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Revista de Psicologia da UNESP

On-line version ISSN 1984-9044

Rev. Psicol. UNESP vol.18 no.spe Assis  2019

 

ARTIGOS

 

Por que a Atenção Psicossocial exige uma clínica fundada na psicanálise do campo Freud-Lacan?1

 

Why does Psychosocial Care require a clinic founded on the Psychoanalysis of the Freud - Lacan field?

 

 

Abílio da Costa-Rosa

Psicanalista e Analista Institucional, Professor Livre-Docente do departamento de Psicologia Clínica da UNESP/Assis, SP. Foi um importante trabalhador, teórico e militante do campo da Saúde Mental Coletiva. Nos últimos vinte anos de sua vida, dedicou-se, apaixonadamente, à formação de trabalhadores para esse campo, atuando como professor nos cursos de Graduação e Pós-graduação em Psicologia na Universidade Estadual Paulista (UNESP) - campus de Assis. Fundador do "Laboratório Transdisciplinar de Intercessão-Pesquisa em Processos de Subjetivação e 'Subjetividadessaúde'" (LATIPPSS) - associado ao Grupo de Pesquisa "Saúde Mental e Saúde Coletiva" inscrito no diretório de grupos do CNPq

 

 


RESUMO

Discutimos alguns fundamentos de uma clínica fundada na psicanálise do "campo Freud-Lacan" que visa a oferecer Atenção aos impasses psíquicos dos sujeitos, no contexto da Saúde Coletiva, sob a perspectiva do Paradigma Psicossocial definido como superação dialética da Reforma Psiquiátrica. Para tal, se o horizonte ético da Atenção Psicossocial passa a ser a implicação dos sujeitos no desejo e no carecimento é justo propor que isso se traduza num empuxo à Psicanálise. Igualmente, estamos conectados ética e politicamente com o campo da Reforma Sanitária, originária da luta pela implantação da Saúde Coletiva como superação radical da Saúde Pública. Destacamos o imprescindível lugar da "Instituição de Saúde Mental" e dos seus estabelecimentos como intermediários necessários entre os trabalhadores da área e os sujeitos do tratamento. Assim, ao abordarmos a pertinência da psicanálise na Saúde Coletiva, elucidamos três temas fundamentais para avançar nessa direção: 1) adequar o dispositivo institucional a fim de que nele possa caber a psicanálise; 2) a caracterização de um trabalhador de Saúde Mental de um novo tipo, nomeado como trabalhador-intercessor, e 3) as noções de "acontecimento-sujeito" e de "transferência" como primordiais ao trabalho nesse campo. Sublinhamos, ainda, que, no que toca especificamente à psicanálise, nos localizamos no âmbito da ampliação do que Lacan definiu como "psicanálise em intensão", muito longe, portanto, da noção de "psicanálise aplicada".

Palavras-chave: Atenção Psicossocial; Psicanálise do campo Freud-Lacan; Saúde Coletiva; Instituição.


ABSTRACT

We discuss some fundamentals of a clinic founded on psychoanalysis of the " field Freud - Lacan " that aims to offer Attention to the subjectivity psychic impasses, in the context of Collective Health, from the perspective of the Psychosocial Paradigm defined as a dialectical overcoming of the Psychiatric Reform. So, if the ethical horizon of Psychosocial Care has became the implication of the subjects in desire and in bedurfnis, it is corrected to propose that this translates into a thrust to Psychoanalysis. Equally, we are connected ethically and politically with the Health Reform field, originated from the struggle for the implementation of Collective Health as a radical overcoming of Public Health. We highlight the indispensable place of the "Mental Health institution" and its establishments as necessary intermediaries between the worker s of the area and the subjects of the treatment. Thus, by addressing the pertinence of psychoanalysis in Collective Health, we elucidated three fundamental themes to advance in this direction: 1) To adapt the institutional device to fit the psychoanalysis; 2) The characterization of a Mental Health worker of a new type, named as worker - intercessor, and 3) The primordial notions of "event - subject" and of "transference" to work in this field. We also emphasize that, specifically on psychoanalysis, we are loca ted in the context of what Lacan defined as "psychoanalysis in Intension", so far from the notion of "applied psychoanalysis".

Keywords: Psychosocial Care; Psychoanalysis of the Freud - Lacan field; Collective Health; Institution.


 

 

Introdução

Neste trabalho pretende-se discutir alguns fundamentos de uma clínica fundada na psicanálise do "campo Freud-Lacan" para os impasses psíquicos no campo da Saúde Coletiva, sob a perspectiva do ideário e das práticas da Atenção Psicossocial, concebidas como um campo originado da Reforma Psiquiátrica (RP) brasileira, mas também como um campo que procura introduzir transformações radicais, para fazer avançar/bifurcar a própria RP na direção de subversão da lógica paradigmática da psiquiatria. Portanto, a Atenção Psicossocial que exige a psicanálise, como aqui proposta, corresponde à ética e à política do sujeito do desejo e do Homem do carecimento (Costa-Rosa, 2013a).

