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Revista Psicologia e Saúde

versión On-line ISSN 2177-093X

Rev. Psicol. Saúde vol.5 no.2 Campo Grande dic. 2013

 

Conhecimentos, atitudes e percepção de risco dos acadêmicos de farmácia frente a AIDS

 

Knowledge, attitudes and risk perception of university students from the pharmacy about AIDS

 

Conocimientos, actitudes e percepción de riesgo de los estudiantes de la carrera de farmacia frente al SIDA

 

 

Dalila Castelliano de Vasconcelos1; Angela Elizabeth Lapa Coêlho

Centro Universitário de João Pessoa- UNIPÊ

 

 


RESUMO

O objetivo desta pesquisa foi analisar os conhecimentos, atitudes e percepção de risco dos estudantes do Curso de Farmácia frente à AIDS. Foi utilizado um questionário estruturado com questões sobre: conhecimentos sobre a identidade do HIV, atitudes frente à AIDS, percepção de risco frente à AIDS e dados demográficos. Participaram 88 estudantes dos quatro anos do Curso de Farmácia, com idade média de 20,6 anos predominando o sexo feminino. A maioria dos acadêmicos tem conhecimento sobre HIV/AIDS, porém, quase 40% não sabem da inexistência da vacina contra AIDS. As atitudes e percepção de risco frente ao HIV/AIDS são preocupantes, pois mais de 40% responderam que não correm o risco de pegar AIDS. Os acadêmicos revelaram sentirem-se despreparados para trabalhar nessa área. Assim, faz-se necessário que o assunto seja tratado como conteúdo transversal durante a formação acadêmica.

Palavras-chave: AIDS; Prevenção; Epidemia; Conhecimento.


ABSTRACT

The objective of this research was to analyze knowledge, attitudes and risk perception of university students from the Pharmacy about AIDS. A structured questionnaire was used, with questions divided in four areas: knowledge about the HIV identity, ways of transmission, prevention strategies, attitudes regarding AIDS and persons with AIDS, risk perception and demographic data. Eighty eight students answered the questionnaire. The average age of the participants was of 20, 6 years, and the majority was female. Most students had knowledge about HIV/AIDS, however, almost 40% did not know there was no vaccine against AIDS. As for the attitudes and risk perception regarding HIV/AIDS, the results are preoccupying; because more than 40% have answered that they are not at risk of getting AIDS. The students do not feel prepared to care for persons living with HIV/AIDS. Thus, it is necessary that the matter be treated as content cross during the academic.

Key-words: AIDS; Prevention; Epidemic; Knowledge.


RESUMEN

El objetivo de esta investigación fue analizar los conocimientos, actitudes e percepción de riesgo de los estudiantes de la Carrera de Farmacia frente al SIDA. Fue utilizado un cuestionario estructurado con preguntas sobre: conocimientos sobre la identidad del VIH, actitudes frente al SIDA, percepción de riesgo frente al SIDA y datos demográficos. Participaron 88 estudiantes de los cuatro años de la Carrera de Farmacia, con edad promedio de 20,6 años predominando el sexo femenino. La mayoría de los académicos tiene conocimiento sobre VIH/SIDA, pero casi el 40% no sabe de la inexistencia de la vacuna contra el SIDA. Las actitudes y percepción de riesgo frente al VIH/SIDA son preocupantes, pues más del 40% respondieron que no corren riesgos de contraer SIDA. Los académicos revelaron que se sienten despreparados para trabajar en esa área. Así, se hace necesario que el asunto sea tratado como contenido transversal durante la formación académica.

Palabras-clave: SIDA; Prevención; Epidemia; Conocimiento.


 

 

A AIDS surgiu em uma época em que o avanço no conhecimento médico e tecnológico era suficiente, para dar uma falsa segurança às autoridades sanitárias mundiais quanto ao controle dessa doença infecciosa. Foi necessária uma mudança nas respostas e comportamentos coletivos e políticos visando à diminuição do que se tornou o maior problema de saúde pública (Marques, 2002).

Uma dimensão afetiva está associada à doença em que se destacam elementos como preconceito, sofrimento e medo. Natividade e Camargo (2011), por meio de questionários aplicados a 150 estudantes do ensino médio de uma escola pública, identificaram os elementos doença e medo, e este último correlacionado a morte, como valores simbólicos associados à AIDS. Entretanto, diferentemente do que ocorreu no início da epidemia, a AIDS é considerada uma doença crônica e passível de controle (Suit & Pereira, 2008).

