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Trivium - Estudos Interdisciplinares

On-line version ISSN 2176-4891

Trivium vol.8 no.1 Rio de Janeiro Jan./June 2016

 

EDITORIAL

 

Interface: Psicanálise, Ética, Estética

 

 

Betty Bernardo Fuks

Editora Responsável

 

 

No dia 21 de junho estava terminando de preparar este novo número da Trivium: estudos interdisciplinares, quando recebi a notícia de que o professor Manoel Tosta Berlinck, presidente da Associação Universitária de Psicopatologia Fundamental, falecera serenamente, com o rosto calmo e sem dor. Durante várias décadas esse homem notável havia lutado por manter a transmissão da Psicanálise no espaço universitário, lugar em que, como ele costumava dizer, "a exposição ao Lógos produz o amor ao estrangeiro e dissolve a convicção totalitária". Quis o acaso que em meio a uma série de artigos disponibilizados na presente edição, orientados pela psicanálise e por outras disciplinas que com ela estabelecem interlocuções acerca de questões que incidem no campo da Ética e no da Estética, encontra-se um texto do professor escrito em conjunto com um de seus inúmeros orientandos para os quais sempre transmitiu a magia do que designou de "natureza babélica do Lógos". Ao legado inestimável de trabalho que Manoel nos deixou e à amizade da qual tivemos a honra de desfrutar, o corpo docente do Programa de Pós-graduação em Psicanálise, Saúde e Sociedade dedica esta edição.

Na abertura, a conferência "Ética y Herejía", proferida por Norberto Rabinovich em um Seminário Internacional (2015) de nosso Programa de Pós-Graduação, o leitor encontrará uma importante distinção lógica entre Moral e Ética, cujo propósito é o de iluminar a teorização lacaniana do estatuto ético do inconsciente: "nem amoral nem imoral, senão ético".

A seção Artigos Temáticos é composta por três diferentes blocos de textos. O crítico literário Jean-Michel Rabaté, em "A história de um trauma", retoma os estudos sobre o trauma, aproxima divergências importantes entre os autores que se dedicaram ao tema e, delineando suas próprias posições, identifica um desejo geral de testemunhar catástrofes históricas. Da escrita de Marguerite Duras e de Robert Antelme, extrai a ideia de uma primazia da decisão ética de testemunhar, ou via ficção, ou via documentário. Em seguida, Luis Vinicius do Nascimento e Denise Maurano, em "O que se inscreve é o que se transmite", defendem que a psicanálise, por posicionar-se de forma eticamente diferenciada com respeito ao discurso sustentado pela ciência, exige do analista um posicionamento singular em relação à transmissão de seus conceitos. Na sequência, em "O Moisés de Freud e o Joyce de Lacan" de Claudia Lemos, somos convidados a mergulhar na escrita de duas obras-primas da literatura psicanalítica, nas quais a letra sinaliza um não-saber-fazer com o que se sedimenta no mito, nas religiões e até mesmo na história dos historiadores.

Os artigos do segundo bloco abordam a interface ética psicanalítica e laço social. Para João E. Grecco e Mariana R. Ferreira, autores de "Che vuoi? A ética psicanalítica para além da finda-linha", ressaltam a bússola que norteia o psicanalista, em sua práxis, a fazer face ao apagamento do sujeito contemporâneo: a ética do desejo. "Uma revisão teórico-conceitual sobre a ética da psicanálise e laço social" de José Henrique P. Palumbo, apresenta uma série de reflexões para uma leitura sobre o modo como uma psicanálise atua, tendo como pano de fundo o campo social.

Os textos do último bloco temático abordam diferentes estéticas de subjetivação. Laerte de Paula e Manoel Berlink, em "Uma estética para o gozo perverso", sustentam que o ideal estético da fantasia perversa erige um monumento à recusa, pela transformação do horror à castração em valor a ser cultuado com a presença de testemunha. Amadeu Oliveira, em "A enunciação da feminilidade em 'Rebecca', de Hitchcock" tenciona a estética subjetiva da protagonista hitchcockiana em meio a sua trajetória de encontrar uma inscrição simbólica e a feminilidade que encarna. Em "Kandinsky pesquisador da psicologia e da arte", Luana Wedekin revela a relação deste artista com alguns conceitos psicológicos que identificou em seus escritos.

No segmento Artigos, F. Sebastián, De Avila Xochiquetzaly e María del Carmen Hernández em "Anorexia, religión y maternidad" demonstram, a partir de um caso clínico, que, nesta patologia, a percepção de um corpo alheio, templo de Deus e objeto habitado pelo pecado, sustenta a fantasia de redenção pela inanição como possibilidade de sacrifício. Em "Para além dos nove meses", Monica Vianna e Junia de Vilhena, tomando como ponto de partida a escuta clínica, discutem a ocorrência e os efeitos de Transtornos Alimentares (TAs) durante o ciclo gravídico-puerperal.

A resenha do livro de Ana Costa, "Litorais da Psicanálise", salienta a capacidade surpreendente, que a autora tem de produzir teoricamente na interface psicanálise e literatura, psicanálise e arte, psicanálise e a ética.

Na seção Artes, "SIDERAL em nós" do diretor de cinema Guilherme Coelho, é um comentário-testemunho comovente sobre o alcance da estética fotográfica de Luiz Braga no espectador. Na sequencia, a psicanalista Viviane de Lamare, em "Um mundo de luz e sombra", indica de forma precisa as pistas da escolha ética do fotógrafo e cineasta Sebastião Salgado em "O sal da terra".