Para situar as relações intrínsecas da Atenção Psicossocial com o campo da Saúde Coletiva é necessário introduzir um pequeno comentário histórico. A Saúde Coletiva deve ser vista como o campo originário das lutas políticas do "Movimento Sanitário Brasileiro", cujos efeitos desaguaram nas propostas de um Sistema Único de Saúde (SUS) oriundas da VIII Conferência Nacional de Saúde, garantidas na constituição federal de 1988, e que deram a base para as práticas designadas como Reforma Sanitária brasileira, que incluem, entre outras conquistas, sobretudo, a concretização das primeiras práticas efetivas do SUS, a partir da década de 1980 (Brasil, 1986; 1988). Nesse sentido, os fundamentos essenciais da Saúde Coletiva, como campo de práxis referente ao campo da Saúde, incluem as contribuições da Medicina Social (da qual se extrai uma concepção de saúde, considerada como um complexo constituído pelo processo de produção saúde-adoecimento-Atenção, resultante e absolutamente conjugado com os demais processos sociais de produção da vida material, social, cultural e subjetiva).

A Saúde Coletiva parte, ainda, de uma crítica consistente ao modelo preventivista da Saúde Pública, na figura da Medicina Preventiva Promotora, esta sim, passível de ser designada como uma política de Saúde Pública, justamente na medida em que consiste na transposição modificada do "modelo flexneriano" de Atenção às doenças (modelo originariamente individualizante, médico-centrado, fundamentalmente curativo, e privatista) para o conjunto social (Arouca, 2003; Mendes, 2006). Portanto, quando designamos a Atenção Psicossocial numa extração que procura trabalhá-la como superação das reformas da psiquiatria, estamos nos conectando ética e politicamente com o campo de lutas da Reforma Sanitária, originária do movimento de luta pela implantação das propostas da Saúde Coletiva e não apenas da Saúde Pública.

Esta é, não obstante, a proposta que vigora no SUS; consideração que importa sobremaneira fazer, para deixar claro que as proposições de uma Atenção Psicossocial conectada com a ética da Reforma Sanitária, do sujeito do desejo e do homem do carecimento não ignoram que os modelos instituídos e sintônicos com os interesses sociais dominantes são os modelos que vigoram maciçamente. Desse modo, portanto, nossas propostas não ignoram seu lugar de táticas numa estratégia ética e política que aceita a tática da ocupação das brechas abertas no conjunto dos discursos e das práticas instituídas dominantes, cuja fisionomia e anatomia são antípodas ao ideário da Saúde Coletiva e, nessa medida, dos princípios da Atenção Psicossocial conceituada dialeticamente além2 das reformas psiquiátricas.

Quanto à psicanálise do campo de Freud-Lacan é bastante adiantar que os conceitos de Freud (re)cortados, (re)encontrados, (re)lidos e ampliados por Lacan, além dos essenciais acréscimos ao campo da psicanálise realizados por ele, configurando um campo que alguns chamaram de quarta psicanálise (na sequência da freudiana, kleinina, psicologia do ego) (Mezan, 1988), optamos por apresentá-la apenas na medida de nossa necessidade imediata (mas é importante esclarecer que não se trata apenas da psicanálise lato sensu).

 

Como ponto de partida, uma constatação fundamental: a instituição é necessária

O acesso à Atenção aos impasses e sofrimentos psíquicos, para camadas amplas da população - trabalhadores e excluídos do trabalho -, só se tornou possível graças à ação do Estado como intermediador das relações de tratamento, através da interposição de uma Formação Social específica: a "Instituição de Saúde Mental" como mais um dispositivo da produção social. Os campos da Análise Institucional (Lourau, 1970/2014) e o da Análise Política de Instituições (Luz, 1979; Donnângelo, 2014) têm demonstrado que, como Formações Sociais específicas, as instituições são produtoras autônomas de sua série de efeitos que acabam incorporados tanto ao processo de produção que nelas se realiza, quanto aos seus produtos-fim pretendidos (Costa-Rosa, 2013a).

Em síntese, em quaisquer das suas diferentes figurações, a instituição de Saúde Mental como Formação Social e dispositivo de produção é, ela própria, um componente necessário (não-contingente) da análise e da transformação das práticas do campo da Saúde Mental Coletiva (SMC). E a disposição e a decisão de se levar ou não em conta a presença e os efeitos desse intermediário podem ter conseqüências absolutamente cruciais; mais decisivas, ainda, para os resultados daquelas práticas da Atenção Psicossocial que, neste momento histórico, procuram sustentar as conquistas principais da Reforma Psiquiátrica e mesmo levá-las ainda mais adiante.

No caso da produção social de Atenção ao sofrimento psíquico, muitas transformações têm ocorrido nessa Formação Social específica desde sua figura pioneira, o velho Manicômio arquitetônico; transformações que, entretanto, até o presente, não conseguiram deixar de conviver com ele.

 

Por que a psicanálise no campo da Saúde Mental Coletiva?

