optar por priorizar o âmbito profissional. Ainda relataram que muitas decisões, que fazem parte de planos de carreira individuais, são tomadas para que ocorram ao mesmo tempo, como forma de ajuda mútua. Outrossim, demonstraram encontrar no companheiro ou na companheira uma estabilidade afetiva e financeira para, caso necessário, redirecionem suas carreiras (Domene et al., 2012) ou dispensem maior tempo com capacitação.

No caso de Arthur e Ricardo, o campo de possibilidades se mostrou sempre atrelado a um emprego formal, seja na esfera pública ou privada. A formação socio-histórica muito marcada pela noção de trabalho limita o "rol de alternativas" a partir da reflexão no presente sobre uma mudança mais brusca de projeto, como sendo empreendedores, autônomos no futuro, por exemplo. Diferentemente de Lucas e Maurício que, mesmo oriundos da mesma classe social, perseguem concursos públicos e vislumbram uma atuação autônoma, mesmo que informalmente conjugada com um cargo na esfera pública. Em complementariedade a essa categoria, a próxima aborda a mobilidade e os dilemas e conflitos que a interligam com planos de carreira compartilhados pelos casais.

Mobilidade: Dilemas e Conflitos

Como terceiro eixo destacou-se a mobilidade e, consequentemente, os dilemas e conflitos advindos desta. As mudanças de cidade e de país vivenciadas pelos casais foram justificadas ora por motivos de trabalho, ora por questões de relacionamento amoroso, fato que vem ao encontro da perspectiva de que as metamorfoses em uma carreira podem ser externas ao mundo do trabalho. Além disso, é importante ressaltar que essas metamorfoses não só se apoiam, como dependem dos projetos individuais e coletivos dos indivíduos, que são negociados a partir dos cenários que visualizam.

Segundo DeLuca et al. (2016), dilemas, conflitos e o consequente processo de negociação surgem do trânsito por diferentes realidades, que se torna possível em virtude da capacidade de metamorfose de cada indivíduo. No caso dos casais analisados, a mobilidade tornou-se um elemento objetivo de distanciamento e aproximação dos projetos individuais e do casal, evidenciando o potencial de metamorfose latente que se manifesta em cada momento de possível transformação no projeto.

Em específico, analisando o caso de Arthur e Ricardo, os conflitos oriundos da mobilidade em nossa contemporaneidade se tornaram evidentes. Ambos começaram a trabalhar ainda adolescentes e possuem uma noção de trabalho muito forte e presente desde cedo, com base nos valores recebidos em casa, pelos pais, de dedicação e esforço para alcançar o que pretendem e uma forma de poderem adquirir o que quisessem com o dinheiro do próprio trabalho: "eu dedico bastante tempo ao meu trabalho, ele influencia no meu humor, na minha disposição, principalmente, na minha satisfação. De uma forma geral, acho que se eu não tô bem no meu trabalho, eu dificilmente tô bem em outra área da minha vida" (Arthur - companheiro de Ricardo).

O casal se conheceu e começou a namorar no mesmo ano, todavia, houve uma ruptura da união após dois anos de relacionamento, pois Ricardo (companheiro de Arthur) foi aprovado em um concurso público em outro estado e teve que se mudar. De início, o casal tentou conciliar a relação, mas depois de um período de meses morando longe, eles decidiram terminar o relacionamento, momentaneamente, pois, segundo Ricardo: "não queria que o desejo estivesse associado às promoções da companhia aérea para poder ver quem gosta". A separação durou oito meses, período em que cada um tentou viver seu projeto de carreira isoladamente. No entanto, os conflitos oriundos dessa desunião devido à distância geográfica provocaram muita infelicidade em ambos, decidindo retomar o relacionamento quando Ricardo teve notícia de aprovação em outro concurso federal, podendo eventualmente pedir transferência e retornar ao estado de origem, onde Arthur ainda vivia. Passados alguns meses da posse, Ricardo tentou diversas vezes solicitar sua transferência, mas não foi atendido devido às restrições de mobilidade da organização e seu tempo recente de trabalho. Mesmo dando muito valor ao trabalho e às conquistas profissionais, Ricardo preferiu pedir afastamento e ser eventualmente exonerado caso o último pedido de transferência não fosse aceito, regressando a Porto Alegre para viver próximo a Arthur. Percebe-se claramente, conforme proposto por Velho (2003), a metamorfose engendrada por Ricardo ao ressignificar sua prioridade de atuação e projeto individual, privilegiando um projeto coletivo de carreira ao lado de Arthur do que sozinho longe dele.