A ideia de grupo de risco ainda se perpetua mesmo entre profissionais de saúde, de acordo uma pesquisa realizada por Oltramari e Otto (2006) a partir de dez estudos de caso com universitários que vivem em relacionamento de conjugalidade e coabitação. Os entrevistados acreditam que como não fazem parte do grupo de risco não apresentam vulnerabilidade à doença. Segundo Paiva, Lima, Santos, Ventura-Filipe e Segurado, (2002, p. 55), "A construção simbólica sobre a AIDS, mais do que ajudar no controle da epidemia, estigmatizava os portadores e afastava da sensibilização para a prevenção de milhares de brasileiros [...]".

O conceito de vulnerabilidade visa suprir lacunas deixadas pelo uso de grupo e comportamento de risco bastante utilizados no início da epidemia. Moraes (2011) analisou como o conceito de risco foi utilizado ao longo da história da AIDS e como ocorreu seu abandono parcial à medida que o conceito de vulnerabilidade passou a ser considerado.

Os conceitos iniciais eram insuficientes para explicar problemas além da relação causa e efeito, o que gerou respostas limitadas frente ao avanço da doença, pois os mesmos não propiciavam uma visão ampliada e contextualizada da epidemia, uma vez que seu foco é o indivíduo e as relações causais de natureza fisiopatológica dos fenômenos de adoecimento, desconsiderando as interações estabelecidas entre o individual, o coletivo e o processo saúde-doença (Schaurich & Freitas, 2011).

A recusa por utilizar o conceito de risco está atrelada, segundo Moraes (2011), ao entendimento normativo e moralizante que se baseia em elementos causais individualizantes, desconsiderando, assim, os sentidos históricos dessas produções. Entretanto, o autor argumenta que há sempre uma potência no que a epidemiologia e a saúde nomeiam de risco, e a relação entre comportamento e dano deve ser também investigada. Moraes (2011) argumenta ainda sobre a positividade do conceito de risco no campo da saúde. Uma das formas de considerar esse conceito de maneira contemporânea é estudá-lo a partir do entendimento de sociedade de risco que se centra na atividade.

Um problema destacado por Marques Junior, Gomes e Nascimento (2012) quanto à classificação de práticas de maior ou menor risco é a classificação de práticas sexuais como mais perigosas ou mais inocentes e, consequentemente, de maior ou menor normalidade. Isso ocorre, por exemplo, pela classificação do sexo anal como perigoso e o vaginal como não sendo. Essa compreensão colabora para a vulnerabilidade do homem heterossexual uma vez que pratica sexo na forma socialmente aceita.

As desigualdades de gênero também são destacadas na pesquisa de Sampaio, Santos, Callou e Souza (2011), que realizaram uma pesquisa com adolescentes com o objetivo de compreender sua exposição às DST/AIDS, utilizando uma abordagem qualitativa em saúde, que incluiu observação participante, entrevistas e grupos focais com 72 profissionais de saúde e 360 adolescentes de ambos os sexos. Os resultados indicaram como vulnerabilidade da população feminina a baixa escolaridade e as relações de poder desiguais entre homens e mulheres. Como fator de vulnerabilidade do homem à AIDS aparece a compreensão de que os serviços de saúde são um espaço exclusivo da mulher. Outras dificuldades relativas a ambos os sexos é a não existência de uma política de prevenção voltada para adolescentes e a falta de um vínculo entre a população e os profissionais de saúde.

Camargo, Giacomozzi, Wachelke e Aguiar (2010) realizaram um estudo quantitativo e comparativo a fim de conhecerem a vulnerabilidade ao HIV/AIDS entre adolescentes afros descendentes e brancos. A vulnerabilidade dos adolescentes ao HIV/AIDS não esteve associada a fatores étnicos, mas sim a fatores sociais, econômicos e culturais. São as dificuldades enfrentadas por essa camada social que propiciam a vulnerabilidade à doença, mas, no Brasil, as camadas populares são predominantemente de raça negra, e, com isso, é comum a associação da afro descendência e a vulnerabilidade ao HIV/AIDS. Outros fatores como o uso de drogas, a violência e a proximidade com pessoas já infectadas, associados à dificuldade de acesso a informações claras e sistemáticas e ineficientes serviços de saúde que essa população tem acesso, dificulta o cuidado preventivo à saúde de uma forma geral e da proteção contra a AIDS de forma particular.

Além da falta de vínculo entre usuário e profissional e dos problemas inerentes ao próprio sistema de saúde acima citados, outras pesquisas apontam para o despreparo dos profissionais de saúde para trabalhar com a AIDS. Assim, muitos estudos indicam para a necessidade de capacitação do profissional de saúde para lidar com as várias faces da epidemia, ajudando na prevenção à AIDS e na qualidade de vida das pessoas que vivem com o vírus ou ainda no suporte à família das pessoas infectadas.

