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Revista de Psicologia da UNESP

versão On-line ISSN 1984-9044

Rev. Psicol. UNESP vol.13 no.1 Assis jan. 2014

 

Artigo

 

Pesquisas em Psicologia Social no campo da Saúde da População Negra no Brasil

 

Research in Social Psychology in the field of Health of the Black Population in Brazil

 

 

Sônia Regina Corrêa LagesI;Natália de Oliveira TavaresII;Suely Virginia dos SantosIII;Marco Aurélio Saraiva CarvalhoIV;Laura Félix Reis MacielV

I, II, III, IV, V Universidade Federal de Minas Gerais

 

 


RESUMO

O presente artigo delineia o estado da arte das pesquisas no campo da Psicologia Social e saúde da população negra, no Brasil, considerando que os coletivos negros sofrem desigualdades sócio-historicamente determinadas e, dentre elas, doenças e agravos que são prevalentes nesta população. Dados estatísticos demonstram que a morbi-mortalidade no Brasil tem cor, ela é negra, o que aponta para a iniquidade em tratamento à saúde no Brasil. A busca por produções limitou-se: ao Banco de Teses da Capes - dissertações e teses, na área da Psicologia Social; na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - BDTD, e nas Revistas de Psicologia (em interface com o social), indexadas na Rede Scielo. Esse estudo preliminar apontou para uma baixa produção da Psicologia Social no referido tema, o que limita sua atuação na luta pelos direitos sociais e sua participação nas políticas públicas sobre saúde.

Palavras-chave: Psicologia Social; Saúde da População Negra; Produções Científicas.


ABSTRACT

This work seeks to outline the state of the art of the research in the field of Social Psychology that deal with black population health in Brazil. Black people suffer with specific inequalities which have social and historical causes, and that can be seen also in health care field, particularly concerning diseases that are prevalent in that population. Statistics show that morbidity in Brazil has a color, it is black, which points to the iniquity in health care. The search was limited to following productions: to Capes Theses Database - dissertations and theses in the field of Social Psychology; the Digital Library of Theses and Dissertations - BDTD; the Journals of Psychology (in interface with the social) indexed in SciELO electronic library. This preliminary study indicated a low production in social psychology about the subject, which limits its role in the struggle for social rights and its influence in public health policy.

Keywords: social psychology; the black population health; scientific productions.


 

 

A saúde só veio receber um olhar mais focado sobre ela, a partir do início do séc. XX, quando foram criadas políticas sanitaristas com grandes campanhas de vacinação, medidas de intervenção ambiental, de saneamento e estratégias de controle de doenças. Com isso, a saúde ganhou destaque, pelo menos nas cidades e grandes centros, passando a ser acessada de duas maneiras: pela população que tinha poder aquisitivo e podia pagar pelo serviço de saúde privado; e, gratuitamente, pelas pessoas que possuíam vínculo empregatício, que por conseguinte, contribuíam mensalmente com a previdência social. Quanto ao restante da população, esta não tinha acesso à saúde pública. Isto fazia da saúde, um bem de consumo assegurado apenas para parte da população, não sendo pois, um direito universal. (Oliveira, 2001)

O marco da saúde pública no Brasil viria a partir da VIII Conferência Nacional de Saúde realizada em 1986, quando se decidiu pelo início do processo de democratização da saúde, com o lançamento dos princípios da Reforma Sanitária e a criação do SUS - Sistema Único de Saúde brasileiro em 1988, financiado pelas contribuições sociais e por significativa parcela de impostos arrecadados. O SUS nasceu com o propósito de propiciar o acesso de toda a população brasileira a um serviço de saúde pública preventivo, terapêutico, gratuito, de qualidade e promotor da equidade, indiscriminadamente, a toda a nação brasileira (Luna, 2009).

Apesar de ter sido fundamentado pela teoria da universalidade, integralidade, equidade e direito à informação, o SUS nunca conseguiu atender a população com a abrangência e efetividade com que deveria. A sua ineficácia levou à estratégia estatal de alteração do texto da Constituição Federal em 1998, concedendo permissão para a iniciativa privada ofertar serviços de saúde suplementar para as pessoas que pudessem pagar por esta modalidade de saúde. (Ibid).

Quando o foco se dirige para a saúde da população negra no Brasil, a situação se torna mais grave, pois além dela ocupar a camada social mais atingida pela pobreza, que por si só já causa uma série de doenças, é a ela adicionada o racismo existente no país, que afeta igualmente a morbi-mortalidade desses coletivos.