A mobilidade também está presente na vida do casal carioca, em uma perspectiva futura, pois Lucas e Maurício já negociam as possibilidades de ficarem distantes quando cada um for morar no exterior devido ao período de experiência fora do país proporcionado pelo doutoramento: "Então uma coisa que eu tinha colocado como condição, se eu fosse fazer o sanduíche [...] tinha pensado de 6 a 8 meses seria um tempo legal, que é mais ou menos o tempo que ele pensa em fazer no doutorado dele" (Lucas). Percebe-se que a impossibilidade de morar fora, por uma limitação do casal, não é algo sequer cogitado, entrando em discussão somente o melhor período para ambos. No caso de Lucas e Maurício, a questão consensuada é não ficarem tanto tempo distantes. Além disso, o parceiro estar no exterior é visto como uma oportunidade do outro ir visitá-lo e aproveitarem um momento especial a dois em outro país, como uma lua de mel.

Isso marca fortemente uma característica dos casais homossexuais, que parecem reduzir as assimetrias presentes, por vezes, numa relação heterossexual, ao passo que procuram estabelecer elos de reciprocidade, em que ambos cedem de alguma forma e possuem as mesmas oportunidades de mobilidade na carreira, mesmo que em momentos distintos. De tal modo, os casais mobilizam muitos conflitos de carreira entre a parceria de forma positiva, a partir das oportunidades que ambos podem usufruir juntos de determinada questão de mobilidade que se coloca diante dos dois. Essa questão é destacada por Laura (companheira de Sofia), ao evidenciar que, caso uma delas receba uma proposta em outra cidade, a transição será planejada e organizada em conjunto "Acho que a preparação seria de eu buscar espaço pra mim nessa cidade. De repente uma vai primeiro, a outra vai depois. [...] não pode simplesmente 'ah, vou abandonar tudo, vou-me embora".

Observa-se que uma questão de mudança de lugar para morar, devido à carreira, é algo passível de ocorrência, desde que haja preparação e planejamento sobre como a carreira de ambos irá se projetar na nova cidade. A última categoria aborda particularidades que interligam orientação sexual e a construção conjunta de carreira.

Particularidades de Casais Homossexuais na Construção Conjunta de Carreira

Ainda que o olhar da pesquisa tenha sido direcionado à compreensão da construção de carreira de casais, individual e conjuntamente, em face das negociações frente a essas duas perspectivas, o fato de essas uniões serem constituídas por homossexuais abre espaço para discussões que talvez não teriam a mesma tônica no caso de heterossexuais (Bieschke & Toepfer-Hendey, 2006; McFadden, 2015; Parnell et al., 2012; Patton & McMahon, 2014).

O entendimento de ser "assumido" como homossexual no ambiente trabalho, pelos casais entrevistados, não necessariamente significa falar abertamente sobre sua orientação sexual. O momento de apresentar ou introduzir o cônjuge nas atividades fora do ambiente laboral (como festas de empresa, por exemplo), ou até mesmo o grau de abertura a respeito de quem pode saber abertamente a respeito da orientação sexual, apareceram nos relatos com diferentes tônicas e formas de lidar, até mesmo dentro da mesma união, conforme apontado por O'Ryan e McFarland (2010).

Algumas falas que ilustram esses entendimentos foram destacadas abaixo e representam o diálogo do casal quando mencionaram ou foram incentivados pelos entrevistadores a explicitarem como lidam com o a orientação sexual no trabalho.