Comumente os psicanalistas têm colocado a questão da relevância da psicanálise na SMC a partir de questões, certamente pertinentes e justas já derivadas das suas inserções nesse campo. Essas questões, via de regra, têm como foco principal a meta de ampliar o campo de possibilidades de inserção e atuação da própria psicanálise, e costumam passar ao largo de considerações ou análises que levem em conta a especificidade e as circunstâncias do novo campo.

A esse argumento vindo do seio psicanalítico pretendo agregar outros derivados da análise da especificidade das demandas que chegam às instituições do campo da SMC. Basta dizer que os impasses, sofrimentos, enigmas, sintomas que interpelam os trabalhadores da SMC têm essencialmente a especificidade de uma "realidade psíquica" - aquela que Freud (1950 [1895]/1996) nomeou Realittät: uma realidade que é feita de sentido (consciente e, sobretudo, inconsciente) e corpo pulsional (muito além, portanto, de qualquer realidade neuronal). O indivíduo que procura as instituições da SMC é, então, essencialmente um ente social, cultural e subjetivado que comparece especificamente pelos impasses nessa dimensão psíquica, subjetiva, da sua realidade. Adiante acrescentaremos outros detalhes que permitirão compreender aquilo que se especifica aqui como impasses numa realidade psíquica. Por outro lado, não é preciso dizer que isso caracteriza o "sujeito dos sintomas e sofrimentos psíquicos" de modo bastante diferente de um organismo, um corpo, ou mesmo um sistema neuronal e psicológico transtornados.

Na sequência acrescentaremos outros argumentos em favor da tese de que a demanda de inclusão da psicanálise vem fundamentalmente do próprio campo da Saúde (Mental) Coletiva. E uma das vias importantes dessa inclusão é constituída pela própria Atenção Psicossocial como um conjunto de práticas e teorizações do campo de Atenção ao sofrimento psíquico que tem procurado avançar para além das psiquiatrias reformadas. É verdade que para falar da relevância e da necessidade da presença da psicanálise no campo da SMC, mostra-se necessário partir das reflexões realizadas pelos próprios psicanalistas.

 

Como incluir a psicanálise no campo da Saúde Mental Coletiva?

Neste ponto pretendo introduzir três temas que considero principais para avançarmos na direção da resposta à pergunta colocada. 1. Uma configuração institucional como lugar possível para a psicanálise do campo Freud-Lacan. 2. Alguns elementos para a caracterização inicial de um trabalhador-intercessor do campo da SMC. 3. Aspectos clínicos: acontecimento-sujeito e a especificidade da transferência como condição de possibilidade da clínica fundada na psicanálise na SMC.

Uma instituição como lugar possível para a psicanálise: comecemos pela análise das transformações do campo da Saúde Mental que sucedem a implantação da Atenção Psicossocial como política pública oficial do Ministério da Saúde como desdobramento das conquistas da Reforma Sanitária e da Reforma Psiquiátrica.

É conveniente abordarmos o tema das transformações institucionais em andamento no campo da Reforma Psiquiátrica e da Atenção Psicossocial sob a perspectiva de uma análise paradigmática de suas principais características. Ou seja, consideraremos a multiplicidade e variabilidade das ações no campo da Atenção ao sofrimento psíquico, a partir da sua agregação em dois conjuntos principais, construídos a partir da análise da sua estruturação fundamental quanto aos aspectos teóricos, técnicos e ético-políticos que os atravessam.

 

1. Uma configuração institucional como lugar possível para a psicanálise do campo Freud-Lacan

Falarei diretamente do Paradigma Psicossocial (PPS) como movimento de subversão do Paradigma Psiquiátrico Hospitalocêntrico Medicalizador (PPHM), em quatro parâmetros considerados fundamentais para a sua constituição como paradigmas3:

Parâmetro I. Concepções efetivadas do "referente" das ações de Atenção e dos "meios" de trabalho do trabalhador-intercessor.

O Paradigma Psicossocial trabalha e luta na direção da subversão das concepções de Saúde-adoecimento e dos meios utilizados para o tratamento.

Naquilo que diz respeito ao referente das ações de Atenção destacamos alguns pontos de partida: atua-se diretamente junto a uma "realidade psíquica" (que inclui o corpo) contextualizadas histórica e socialmente. Realidade psíquica que nos aparece através de seus diversos impasses. Essa realidade psíquica só pode ser acessada pelos trabalhadores da SMC

através da mediação de "realidades sociais"subjetivadas - as Formações Sociais: o Território, a instituição como dispositivo social de produção, as disciplinas profissionais, a concepção implícita ou explícita de ciência, a divisão técnica e a divisão social do trabalho.

Como referente imediato da ação "terapêutica" essa realidade psíquica já inclui o sujeito, como sujeito dividido, tal como é grafado na psicanálise do campo Freud-Lacan ($), e inclui também o Outro, como campo do sentido ou campo do Simbólico. Daí podemos afirmar que a "realidade" psíquica trabalha, isto é, no próprio tempo da sua constituição inaugural ela emerge em trabalho (onde Freud falava em aparelho psíquico, para o qual apresentou diferentes configurações tópicas, Lacan falou propriamente em realidade psíquica, tal como é apresentada no famoso "Esquema R" (Lacan, 1957-1958/1999).

