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Revista do NUFEN

versão On-line ISSN 2175-2591

Rev. NUFEN vol.9 no.3 Belém  2017

http://dx.doi.org/10.26823/RevistadoNUFEN.vol09.n03artigo11 

Artigo

DOI: 10.26823/RevistadoNUFEN.vol09.n03artigo11

 

Influências humanistas na produção de conhecimento psicológico da Pontifícia Universidade Católica - Campinas

 

Humanistic influences on the psychological knowledge production at Pontifical Catholic University Campinas

 

Influencias humanistas en la producción de conocimiento psicológico de la Pontificia Universidad Católica Campinas

 

 

Paulo Coelho Castelo Branco; Heitor Blesa Farias; Laryssa Soares Leite

Universidade Federal da Bahia

 

 


RESUMO

Objetivamos analisar a produção científica relacionada às Psicologias Humanista, Fenomenológica e Existencial na Pontifícia Universidade Católica - Campinas. Argumenta-se que essa instituição tem uma tradição histórica no desenvolvimento dessas perspectivas no Brasil. Por isso, definiu-se o Banco de Dissertações e Teses do Programa de Pós-Graduação dessa Universidade e o seu periódico, Revista Estudos de Psicologia (Campinas), como objetos de revisão sistemática. Foram categorizados e analisados 38 produções de Mestrado e Doutorado e 40 artigos, no período de 1997-2016. Os resultados sugerem que essas bases de dados são representativas ao estudo do perfil das produções naquela Universidade. As duas bases, por um lado, evidenciam uma tendência para enfoques em discussões clínicas; por outro, distinguem-se entre a predominância de produções empíricas, nas dissertações e teses, e produções teóricas, nos artigos. Considera-se, finalmente, a possibilidade realizar outras pesquisas que investiguem as diferentes manifestações institucionais acadêmicas da Psicologia Humanista, Fenomenológica e Existencial no Brasil.

Palavras-chave: Psicologia Humanista; Revisão de Literatura; Pós-Graduação.


ABSTRACT

We aim to analyze the scientific production on Humanistic, Phenomenological and Existential Psychologies at Pontifical Catholic University of Campinas. It's argued that this institution has an historical tradition in these perspectives in Brazil. Thus, Post-Graduation Program's Bank of Dissertations and Thesis and its periodical, Psychological Studies (Campinas), were defined as objects of systematic review. Thirty eight Masters and Doctorate productions and forty articles from 1997 to 2016 were categorized and analyzed. The results suggest that these data bases are representative to the study of the productions profile at University. The two bases, on one side, point to a tendency to focus on clinical discussions; on the other side, they distinguish from each other in predominance of empirical productions in dissertations and thesis, and theoretical productions in papers. Finally, the possibility of new researches which assess the different institutional academic manifestations of Humanistic, Phenomenological and Existential Psychologies in Brazil is considered.

Keywords: Humanistic Psychology; Literature Review; Postgraduated Training.


RESUMEN

Analizamos la producción sobre las Psicologías Humanística, Fenomenológica y Existencial de la Pontificia Universidad Católica - Campinas. Esta tiene una tradición en el desarrollo de la Psicología Humanista brasileña. Definimos el Banco de disertaciones y tesis del programa de postgrado de esta Universidad y su revista, Revista Estudios de Psicología (Campinas), como objetos de revisión sistemática. Fueron clasificados 35 producciones de Doctorado y Maestría y 40 artículos en 1997-2016. Los resultados sugieren que estas bases de datos son un perfil representativo del estudio de las producciones humanísticas en esta universidad. Las dos bases muestran una tendencia con enfoques en discusiones clínicas; pero se distinguen desde el predominio de producciones empíricas, en las disertaciones y tesis, y producciones teóricas de artículos. Se considera, por último, la posibilidad de llevar a cabo más investigaciones para averiguar las diferentes manifestaciones institucionales académicas de las Psicologías Humanística, Fenomenológica y Existencial en Brasil.

Palabras-clave: Psicología Humanista; Revisión de Literatura; Posgrado


 

 

INTRODUÇÃO

A Psicologia Humanista é uma perspectiva de Ciência composta por variadas abordagens que compartilham uma visão positiva dos potenciais humanos e dos seus aspectos inter-relacionais. Cabe destacar individuais e grupais, além de desenvolver um escopo de pesquisas empíricas sobre a experiência humana (Moss, 2001).