Dados estatísticos constantes no Relatório Anual das Desigualdades Raciais no Brasil, 2009-2010, revelam as desigualdades no campo da saúde em todos os quesitos e recortes (gênero, doenças transmissíveis, geração, violência, acesso a planos particulares de saúde, tratamento dentário, saúde reprodutiva), o que demonstra o descaso com a saúde desses grupos sociais e para a evidência do racismo no SUS. (Paixão, 2011).

As desigualdades e a exclusão social provocam uma série de sofrimentos psíquicos nos sujeitos, e acabam, por muitas vezes, conforme pontua Sawaia (2008), despotencializando as pessoas para ações de resistência e luta no sentido de superar as situações de subalternidade. Quando à pobreza é adicionado o racismo, o sofrimento é redimensionado, e este é o caso brasileiro.

O racismo institucional na saúde é considerado como o fracasso coletivo para a promoção de um serviço apropriado e profissional para as pessoas devido à sua cor ou etnia, e pode se manifestar em processos, atitudes, comportamentos discriminatórios, negligência e esteriótipos racistas. (Documento da Comission for Racial Equality, 1999, apud Sampaio, 2003, p. 82). Essa prática constrói uma série de procedimentos que comprometem a equidade como a invisibilidade de determinadas doenças que afetam de forma mais significativa a população negra; a não inclusão da questão racial na formação médica e de equipes de saúde; a dificuldade no acesso a determinados serviços e a qualidade no atendimento. (Loureiro e Rozenfeld, 2005; Lopes, 2005a; Paixão, 2008).

É diante dessa temática, considerando a importância da psicologia social crítica das relações sociais para o combate do racismo no Brasil, e com foco na saúde da população negra, é que foi realizado o levantamento sobre o estado da arte em psicologia social e saúde da população negra com o objetivo de levantar os temas que têm recebido destaque nessa área, assim como os vazios de determinados campos da pesquisa. Essa necessidade surgiu de um grupo de pesquisa e extensão sobre o tema, e que tem como um dos seus objetivos, construir um acervo sobre a o referido campo.

A referida pesquisa tem caráter exploratório, preliminar, "realizado com a finalidade de melhor adequar o instrumento de medida à realidade que se pretende conhecer" (Piovesan, 1995), ou seja, ela pretende apontar temas que necessitam, posteriormente, de maior problematizações e aprofundamentos para sua compreensão e análises.

Se por um lado as doenças físicas afetam o corpo do sujeito, os preconceitos, o desmerecimento das identidades culturais, afetam as subjetividades, e esse afetamento pode alcançar o sujeito psíquico provocando depressão, desmotivação, baixa auto-estima.

Sawaia (2008) chama a experiência emocional de quem se vê impedido de expressar-se em todo o seu potencial humano, por estar condicionado a qualquer tipo de modalidade processual de exclusão, de sofrimento ético-político. Segundo ela, esse sofrimento

é a dor mediada pelas injustiças sociais. É o sofrimento de estar submetida à fome e à opressão, e pode não ser sentido como dor por muitos. (...). Por serem sociais, as emoções são fenômenos históricos, cujo conteúdo e qualidade estão sempre em constituição. Cada momento histórico prioriza uma ou mais emoções como estratégia de controle e coerção social. (Sawaia, 2008:102).

A autora cita o banzo, nome popular de uma doença que nunca foi explicada, mas que causou a morte de inúmeros negros, sobretudo, crianças, no período do regime escravista brasileiro, para mostrar que o sofrimento psíquico é derivado de situações históricas e sociais.

Por outro lado, Carreteiro (2008) identificou as consequências psicossociais da exclusão, denominando-as de sofrimento psíquico social. Para ela, as pessoas que têm os seus direitos violados, permanecem à margem das dimensões de acesso institucionais, como da saúde, educação e trabalho, mantendo posições sociais fragilizadas e sendo reconhecidos como os desfavorecidos. Esse rótulo se transfere rapidamente para a subjetividade da inutilidade. Essa sensação de inutilidade é geradora de sofrimento psíquico, e por ter uma raiz social, deve ser considerado como sofrimento social. No entanto, esse sofrimento não é reconhecido no interior das esferas de proteção social, somente são aquelas etiquetadas como sendo doença no corpo doente.