Quando os estudos são voltados para os próprios profissionais, eles afirmam estar despreparados para lidar com a epidemia. Essa situação pode ser proveniente do período de formação desses profissionais que não incluiu o assunto em suas grades. Isso pode ser verificado em diversas pesquisas que apresentam como população pesquisada estudantes dos cursos das áreas de saúde como o de Colussi e Coêlho (2003), com estudantes de fisioterapia, Sposto, Santos, Domaneschi, Navarro e Onofre (2003) e Pinelli, Garcia, Campos, Dotta e Rabello (2011), com acadêmicos de odontologia, Santos e Oliveira (2009), com universitários de diferentes cursos como enfermagem, administração, contabilidade, história, matemática e pedagogia.

Colussi e Coêlho (2003) realizaram uma pesquisa com 180 estudantes do Curso de Fisioterapia de uma universidade particular de Campo Grande, MS. Os alunos demonstraram um bom conhecimento em relação à AIDS, porém, em questões mais específicas sobre o tema, os alunos estavam confusos. Os participantes também revelaram não se sentirem preparados para atender pessoas vivendo com o HIV/AIDS. Dando continuidade a esta temática, as autoras realizaram, no ano de 2005, uma pesquisa semelhante com estudantes do Curso de Terapia Ocupacional. Os participantes revelaram ter conhecimento razoável em relação à identidade do HIV e da AIDS, a contaminação e a transmissão do vírus, porém, os acadêmicos apresentam atitudes negativas em relação ao tema, além de revelarem não se sentirem capacitados para o atendimento (Colussi & Coêlho, 2005). Tais estudos revelam a importância de se trabalhar o tema HIV/AIDS em uma perspectiva biopsicossocial na formação dos profissionais da área de saúde.

Seidl, Ribeiro e Galinkin (2010), em uma pesquisa com 503 universitários de ambos os sexos, verificaram a presença de opiniões preconceituosas em relação a pessoas que vivem com HIV e a culpabilização das mesmas pela infecção. É preciso considerar que paralelo à vivência de serem profissionais, essas pessoas são filhos, pais, mães, participantes de centros religiosos, pertencentes a classes sociais diferentes, etc. fatores que podem contribuir na própria vulnerabilidade dessas pessoas que irão fazer ou fazem parte do grupo de profissionais de saúde do nosso país. Rebello, Gomes e Souza (2011) concluíram que o grande desafio que se impõe hoje para a prevenção é transformar aspectos culturais e sociais que favoreçam a vulnerabilidade à transmissão do HIV.

Verificando a importância desses profissionais estarem capacitados para trabalhar com o HIV/AIDS e, ainda, reconhecendo esses profissionais como pessoas que também estão vulneráveis a essa contaminação é que o presente estudo teve o objetivo de compreender os conhecimentos, atitudes e percepção de risco dos estudantes do Curso de Farmácia frente à AIDS.

 

Método

Foram escolhidos estudantes da área de saúde por se tratarem de futuros profissionais que poderão estar envolvidos na assistência direta a pessoas e/ou em contato com materiais potencialmente contaminados. Além disso, a faixa etária à qual a maioria dos acadêmicos pertence apresenta um alto nível de contaminação segundo o Ministério da Saúde (Brasil, 2004). A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Católica Dom Bosco sendo protocolado sob nº 101/2004.

A pesquisa contou com a participação voluntária de alunos do Curso de Farmácia de uma universidade particular de Campo Grande. Os alunos que participaram foram avisados de que os dados seriam confidenciais e que eles poderiam desistir a qualquer momento da pesquisa. Todos os alunos participantes assinaram um termo de Consentimento Livre e Esclarecido autorizando a utilização dos dados. Participaram da pesquisa 88 alunos do curso, sendo 32 no 2º semestre, 18 no 4º semestre, 22 no 7º semestre e 16 no 8º semestre.

Foi utilizado um questionário estruturado que envolvia questões sobre: participação em eventos que tratassem sobre o assunto AIDS; conhecimentos sobre a identidade do HIV; medidas de prevenção; meios de transmissão; atitudes frente à AIDS e ao indivíduo com AIDS; percepção de risco e dados sócio-demográficos.

Inicialmente, foi agendada uma reunião com a Coordenadora do Curso de Farmácia para que fosse feita a apresentação do projeto. Foi autorizada pela Coordenadora a aplicação dos questionários em sala de aula. Foi agendado com os professores o melhor horário para a aplicação dos questionários. Após a aplicação, foi realizada a inserção dos dados no programa Excel. Posteriormente, foi feita a análise dos dados.