A realidade psíquica trabalha diretamente tanto na configuração do problema, constituindo o modo sob o qual ele chega à instituição de SMC, quanto nos processamentos de seu equacionamento. Isso vai implicar imediatamente que o trabalho fundamental de "tratamento" se processe no campo dessa realidade psíquica, na relação do sujeito ($) como ente de sentido e pulsão, com o Outro como campo do Simbólico. Nessa perspectiva, por sua vez, o trabalho terapêutico realizado nas práticas da Atenção se torna um trabalho relacional, isto é, uma terapêutica sob transferência.

O trabalho psíquico se especifica pela produção de sentido ou saber inconsciente, sob transferência, com implicações radicais sobre o tempo de trabalho (o tempo do sujeito do sofrimento e o tempo do trabalhador não são idênticos) e sobre os modos de produção, que convém abordar a partir dos discursos de Lacan como laços sociais e modos de produção (Lacan, 1969-1970/1992).

Proponho o conceito acontecimento - sujeito para apreendermos os impasses nesta realidade psíquica, dado o modo como chegam às instituições de SMC em nosso contexto neste momento histórico. Tenta-se apreender a especificidade dos modos como os indivíduos comparecem às instituições - os indivíduos comumente chegam às instituições de SMC "analisandos das situações de crise vividas"(convém sublinhar o gerúndio do tempo verbal). É especificamente da modalidade da "oferta de possibilidades transferenciais" que irá depender o fato de ele vir ou não a se tornar analisante no sentido próprio do conceito na psicanálise do campo Freud-Lacan.

Ainda no parâmetro I do paradigma, considerando agora os meios de ação de um trabalhador junto aos efeitos da Demanda Social, o Paradigma Psicossocial exige trabalhadores configurados e posicionados de modo absolutamente singular (ainda que neste momento histórico sejam necessariamente situados em processo de formação para esse novo campo também em constituição). Proponho o conceito de trabalhador-intercessor. São

trabalhadores precavidos pela psicanálise do campo Freud-Lacan, pela Análise Institucional, por elementos do Materialismo Histórico e elementos da Filosofia da Diferença (campos transdisciplinares e, por hipótese, correlatos, em alguma medida). Veremos que a esse trabalhador é necessário também um certo atravessamento pelos efeitos da própria análise (exigência diretamente derivada dos conceitos de realidade psíquica e de acontecimento-sujeito incluídos na concepção do referente da Atenção).

Esse trabalhador-intercessor está posicionado em sua ação e sua reflexão sobre ela para trabalhar na construção de um trabalho transdisciplinar, de um conhecimento transdisciplinar e de um saber singular que a psicanálise especifica (saber ajudar a saber) - saber que Freud identificou e Lacan especificou quanto às características e quanto aos modos de operar para a sua produção.

Antecipamos algumas proposições a respeito das táticas mínimas necessárias a um trabalhador-intercessor do campo da SMC: restituir ao trabalho na SMC o estatuto de práxis; restituir a importância do trabalho em coletivos, sobretudo, na(s) clínica(s); recuperar a importância do trabalho cooperado e da configuração de coletivos em "transferência de trabalho", tanto no plano da clínica, quanto no plano da instituição de SMC como dispositivo social de produção (citar).

Parâmetro II. Concepções efetivadas dos modos de organização e de gestão da instituição de SMC como dispositivo social de produção.

Neste ponto, o Paradigma Psicossocial procura avançar na direção das exigências que a própria concepção ético-política do trabalhador-intercessor e seus coletivos, e de seu "referente" de ação (uma realidade psíquica) exigem; isto é, trabalha-se para a subversão dos modos da gestão verticalizada e heterogerida herdados das figuras da instituição de SMC baseadas no modo típico das "instituições" organizadas para atender aos fins do Modo Capitalista de Produção (MCP). O modo mais imediato de se avançar nessa direção consiste na transformação dessas relações intrainstitucionais típicas do MCP, fundando-se na tese absolutamente simples de se demonstrar de que as relações, como fatores e modos do processo de produção da instituição como dispositivo, fatalmente são transladadas para as relações específicas da Clínica, isto é, para as relações do trabalhador-intercessor com os "sujeitos do sofrimento". Naturalmente, isso é também um desdobramento do fato de que a instituição como dispositivo de produção é intermediadora inevitável nas relações dos trabalhadores entre si e com os sujeitos que recorrem à sua ajuda.

Ora, sabemos que propor uma reorganização intrainstitucional avessa à das organizações hetorogeridas que são predominantes em nosso estilo societário não é uma questão que se possa sacar da cartola de uma hora para a outra. Portanto, é fundamental não perder de vista, quanto a este aspecto, as lutas e os avanços tanto em termos de análise política das instituições específicas do setor da Saúde, quanto de suas conquistas efetivas, dos movimentos da Reforma Sanitária brasileira e das heranças das Reformas Psiquiátricas internacionais e nacionais para a Atenção Psicossocial. A ética da SMC (Costa-Rosa, 2012), na qual se insere a Atenção Psicossocial, exige a subversão da hetorogestão. Para isso é suficiente pôr efetivamente em ação os dispositivos de gestão e participação facultados pela Reforma Sanitária e já garantidos em legislação oficial; como os "conselhos de gestão de unidade de Saúde", e os desacreditados "Conselhos de Saúde", nos três âmbitos da federação, cuja função se designa especificamente como "participação no planejamento, gestão e controle" das ações do executivo no setor Saúde, em todos os aspectos das suas ações.