As doenças que afetam a população negra não podem ser desvinculadas da realidade social em que vivem, e esta causa danos à construção de sua identidade e subjetividade, mesmo aquelas com raiz genética, como a anemia falciforme. O descaso do próprio do próprio Ministério da Saúde, do SUS, e dos centros de saúde quanto a essa doença, e à saúde da população negra de forma geral, tem sido relatado pelos pesquisadores e pelo movimento social negro. (Loureiro e Rozenfeld, 2005; Lopes, 2005a; Batista etc.tal, 2005). Nesse sentido, ela ultrapassa a esfera individual e se coloca como um problema político.

A psicologia social, a partir da sua vertente social crítica, tem o compromisso de dar visibilidade às desigualdades sociais, às ideologias que estigmatizam e oprimem as minorias, e de construir um conhecimento que possibilite sua articulação com as políticas públicas, levantando as prioridades, denunciando as violações dos direitos humanos em todos os campos de atuação do ser humano.

Dessa forma, a proposta do levantamento bibliográfico, contribui, pontualmente, com a psicologia social, avaliando sua atuação nesse campo de pesquisa. Veremos que, no campo da saúde dos coletivos negros, ela apresenta escassas pesquisas, o que vai contra seus princípios, expressos em seu Código de Ética e no CREPOP - Centro de Referência Técnica em Psicologia e Políticas Públicas, órgão operacional do Sistema Conselhos de Psicologia que representa o esforço para a participação da psicologia na luta pelos direitos sociais e implementação de políticas públicas.

Importante, ainda, registrar, que apesar da pouca divulgação das pesquisas neste campo, profissionais de diferentes disciplinas, têm se organizado em torno do combate ao racismo no Brasil, como é o caso da ANPSINEP - Articulação Nacional de Psicólogas (os) Negras (os) e Pesquisadoras (es); e de alguns grupos de estudo e pesquisa como: Diálogos Interculturais (USP); Saúde das Minorias Sociais e Comunicação (UFSM); Centro de Estudos das Relações Raciais e Desigualdades (CERRT); Núcleo de Estudos Interdisciplinares do Negro Brasileiro (USP); e Estudos Culturais sobre Classe, gênero e Raça (IFB); e Genera (FEAUSP).

 

Método

A pesquisa fez uso do método " estado da arte", que de acordo com Ens & Romanowski (2006) contribui para com a constituição do campo teórico de uma área do conhecimento, identificando os aportes significativos da construção teórica, sublinhando as restrições do campo em que se move a pesquisa e suas lacunas, identificando as experiências inovadoras e as alternativas para os problemas relacionados ao campo investigado. E, ainda, possui caráter exploratório, o que pressupõe futuras pesquisas que possam ampliar e aprofundar a realidade investigada.

O corpus o qual incidiu o levantamento limitou-se: ao Banco de Teses da Capes - dissertações e teses, na área da Psicologia Social, a partir de 1987, data em que foi disponibilizados os resumos; na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - BDTD, a partir de 2003, data da disponibilização do site para a publicação de teses e dissertações; e nas Revistas de Psicologia (em interface com o social), indexadas na Rede Scielo Brasil, a partir de 1997, início de sua coleção.

A título de esclarecimento, informamos que a BDTD é um portal que integra os sistemas de informação de teses e dissertações existentes no país realizadas nos diferentes campos do saber; e que, por interface com o social, o critério estabelecido foi o de selecionar as revistas que privilegiam pesquisas que consideram o diálogo entre a psicologia e a sociedade, a partir de uma postura crítica das ideologias e processos sociais de poder e dominação. Para tanto, foi realizada a leitura do escopo das revistas.

Informamos, ainda, que não foi objetivo nesse levantamento, analisar variáveis como região geográfica da produção, instituições de onde derivam os artigos, ano de publicação, sexo dos autores, área de pesquisa com suas articulações interdisciplinares, teorias de base de análise, entre outros. São estudos bem importantes para o campo da saúde da população negra, e que devem ser realizados em outro momento de maneira específica.

O levantamento utilizou um rol de palavras-chaves, para o processo de localização dos textos, referentes à Psicologia Social e saúde da população negra, para em seguida, proceder a leitura dos resumos, identificando o tema e a metodologia utilizada. As palavras-chaves foram: racismo institucional, racismo e saúde, saúde da população negra, saúde e preconceito, saúde pública e racismo, doenças e população negra, população negra, saúde da mulher negra, população afro-brasileira e saúde, saúde da população remanescente de quilombos/quilombola, negros e saúde. Após a localização dos trabalhos, foi realizada a leitura dos resumos.

