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Revista do NUFEN

versão On-line ISSN 2175-2591

Rev. NUFEN vol.4 no.2 São Paulo dez. 2012

 

ARTIGO

 

 

A noção de paternidade no documento "situação da infância brasileira. Desenvolvimento infantil: os primeiros seis anos de vida", da UNICEF

 

The notion of paternity in document "brazilian state of childhood. Child development: the first six years of life" of UNICEF

 

 

Ellen Aguiar da Silva; Fernanda Cristine dos Santos Bengio; Klézio Kleber Teixeira dos Reis; Pedro Paulo Freire Piani

Universidade Federal do Pará - UFPA

 

 


RESUMO

O presente artigo tem por objetivo refletir sobre a paternidade no documento de domínio público, enquanto prática discursiva, intitulado "Situação da Infância Brasileira. Desenvolvimento Infantil. Os primeiros seis anos de vida.". Tal análise procederá inicialmente a partir da noção de governamentalidade em Michael Foucault e do uso dos repertórios linguísticos ancorado em Mary Jane Spink, levando-se também em consideração a subjetividade e a linguagem como um viés para compreensão dessa identidade paterna, tendo em vista que o documento expõe prescrições no âmbito do cuidado e participação do pai no desenvolvimento da criança e da família e contribui para o debate sobre as rupturas, mudanças, interrogações em torno da paternidade na contemporaneidade.

Palavras-chave: paternidade; pai; homem; documento; UNICEF.


ABSTRACT

The aim of this paper is to reflect on fatherhood in the public domain document, entitled "Situation of Brazilian Children. Child Development. The first six years of life. Initially, analysis will proceed from Michel Foucault's conception of governmentality, and the use of linguistic repertoires based on Mary Jane Spink, taking into account subjectivity and language as bias for understanding this paternal identity once the document sets out requirements under the care and participation of the father in child development and family, besides contributing to the debate on the breaks, changes, questions regarding paternity nowadays.

Keywords: fatherhood; father; man; document; UNICEF.


Resumen

El presente artículo tiene por objetivo reflejar acerca de la paternidad en el documento de dominio publico, como práctica discursiva, intitulada "Situación de los niños brasileños. Desarrollo infantil. Los primeros seis años de vida". Este va a empezar con la noción de governamentabilidade en Michel Foucault y el uso de los repertorios lingüísticos anclados en Mary Jane Spink, teniendo en cuenta también la subjetividad y el lenguaje como un sesgo de entender esta paternidad, teniendo en cuenta que el documento haz recetas bajo el cuidado y participación del padre en el desarrollo de los niños y de la familia y contribuye al debate acerca de las rupturas, câmbios, interrogaciones en torno a la paternidad contemporánea.

Palabras clave: paternidad; padre; hombre; documento; UNICEF.


 

 

Introdução

A publicação de documentos de domínio público de forma seriada e regular, como revistas, periódicos ou relatórios anuais de organismos internacionais refletem práticas discursivas que remetem a "momentos de ressignificações, de rupturas, de produção de sentidos, ou seja, corresponde aos momentos ativos do uso da linguagem, nos quais convivem tanto a ordem como a diversidade" (Spink, 2004, p. 45). Os documentos tornados públicos intercruzam formas de pensamentos, posicionamentos, polissemia de termos, saberes e fazeres e temporalidades distintas que compõem sua intersubjetividade e historicidade.

A processualidade destes documentos instiga a produção dos sentidos como construção social que se sedimenta em um contexto, em uma matriz demarcada por questões e interações históricas e sociais. O uso de documentos públicos como práticas discursivas e objeto de pesquisa envolve a produção de subjetividade, condições de possibilidade de relações de forças, poder, resistências, negociações, enfrentamentos, endereçamentos e finalidades.

São instrumentos que podem produzir direta ou indiretamente formas de governar no âmbito das práticas sociais e individuais. Promovem reflexões como estratégias de governamentalidade, com efeitos na construção de regimes de pessoalidade destinados ao controle da conduta dos indivíduos e a circulação dos repertórios linguísticos que transitam na análise dos documentos.