Portanto, as exigências da Atenção Psicossocial como política, já há algum tempo admitida no discurso oficial do Executivo nacional como Política Pública, é que dão condições e lugar para que em seus dispositivos institucionais se introduza a psicanálise do campo Freud-Lacan com sua ética e sua política.

Parâmetro III. Concepções efetivadas das relações Instituição-Território sócio demográfico e geopolítico, e concepções das relações instituição e seus trabalhadores com os efeitos da Demanda Social considerados da perspectiva de uma "Clínica sob transferência".

Este parâmetro permite considerar um conjunto de questões absolutamente fundamentais para a possibilidade efetiva de uma ação junto aos problemas psíquicos que seja capaz de se pautar pelas exigências advindas do SUS como dispositivo que se propõe a avançar na luta para implantar uma lógica de ação fundada nas bases da Medicina Social e nas premissas sustentadas pelo Movimento Sanitário Brasileiro desde a década de 1970. Essas bases incluem uma ação sobre os processos de produção saúde-adoecimento-Atenção no âmbito do Território complexo, muito além de práticas estritamente curativas, portanto; compreende-se que esse processo não pode ser separado do estilo societário, isto é, da forma como estão organizados os processos de produção da vida material da coletividade, em termos amplos.

Não é preciso dizer que este aspecto exigirá, por um dado, dos trabalhadores-intercessores um giro de estudo e análise crítica das origens históricas da SMC e da Reforma Sanitária naquilo que elas embasam as heranças da Reforma Sanitária e da Atenção Psicossocial; e por outro lado, exige a análise do próprio estágio de consolidação do SUS, como estratégia que procura avançar numa conjuntura inevitavelmente adversa (uma sociedade cujo estado da luta entre interesses e valores que nela se articulam é massiçamente desfavorável aos interesses e valores, e às ideias e ações que compõem o instrumental e o ideário da SMC), e cujo resultado mais sólido e consistente é ainda uma forma da Medicina Preventiva Promotora, cuja base consiste no chamado modelo flexneriano - modelo de Atenção às doenças originalmente individual e privado - que se procura transpor para o conjunto social, sob a figura ideológica do "direito universal à saúde", quando na prática é exatamente uma concessão tática no campo das demandas por saúde, sob a forma estrita da Atenção às doenças.

Este parâmetro permite considerar aspectos que são absolutamente cruciais para a possibilidade de uma clínica dos processos psíquicos capaz de considerar radicalmente a hipótese de uma realidade psíquica (Realittät) estritamente em continuidade moebiana com a realidade propriamente social como referentes de ação; que exigem, por sua vez, a colocação em ação de uma práxis clínica sob transferência.

Essas são algumas das razões que determinam que uma Atenção Psicossocial além das reformas psiquiátricas seja capaz de enfrentar o desafio da subversão das relações da instituição de SMC com o Território, e das relações dos "trabalhadores de saúde mental" com a população e especificamente com os sujeitos dos impasses psíquicos; relações cujo estado atual, à mínima análise, logo deixam ver seu caráter de relações sociais típicas dos modos de produção dominantes na própria sociedade; isto é, relações do tipo dominantes-subordinados, sapientes-ignaros, supridos-carentes, e outras.

Essas subversões implicam, a princípio, fazer as instituições-estabelecimento operarem como espaços de (inter)locução e instâncias de "oferta de possibilidades transferenciais" para os efeitos da Demanda Social, e das demandas psíquicas, que se apresentam indistintamente nas figuras de demandas por Atenção ao sofrimento psíquico, vivenciado estritamente como sofrimento privatizado. Neste primeiro encontro dos sujeitos do sofrimento com os trabalhadores da instituição já se põe em andamento o primeiro passo da transferência, de que dependerão todas as ações terapêuticas realizadas. Vê-se claramente, portanto, como no campo da SMC é a própria instituição o alvo de endereçamento da "suposição de saber", à qual o trabalhador-intercessor deverá se anexar. Nesse caso não é difícil concluir sobre a importância decisiva desempenhada pelo modo como a instituição é capaz de se apresentar, e o modo como é percebida, no Território como espaço geopolítico, imaginário e simbólico.

Parâmetro IV. Concepções efetivadas em termos dos efeitos terapêuticos e dos desdobramentos éticos das ações de Atenção.