No cenário brasileiro muitas abordagens consideradas humanistas desenvolveram-se a partir da década de 1940, havendo minutas históricas da recepção das ideias de Rogers, Perls e Frankl em diversas regiões, em razão do retorno de alguns psicólogos que foram estudar, nos EUA, com alguns expoentes e colaboradores de cada vertente. Além disso, o movimento humanista nacional se consolidou com a vinda de alguns autores humanistas – como Rogers, Giorgi, May e Frankl – para ministrar cursos, palestras e workshops (Gomes, Holanda & Gauer, 2004). Tais acontecimentos ocasionaram um contexto formativo propício à propagação e o desenvolvimento dos ideais humanistas no Brasil, seja pelo circuito acadêmico-universitário seja pelos centros de formação extrauniversitários.

Em distinção a Psicologia Humanista estadunidense, percebemos que no Brasil existe a filiação de algumas outras abordagens de influências fenomenológicas e existenciais, entendidas como humanistas – por exemplo, destacamos o Psicodrama e a Daseinanálise. Com efeito, no Brasil, os aportes da Fenomenologia e do Existencialismo parecem ser o denominador, frequentemente, comum que suscita a comunhão das distintas abordagens consideradas humanistas (Holanda, 2014), congregando-as em um espaço de ensino e desenvolvimento daquele conhecimento psicológico não situado nos campos psicanalíticos, comportamentais e cognitivistas. Destarte, as abordagens humanistas, não raro, são articuladas e pensadas em relação à Fenomenologia e ao Existencialismo, sendo vias para o aprendizado dessas filosofias e para o desenvolvimento de outras psicologias entendidas como fenomenológicas e existenciais (Goto, 2008).

Com efeito, após esse breve panorama, convém situar que existem alguns espaços de formação e circulação de conhecimento que retratam o movimento da Psicologia Humanista brasileira. Existe, pois, uma variedade de produções científicas dispersas em diferentes fontes aguardando o trabalho de revisões metódicas que organizem e explicitem o status corrente dos conhecimentos humanísticos pátrios. Identificamos, recentemente, alguns trabalhos de revisão de literatura no cenário nacional que apontaram a predominância dos aportes fenomenológicos e existenciais no Plantão Psicológico (Souza & Souza, 2011; Scorsolini-Comin, 2015) e no Aconselhamento Psicológico (Scorsolini- Comin & Santos, 2013), além haver um mapeamento das contribuições do método fenomenológico empírico para os estudos em Psicologia no Brasil (Moreira & Souza, 2016). No que concerne ao levantamento de trabalhos nacionais vinculados a algumas abordagens humanistas, existem revisões sobre a produção da ACP (Tassinari & Portela, 2002; Castelo- Branco, 2015), da Gestalt-Terapia (Holanda & Karwowski, 2004; Holanda, 2009) da Logoterapia (Véras & Rocha, 2014) e do Psicodrama (Castelo-Branco, Farias, Carpes & Leite, 2015). Em uma perspectiva que revisa os estudos publicados somente em um periódico, apontamos outros que esse campo de Ciência não reconheceu um criador específico, a despeito de situar Maslow como o seu maior idealizador e organizador. Fundada oficialmente em 1961, a Psicologia Humanista é caracterizada como uma congregação de psicólogos que desenvolveram diversas perspectivas de intervenções

Trabalhos que analisaram as produções humanistas em uma extinta revista (Sacomano & Faria, 2014; Sacomano, Faria & Ferrete, 2016) e as discussões fenomenológicas publicadas em um periódico, ainda, em circulação (Castelo-Branco & Andrade, 2011).

