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Neuropsicologia Latinoamericana

versión On-line ISSN 2075-9479

Neuropsicologia Latinoamericana vol.1 no.1 Calle ene. 2009

 

 

Espectrografia Funcional de Infravermelho Próximo (fNIRS): a técnica e sua aplicação em estudos da linguagem

 

Espectografía funcional de infrarrojo cercano (fNIRS): la técnica y su aplicación en estudios de lenguaje

 

La spectroscopie fonctionnelle par infrarouge (fNIRS): la technique et son application pour des études de langage

 

Functional Near Infrared Spectroscopy (fNIRS): the technique and its application in language studies

 

 

Lilian Cristine Scherer I; Karima Kahlaoui II; Ana Inés Ansaldo II, III

IUniversidade de Santa Cruz do Sul – UNISC, Brasil
IICentre de recherche, Institut universitaire de gériatrie de Montréal, Canadá
IIIFaculté de médecine, Université de Montréal, Canadá

Endereço de correspondência

 

 


RESUMEN

En los últimos años, en especial a partir de la década de 1990, conocida como la "década del cerebro", distintos ámbitos científicos se interesaron por la investigación del funcionamiento cerebral. Estas investigaciones fueron impulsadas por la aplicación de técnicas de neuroimagen cada vez más precisas, las que generaron un nuevo escenario en las neurociencias cognitivas. Los datos obtenidos en esos estudios fueron confrontados con las bases teóricas hasta entonces vigentes, corroborándolas o desafiándolas, motivando nuevas reflexiones y avanzando la ciencia con datos del funcionamiento cerebral in vivo. Son varias las técnicas de neuroimagen actualmente a disposición de los investigadores, cada una con sus características. El presente trabajo pretende destacar la aplicación al estudio de la cognición humana de una técnica emergente y promisoria: la Espectografía funcional de Infrarrojo Cercano (del inglés, fNIRS). Se presentan las principales características de la técnica, su funcionamiento, ventajas y limitaciones, tanto como su aplicación, especialmente en estudios lingüísticos. La evidencia obtenida por los estudios realizados con fNIRS demuestra la validez de la técnica en la investigación de diversos aspectos de la cognición humana. Además, se observa el surgimiento de una tendencia a la multimodalidad, por medio de la aplicación conjunta de fNIRS y otras técnicas para corroborar los resultados y aumentar los análisis de los datos.

Palabras-clave: Técnicas de neuroimagen, Multimodalidad, fNIRS, Cognición, Lenguaje.


ABSTRACT

In the past years, especially since the 1990s, a period known as "the decade of the brain", several scientific research fields have turned their focus to research correlated with cerebral functioning. These studies have been fostered by the application of ever refining neuroimaging techniques, which generated a new scenario in neurocognitive sciences. Data derived from these studies have been gradually confronted to the theoretical bases developed so far, corroborating or challenging them, leading to new reflections and causing science to advance with empirical data on cerebral functioning registered in vivo. A great array of neuroimaging techniques is available to researchers nowadays, each one with its singularities. This article aims to highlight the application of an emergent and promising neuroimaging technique, functional Near-Infrared Spectroscopy (fNIRS), in the studies of human cognition. The main characteristics of the technique, its functioning, advantages and limitations, as well as its applications, especially in language studies, will be presented. Evidence brought by fNIRS research demonstrates the validity of the technique for the study of several aspects of human cognition. Moreover, multimodality has frequently been a tendency in these studies, by the simultaneous data collection by fNIRS and other neuroimaging technique, as a means of corroborating results and incrementing data analysis.

Keywords: Neuroimage, Multimodality, fNIRS, Cognition, Language.