A produção deste estudo possui como finalidade precípua interrogar como têm sido realizadas as diferentes interlocuções entre o Pai nos dois principais modelos de família descritos por Jurandir Freire Costa (1989), cotejando esta análise ao documento de domínio público intitulado "Situação da Infância Brasileira. Desenvolvimento infantil. Os primeiros seis anos de vida." (UNICEF, 2001).

Enfatizamos que este documento é alvo de análise por demarcar novos atravessamentos na produção do Homem-Pai contemporâneo, uma vez que as posições que o pai/homem/menino vem assumindo, no contexto das políticas públicas, estão sendo entendidas como modos de governar a população que produzem determinada forma de subjetividade paterna.

 

O documento e a noção de governamentalidade

Segundo Ferreri (2011), a Organização das Nações Unidas (ONU), criada em 1945, depois da Segunda Guerra Mundial, com fim supranacional de institucionalizar a orientação de ações políticas no campo das relações internacionais entre os países, produz em 1946 o Fundo das Nações Unidas para Infância (UNICEF) como órgão auxiliar que demarca suas orientações de cunho assistencial, universalista e compensatório, instituindo diretrizes voltadas para o escopo dos direitos e garantia da criança e adolescente, incluindo o Brasil e demais países no plano global, nacional e local, com o intuito de buscar tentativas de possíveis resoluções dos problemas sociais. Seu primeiro escritório foi inaugurado no Brasil em 1950, e se estende por quase todo território nacional.

Suas ações englobam publicações de livros, periódicos, relatórios anuais, financiamentos de projetos e promoção de eventos sobre os direitos para as crianças e adolescentes, como, por exemplo, os documentos de domínio público disponibilizados em versão de relatórios. Dentre eles podemos citar os relatórios da UNICEF, de 2001, "Situação da Infância Brasileira: Desenvolvimento Infantil. Os seis primeiros anos de vida." (2001). Este documento focaliza a primeira fase de vida da criança, ou seja, da gestação aos primeiros seis anos de vida de meninas e meninos, incluindo proposições de investimentos, políticas e programas, cuidados e atenções especiais destinados a este ciclo de vida e no qual centralizaremos nossa análise.

O plano de ações e intervenções demarcadas nos documentos nos induz à reflexividade sobre a noção de governamentalidade de Foucault (1997), alusiva à arte de governar, pela qual prima todo Ocidente, de modo incisivo, ao notabilizar o governo das condutas, isto é, sobre todos os outros, que são objetivados e circulam no espaço/território, com a finalidade de produzir segurança e ampliação da vida através do controle e disciplinaridade dos corpos. A ação de governar por meio dos documentos da UNICEF ocorre de maneira prescritiva quanto aos modos de cuidar das crianças. Tais prescrições acontecem na gestão da norma, a qual sustenta a produção de saberes de uma economia política direcionada para orientar a condução da população. Em nome da saúde, qualidade de vida e do bem-estar físico e social, é justificada a governamentalidade da população. Tal perspectiva traduz o que Spink (2010) chama de "regime de pessoalidade'', que se vincula à diversidade de programas, propostas, diretrizes circunscritos nos documentos de organismos internacionais tornados públicos e que apontam o controle da conduta dos indivíduos, não somente para assujeitá-los, mas para internalizar propostas positivadas que levam ao empoderamento e à autorrealização.

O governo das condutas acontece, por exemplo, nas relações familiares, nas relações entre crianças, entre homens, mulheres. O governo de si e dos outros agencia um leque de situações diferenciadas que podem compor determinada força de sujeição. Uma mulher branca rica pode sujeitar outra mulher branca, pelo fato de esta última trabalhar como empregada doméstica na casa da primeira; e esta empregada doméstica, por sua vez, pode sujeitar outra mulher branca analfabeta (neste caso, além do componente econômico, existe também o social).

Para Foucault (2007), os modos de governar não se restringem às práticas políticas institucionais, mas ocorrem de maneiras ramificadas em situações diversas por meio de relações de poder móveis e intercambiáveis que, por sua vez, apresentam composições múltiplas.