A inclusão da ética como um parâmetro essencial da práxis do trabalhador-intercessor é conseqüência das hipóteses que fundamentam sua ação, tanto no âmbito da instituição como dispositivo social de produção, quanto no trabalho específico junto aos sujeitos dos impasses psíquicos que recorrem às instituições de SMC. Por um lado, a inclusão do trabalhador em qualquer práxis de produção social torna irrecusável a consideração da dimensão política, uma vez que mesmo a pretensão de neutralidade política não escapa aos contornos de uma posição política bem caracterizada. Por outro lado, a concepção do referente de ação como uma realidade psíquica encarnada num ente social, cultural, político e desejante constitui argumento suficiente para fundar a inclusão da ética como política nos efeitos dos tratamentos psíquicos. Como recusar o estatuto político a uma realidade que inclui o sujeito, constituído pelo indivíduo mais o inconsciente e, dimensão homóloga, o sujeito como aquilo (dimensão pulsional) que aparece como um significante no campo simbólico? (hipótese de Lacan). Em outros termos, este é o sujeito cujo movimento desejante é práxis criativa, tanto no seu reposicionamento subjetivo na sintomática cotidiana, ou nos momentos de impasse, quanto no trabalho de seu reposicionamento frente à alienação ao desejo do Outro e, sobretudo, no trabalho de alargamento de suas possibilidades criativas frente ao desejo, que é a política que define o homem como tal.

A Atenção Psicossocial se define para além da Reforma Psiquiátrica ao se propor a avançar na direção da subversão das éticas psiquiátrica e psicológica como éticas do tamponamento dos sintomas e dos efeitos dos demais impasses psíquicos considerados, em si, como transtornos; éticas da adaptação no plano do eu à realidade e das carências aos suprimentos. Como subversão dos eixos eu-realidade e carência-suprimento, os trabalhadores-intercessores referenciam-se nos eixos sujeito-desejo e carecimento-Ideais, fundamentos da definição do sujeito com "entre" sentidos e pulsão (realidade psíquica) e como "entre" semelhantes (realidade social).

Esse sujeito que aparece como subversão do eu constitui um ente para o qual a adaptação, o conformismo e a estase subjetiva jamais são condições toleráveis sem gravíssimas consequências no plano da sua existência cotidiana.

Em suma, quanto à questão da necessidade e das possibilidades de inclusão da psicanálise no campo da SMC é necessário sublinhar que, junto com os esforços necessários já em ação para inserir a psicanálise nas instituições de Atenção, mais fundamental, ainda, é trabalhar para adequar o dispositivo institucional, a fim de que nele possa caber a psicanálise; mas antes de tudo para que a instituição se torne um local efetivamente viável para recepção e escuta (no sentido freudiano dos termos) das demandas dos "sujeitos do sofrimento", com a especificidade que elas carregam: uma realidade psíquica na qual emergem acontecimentos-sujeito marcados pelo sentido e pela pulsão/gozo como estratégias que os indivíduos põem em ação como meios de se situarem e se manterem no plano do desejo; daí a radical dimensão política da ética que dá fundo à Estratégia Atenção Psicossocial.

 

2. Alguns elementos para a caracterização inicial de um trabalhador-intercessor do campo da SMC

A reversão da lógica dominante que se expressa no Paradigma Psiquiátrico Hospitalocêntrico Medicalizador exige um trabalhador posicionado com radical precisão devido às exigências da subversão da instituição como dispositivo social de produção, mas, sobretudo, em decorrência da necessidade de operar com a nova configuração do "referente" da ação nas práticas clínicas: uma "realidade psíquica", cuja dinâmica inclui principalmente os "acontecimentos-sujeito" e seus desdobramentos necessários. O que é um trabalhador-intercessor?

De imediato ele precisa se posicionar para poder driblar a confusão letal induzida pelo "olhar" construído pelos especialismos disciplinares nos quais foi originalmente formado e instruído: psiquiatria, psicologia, serviço social, etc.

Esse trabalhador-disciplinar que temos atualmente, trabalhando na suposição de que ele será capaz de se organizar na forma do coletivo de trabalho interdisciplinar, é o avesso do trabalhador-intercessor. Portanto, para a constituição desse trabalhador será necessário construir a difícil passagem que vai do trabalhador-disciplinar que temos, ele próprio ainda mal constituído, até o trabalhador transdisciplinar que é exigido pela ética que orienta a clínica e as demais ações do paradigma da Atenção Psicossocial. Sem dúvida alguma essa tarefa deverá interessar profundamente também às Universidades.

Em síntese, podemos dizer que o trabalhador-intercessor é um trabalhador precavido (teórica, técnica e eticamente) pela psicanálise do campo Freud-Lacan. Nessa precaução incluímos, ainda, a possibilidade dos conhecimentos vindos da Análise Institucional, do Materialismo Histórico e da Filosofia da Diferença, todos originariamente campos de saber e ação transdisciplinares. Campos que lhe interessam diretamente em virtude da constituição transdisciplinar que os constitui e pelo fato de que esse trabalhador irá operar com "Formações Sociais" e "Formações Subjetivas/Inconscientes", em associações diversas: de continuidade (moebiana), e às vezes de contigüidade e de interpenetração.