RESUMO

Nos últimos anos, em especial a partir da década de 1990, conhecida como a "década do cérebro", diversos campos científicos voltaram seus interesses a pesquisas sobre o funcionamento cerebral. Essas pesquisas foram alavancadas pela aplicação de técnicas de neuroimagem cada vez mais precisas, as quais geraram um novo cenário nas ciências neurocognitivas. Os dados advindos desses estudos vêm sendo aos poucos confrontados com as bases teóricas até então vigentes, corroborando-as ou desafiando-as, de modo a motivar novas reflexões e fazendo avançar a ciência com dados do funcionamento cerebral in vivo. Várias são as técnicas de neuroimagem atualmente à disposição dos pesquisadores, cada qual com suas características. O presente artigo pretende destacar a aplicação de uma técnica emergente e promissora, a Espectrografia Funcional de Infravermelho Próximo (fNIRS, sigla em inglês), no estudo da cognição humana. As principais características da técnica, seu funcionamento, vantagens e limitações, bem como sua aplicação, especialmente em estudos linguísticos, serão aqui apresentados. As evidências trazidas pelos estudos desenvolvidos com fNIRS demonstram a validade da técnica na investigação de diversos aspectos da cognição humana. Além disso, verifica-se o surgimento de uma tendência à multimodalidade, por meio da aplicação concomitante de fNIRS e outras técnicas, como forma de corroborar os resultados e incrementar a análise de dados.

Palavras-chave: Neuroimagem, Multimodalidade, fNIRS, Cognição, Linguagem.


RESUMÈ

Ces dernières années, spécialement depuis les années 1990, période durant laquelle on a assisté à «la décennie du cerveau», de nombreux champs de recherche scientifiques se sont focalisés sur le fonctionnement cérébral, en particulier grâce à l'apport des techniques de neuroimagerie qui ont permis une nouvelle approche du domaine des sciences cognitives. Les données issues des études réalisées en neuroimagerie ont permis d'appréhender autrement certaines bases théoriques issues essentiellement des études comportementales. Ces données ont permis d'apporter de nouvelles réflexions et une avancée scientifique considérable au niveau du fonctionnement cérébral in vivo. Les chercheurs disposent actuellement d'un très grand nombre de technique en neuroimagerie, chacune ayant sa singularité. Cet article a pour objectif de souligner l'apport d'une technique de neuroimagerie émergente dans le domaine de la cognition humaine, l'imagerie optique infra-rouge fonctionnelle ou functional Near-Infrared Spectroscopy (fNIRS). Les principales caractéristiques de cette technique, son fonctionnement, ses avantages, ses inconvénients ainsi que son application, en particulier dans les études sur le langage, seront présentés. Des nombreuses données issues de la littérature sont en faveur de la validité de cette technique pour l'étude de nombreux aspects de la cognition humaine. Par ailleurs, les acquisitions réalisées simultanément, c'est-à-dire en combinant les enregistrements fNIRS avec des enregistrements issus d'autres techniques de neuroimagerie, ont permis de corroborer certains résultats tout en améliorant les analyses de données.

Mots-clés: Neuroimagerie, Multimodalité, fNIRS, Cognition, Langage.


 

 

Embora muitas das técnicas de neuroimagem atualmente empregadas nos estudos da cognição humana tenham sido desenvolvidas nos anos 1970, foi na década de 1990 que elas, em sua maioria, registraram um incremento em termos de refinamento e de aplicação em pesquisas. As técnicas de neuroimagem hoje disponíveis no mercado podem ser divididas de acordo com quatro características: 1) grau de precisão (maior ou menor precisão temporal ou espacial), 2) grau de invasão (invasivas ou não-invasivas, ou seja, com ou sem injeção de líquido de contraste), 3) forma de mensuração da atividade cerebral (diretamente – por meio da medida do campo elétrico (eletroencefalografia, EEG) ou do campo magnético (magnetoencefalografia, MEG) do cérebro durante uma dada tarefa versus indiretamente – por meio da mensuração do fluxo sangüíneo (ressonância magnética funcional, fMRI, em inglês) e 4) tipo de método utilizado, os quais podem ser de três tipos: a) estrutural, como a tomografia computadorizada, TC, ou a imagem por ressonância magnética, IRM, que registram imagens estáticas da estrutura do cérebro e de regiões específicas; b) funcional, desenvolvido por meio da tomografia por emissão de pósitron, TEP, ou PET em inglês, da imagem por fMRI, da espectrografia funcional de infravermelho próximo, fNIRS, MEG e EEG, técnicas que registram imagens dos padrões de ativação cerebral durante uma atividade e c) método de estimulação, como a estimulação magnética transcraniana, TMS, em inglês. Assim sendo, as especificidades da técnica de neuroimagem devem ser levadas em conta ao se eleger uma que seja adequada ao estudo em vista.