Inspirado pelos estudos citados anteriormente e com o intuito de somar contribuições ao exame da Psicologia Humanista nacional, considerando os seus afluentes fenomenológicos e existenciais de fazer pesquisa e propor intervenções terapêuticas, este trabalho objetiva analisar as produções humanistas, fenomenológicas e existenciais disponíveis no Banco de Dissertações e Teses do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica – Campinas (PUC-Campinas) e no seuperiódico acadêmico, Estudos de Psicologia (Campinas). Elegemos esse espaço de produção de conhecimento mediante o argumento de que ele é uma instituição brasileira com tradição histórica na formação de psicólogos-pesquisadores com vertentes humanistas e que o seu periódico possibilita uma circulação de variadas produções de bases humanísticas, fenomenológicas e existenciais.

Convém ressaltar que, em 1976, Joel Martins, um dos pioneiros da Fenomenologia no Brasil, foi colaborador da Universidade de Campinas (UNICAMP), tornando-se professor emérito desta instituição ao orientar diversas dissertações e teses na área educacional. Nessa região, Martins estabeleceu parcerias com Maria Bicudo, no desenvolvimento de metodologias qualitativas de pesquisa com base fenomenológica (Lima, 2005). Ainda na Faculdade de Educação da UNICAMP, destaca-se a figura de Miguel de la Puente, propagador das teorias educacionais de Rogers e das contribuições de Gendlin. De la Puente foi, também, professor do curso de Mestrado em Psicologia Clínica da PUCCampinas Assim, desde os anos de 1970, a região campinense respirava fenomenologia e humanismo. Ressaltamos que essa tradição, na PUC-Campinas, intensificou-se com John Wood, colaborador de Rogers que estabeleceu residência no Brasil e docência na PUCCampinas, vinculando-se ao Programa de Pós-Graduação em Psicologia, entre 1985 e 1990 (Moreira, Landim & Romcy, 2014). Além de Wood, destacamos a docência de Mauro Amatuzzi, reconhecido expoente humanista nacional que lecionou de 1991 até o início da década vigente.

O mencionado programa conta com um Mestrado, criado no final da década de 1970, e um Doutorado, instituído em 1995, que formou dezenas de mestres e doutores com interface humanista. Atualmente, o programa segue com a tradição humanística, pois tem, em sua estrutura curricular, uma disciplina eletiva intitulada Humanismo em Psicologia Clínica e conta com um grupo de pesquisa de inspiração fenomenológica (Pontifícia Universidade Católica de Campinas, 2017). Em relação à Revista Estudos de Psicologia (Campinas) (2017), a despeito de sua orientação editorial focada para publicar trabalhos em geral, sem uma abordagem específica, argumentamos que há um panorama de publicações humanistas, considerando a abertura institucional para divulgar artigos nessa perspectiva.

Esses fatores, segundo o nosso entendimento, tornam o Programa de Pós- Graduação em Psicologia da PUC-Campinas e o seu periódico nossos objetos de estudo para investigar a manifestação da Psicologia Humanista brasileira em um espaço acadêmico, com lugar histórico no cenário nacional de produção, formação e circulação de conhecimento humanístico.

 

MÉTODO

Trata-se de uma revisão sistemática de literatura, inspirada pelos aportes de Costa e Zoltowski (2014), que busca organizar e agrupar os dados concernentes às produções humanistas que circulam na PUC-Campinas. A revisão de literatura é uma estratégia metodológica que, em suma, aponta para um trabalho descritivo e analítico do material analisado nessas duas bases de dados. Os procedimentos empregados foram: identificação do tema e questão norteadora; estabelecimento de critérios de inclusão; organização e tabulação do material coletado, feita por três juízes independentes; categorização dos estudos; e síntese do conhecimento obtido.

A questão norteadora que conduziu a pesquisa em todos os seus momentos foi: como se configura o conhecimento sobre a Psicologia Humanista, Fenomenológica e Existencial produzido no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUC-Campinas e na Revista Estudos de Psicologia (Campinas)? As bases de dados consultadas foram, respectivamente, o Banco de Dissertações e Teses do mencionado Programa e o site da Revista Estudos de Psicologia (Campinas), sediado na plataforma do Scientific Electronic Library Online (SciELO). Nas duas bases estabelecemos como critério de inclusão, dissertações, teses e artigos que abordaram qualquer discussão teórica ou prática de cunho humanista, fenomenológico e existencial, bem como utilizaram qualquer procedimento de pesquisa sob esses vieses. Para tanto, buscamos identificar, utilizando uma leitura seletiva, esse perfil nos títulos, resumos e palavras-chave de cada material bibliográfico, independente da área de conhecimento em que ele foi produzido. Foram descartadosexcluídos aqueles trabalhos que não se aproximavam da Psicologia Humanista e os artigos repetidos foram contabilizados somente uma vez. O levantamento e a análise do material bibliográfico ocorreram durante os meses de outubro e dezembro de 2016.