Um trabalhador-intercessor se constitui também pelo atravessamento dos efeitos advindos da sua própria (psic)análise. Certamente isso implica em aceitar, portanto, não só para o outro que se queixa, a condição do inconsciente e da pulsão como constituintes da realidade psíquica (R ealittät), e operantes no seu funcionamento. Do mesmo modo, esse atravessamento pelos efeitos da própria análise dá ao trabalhador-intercessor um dos requisitos necessários para a compreensão e aceitação da presença da "Outra cena" e de um "real irredutível", também nas Formações Sociais como é o caso da instituição de SMC, que atravessa todas as suas ações e da qual ele é constituinte privilegiado. Todos esses atravessamentos certamente ajudam a prepará-lo também para se posicionar diante dos acontecimentos-sujeito, manejáveis necessariamente apenas sob transferência.

Do atravessamento do trabalhador-intercessor pelos efeitos da própria análise é importante destacar, ainda, aquilo que a teoria da psicanálise define como "destituição subjetiva". Esta tem relação direta com as possibilidades de posicionar-se sob transferência: emprestar o corpo e a subjetividade (sua própria realidade psíquica) sem ter que pagar em excesso, em narcisismo e em gozo (sob as formas comuns da angústia ou do regozijo bondoso); isso vale tanto diretamente no trabalho com os sujeitos que se queixam, quanto no contato com os efeitos advindos da posição de trabalhador dos coletivos institucionais (grupos de trabalho diversos) e da própria instituição. Para concluir este ponto convém explicitar que esses são apenas alguns pontos preliminares, postos ao modo de um convite à ação e reflexão; praticamente tudo, do essencial, ainda está por ser feito.

 

3. Aspectos clínicos: acontecimento-sujeito e a especificidade da transferência como condição de possibilidade da clínica fundada na psicanálise na SMC

Acontecimentos-sujeito são figuras "visíveis"/audíveis que permitem a um trabalhador-intercessor supor processos de subjetivação que o indivíduo que veio se queixar está pondo em movimento, com maiores ou menores possibilidades e desenvoltura, para dar conta de desarranjos produzidos na sua realidade psíquica, decorrentes de eventos, injunções, que a impactaram numa medida e proporção, obrigando-a a rearranjos específicos.

Tais injunções podem ter vindo tanto da realidade exterior compartilhada, mais especificamente de pedaços dela (que Freud (1950 [1895]/1996) chamou de Wirklichkeit), quanto da própria realidade psíquica (invasões do real angustioso): são sintomas em configurações diversas: pânicos, paroxismos obsessivos, ansiedades e depressões diversas, dores andarilhas que percorrem o corpo; e um vasto conjunto de sofrimentos simplesmente referidos como aqueles a que a medicina não dá respostas; os gozos compulsivos comuns e aqueles diretamente relacionados ao estilo societário dito hipermoderno; e, ainda, os impasses e sofrimentos relacionados ao sofrimento dito psicótico (alucinações, delírios, depressões extremas, atos contraditórios como o suicídio); entre outros. Em todos os casos se trata de efeitos psíquicos de injunções radicais que impactaram a realidade psíquica (Realittät) exigindo respostas de sentido (incluindo o cantrasenso).

Acontecimento-sujeito é um conceito necessário justamente a esse novo lócus da clínica que parte da psicanálise de Freud e Lacan.

Constata-se facilmente que, neste momento histórico, o campo da SMC não possui potência de endereçamento de transferência no sentido freudiano do conceito. Tudo nele está "preparado" para uma figura da transferência que podemos chamar de "transferência anônima"(Miller, 1989), por dirigir-se, ainda, ao contexto social e cultural amplo (cultura do narcisismo, do misticismo, etc.); ou por dirigir-se à própria ciência na figura da psiquiatria DSM como uma medicina mental.

Nessas circunstâncias, o sujeito, como sujeito do inconsciente, costuma aparecer apenas no seu movimento de eclipse; isto é, ele aparece para sumir imediatamente na adequação ao saber da ciência, das práticas psicológicas de suprimento, ou mesmo na adequação às práticas das diversas instituições místico-religiosas.

Em outros termos, o acontecimento-sujeito que se abre como resposta da própria realidade psíquica (buscando seu reequilíbrio, após os abalos sofridos) colide com esse horizonte das ofertas de possibilidades transferenciais das práticas profissionais disciplinares, no qual não se vislumbra, para o indivíduo que se queixa, outra saída que a de pôr-se como "objeto para um sujeito" (característica dominante das disciplinas profissionais e da ciência aí atuantes); objeto para um sujeito que promete fundamentalmente ser para ele um onipotente supridor, versões inconfundíveis daquilo a que Jacques Lacan (1958-1959/2016) chamou "Outro do Outro".

Em contrapartida, como operam as instituições do campo da SMC parametradas pelas ações do trabalhador-intercessor, diante dos acontecimentos-sujeito? Operamos com os Discursos de Lacan (1969-1970/1992), como "modos de produção", na análise dos impasses psíquicos.