 

Apresentação e discussão dos resultados

No Banco de Teses da CAPES, na área da Psicologia, não foi encontrada nenhuma dissertação ou tese com tema relacionado à saúde da população negra.

Já na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações - BDTD, foram localizadas 29 produções com as palavras-chaves anemia falciforme e saúde da população negra (com recorte na área de humanas e social). Destes, 02 pesquisas foram realizadas em programas de pós-graduação em psicologia, e trataram dos temas de qualidade de vida dos portadores de anemia falciforme (Pitaluga, 2006), e relações étnico-raciais na relação médico e paciente (Santos, 2011).

A dissertação de mestrado de Pitaluga (2006), foi realizado na PUC de Goiás e teve como foco o sofrimento causado pela anemia falciforme e seu impacto na vida dos portadores. Para tanto foram aplicadas a Escala Análogo-visual de Qualidade de Vida e entrevistas semi-estruturadas a pacientes de um ambulatório de hematologia, argumentando que as novas tecnologias médicas que aumentam o tempo de vida dos pacientes não correspondem ao aumento da qualidade de vida daquelas pessoas, recebendo maior impacto a depressão, o isolamento social e a tristeza. No entanto, o atendimento médico cuidadoso e atencioso, foram descritos como minimizadores daqueles quadros.

Quanto à pesquisa de Santos (2011), defendida no Programa de Pós-graduação em Psicologia Social na USP, foi dada atenção à percepção dos médicos quanto aos marcadores sociais da diferença que se transformam em desigualdade. Segundo o autor, as distinções de feminino e masculino foram percebidas de maneira conservadora, e no caso das desigualdades raciais, de um lado a negação das desigualdades e por outro, a valorização da identidade branca. As desigualdades foram consideradas como sendo referentes à classe social, e discursos racistas e machistas apareceram ao longo das entrevistas. A metodologia aqui utilizada foram entrevistas abertas.

No que refere às outras pesquisas localizadas na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, e que foram defendidas em sua grande maioria na área de ciências médicas, enfermagem e saúde coletiva, 04 foram sobre a população negra e HIV/Aids; 16 sobre anemia falciforme e sua relação com questões de gênero, saúde reprodutiva, infância, maternidade, família, cuidadores e qualidade de vida; 04 sobre desigualdade social incluindo recorte em saúde da população negra; 01 em políticas nacionais de saúde pública, também incluindo a saúde da população negra, e 01 sobre o acolhimento psicossocial em terreiros de Candomblé.

Na Rede Scielo, foram encontrados 14 artigos com o referido tema. Em revistas de psicologia e sua interface com o social, foram localizados 03 trabalhos: 01 na Revista Psicologia & Sociedade; 01 na Revista Estudos em Psicologia, e 01 na Revista Psicologia Argumento/PUC/PR.

O tema abordado na Revista Psicologia & Sociedade (Fleury, 2011) foi sobre a desigualdade no sistema de saúde pública; quanto à Revista Estudos em Psicologia, discutiu-se a relação entre o estresse e o racismo (Faro, 2011), e na Revista Psicologia Argumento foi a relação das religiões afro-brasileiras e a saúde da população negra.(Lages, 2013).

Fleury (2011), professora da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro, numa edição especial da Revista Psicologia & Sociedade, apresenta um estudo realizado em hospitais públicos do Rio de Janeiro que pretendeu investigar os fatores percebidos como condicionadores de desigualdades injustas no acesso e utilização dos serviços de saúde, com enfoque do direito à saúde. A autora enfatizou aquelas desigualdades no acesso e utilização dos serviços públicos de saúde, tentando identificar a ocorrência da discriminação. A metodologia utilizada foi observação participante e entrevistas semiestruturadas, realizadas com usuários dos serviços, profissionais de saúde e gestores.

Apesar da pesquisa não focar diretamente a saúde da população negra, Fleury (2011) integrou à metodologia de pesquisa, um grupo focal com mulheres negras que atuam como lideranças comunitárias com interface com a área de saúde, possibilitando a vivência das discriminações sofridas pelas participantes dos serviços. Mas se este grupo facilitou esta vivência, nas outras entrevistas realizadas, com os usuários dos serviços, profissionais e gestores, o racismo aparece de forma muito velada. Quanto aos usuários do serviço de saúde, conforme diz a a autora, " muitos usuários têm enorme dificuldade de se colocar no lugar do discriminado. Relatam situações de preconceito e discriminação, mas esse lugar é sempre o do outro, nunca de si mesmo" (Fleury, 2011, p.51). Nesta pesquisa, o racismo apareceu de forma muito velada, mas aparece de forma explícita quando se trata das práticas religiosas de matriz africana, e das orientações sexuais diferentes da norma.