Este autor destaca o biopoder como a grande tecnologia de poder do século XIX, que seria uma composição da disciplina, a qual incide sobre o indivíduo, sobre o corpo, por meio de prescrições normalizantes; e da Biopolítica, que se inscreve como governo das populações, produzindo modos de fazer viver e deixar morrer.

Deste modo, situaremos nossa análise no sujeito Pai, o qual tem ocupado diferentes posições de sujeitos na história da família em decorrência da produção constante de saber sobre estes objetos, destacando-se o saber denominado cientifico.

 

Pai, chefe de família? interrogando as descontinuidades

O homem-pai vem ocupando diferentes posições dentro da instituição família e essas mudanças atravessam e/ou são atravessadas por determinadas racionalidades de governo.

Costa (1989) problematiza as transformações ocorridas na sociedade brasileira referentes ao modelo de família predominante no período colonial e republicano, respectivamente. Ele questiona as estratégias médicas e higienistas1 utilizadas na desqualificação da família "colonial", demarcada pelo patriarcalismo e pela emergência da família "colonizada", caracterizada pela distinção do modelo de família burguesa que se destaca no período republicano.

Donzelot (1989), ao se debruçar sobre os modos de assistência à infância e à juventude na Europa, afirma que a família, no Antigo Regime, tem no pai-homem o "chefe de família", o qual era respeitado e/ou temido por seus familiares, no sentido de que estes deviam obrigações a ele; assim, o "chefe de família" era a intersecção entre os seus e a sociedade de modo geral. Após o Antigo Regime, este modelo de família se tornou insustentável, pois uma nova configuração de governo emerge com a formação dos Estados Nacionais.

Costa (1989) assevera que o modelo de família central do período colonial brasileiro se situava como instituição altamente independente, mas não desarticulada do regime de governo que vigorava naquela época. Sua insustentabilidade derivou, sobretudo, da emergência do Estado-Nação, o qual precisava ser construído sob práticas tutelares, de modo que a independência da instituição familiar precisou ser quebrada para que o Estado pudesse intervir nos modos de governo dessa família.

Neste processo, o homem-pai, chefe de família, perde a centralidade na posição em que ocupava e a mulher-mãe, mediante alianças com saberes, como o da medicina higienista e, também, alianças com o Estado, destaca-se como figura de importância singular para o bom desenvolvimento da criança, futuro da nação, e do cultivo de um lar que seja propício a este bom desenvolvimento.

O período republicano brasileiro é um recorte histórico da emergência de um modelo de família aos moldes burgueses. Toda uma economia social se configura mediante interesses políticos e econômicos que estavam em jogo. Assim, o cuidado com a criança se articula a um projeto de Nação que estava sendo construído.

Esse modelo burguês quebra com o domínio patriarcal sobre os membros desta instituição, delegando à mãe diferentes responsabilidades dentro desta nova configuração. A aliança entre o médico e a mulher não proporcionou apenas outro olhar sobre a função feminina na família, mas também o homem foi afetado.

Surge, então, a produção de novas subjetividades concomitantes à produção de um modelo familiar mais intimista. A conversão do homem ao papel de pai e da mulher ao papel de mãe, aos moldes higiênicos, foi possível, dentre outras coisas, graças ao saber médico que tinha muito a dizer sobre os modos de ser homem e mulher, pai e mãe, e suas correlações com a produção de uma infância saudável. Neste arranjo familiar higienista, o pátrio poder deixa de ser exclusivo do pai.

O homem passa a ocupar uma nova posição de sujeito não apenas na família, mas na sociedade. As prescrições de como ser um bom pai se tornaram bastante assépticas.

O objetivo higienista de converter o homem à personagem do pai de família teve três figuras "opositoras": o libertino, o celibatário e o homossexual. Essas três figuras não respeitavam a ordem e a moral social estabelecida, apesar de, no caso da homossexualidade, ela já ser uma prática condenada desde o Brasil colônia.