O ponto de partida consiste em distinguir o sujeito ($) que está em ação no acontecimento-sujeito. Esse sujeito deve ser considerado como "analisando/questionando" da situação de crise que experiencia; o que faz dele uma figura do sujeito barrado, sem dívida, mas uma figura particular. Trata-se de distinguir, portanto, o sujeito da transferência anônima, do sujeito que se dirige ao outro na "suposição de saber" configurando o Discurso da Histeria como tal. Este outro, no Discurso da Histeria, a que se dirige o sujeito que se queixa já está situado e é reconhecido por ele como capaz, de certo modo, de responder com a oferta caracterizada nos moldes de uma psicoterapia em cuja práxis a psicanálise de Freud e Lacan é ampliada (Périco, 2014, 2016). Também é fácil ver que se está a um passo adiante da situação que constitui a transferência anônima; portanto, ter chegado a esse ponto, no contexto da SMC, supõe ter dado uma considerável caminhada no "trabalho da transferência". Ou seja, para poder se posicionar, o trabalhador-intercessor precisa compreender claramente que a modalidade do sujeito, que pode engajar-se na via do trabalho exigido pela "realidade psíquica", é posicionado no trabalho, como efeito da própria modalidade da oferta transferencial. Modalidade, esta, que só pode referenciar-se tendo no horizonte o modo de produção da Atenção correspondente ao Discurso do Analista.

Esse posicionamento do sujeito e do trabalhador-intercessor poderá ser melhor apreendido teórica e tecnicamente através do algoritmo da transferência proposto por Lacan (Quinet, 2008). Ou também, dito de outro modo: o ponto de partida do trabalho de um psicanalista na situação da psicanálise em intensão, ainda precisa ser construído na situação da Atenção ao sofrimento psíquico, nas condições da SMC; situação que arrisco definir como alargamento das possibilidades do campo da "intensão comum" da psicanálise.

Consideradas essas definições preliminares, os passos seguintes consistem em configurar a especificidade técnica e ética das demandas que chegam ao trabalhador-intercessor, configuradas sob o modo dos acontecimentos-sujeito, que emergem tanto no plano de realidades psíquicas, quanto no plano da realidade da própria instituição de SMC como Formação Social específica. É fundamental não se perder de vista que nesta última situação são os próprios trabalhadores-intercessores que são atravessados por eventos/injunções que os tornam analisandos/questionandos das situações produzidas pela instituição como dispositivo de produção. Ainda nessa direção da análise, são necessários outros caminhares teóricos até chegarmos a configurar com a clareza necessária, para os efeitos-sujeito específicos do âmbito da instituição, a particularidade própria da cena homóloga à da realidade psíquica; ou seja, a realidade psíquica e a realidade social são realidades homólogas e estão absolutamente em continuidade (moebiana) (Lacan, 1968-1969/2008), porém, de especificidades particulares quanto ao trabalho que "processam", e, desse modo, quanto aos posicionamentos e ações exigidos dos trabalhadores-intercessores nos planos da teoria, das técnicas, da ética e da política.

A fim de marcar o teor essencial das considerações realizadas até o momento neste artigo preliminar, é importante sublinhar que, naquilo que diz respeito à psicanálise, elas permanecem totalmente dentro do âmbito que Jacques Lacan (2001/2003) define como "psicanálise em intensão"; ainda estamos, portanto, fora da "psicanálise em extensão", e pretendemos ficar mais longe, ainda, da dita "psicanálise aplicada".

 

Referências

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Recebido em: 13/09/2019
Aprovado em: 15/11/2019

 

 

1 Publicação póstuma do texto escrito pelo Prof. Dr. Abílio da Costa-Rosa em 2015. Editores do texto "manuscrito" e confecção do resumo: Maico Fernando Costa, Psicólogo, Mestre e Doutorando em Psicologia pela UNESP-Assis; Waldir Périco, Psicólogo e Mestre em Psicologia pela UNESP-Assis, Doutorando em Psicanálise pela UERJ e Silvio José Benelli, Psicólogo e Mestre em Psicologia pela UNESP-Assis, Doutor em Psicologia Social pela USP/SP. Integrantes do "Laboratório Transdisciplinar de Intercessão-Pesquisa em Processos de Subjetivação e 'Subjetividadessaúde'" (LATIPPSS).
2 [Nota dos editores] A expressão "dialeticamente além" merece um esclarecimento, a fim de melhor situar o leitor. O autor a emprega no sentido daquilo que a Filosofia da Práxis define como "superação dialética", ou "suprassunção" (Aufhebung). Trata-se do movimento dialético em que algo se suprime ou se desfaz, algo é conservado e algo é elevado a outro estatuto. Assim, o autor propõe uma análise dos avanços operados pela RP para que possamos, por meio do crivo ético-político da psicanálise e do materialismo histórico, delimitar o que nela devemos suprimir, o que devemos conservar e o que podemos ampliar para ir a um outro patamar. Quanto a isso, também temos (Périco, 2016) nos inspirado na noção de "para além" proposta por Lacan (1975-1976/2007), quando propõe que devemos ir além do pai, contanto que, antes, dele possamos nos servir.
3 [Nota dos editores]: Para maiores aprofundamentos dessa análise paradigmática, o leitor pode consultar vários trabalhos (Costa-Rosa, 1987; 1999; 2000; 2013b; Costa-Rosa, Luzio & Yasui, 2003).

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