Uma técnica crescentemente utilizada nos estudos da cognição humana é a espectrografia por infravermelho próximo, conhecida pela sigla fNIRS (do inglês, functional Near-Infrared Spectroscopy). Dentro da classificação acima apresentada, esta técnica é do tipo funcional e não-invasiva, com excelente precisão temporal e boa resolução espacial, com medida indireta das ativações cerebrais, calculadas pelo volume sanguíneo recrutado nas regiões de interesse. Devido ao grande potencial já demonstrado por essa técnica de neuroimagem em estudos de variadas áreas da cognição humana, o presente artigo pretende apresentar e discutir algumas das suas características, suas vantagens e limitações, suas aplicações, enfatizando os estudos desenvolvidos na área do processamento lingüístico.

 

A Técnica de Neuroimagem fNIRS: Vantagens, limitações e Aplicações

A aplicação de fNIRS no estudo do tecido cortical foi inicialmente proposta por Jobsis (1977), o qual foi o primeiro pesquisador a demonstrar a eficiência da penetração das luzes infravermelhas no crânio no monitoramento da ativação cortical. Apenas uma década após emergiram estudos sobre a função cerebral. Os primeiros estudos empregaram tarefas motoras e sensoriais simples, com o intuito de demonstrar a aplicabilidade da técnica para estudar a atividade cerebral de uma maneira não invasiva, em uma determinada área do córtex (Son & Yazici, 2006). A partir de então, um crescente número de estudos vem investigando funções cognitivas mais complexas.

fNIRS é uma técnica que emprega luz infravermelha, transportada por uma fibra óptica, a qual irradia luz ao escalpo da pessoa sob exame. A luz emitida pelas fontes propaga-se através do crânio e é capturada pelos detectores, desenhando uma curva em forma de banana na estrutura superficial do córtex. Então, as alterações na reflexão das luzes são medidas, com a possibilidade de se distinguir entre os níveis de oxigenação e desoxigenação sanguínea. Isso é possível porque toda a ativação de uma área específica do cérebro em decorrência da execução de alguma função demanda um incremento no fornecimento de oxigênio e glucose. A hemoglobina presente no sangue absorve a luz, possibilitando aos detectores de fNIRS capturarem as alterações na intensidade da luz refletida.

A localização das fontes e dos detectores no escalpo de acordo com as áreas cerebrais a serem observadas tem sido feita em geral pelo auxílio do sistema 10x20 (Jasper, 1958), amplamente empregado nos estudos com eletroencefalografia (EEG). Alguns estudos associaram o uso deste sistema à imagem por ressonância magnética (IRM), a fim de mais precisamente permitir a comparação de dados obtidos com fNIRS e imagem por ressonância magnética funcional (IRMf), cuja correlação tem sido demonstrada com sucesso em alguns estudos, como será discutido mais adiante neste artigo.

A aplicação de fNIRS nos estudos da cognição humana surge como uma ferramenta alternativa e promissora de neuroimagem. Seu uso apresenta muitas vantagens na comparação com outras técnicas, especialmente em termos de custo, praticidade, facilidade para aplicação e validade ecológica para apresentação e resolução de tarefas.

Os vários modelos agora disponíveis no mercado têm um custo muito menor se comparados aos scanners de TEP e IRMf, tanto em termos do valor de compra quanto o de manutenção. Além disso, até mesmo os modelos maiores são portáteis, o que permite seu uso em vários lugares, como junto a leitos de hospitais. Uma nova versão em desenvolvimento permitirá que as pessoas executem atividades físicas, como caminhar, enquanto os sinais capturados pelos detectores serão enviados por um sistema sem fio ao computador.

Outra importante vantagem está relacionada ao fato de suas fontes infravermelhas não apresentarem radiação ionizante, o que permite seu uso repetido sem prejuízo aos participantes de pesquisa ou pacientes. Além disso, não há contra-indicações ao seu uso considerando-se questões relacionadas ao indivíduo estudado, como a claustrofobia ou o uso de marca-passo, clip arterial, implantes, entre outros problemas ou artefatos que levariam à impossibilidade do uso de um scanner de IRMf.