O libertino, por meio de seus atos imorais, expunha-se às moléstias decorrentes da luxúria e contaminava a esposa, comprometendo a qualidade da prole, além de ser um mau exemplo aos filhos. O celibatário também se expunha às doenças venéreas e, quando resolvia se casar, geralmente estava velho demais e escolhia uma mulher mais jovem, que se deixava corromper pela riqueza do homem. Mas os homossexuais eram a pior espécie, pois não faziam mal às famílias pelas doenças ou casamentos tardios; eles negavam sua condição natural de homens (Costa, 1989). Esses são alguns exemplos de homens que o higienismo combateu, pois representavam desvios que precisavam ser anulados.

As mudanças dos modelos de família "supracitadas acima" expressam modos de arranjos e rearranjos que se estruturam em multiplicidade na formação e condições históricas dos sujeitos. Inclui-se também a legitimação de dispositivos legais que operam sobre o lugar do pai na família e o exercício da paternidade, pois não é correto afirmar que a figura do homem perdeu força na relação que compõe a família e o jogo de tutela estatal.

O interesse em destaque sobre o homem-pai como uma estratificação do biopoder dá-se ao fato de o corpo ser uma realidade biopolítica. Dentro do campo legal, já temos algumas leis que jogam luz sobre esta questão. Como exemplo, podemos citar o projeto "Pai presente", programa coordenado pela Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) e que objetiva estimular o reconhecimento de paternidade de pessoas sem esse registro (Conselho Nacional de Justiça, 2012).

Outro exemplo é a Lei n° 1164 de 2007, a qual foi aprovada no Congresso Nacional, que obriga aos órgãos responsáveis a comunicação dos registros de nascimento lavrados sem o nome do pai à Defensoria Pública.

A partir da análise das rupturas existentes na instituição família, inquieta-nos o fato de o direito à paternidade se tornar matéria de disputas de modo flagrante apenas recentemente. A nível de exemplo, podemos citar o direito à licença-paternidade, promulgado na Constituição Federal de 1988. O direito à paternidade foi garantido pelo artigo 226, §7ª :

Art. 226: A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas (pp.237-238).

As estratégias de governo da população se materializam de maneiras diversas. Estamos enfatizando os modos de governo que têm como discurso a produção de uma infância saudável, tendo como alvo a família e a criança, produzindo modos corretos de ser pai e mãe.

Estes acontecimentos demonstram alguns aspectos da construção do modelo de pai higiênico que emerge durante o período republicano. Algumas dessas prescrições de modos de ser pai estão sendo atualizadas pela UNICEF, organismo internacional com importante papel político nas políticas para a infância em vários países do ocidente, como o Brasil. No próximo tópico, vamos explicitar como a UNICEF, por meio do relatório "Situação da Infância Brasileira 2001", tem atualizado práticas prescritivas de cuidado com a criança, destacando o papel do homem no desenvolvimento infantil.

 

UNICEF e o pai contemporâneo

A interface das mudanças dos modelos de família e os múltiplos arranjos atuais permitem analisar como são prescritos os modos de ser homem-pai de acordo com a avaliação da UNICEF, enquanto sujeito responsivo e como uma estratificação do biopoder, pois este corpo é uma realidade biopolítica.

As prescrições de como ser pai na atualidade, conforme a UNICEF, estão relacionadas ao uso do termo "Desenvolvimento Infantil", o qual está associado à realização de tarefas conjuntas que devem contemplar a participação efetiva da família, da comunidade, das organizações sociais e dos governos sociais, bem como a participação do pai, a qual assume novas nuances no âmbito da sobrevivência, da saúde e cuidado da criança.

O posicionamento de ser homem-pai, visualizado no documento analisado, tem como pressuposto básico a ênfase na análise do discurso e a circulação dos repertórios linguísticos que se estruturam pela produção de conteúdos e processos que vão produzindo sentidos e políticas na sociedade. Os repertórios indicam interpretações, tipificações de papel que mobilizam trocas simbólicas no campo da intersubjetividade e da interpessoalidade.

O modelo colonial de família sofreu transformações e rearticulou os papéis da mulher e do homem. "(...) a higiene desfocava a importância de velhos e adultos e fazia brilhar a infância. Realçando o papel da mulher, recalcava o poder do marido" (Costa, 1989, p.73).