Foram aplicados os seguintes descritores, disponíveis no índice de assuntos da Revista Estudos de Psicologia (Campinas): psicologia humanista, psicologia humanística, humanismo, humanista, humanística, humanistic psychotherapy, humanistic theory, fenomenologia, fenomenologia mundana, fenomenológica, fenomenológico, psicologia fenomenológica, análise fenomenológica, pesquisa fenomenológica, psicopatologia fenômeno-estrutural, experiência, experiência vivida, existência, Carl Rogers, abordagem centrada na pessoa, terapia centrada no cliente, Gestalt, Gestalt-terapia, Gestalt-therapy, psicodrama, psicodrama infantil. Ressaltamos que esses termos não foram combinados e não foram encontrados descritores relacionados à Deseinanálise, Logoterapia e Psicologia Existencial. O período compreendido na coleta foi de 1997, ano em que a revista iniciou a virtualização dos artigos publicados, até 2016. Consideramos, pois, o mencionado período representativo para fazer inferências sobre os tipos de produções humanistas na PUCCampinas.

No Banco de Dissertações e Teses do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da PUC-Campinas, buscamos os mesmos descritores mencionados anteriormente. Analisamos individualmente todos os trabalhos situados de 1997, ano em que começou registro institucional, até 2016. Expressamos na Figura 1, em seguida, o fluxograma de nossa estratégia de compilação de dados.

 

 

 

Os trabalhos recuperados como dados finais, em cada base de dados, foram catalogados e analisados. No que concerne ao Banco de Dissertações e Teses, os escritos foram categorizados em tabelas conforme o ano, nível de trabalho (Mestrado ou Doutorado), tipo (teórico ou empírico) e área de conhecimento. Nos artigos compilados na Revista Estudos de Psicologia (Campinas), as tabelas geradas foram categorizadas em ano, tipo (teórico ou empírico), autores, filiação institucional e área de conhecimento. Em caso de dúvidas na tabulação, houve ponderação e consenso entre os pesquisadores.

Embora tenhamos avaliado a possibilidade de dividir este trabalho em dois estudos distintos para cada base de dados, optamos por não seguir essa proposta, em razão de consideramos que a nossa visada objetivou adentrar o caráter global das produções humanistas na PUC-Campinas. Essa organização facilitou, portanto, a visualização das principais características do conhecimento humanístico recuperado nos meios de circulação acadêmica dessa instituição e possibilitou a elaboração de algumas análises sobre ela.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Análise do Banco de Dissertações e Teses da PUC-Campinas

Como já foi apontado, na Figura 1, o Banco de Dissertações e Teses da PUCCampinas, no período de 1997-2015, conta o total de 335 trabalhos. Destes escritos, analisamos, segundo os critérios inclusivos da pesquisa, 38 produções humanistas, conforme podemos visualizar, a seguir, na Tabela 1.

 

 

Os dados quantificados indicaram maior produção de dissertações (n=25) do que teses (n=13). No Mestrado a concentração de produções ocorreu no ano de 2008 (n=5); no Doutorado aconteceu em 2006 (n=3). Percebemos uma falta de estabilidade de produções nos anos de 1997 até 2003, algo que, posteriormente, firmou-se de 2004 até 2013. O ano de 2014 não apresentou defesas de dissertações e teses humanistas, fenomenológicas e existenciais. O ano de 2008, destarte, foi o mais profícuo em termos de defesas de dissertações e teses, reunindo 15,80% do total de produções no Programa de Pós-Graduação da PUC-Campinas.