Mais focado no racismo na saúde, Faro (2011), psicólogo social, professor da Universidade Federal da Bahia, desenvolve seu trabalho tentando levantar evidências entre racismo e saúde a partir dos estudos sobre estresse, compreendendo-o como criador e mantenedor de estressores no âmbito das relações sociais. Para tanto, optou pela sistematização do conhecimento acerca das relações entre raça e saúde, mostrando os estudos que investigam essa relação, em sua grande maioria, realizados fora do Brasil. O próprio autor fala sobre a limitação desses estudos que pouco se aprofundaram a respeito das múltiplas formas do impacto do racismo na saúde dos sujeitos, e também no processo de enfrentamento e adaptação psicossocial. Ressalta, ainda, a carência de estudos relacionados ao estresse e ao racismo em âmbito nacional, dizendo que não foram encontrados até aquele momento, nenhuma pesquisa que objetivassem investigar a relação entre estresse, racismo e saúde.

Já a pesquisa de Lages (2013), psicóloga social, professora da Universidade Federal de Minas Gerais, publicado na Revista Psicologia Argumento, discute a gravidade da invisibilidade dos conflitos raciais para os profissionais psicólogos que atuam em três hospitais públicos na cidade de Belo Horizonte. A percepção daqueles é de que existe uma igualdade racial a partir do momento que todos podem ter acesso a ela, seja por um esforço próprio, que nos leva à ideologia da meritocracia; ou através da ideologia do embranquecimento. As falas são recortadas pelo viés psicanalítico individualista, colocando nas mãos do próprio sujeito a culpa por ocupar determinada posição social. O desconhecimento sobre as políticas afirmativas no campo da saúde e sobre as doenças que atingem de forma mais específica a população negra, foi de total desconhecimento.

Os outros 11 artigos, publicados na Rede Scielo, foram encontrados em revistas com uma produção interdisciplinar, tendo como autores, profissionais de diferentes áreas de conhecimento: Revista Saúde e Sociedade (04 artigos); Cadernos de Saúde Pública (05 artigos que fazem parte do Fórum sobre a temática), e Revista Estudos Feministas (01 artigo).

Dos artigos publicados nessas revistas, 04 artigos foram sobre a relação da Aids com cor e raça; 02 sobre o racismo institucional na saúde, e 01 sobre anemia falciforme, e os artigos do Fórum dos Cadernos da Saúde Pública, versaram sobre o racismo institucional, epidemiologia e desigualdade racial e mortalidade infantil com recorte em cor e raça.

 

Considerações Finais

O levantamento bibliográfico, a partir das bases consultadas, aponta a escassez nas pesquisas e estudos da psicologia social no que se refere à saúde da população negra no Brasil. No Banco de Teses da Capes, não foi encontrada nenhuma dissertação ou tese; na Biblioteca Digital de Teses e Dissertações, apenas 02 foram encontradas, e na Rede Scielo , somente 03 artigos. Os temas foram variados, sem nenhuma área de concentração: qualidade de vida; percepção de médicos sobre desigualdades sócio-culturais; religião; estresse e racismo; políticas públicas em saúde; desigualdades na saúde pública.

Foi nos Programas de Pós-graduação em Ciências Médicas, Enfermagem e Saúde Coletiva (com recorte na área de humanas e social), que foram localizadas um maior número de estudos, recebendo destaque a anemia falciforme; e importante dizer que essas pesquisas foram realizadas a partir de 2004, apesar do PAF - Programa Anemia Faciforme, do governo federal, ter sido implantado em 1995. É que este programa só recebeu atenção de alguns municípios, a partir do ano 2000, pela pressão que receberam por parte do movimento social negro.

Esses dados interpelam a psicologia social crítica das relações sociais no Brasil, quanto à necessidade de maior investimento desta área do conhecimento em pesquisas que possam dar visibilidade a uma série de questões que envolvem a saúde da população negra, abrangendo: o racismo como determinante da saúde; os efeitos psicossociais do racismo; a saúde da mulher negra; as relações de gênero; a saúde da população negra e políticas públicas; as consequências psicossociais da anemia falciforme; o descaso do Estado quanto às doenças que mais atingem a população negra, dentre outros.

 

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Recebido: 27 de maio de 2014.
Aprovado: 01 de junho de 2014.