A partir dos repertórios expressos no documento abaixo, observamos que este "recalque do marido" deixa de ser útil às estratégias de governo da população, denotando que a face produtiva da normalização que acusava negativamente os pais, elege o homem-pai como figura essencial para produção de uma infância saudável, prescrevendo outros novos modos de se comportar, concomitantemente à crescente importância que a infância passa a ter neste processo. O relatório "Situação da Infância Brasileira. Desenvolvimento Infantil. Os primeiros seis anos de vida" (2001) aponta:

(...) O importante papel dos pais muitas vezes é esquecido. Entretanto, morando ou não com a mãe e o bebê, o homem precisa participar nos cuidados com a criança. Além de prover apoio à mãe para que ela possa ser mãe e cuidar de si, os homens devem envolver-se das mais diferentes for- mas no desenvolvimento da criança. Ainda no útero ou nos primeiros dias de vida, os bebês reagem de maneira diferente à voz da mãe e à voz do pai [...] Portanto, as únicas tarefas exclusivas da mãe são a gestação e a amamentação (em ambas o pai pode ajudar). Todas as outras – cuidar, alimentar, limpar, dar banho, levar ao médico, brincar, colocar para dormir, contar histórias, levar à creche ou à escola, passear com a criança – o pai pode desempenhar da mesma maneira que a mãe. O papel do homem é essencial para que a família esteja centrada na criança, colocando os direitos de meninas e meninos no centro de suas decisões e promovendo o crescimento e o desenvolvimento da criança (p.10).

Segundo Staudt e Wagner (2008), "Essa nova expressão do papel masculino aparece como uma das transformações importantes nas relações parentais da família contemporânea, e o exercício da paternidade tem acontecido de maneira cada vez mais participativa" (p. 175 ). Onde este homem toma para si, não somente, a responsabilidade de sustentar a casa economicamente, mas também o exercício direto de atividades que envolvam o afeto e o cuidado com a criança (Sutter & Bucher- Mauschke, 2008).

Ao focarmos o discurso e o papel desse homem no exercício da paternidade, nesse documento, podemos notar diversos fatores que perpassam a subjetividade dos sujeitos envolvidos - nesse contexto, especificamente, o papel do Pai. E considerando que esta subjetividade é constituída e atravessada por esses elementos, dentre eles a linguagem, vê-se a necessidade de explanar quais códigos de conduta estão implícitos nesses documentos e de que maneira eles afetam a conduta desses homens no exercício da paternidade. A leitura do documento permitiu observar a importância que esse documento de domínio público exerce sobre o modus operandi da concepção de Pai, levando-se em consideração que, ao retomar os aspectos históricos da construção da identidade paterna, argumenta-se que esta identidade tradicional foi sendo gradativamente desconstruída e, a partir das novas circunstâncias que estavam emergindo, o fenômeno da paternidade tem sido vivenciado de maneira diferente pelos homens da atualidade (Staudt & Wagner, 2008).

Logo, através dessas novas configurações parentais, é demandada deste pai uma maior participação no cuidado e educação de seus filhos com o intento de estreitar mais a relação Pai-filho (os).

 

O uso da linguagem na construção da subjetividade paterna

A UNICEF disponibiliza, através de seus documentos em versão de relatórios, uma gama de orientações que estabelece um meio pelo qual os cuidadores devem interagir com seus filhos para que os mesmos possam desenvolver-se de modo "saudável", tendo em vista o processo de desenvolvimento biopsicossocial da criança e, também, os níveis educacional e cultural dos sujeitos envolvidos.

A utilização do documento como texto escrito tornado público, enquanto práticas discursivas, "por exemplo, constitui um ato de fala impresso, um elemento de comunicação verbal que provoca discussões ativas: pode ser elogiado, comentado, criticado, pode orientar trabalhos posteriores" (Spink, 2004a, p.47).

A análise das práticas discursivas como linguagem em ação pressupõe a produção de enunciados como eixo norteador da dialogia. O enunciado é uma unidade de comunicação organizada em interação corrente com outros enunciados. Compreende-se aqui o enunciado na lógica de Mikhail Bakthin (1992) como expressão de palavras e sentenças, articuladas por vozes, isto é, diálogos, negociações que se estruturam a partir da comunicação efetivada face a face entre falante e ouvinte disponíveis. A interlocução do enunciado direcionado por vozes também considera os conteúdos denominados de repertórios linguísticos que dependem da relação contextual em que são produzidos.

