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Revista do NUFEN

versão On-line ISSN 2175-2591

Rev. NUFEN vol.9 no.1 Belém jan. 2017

 

Editorial

 

 

Linguagens para facilitar a expressão e a comunicação entre terapeuta e cliente

 

 

Adelma Pimentel; Lucivaldo Araújo; Tommy Akira Gotto; Marciana Farinha

 

No horizonte da clínica fenomenológica existencial hermenêutica, os profissionais que atuam no contexto privado, no universo público da saúde mental, nas unidades básicas de saúde (UBS), núcleos de apoio à saúde da família (NASF), centros de atenção psicossocial (CAPS), na escola, em instituições militares etc, podem dispor de várias linguagens artísticas para facilitar a expressão e a comunicação entre terapeuta e cliente.

A arte, especialmente por meio do teatro e do desenho, é temática central deste volume. É também um extraordinário mecanismo para apreender e transmitir o modo como os fenômenos mundanos nos afetam e para desconstruir as percepções que os “naturalizam”. No Brasil, destaca-se a contribuição do trabalho de Nise da Silveira, psiquiatra que criou o Museu de Imagens do Inconsciente, uma referência atemporal para o uso de vários recursos terapêuticos ligados às múltiplas formas de manifestação artística nos contextos de cuidado à pessoa em sofrimento mental.

As linguagens artísticas desenvolvidas por Psicólogos, Psiquiatras, Terapeutas Ocupacionais e pesquisadores de inúmeros campos de conhecimento, contribuem para o avanço da clínica da saúde humana, da percepção e da imaginação; e para que os clientes ampliem a capacidade criativa e crítica, tendo em consequência a redução do sofrimento humano.

No âmbito antropológico e sociopolítico apresentamos elementos para o debate sobre a iniciação religiosa de crianças, um tema que requer mais focalizações devido aos estereótipos que cercam as representações sobre a infância. É outra linguagem importante neste volume, juntamente com o ponto de vista sobre os modos de “produção das crianças anormais” e as práticas de patologização e medicalização dos comportamentos infantis.

A linguagem da psicologia ambiental empregada no contexto de uma comunidade terapêutica foi explorada na realização da Oficina Temática “Capacitar para Reciclar”. A linguagem experimental do Teatro Dadivoso apresenta-se como uma potência poética e como espaço de encenação, já que se desloca para as casas, o espaço de intimidade das pessoas para instaurar vibrações, intensidades, escolhas e cura. Temos, ainda, análise dos costumes que configuram o trabalho de homens que exercem a função de bombeiros, outra linguagem no volume. A apreciação ressalta e comunica a importância da escuta clínica como método que permite desvelar os sentidos vividos do trabalho.

Para enriquecer a compreensão hermenêutica da psicanálise, um dos textos se vale da obra de Paul Ricoeur. Nele afirma-se que não existe compreensão e interpretação sem mediação, uma condição para proceder a uma interpretação. Assim, uma das funções da psicanálise é desvendar o significado de sentidos ocultos através da linguagem e da escrita. É uma contribuição de além-mar, de nossos colegas pesquisadores portugueses.

É digno de nota ainda, o modo como as autoras e os autores compuseram seus textos neste volume. Há ricos relatos de pesquisa e de intervenção clínica e artística que são apresentados em estruturas narrativas onde predominam diferentes estilos linguísticos e influências epistemológicas que não só diversificam, como também enriquecem o modo como o conhecimento científico é produzido e compartilhado.

Alguns textos utilizam linguagem poética e fluida. Expressam o movimento de autoras e autores que se colocam na contramão dos sistemas conceituais totalizadores e, portanto, a linguagem poética que utilizam não intenta significar, mas, como aponta o escritor francês Yves Bonnefoy, deixar as palavras cheias de intensidade e de poder designar coisas fundamentais na nossa relação conosco ou com os outros aqui e agora.

Convidamos os leitores a adentrar neste volume composto como uma artesania do cuidado. Os textos apresentados podem ajudar os leitores a elaborar projetos de escape às modelizações opressoras da saúde mental.

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