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Trivium - Estudos Interdisciplinares

versão On-line ISSN 2176-4891

Trivium vol.11 no.1 Rio de Janeiro jan./jun. 2019

http://dx.doi.org/10.18379/2176-4891.2019v1p.Edit 

EDITORIAL

 

Psicanálise, imagem e escrita

 

 

Betty B. Fuks

Editora Responsável

 

 

Neste número, Trivium oferece uma série de artigos dedicados aos estudos interdisciplinares sobre imagem e escrita. Sabemos que Freud estabeleceu um diálogo fecundo com a Literatura e a Arte, embora sua primeira abordagem de trabalho - inferir deduções sobre a obra e a vida do autor a partir do saber psicanalítico -, dê margem, por vezes, a que os psicanalistas e leigos pratiquem o ato de aplicar, sem pudor, conceitos psicanalíticos às produções culturais. Para evitar esse tipo de abuso, Freud aconselhou aos psicanalistas a "depor suas armas", isto é, a abrir mão daquilo que sabem, quando estivessem frente à força da escrita e da imagem artística, para, desse movimento, extrair algo que pudesse fazer avançar a teoria do inconsciente.

Convidamos, então, o leitor a começar a leitura do presente fascículo pela entrevista de Paolo Lolo conduzida por Marco Antonio C. Jorge - Alain Didier-Weil (1939-2018) -, pois trata-se de um testemunho contundente sobre a aposta de Didier-Weil nessa via de trabalho fundamental à pertinência do discurso psicanalítico na contemporaneidade. A decisão de publicar a entrevista, foi a forma que encontramos de prestar nosso tributo a esse grande psicanalista que legou à comunidade intelectual internacional, vários livros de referência, peças de teatro e um importante documentário cinematográfico sobre a clínica e o ensino de Jacques Lacan.

Abrindo a sessão temática, a filósofa Isabelle Alfandary, em Rewriting Psychoanalysis, H.D.'s Tribute to Freud, desenvolve a ideia de que o livro Por amor a Freud, da poetisa americana Hilda Doolitt, pode ser lido, ao mesmo tempo, como um texto de luto e um texto de rebelião; um texto de compromisso e de resistência à psicanálise. Em A problemática da psicobiografia em Kant com Sade, Fábio de Augusto R. D. de Mello Silva e Giselle Kosovski expõem dois eixos de relação entre Psicanálise e Literatura, a partir dos quais concluem que a obra de Lacan, Kant com Sade, foge a uma classificação que o defina ou não como psicobiografia. Em seguida, o artigo Freud leitor, Lacan leitor, de Andrea B. Tigre e Maria Helena C. da Cunha, testemunha a fecundidade da vertente da leitura de texto pela qual é possível ao leitor colher da escrita literária algo que faça avançar a teoria psicanalítica. José Maurício Loures e Sonia Borges, em Francesca Woodman: retrato da artista quando mancha, propõem, na intenção de lançar algumas luzes sobre o potencial da arte fotográfica em tocar o insabido, uma reflexão sobre os limites do espaço da representação. Na mesma linha, em Reverberações éticas da ferrugem no cinema de Harun Farock, Luiz Henrique Graff e Simone Z. Moschen, diante da estranheza frente a uma imagem cênica criada pelo cineasta russo, perguntam-se sobre a maquinaria da constituição da subjetividade. Marisa T. Oliveira e Liliane Froemming, em A visão da adormecida no filme O espelho de Tarkovski, estabelecem relações entre as imagens poéticas do filme e as sensações de déjà vu que Freud atribuiu ao contato do sujeito com fantasias inconscientes. Ariane de Freitas e Edson de Souza, no artigo (Des)velar imagens: derivações sobre o olhar na obra de Amedeo Modigliani, destacam a sensação de estranhamento na categoria do olhar através do efeito unheimlich do buraco nos olhos, que as pinturas do pintor Amadeo Modigliani apresentam.

Na seção Artigos livres, Enzo Pizzimenti, Isis G. Da Silva e Ivan Ramos, em Da queda livre ao encontro com o outro nas redes sociais, expõem os efeitos da apropriação de termos psicanalíticos pelo discurso leigo e discutem o uso corrente do termo "narcisismo" pelas redes sociais. No artigo Notas sobre a sexuação a partir do filme O Lagosta, Fabiano Rabêlo, Karla P. Martins e Leonardo J. Danziato constroem um debate interdisciplinar entre a psicanálise, a arte e os estudos de gênero. (Im)possibilidade de investimento pulsional no trabalho: análise de um caso em clínica do trabalho apresenta o estudo de um caso que levou quatro pesquisadores de diferentes universidades, Laene P. Gama, Ana M. B. Mendes, Eliana R. Lazzarini e Fernando O. Vieira, a perscrutar o investimento pulsional no trabalho.

A resenha "O descompasso entre o corpo e a imagem" revela com precisão, a importância do livro Transexualidade: o corpo entre o sujeito e a ciência, de Marco Antônio C. Jorge e Natália P. Travassos, no debate sobre a questão transexual na contemporaneidade. O depoimento de Richard Leds, autor do filme No human is illegal - refugees detained on Lesvos, confirma que a arte de fazer cinema, quando conectada à política, é um ato de denúncia do mal-estar na cultura. O poema da jovem Milla F. Salluh, Só ganha dia quem é ignorada na maioria, é um verdadeiro protesto contra a insistência da cultura em manter sorrateiramente a política antifeminista.

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