A noção de repertórios linguísticos de Mary Jane Spink (2004b) possibilita diferenciar os conteúdos e processos. Os repertórios integram as unidades elementares da linguagem e comunicação. Situam a linguagem como uma perspectiva que ultrapassa uma visão estrutural e privilegiam a singularidade e o uso distintos dos contextos na formatação de documentos escritos e formulação de textos que são impregnados por uma gama de relações dialógicas e a presença da polissemia.

Conceber a linguagem em uso, como prática social, proporciona-nos compreender a dinâmica, a produção dos sentidos e o posicionamento assumidos pelas pessoas no contexto social e interacional.

Historicamente, a produção discursiva da inserção e diferenciação do homem e da mulher na sociedade sempre despertou questionamentos sobre a subjetivação e a hierarquização de papéis instituídos socialmente por relações de poder. As posições de sujeito são sempre intercambiáveis. Não existe um lugar fixo de quem "tem o poder". O poder, entendido como ação sobre ação (Dryfus & Rabinow, 2005), permite problematizar esse outro que é sempre alheio a qualquer interesse próprio.

Segundo Coelho e Carloto (2007), a participação do movimento feminista nesse processo tornou-se um fecundo expoente para se discutir as formas de relações de poder entre homens e mulheres e contribuiu para o surgimento de várias formas de questionamentos sobre a masculinidade. A naturalização do que deveriam ser os homens e as mulheres despertou reflexões no campo de estudo de gênero no que concerne à problematização dos saberes médicos, jurídicos, religiosos, etc., divulgados para explicar a diferença entre os sexos. Promoveu maior amplitude para compreender as dinâmicas culturais, biológicas, psíquicas e políticas que envolvem a masculinidade. Em cada situação, há integração e articulação contínua entre pessoas que produzem, reproduzem e negociam relativamente posições de poder, enquanto indivíduos e como representantes de categorias sociais, tais como gênero, idade, classe ou raça, sendo que as relações de poder não estão apenas nos corpos, mas em sua forma de governo de si e do outro e na produção de outros modos de subjetivação.

A emergência de novas organizações e reorganizações dos papéis sociais entre homens e mulheres construídos socialmente, no limiar da realidade atual, produziu novas reflexões sobre o exercício de ser pai e ser mãe, que não atende mais apenas à constituição de uma família tradicional na qual o homem é provedor da família, estruturado no modelo tríade pai-mãe-filho, ou seja, "a família nuclear proposta pelo ideal burguês'', na ótica de Philipe Ariés (1981). A pós-modernidade e a aquisição das inovações tecnológicas, as mudanças de reestruturação produtiva no mercado de trabalho, via globalização, possibilitaram o surgimento de novas configurações familiares como "novos casais, tais como: homossexuais, recasados, sem filhos, com filhos" de acordo com (Beltrame & Bottoli , 2010, p. 206 ).

A ênfase na produção dessas subjetividades potencializou a análise reflexiva sobre as diferenças, as ambiguidades, as incertezas, tensões, complexidades e exigências que se estendem em volta da família e, principalmente, do exercício da paternidade na contemporaneidade.Assim destacamos os seguintes trechos do documento da UNICEF que explicitam nosso posicionamento:

A participação dos pais no pré-natal deve ser estimulada. Eles podem ir às consultas, participar das orientações sobre o parto e o nascimento. Mesmo quando são pais adolescentes, eles podem ser envolvidos desde o processo da gestação, para que se reforce sua ligação com a criança desde o princípio. E os pais podem e devem participar na hora do parto [...] Quando está envolvido com o desenvolvimento da criança, o pai passa a ser mais cuidadoso consigo mesmo, cuida mais de sua própria saúde (pp.9- 10).