No caso de estudos sobre o funcionamento da linguagem, fNIRS apresenta uma grande vantagem sobre outras técnicas de neuroimagem como TEP e IRMf porque a apresentação dos estímulos e sua resolução podem ser feitas em situações mais naturais, com maior validade ecológica, uma vez que o participante pode desenvolver a tarefa sentado ou reclinado confortavelmente em uma poltrona. Além disso, não há interferência de ruídos altos como os gerados pelos scanners. Em situações de apresentação de estímulos auditivos, esta característica tem importância primordial, pois não há ruído interferindo e competindo com o nível atencional da pessoa em estudo.

Em complementaridade, fNIRS representa uma ferramenta valiosa para o desenvolvimento de experimentos em que o tempo de ativação é relevante, uma vez que o registro dos sinais ocorrem na ordem de milissegundos, comparados a segundos em aquisições com IRMf. Outra vantagem desta técnica é, ainda, que ela permite tomar-se a medida independente das alterações temporais nas taxas de oxi-hemoglobina O2Hb e de desoxi-hemoglobina (HHb).

A maior desvantagem associada à técnica é sua relativamente baixa resolução espacial. No entanto, sua associação à digitalização e/ou a medidas usadas em EEG, com base no sistema 10x20, minimiza significativamente esta desvantagem, a qual é totalmente superada pela associação de uma IRM anatômica para guiar o posicionamento de fontes e detectores de acordo com as especificidades da anatomia cerebral de cada indivíduo. Outras limitações da técnica dizem respeito à profundidade e à qualidade dos sinais capturados. Mais especificamente, é importante notar-se que suas medidas estão restritas à superfície cortical, o que deve ser levado em conta dependendo dos objetivos do estudo. Há também alguma refração produzida pelos tecidos no cérebro (Koisumi et al., 2003); finalmente, como mencionado por Quaresima et al (2002, p. 241), "a contribuição de artefatos extracraniais deve ser cuidadosamente avaliada".

Existe, ainda, certa dificuldade em estabelecerem-se análises quantitativas entre participantes. Isso ocorre devido à grande variabilidade nos padrões de oxi- e desoxigenação encontrada em vários estudos, explicável pela natureza relativa dos dados hemodinâmicos (Son & Yazici, 2006). Além disso, o comprimento preciso do caminho percorrido pela luz infravermelha é difícil de medir; no entanto, como afirmam Son and Yazici (op. cit.), "a forma da evolução temporal dos sinais é semelhante entre os sujeitos e por isso pode ser analisada usando-se comparações qualitativas" (p. 23).

Assim sendo, como ocorre com todas as outras técnicas de neuroimagem atualmente empregadas nos estudos da cognição humana, fNIRS apresenta suas limitações, discutidas acima. Apesar da existência dessas limitações, fNIRS já demonstrou ser confiável para a investigação de processos cognitivos, como a compreensão e a produção de linguagem, o que tem levado à sua crescente adoção por pesquisadores. De acordo com Strangman e colegas (2002), "para a investigação da ativação cortical [...] e especialmente quando referenciado a um sistema exterior de demarcação (por exemplo, o sistema internacional 10x20), métodos ópticos difusos podem fornecer oportunidades não disponibilizadas por outra técnica existente" (p. 690).

Uma proeminente arena de aplicação de fNIRS tem sido os estudos com crianças, incluindo os neonatais. Devido às suas características – a portabilidade, a tolerância a certo grau de movimentos, a segurança – fNIRS é uma das técnicas de neuroimagem mais utilizadas em pesquisas com a população infantil. Estudos com essa população têm abordado a estimulação sensorial olfativa, auditiva e visual especialmente em neonatais (Bartocci et al., 2001, Meek et al., 1998, Sakatani et al., 1999) e disfunções cerebrais (Gallagher et al., 2008).