Com a finalidade de analisar os tipos das produções tabuladas, constatamos a existência de 37 trabalhos empíricos e somente 1 teórico, indicando que o Programa demonstra uma orientação hegemonicamente empírica em suas pesquisas. Em análise minuciosa sobre o caráter dessas produções empíricas, observamos que 33 delas exprimem uma orientação fenomenológica na condução da análise dos seus dados. Entendemos que esses dados ratificam uma tendência, também, observada na Psicologia Humanista estadunidense (Wertz, 2001), no que concerne ao uso de metodologias fenomenológicas para legitimar um lugar de empiria à Ciência humanista. Essa tradição de pesquisa circulou na região de Campinas, seja pelos estudos de Joel Martins e Maria Bicudo (influentes na Universidade de Campinas) seja pelas investigações de Mauro Amatuzzi, na PUCCampinas. Com efeito, criou-se um contexto propício ao emprego da perspectiva fenomenológica em pesquisas de orientação humanistas.

Outra constatação, pertinente à análise, refere-se à distribuição das áreas de conhecimento abordadas pelas 38 produções catalogadas, segundo observamos na Tabela 2 exposta em seguida.

 

 

Notamos, com base na Tabela 2, que a área Clínica é a mais versada nas produções humanistas analisadas, recebendo o destaque de registrar 28,95%, praticamente mais de ¼ das pesquisas humanistas realizadas na PUC-Campinas. Consoante ao que foi apresentado na Introdução, essa instituição tem uma disciplina de pós-graduação que relaciona o Humanismo à Clínica, além de contar, também, com disciplinas humanistas teóricas e de supervisão de estágios básicos e específicos em Saúde/Clínica, conforme verificamos no ementário disponível na instituição. O viés clínico-humanista da PUCCampinas, segundo ajuizamos, advém da tradição presente na fundação da Psicologia Humanista, que congregou diversas abordagens de procedência Clínica, como, por exemplo, a Abordagem Centrada na Pessoa e a Gestalt-Terapia (Moss, 2001). A despeito disso, as áreas da Saúde (n=7; 18,42%) e Hospitalar (n=4; 10,53%), merecem destaque como índices importantes às produções ora minutadas, considerando-se a inserção nacional da Psicologia nas Políticas Públicas de Saúde (Ferreira-Neto, 2011). Verificamos, ainda na Tabela 2, uma heterogeneidade de discussões humanistas voltadas para diversas áreas.

Os dados analisados demonstram, portanto, que existe uma preocupação do Programa de Graduação e Pós-Graduação da PUC-Campinas em formar psicólogos humanistas aptos para atuar em dispositivos clínicos e de saúde, além de pesquisar as interfaces humanistas possíveis de serem realizadas neles. Conquanto essa instituição incorpore a tradição humanista-clínica, ela a atualiza segundo as contendas dispostas na articulação da Psicologia com o campo da Saúde.

Análise da revista estudos de psicologia (Campinas)

No que concerne à análise das produções humanistas publicadas na Revista Estudos de Psicologia (Campinas) (N=31), organizamos a distribuição dos artigos na Tabela 3.

 

 

De um modo geral, os dados aqui exibidos expressam que as produções humanistas, fenomenológicas e existenciais tiveram o seu auge em 2016 (n=9), no decorrer dos quatro números no volume 33 da Revista Estudos de Psicologia (Campinas). Em especial, o terceiro número desse volume, apresenta uma seção temática intitulada Psicologia e Fenomenologia: um campo de interlocuções em processo constante de transformação, que contém seis artigos. Esse título sugestivo, segundo Cury (2016), decorre de uma recente consolidação de estudos e pesquisadores brasileiros vinculados ao referencial fenomenológico. A autora, que exerce docência na PUC-Campinas e organizou essa seção, infere tal tendência pela minuta de Grupos de Pesquisas registrados no CNPq (cerca de 50), pelas predileções do que 577 pesquisadores, que notificaram na Plataforma Lattes suas predileções humanísticas e fenomenológicas, e pela criação, em 2014, do Grupo de Trabalho Psicologia e Fenomenologia na Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Psicologia (ANPEPP). Dos 179 artigos publicados na Revista Estudos de Psicologia (Campinas), 40 são vinculados ao referencial humanista, fenomenológico e existencial, ou seja, 22,34% do que foi produzido entre 1997-2016. Um dado representativo, considerando o foco editorial geral da Revista. Com efeito, esta possibilita um alento para o que é produzido nesse movimento que se consolida no Brasil.