Nessa tarefa de brincar, o envolvimento do pai é fundamental, uma vez que as pesquisas apontam para a diferença dos estímulos que homens e mulheres despertam nas crianças. Parece haver uma tendência universal para que as mulheres sejam mais protetoras e os homens, mais fisicamente ativos com as crianças. As mulheres tendem a deixar as crianças liderarem a interação, enquanto os homens lideram mais suas atividades com as crianças (p.15).

Ligada à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Pastoral da Criança promove ações de melhoria da saúde das crianças e suas mães, orienta os homens sobre o papel do pai no desenvolvimento da criança, distribui a multimistura (uma opção barata e eficaz de combate à desnutrição), alfabetiza homens e mulheres, mantém brinquedotecas e apóia ações de geração de renda para famílias pobres (p.31).

É possível verificar a inserção e formatação de práticas de individualização que compõem a constituição da subjetividade paterna e que são dirimidas para afetar a maneira como "homem-pai" deve agir para que as crianças tenham um bom "desenvolvimento".

Para Molon (2011), a subjetividade é compreendida das mais diversas maneiras, ora relativa ao mundo privado como uma instância intrapsíquica, formada por estruturas fixas ou dinâmicas, ora constituída direta ou indiretamente pelas influências do espaço público, através das interações entre sujeito e o meio no qual está inserido – sendo este meio atravessado por cruzamentos de fluxos linguísticos e agenciamentos sociais – por conseguinte, está subordinado às condições sociais, históricas, linguísticas e psicológicas.

A subjetividade está em constante mobilidade, sendo transpassada por diversos fatores internos e/ou externos, que a modificam e a reconstroem a todo o momento. Assim, notamos um processo múltiplo e contínuo de reconfigurações que contribuem para a criação, a todo o momento, na produção de sentidos que serão atribuídos à realidade.

De acordo com Rosa et al. (2006), os sentidos não somente são descobertos inseridos nas palavras como mensagens a serem codificadas, mas apresentam uma estreita relação com o contexto ao seu redor, com as condições nas quais são produzidos e, mais ainda, refletem algo que não foi explicitamente dito ou que se encontra na "periferia" do conteúdo central.

Os autores acima supracitados, com base nos argumentos de Spink e Medrado (2004a) apontam que o sentido pode ser compreendido como uma construção social, com a participação coletiva, quando seus membros interatuam dinamicamente através de relações sócias, historicamente datadas e culturalmente localizadas; elaborando um conjunto de conteúdos com base na compreensão e ações envolvidas em situações e fenômenos adjacentes.

Sobre o sentido, Molon (2011) argumenta que necessitam ser construídos, arraigados, desenvolvidos, incorporados e associados ao contexto no qual se dão essas relações e práticas sociais; onde elas são tecidas e entrelaçadas, pois o sentido das palavras se modifica em determinados contextos; porém, os sentidos são materializados e visualizados à medida que a comunicação se estabelece entre os sujeitos envolvidos. O autor ainda discute sobre o sentido da palavra, relacionando-o à:

riqueza das experiências sociais e históricas que conformam as consciências e aquilo que pode ser expresso por uma determinada palavra. O significado de uma palavra é mais estável e preciso, enquanto o sentido é inesgotável. A palavra é polissêmica e fonte inesgotável de novos sentidos. A modificação do sentido de uma palavra depende tanto das situações quanto dos sujeitos que o atribuem, por isso ele é considerado quase ilimitado; porém os processos de significação são produzidos e apropriados nas relações sociais, em determinadas condições históricas (p. 618).

Ao considerarmos esse processo de produção de sentidos que envolvem e condensam todas as suas manifestações, expressões, sentimentos e emoções; portanto, todo um conjunto de ideias que influenciará o modo de agir e comportar-se desse sujeito (nesse caso, em particular, o pai), podemos avaliar com maior acuidade o material fornecido pela UNICEF, utilizando a linguagem como ferramenta para ampliar nossos olhares sobre esses documentos e retirar deles os seus mais diversos entendimentos.