Rafael: No trabalho eu sempre joguei limpo, nunca ninguém falou... não tem o que falar, mas enfim. Eu nunca escondi nada.

Pedro: Eu também nunca tive problemas, no meu trabalho isso não é problema, nunca foi.

Rafael: É pré-requisito (tom jocoso) [em referência à diplomacia].

Pedro: Na verdade, o problema era mais eu, assim. Como não fazia tanto tempo assim que eu tinha saído do armário, eu tinha o problema de não só eu, assim, mas com as pessoas... então no trabalho foi um processo, assim, progressivo, pouco a pouco, várias pessoas do meu convívio foram sabendo, e ficou tudo bem. Em alguns casos, até melhorou a relação.

Outro casal relata que o ambiente de trabalho regula a liberdade para assumir ou não a relação e algumas situações de homofobia (McFadden, 2015; Parnell et al., 2012):

Clara: Eu só trabalhei em dois lugares depois de ter me assumido. No primeiro trabalho eu tinha que ter todo um cuidado assim, bem mais. Porque era muito tradicional e tal, era bem mais complicado até pela forma de se vestir, nunca houve preconceito, mas eu tinha que me cuidar. Nesse que eu tô agora é totalmente aberto, desde o primeiro dia que entrei. O meu chefe é meu amigo, então ele sabe, tranquilo... eu trabalho a maioria com homens então é muito mais fácil. Todo mundo já sabe do casamento, super apoia, super gostam da Marina.

Marina: Bom, eu sempre fui autônoma. Nesse trabalho agora eu não conto, eu não contei que eu era, mas a mulher que me contratou, ela desconfiou, e hoje em dia eu sei que ela falou pra todo mundo, ela contou pra todo mundo, hoje em dia, não na época, as que são minhas amigas agora me contaram que ela dizia: 'Ai, ela é sapatona, não sei o quê'...Ai, ela vai entender mulher? Não sei...'. [...] Em relação às clientes eu nunca falei, nunca contei pra uma cliente 'sou gay', mas eu tenho clientes que sabem e levam numa boa, nunca fiquei sabendo de alguma que tenha parado de fazer [tratamento estético] comigo por isso.

Na sequência, a forma de incluir o companheiro em situações que envolvam colegas de empresa demostra que a relação é inicialmente mais "subentendida" do que "assumida". O caminhar de um adjetivo para o outro é um processo receoso e que vai se construindo conforme a abertura das outras pessoas mais do que pela naturalidade do casal.

Cheguei e questionei: eu posso levar o João como acompanhante? Mas também não cheguei escancarando: ó, João, enfim, é meu namorado [...] E eles, numa boa, logo já tiveram a percepção, logo entenderam o recado, e não teve qualquer tipo de problema. Aceitaram numa boa e hoje assim, a gente se dá super bem com eles, as festas que tem eles sempre me chamam né? A gente sempre vai (Rodrigo - companheiro de João).

Todavia, essa situação pode não ser vivenciada por todas as pessoas da mesma forma. Cabe ao parceiro preparar seu par para como lidar com as diferentes personalidades dos colegas de trabalho. O assumir-se dentro da esfera laboral representa um momento particular de negociação da realidade no projeto do casal, uma vez que outras pessoas que participam da sua vida laboral estão envolvidas. Este momento particular poderia ser foco de estudos futuros, analisando as implicações do reconhecimento como casal para a trajetória profissional.

 

Considerações Finais

Considerando a agenda de pesquisa proposta por DeLuca et al. (2016), este estudo empírico contribui para o aprofundamento do quadro conceitual em construção sobre dimensões individuais e coletivas das carreiras e o processo de negociação entre projetos a partir das possibilidades que se apresentam. A noção do dinamismo que envolve as trajetórias de casais, no potencial individual e coletivo que estas formações configuram, reafirma o entendimento de que existem trocas constantes, em que negociações objetivas e subjetivas ocasionam rearranjos na sociedade e nas organizações. Considera-se que a utilização da base interacionista de Hughes (1937) e da discussão articulada por DeLuca et al. (2016) para carreira, se constituíram como base teórica instigante e relevante para a análise das entrevistas, uma vez que possibilitam captar a dinâmica dos elementos fundamentais que as compuseram: os indivíduos e suas trajetórias individuais e conjuntas em uma perspectiva que envolve, ao mesmo tempo, elementos objetivos e subjetivos. Assim, quatro pontos merecem destaque a partir das análises.