Em relação ao tipo de artigos publicados no período examinado, constatamos a produção de 28 opúsculos teóricos e 12 empíricos, ou seja, as produções teóricas (70,00%) sobrepõem às empíricas (30,00%). Inferimos, segundo observamos nos resumos, que essa sobreposição demonstra a preocupação de abalizar desenvolvimentos teóricos que (re)pensem a Psicologia Humanista brasileira em suas relações com a Fenomenologia.

Historicamente, no Brasil, as visitas de alguns psicólogos-expoentes humanistas, sobretudo "centrados na pessoa" e "gestalt-terapeutas"1, nas décadas de 1970-1980, foram marcadas por diversas ênfases vivenciais na demonstração de suas práticas interventivasrelacionais (Gomes et al., 2004; Prestelo, 2012). Conquanto tais abordagens apresentassem um escopo de fundamentação teórica de suas práticas, a tradição humanista de elaboração de conhecimento com base no contato direto da experiência na relação terapêutica marcaram o aprendizado e formação de uma geração de humanistas brasileiros. Contudo, da década de 1990 até então, observamos um movimento de retomada, assunção e desenvolvimento teórico das abordagens humanistas no Brasil, demonstrando uma preocupação em descontruir qualquer entendimento de que tais práticas sejam a-teóricas ou destituídas de complexidade teóricas (Tassinari & Portela, 2002; Holanda, 2009). Destarte, os dados apresentados no parágrafo anterior se inserem no aludido movimento nacional.

Ao redistribuir os artigos tabulados pela área de discussão, obtivemos uma predominância nos Fundamentos Epistemológicos, Históricos e Filosóficos (n=20; 50,00%), seguida da Clínica (n=12; 30,00%). Estas foram sucedidas, com discrepância, nas áreas da Psicologia e Religião (n=2; 5,00%), Psicologia e Saúde (n=1; 2,50%), Psicologia Hospitalar (n=3; 7,50%), Semiótica (n=1; 2,50%) e Psicologia Organizacional (n=1; 2,50%). Com efeito, observamos que as áreas predominantes expressam o que já argumentamos em relação à tradição clínica presente na Psicologia Humanista e ao movimento brasileiro de busca por consistência teórica no conhecimento humanístico, fenomenológico e existencial.

Quanto ao total de autores que produziram artigos relacionados ao campo da Psicologia Humanista na Revista (N=75), apontamos os nomes de Mauro Amatuzzi (n=5), Adriano Holanda (n=4) e Virgínia Moreira (n=4) como os mais frequentes no período compreendido, seguidos de William Gomes (n=2), Emanuel Vieira (n=2), Maria Marchi (n=2), Vera Cury (n=2), Manoel Antônio dos Santos (n=2) e Anna Elisa de Villemor-Amaral (n=2). Os demais autores (n=50) publicaram somente um artigo no periódico analisado. Ressaltamos que Mauro Amatuzzi e Virgínia Moreira foram mencionados como os psicólogos humanistas mais influentes, em termos de publicações sobre a ACP, na década de 1990 (Gomes et al., 2004). Além disso, segundo a pesquisa de DeCastro e Gomes (2011), Amatuzzi e Moreira, somados a William Gomes, figuram como os autores mais produtivos em pesquisas fenomenológicas empíricas publicadas em periódicos brasileiros, entre 1997-2007 Nesse panorama, ainda conforme DeCastro e Gomes (2011), a Revista Estudos de Psicologia (Campinas), também, figura como um dos periódicos nacionais mais representativos a circulação do método fenomenológico empírico. Em função dos autores que publicaram na Revista Estudos de Psicologia (Campinas), compilamos as diversas filiações institucionais deles, a seguir, na Tabela 4.

 

 

Verificamos que a PUC-Campinas foi à filiação mais disseminada entre os autores que publicaram no periódico (n=17), havendo, pois, uma diferença considerável de frequências de publicações entre essa instituição e as demais tabuladas. A PUC-Campinas filiou pouco mais que o dobro de autores em relação à Universidade de Fortaleza (UNIFOR), outra instituição com histórico representativo ao cenário humanista nacional, e a Universidade de São Paulo – Ribeirão Preto. Inferimos que essa predominância de publicações ocorra em razão do periódico ser vinculado ao Programa de Pós-Graduação da PUC-Campinas, o que possibilita maior circulação do conhecimento humanístico produzido nesse local. Com efeito, periódico e Programa se relacionam e influenciam-se nesse quesito.