A participação do pai no desenvolvimento da criança definida pelo documento da UNICEF (2001) sugere modificações nas posições dos pais e das crianças na esfera familiar, além de provocar alterações na relação de trabalho e na produção das masculinidades em movimento. O discurso do homem-pai convocado para assumir uma participação ativa junto aos filhos (as) é legitimado pelos especialistas e saberes de ordem biológica, médico, social, psicológica e educacional como medida de prevenção e manutenção do desenvolvimento infantil.

Os sujeitos passam a gerar novos regimes de pessoalidades para integrar práticas, instituições, dispositivos diferenciados de modos de subjetivação que gradativamente vão ocupando lugar e posicionamentos nos processos sociais instituídos. O problema não é apenas conhecer o caminho das continuidades e sua formulação de fundamentos, mas apreender suas transformações e renovações; considerar as descontinuidades dos discursos e avaliar o contexto histórico no qual determinado documento foi produzido e investigar o universo sócio-político da produção discursiva de enunciados e a relação de interlocutores inseridos no contexto e nas formas de subjetivação dos sujeitos.

Discutir as condições de emergência e desdobramentos da constituição da subjetividade paterna nos remete a questionamentos, desnaturalização de significados e a posições engendradas de forma hegemônica na regulamentação do corpo social.

O discurso potencializa a formação de identidades no âmbito dos agrupamentos coletivos e da experiência e vivência subjetiva do homem. A compreensão da paternidade priorizada na contemporaneidade nas atividades sociais serve como parâmetro para se analisar o papel de pai em diferentes organizações familiares e como experiência humana consolidada a partir de uma construção histórica e cultural, que se transforma no universo distinto das temporalidades.

Pensar os modelos preexistentes de pai e suas configurações simbólicas, no contexto interacional, também pode levar ao redimensionamento e valorização da afetividade como aspecto significativo na construção da paternidade e na formação da individualidade masculina.

 

Considerações Finais

A utilização de documentos como fontes de pesquisa é relevante expoente para compreender, em termos teóricos e interacionais, a produção de subjetividades endereçadas a determinados ordenamentos e regulação social dos sujeitos nas atividades sociais, uma vez que o agenciamento dos atores sociais não se dá de forma isolada, mas integra a multiplicidade de interesses, responsabilidades, categorias, estratégias, saberes e fazeres presentes na dinâmica política da sociedade.

Interessou-nos, sobretudo, a partir da ótica de diversos autores, em especial Foucalt e Mary Jane Spink, avaliar os relatórios da UNICEF para compreender as percepções do cuidado masculino com seus filhos, considerando as transformações ocorridas por este Homem/pai no decorrer da história. Portanto, observamos, por meio da literatura consultada, que este papel exercido pelo masculino veio aos poucos sendo modificado devido às mudanças sóciohistóricas que influenciaram, tanto o papel do masculino, quanto do feminino, contribuindo, assim, para um novo olhar sobre gênero; e, desse modo, para atribuir novas funções que "deverão" ser desempenhadas por esses sujeitos.

Por fim, a partir do entendimento sobre masculinidade, subjetividade, linguagem e outros tópicos explorados por nós, pudemos apreender de modo mais profícuo como se dão as relações existentes entre o papel desse homem, como pai, e as instituições envolvidas, abrindo espaço para novos estudos que envolvam pesquisas acuradas sobre os temas estudados, além da criação de políticas voltadas para uma maior compreensão dos sujeitos, os quais são foco de proteção, atenção e cuidado de algumas instituições governamentais.

 

Referências

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Recebido em: 14/06/2012
Aceito em : 24/11/2012

 

 

1.O higienismo, segundo Lúcia Cecília da Silva (2003), é uma herança da medicina social que se apropriou de diversas áreas de saberes, inclusive da psicologia, mostrando que houve trocas entre estes discursos. "(...) o Higienismo revestia-se de ciência social integrando a Medicina, a Psicologia, a Estatística, a Geografia, a Demografia, a Topografia" (p.138). A prática higienista deu novo impulso ao processo de normalização e disciplinarização da sociedade, gerando uma nova ordem discursiva de poder-saber que desqualifica uns como loucos, anormais, degenerados. Podemos afirmar que o higienismo se destaca a partir do aparecimento da população como problema político (Foucault, 1979), enfatizando uma profilaxia social.