Primeiro, como afirmam DeLuca et al. (2016), aspectos objetivos (cargos, status e papeis sociais) e subjetivos (a forma de vivenciá-los) estão presentes nos campos de possibilidades apresentados. A construção do projeto de um casal homossexual traz uma maior evidência da alternância de -- valorização de trajetórias, uma vez que os papeis sociais atribuídos ao masculino e ao feminino podem não encontrar a mesma divisão. Assim, se por um lado há maior liberdade para negociações e abertura a respeito das carreiras, por outro, a partir dos próximos passos na trajetória de cada um, emerge um espaço de dilemas, na forma como estes casais vivenciam papeis e status em uma sociedade pautada na heteronormatividade.

Segundo, este trabalho representa um primeiro esforço de evidenciar a integração entre projetos individuais e coletivos por meio da análise de casais, indicando a construção de uma carreira coletiva. Esta abordagem faz jus ao aprofundamento também com casais heterossexuais, a fim de compreender nuances e pontos de virada de trajetórias de casais de dupla carreira. Evidencia-se que este pode ser um campo fértil para a discussão de carreira rompendo com a dicotomia indivíduo/organização, indicando que na formação de carreiras há a presença não apenas de projetos individuais.

Terceiro, a mobilidade surgiu no estudo como uma categoria particular, sendo recorrente entre os casais. Em alguns casos, contraditoriamente, por estes buscarem maior estabilidade. Por essa ligação com a mobilidade, o título do artigo faz alusão à letra de uma música que traz a ideia de amor e alegria vislumbrados em outro lugar. Pelo estudo, não foi possível inferir alguma relação entre a orientação sexual e a tendência a mudar de cidade ou busca por independência da família, ainda que essa situação de mudança de cidade, em prol de objetivos pessoais, também fez parte das trajetórias dos casais homossexuais investigados. Assim, a mobilidade também surge como um tema relevante a ser explorado nas carreiras de casais. As situações de conflito e dilema que surgiram nesses momentos marcaram pontos de virada, sendo um momento particular para a compreensão de trajetórias profissionais.

Quarto, as particularidades de casais homossexuais na construção conjunta de carreira poderiam ser aprofundadas em estudos posteriores, visto que a constituição de união homossexual ainda acarreta encaminhamentos diferentes da heterossexual relativamente à carreira. Para além, a formação de outras uniões, como a de transexuais e as variadas combinações de identidade sexual entre casais, também abrem um leque de análise particular e pertinente atualmente. Adicionalmente, o fato de o casal ter filhos também prevê outros direcionamentos de pesquisa.

Em termos de limitações deste estudo, embora reconhecido que pode haver diferenças na dinâmica de casais homossexuais femininos e masculinos, neste trabalho não foi feita esta distinção. Por fim, este estudo representa um esforço inicial de compreensão da carreira na vida de casais gays e lésbicos, ainda que os resultados encontrados não possam ser generalizados para todos os casais (homossexuais ou não). Espera-se contribuir para os estudos que abordam a relação entre carreiras, organizações e sociedades, no sentido de explorar e analisar que a carreira é um todo, incluindo a vida dentro e fora do trabalho.

 

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Endereço para correspondência:
Aline Mendonça Fraga
Programa de Pós-Graduação em Administração da Escola de Administração -Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGA/EA/UFRGS)
Rua Washington Luiz, 855, Sala 324 - Centro Histórico
Porto Alegre - RS, CEP: 90010-460
E-mail: alinemf.adm@gmail.com

Recebido em: 10/08/2018
Primeira decisão editorial em: 19/12/2018
Versão final em: 22/12/2018
Aceito em: 27/12/2018

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