Na população adulta, por sua vez, os tópicos das pesquisas com fNIRS têm variado desde o estudo das reações a estimulações sensoriais básicas (Franceschini et al., 2003) até a investigação de tarefas cognitivas mais complexas (Noguchi et al., 2002). Salientam-se, ainda, os estudos envolvendo a saúde mental, incluindo disfunções cerebrais como a depressão e a esquizofrenia (Suto et al., 2004), a epilepsia (Adelson et al., 2002) e a doença de Alzheimer (Hock et al., 1997), e estudos mensurando a atividade cerebral em testes neuropsicológicos, como o estudo de Schroeter et al. (2002), que investigou os padrões hemodinâmicos em adultos neurologicamente saudáveis em resposta ao teste Stroop.

Finalmente, é importante enfatizar-se que uma tendência que vem se solidificando de forma muito marcante nos meios científicos interessados no processamento cerebral é a multimodalidade, que diz respeito ao uso concomitante de diferentes técnicas de neuroimagem de forma complementar. As finalidades da aplicação complementar são, basicamente, buscar evidências que correlacionem e corroborem os dados obtidos por duas técnicas por meio do mesmo design experimental, bem como, e o mais importante, procurar suprir as possíveis deficiências de cada técnica. Por exemplo, o uso de fNIRS (com uma excelente resolução temporal, da ordem de milissegundos, mas com resolução espacial restrita à região cortical) aliado ao de fMRI (com menor resolução temporal, da ordem de segundos, porém com excelente resolução espacial) representa uma forma de compensar deficiências e otimizar o potencial de cada uma dessas técnicas.

 

O Emprego de fNIRS em Estudos do Processamento Lingüístico

Em relação aos estudos lingüísticos, estes têm abrangido pesquisas no nível da palavra, da sentença e do discurso, tanto em termos de produção quanto em termos de compreensão, por intermédio de apresentação visual ou auditiva dos estímulos. Muitos desses estudos aliaram seu uso a outras técnicas, como TEP e IRMf, obtendo resultados comparáveis entre os recursos empregados. Destacam-se, a seguir, algumas dessas pesquisas.

A pesquisa desenvolvida por Watanabe et al. (1998) analisou o desempenho de 11 adultos neurologicamente saudáveis e o de seis adultos com epilepsia, durante uma tarefa de geração de palavras. Os pesquisadores confirmaram seus resultados sobre o hemisfério dominante, o esquerdo, com o questionário Edinburgh para os saudáveis e com o teste de Wada para os epiléticos.

Com o mesmo intuito do estudo acima – determinar a dominância hemisférica numa tarefa de processamento linguístico - Kennan e colegas (2002) investigaram os padrões cerebrais na detecção de inconsistências semânticas e sintáticas em frases apresentadas visualmente. Os participantes revelaram dominância hemisférica esquerda, em diferentes graus, corroborada por intermédio da aplicação paralela de IRMf.

Empregando um estímulo semelhante ao de Kennan et al. (2002), porém apresentando-o de forma auditiva, Noguchi et al. (2002) compararam o desempenho dos participantes em tarefas de julgamento sintático e semântico. Na comparação entre as duas tarefas, a tarefa semântica demandou menor ativação no hemisfério esquerdo. Como ambas as tarefas exigiram pouca ativação no hemisfério direito, os autores sugeriram haver uma dominância hemisférica esquerda para esses dois processos lingüísticos.

Quaresima et al (2002) empregaram uma tarefa de fluência verbal em que os participantes deveriam traduzir em voz alta de sua língua nativa, o holandês, para sua segunda língua (L2), o inglês, ou vice-versa, frases apresentadas visualmente. Observaram que a área de Broca, no córtex frontal inferior, permanecia ativa durante a tradução, independentemente da língua que estava sendo traduzida.

Kovelman et al. (2009) investigaram três grupos de participantes: falantes monolíngues de inglês, bilíngues ouvintes falantes de inglês e da língua americana de sinais (ASL – American Sign Language) e monolíngues falantes da língua de sinais. A tarefa era de nomeação no "modo" monolíngüe, ou seja, com emprego de apenas uma língua por vez, ou no "modo" bilíngue, com emprego simultâneo ou rapidamente alternado das duas línguas. Os dados comportamentais revelaram uma acurácia semelhante entre os grupos e as condições. Os dados de neuroimagem, no entanto, mostraram que os bilíngues, no modo bilíngue, demonstraram uma maior intensidade de sinal nas regiões temporais posteriores – a área de Wernicke – na comparação com os monolíngues. Os autores concluem que a habilidade de usar duas línguas sem esforço envolve regiões específicas da região temporal posterior do cérebro.