Diante do exposto, em suma, entendemos que existe um considerável panorama de produções humanistas na Revista Estudos de Psicologia (Campinas), a despeito desta não possuir uma orientação editorial específica para publicar trabalhos de vertentes humanistas, fenomenológicas e existenciais, como, por exemplo, a Revista da Abordagem Gestáltica – Phenomenological Studies e a Revista do NUFEN – Phenomenology and Interdisciplinarity. Possivelmente, esse atributo se relaciona à herança humanista presente na PUC-Campinas. As produções humanistas do periódico analisado têm como característica um notório direcionamento para artigos de cunho teórico que abordam discussões clínicas; e uma preocupação em aventar os fundamentos epistemológicos, históricos e filosóficos da Psicologia Humanista e suas abordagens psicoterapêuticas e de pesquisa. Com efeito, o periódico se configura como um espaço de circulação científica do humanismo brasileiro.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No transcurso do que foi apresentado conforme a revisão das produções humanistas, fenomenológicas e existenciais dispostas no Banco de Dissertações e Teses da PUC-Campinas e no seu periódico, Estudos de Psicologia (Campinas), nos anos de 1997 a 2016, observamos que essas duas organizações de Ciência se complementam e possibilitam a circulação de variadas publicações que contribuem para disseminar a Psicologia Humanista no Brasil. Certamente os resultados dessa pesquisa devem ser considerados com cautela, dada à natureza diversa de suas bases de dados, que a despeito disso são mecanismos de propagação do conhecimento psicológico, seja ele humanista ou não.

Em resposta à pergunta norteadora, indicada no método, entendemos que o conhecimento humanístico, fenomenológico e existencial da PUC-Campinas, nas duas bases analisadas, configura-se a partir de uma tendência para discussões clínicas; entretanto, elas se distinguem entre a predominância de produções empíricas, no Banco de Teses e Dissertações da PUC-Campinas, e produções teóricas, na Revista Estudos de Psicologia (Campinas). O conjunto das obras analisadas nos permite inferir que a Fenomenologia é a pauta essencial de teoria, pesquisa, formação e discussão de psicólogos interessados em desenvolver a tradição humanista no Brasil. Esta, segundo percebemos, permanece ativa em Campinas.

Consideramos que esse exercício comparativo, enviesado pela revisão sistemática, constitui uma possibilidade de pesquisa sobre o desenvolvimento de um saber psicológico em suas manifestações institucionais. Sugerimos que essa visada seja empregada no estudo de outras universidades e periódicos importantes à ascensão e propagação da Psicologia Humanista nacional. Intencionamos, finalmente, que as informações apresentadas nesse artigo possam ser agregadas a outras pesquisas e revisões sistemáticas que, incessantemente, mapeiam o status corrente do humanismo brasileiro.

 

 

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Notas sobre os autores

Paulo Coelho Castelo Branco. Doutor em Psicologia pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor Adjunto I do Curso de Psicologia do Instituto Multidisciplinar em Saúde da Universidade Federal da Bahia. E-mail: pauloccbranco@gmail.com

Heitor Blesa Farias. Graduando em Psicologia pelo Instituto Multidisciplinar em Saúde da Universidade da Bahia. E-mail: h_heitor@hotmail.com

Laryssa Vasconcelos Leite. Graduanda em Psicologia pelo Instituto Multidisciplinar em Saúde da Universidade da Bahia. E-mail: laryssaasoares245@gmail.com

 

Nota de Agradecimento: os autores agradecem o apoio financeiro da FAPESB e da UFBA.

 

Recebido em: 24/03/2017
Aprovado em: 09/05/2017

 

 

1 Como exemplo, indicamos as visitas de Carl Rogers, John Wood, Maureen O'Hara, Maria Bowen, Jack Bowen, Bob Martin, Janet Rainwater, entre outros.

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