O uso de fNIRS no estudo da compreensão e da produção de linguagem é ainda muito recente, como já mencionado. No caso das outras técnicas de neuroimagem, como TEP, EEG e IRMf, estudos sobre o processamento do discurso iniciaram a ser desenvolvidos após a implementação de várias pesquisas no nível da palavra e da sentença. A tendência parece se repetir com fNIRS, ou seja, raros são ainda os estudos sobre o processamento do texto. Como uma ilustração, pode-se mencionar a pesquisa desenvolvida por Scherer et al. (in press), a qual analisou o processamento de narrativas curtas, por dez adultos jovens falantes nativos de francês, dez adultos jovens falantes nativos de inglês e aprendizes de francês em nível intermediário de proficiência, e dez adultos idosos, falantes nativos de francês. Após lerem cada uma das narrativas curtas, divididas em três blocos conforme o nível do discurso a ser analisado (a micro- e a macroestrutura e o modelo situacional), os participantes tiveram de julgar se a afirmativa que seguia a cada texto era verdadeira ou falsa em relação ao conteúdo do texto, explorando a capacidade de inferenciação e de compreensão leitora dos participantes. Entre os idosos, observou-se uma significativa ativação da região frontal do hemisfério direito no processamento da macro-estrutura, o mesmo ocorrendo com os falantes nativos de inglês aprendizes de francês, os quais também demonstraram ativação significativa no hemisfério esquerdo, regiões temporais e frontais, durante o processamento da micro-estrutura. Os dados obtidos junto aos idosos corroboram achados da literatura sobre a maior participação do HD nos processos de compreensão global do texto (Beeman et al., 2000) e da maior participação deste hemisfério no processamento entre idosos (Cabeza, 2002), bem como de regiões frontais no envelhecimento (Davis et al., 2007). Da mesma forma, os resultados obtidos junto à população bilíngue corroboram várias pesquisas na literatura que demonstraram uma maior ativação de regiões cerebrais, incluindo o HD, entre aprendizes ainda não proficientes em uma L2 (Dehaene, 1997, Abutalebi & Green, 2007).

 

Considerações Finais

Considerando-se o constante refinamento desta técnica de neuroimagem e as muitas vantagens que apresenta em relação a outras técnicas, como o reduzido custo de operação e manutenção, a portabilidade, o fato de não ser invasiva, dentre outras vantagens anteriormente mencionadas, a fNIRS é extremamente promissora para o incremento dos estudos sobre a cognição humana, incluindo a linguagem. Sua aplicação tem crescido de forma considerável em diversos centros de pesquisa de renome internacional, o que impulsionará ainda mais o seu uso em poucas décadas. Os estudos comparativos que vêm sendo desenvolvidos, contrastando os resultados advindos de fNIRS aplicada concomitantemente a outras técnicas, como IRMf, TMS e EEG, têm demonstrado sua grande eficiência. Além disso, a característica peculiar desta técnica, qual seja a de permitir seu uso num contexto ecologicamente mais válido, aliada ao fato de os novos modelos serem cada vez menos sensíveis ao movimento, inclusive permitindo certos movimentos corporais, expandirá as possibilidades de pesquisas a serem desenvolvidas em diversos campos científicos.

Devido às vantagens que possui em relação a outras técnicas, fNIRS se mostra como uma interessante aplicação também em contextos onde a neuroimagem com scanners ainda não é muito acessível especialmente devido ao seu custo. Este é o caso da realidade brasileira e de vários países da América Latina, onde espera-se que a fNIRS seja um recurso promissor de neuroimagem.

 

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Endereço de correspondência
E-mail: lilian.scherer@gmail.com

Artigo recebido: 20/08/2009
Artigo revisado: 23/09/2009
Artigo aceito: 02/10/2009.