 

Resultados

Participaram desta pesquisa 88 estudantes, 65 (73,86%) do sexo feminino e 22 (25%) do sexo masculino. Um participante do sexo masculino deixou o questionário em branco. A média de idade foi de 20,6 anos, onde a menor idade foi de 17 anos e a maior idade foi de 35 anos. Aproximadamente 88% dos entrevistados eram solteiros, 6% eram casados, 1,14% responderam como outro tipo de relação e 2,27% não responderam. A grande maioria, 97,73% dos entrevistados, possuía nível superior incompleto. Quanto à participação em alguma palestra, treinamento e/ou curso sobre AIDS, 68,96% dos entrevistados responderam que já haviam participado pelo menos uma vez, e, deste total, 41,67% responderam que participaram dessas atividades no colégio.

Para as questões relativas à identidade do vírus HIV e da AIDS (Tabela 1), o percentual de respostas certas foi de 63,48%. Aproximadamente 88,63% dos entrevistados responderam como verdadeiro que qualquer pessoa pode pegar AIDS. Da mesma forma, mais de 90% responderam como verdadeiro que a AIDS é transmitida por um vírus. Os entrevistados responderam também como sendo verdadeiro que tanto homens como mulheres podem transmitir o HIV. Porém, apenas 38,63% dos entrevistados responderam como verdadeiro que no ambiente de instituições de saúde deve-se considerar todos os pacientes como potencialmente portadores do HIV. Outro resultado relevante foi que quase 40% dos entrevistados apresentarem dúvidas em relação à inexistência de vacinas contra a AIDS.

Em relação às formas de prevenção (Tabela 2), os dados indicam um percentual de 72,52% de respostas corretas. Cerca de 80% dos participantes considerou "eficaz" a prevenção feita por meio do uso da camisinha feita de látex. Do mesmo modo, 89,77% dos entrevistados consideraram como "nada eficaz" o uso da pílula anticoncepcional como método de prevenção à infecção pelo HIV. Ocorreu uma diminuição progressiva do conhecimento nas questões que se referem ao uso da camisinha nas relações sexuais vaginal, anal e oral. Aproximadamente 84,09% responderam como "eficaz" o uso de camisinha na relação sexual vaginal. Quanto à eficácia da camisinha no sexo anal, 77,27% assinalou como "eficaz", e na relação sexual oral com camisinha 75% respondeu "eficaz". Na questão que se refere ao conhecimento da história sexual do (a) parceiro (a) como um método preventivo, 39,77% considerou como "pouco eficaz", 37,5% considerou como "eficaz" e 18,18% considerou como "nada eficaz".

Para as questões relativas à transmissão do vírus HIV (Tabela 3), 68,74 % das respostas foram consideradas adequadas. Aproximadamente 97% dos entrevistados responderam como improvável contrair o vírus através de aperto de mão, tocar ou beijar o rosto de uma pessoa que é portadora do HIV/AIDS e sobre a possibilidade de se contaminar com o HIV por freqüentar uma escola com um aluno que tem o HIV. Os entrevistados também apresentaram um bom conhecimento, 95% aproximadamente, em relação à possibilidade de contaminação após receber uma transfusão de sangue contaminado, de compartilhar agulhas com usuários de drogas injetáveis, e de ter relações sexuais com profissionais do sexo sem usar camisinha.

Ocorreu novamente nesse item uma queda progressiva quanto ao conhecimento em relação ao sexo vaginal, anal e oral, onde houve um maior conhecimento em relação ao sexo vaginal, com 97,73% de respostas adequadas, reduzindo para 96,59% no sexo anal, e para 94,32% no sexo oral. Em relação a beijar a boca de uma pessoa que é portadora do HIV, 60,77% dos entrevistados responderam como improvável. No item sobre doar sangue, 47,72% dos entrevistados responderam como "improvável" a contaminação. Um dado que chama a atenção é que 84,09% assinalaram como sendo provável a contaminação quando se nasce de uma mãe que é portadora do vírus HIV.

Os dados referentes às atitudes e a percepção de risco frente ao HIV/AIDS estão relatados na Tabela 4. Os resultados são preocupantes, pois 30% não estão seguros de que a contaminação não esteja somente ligada a comportamento promíscuo e ao uso de drogas, e 45,46% dos alunos assinalaram como verdadeiro que não corriam risco de pegar AIDS. Outro dado que merece consideração é que apenas 11,36% dos alunos responderam como verdadeiro quando perguntados se tinham treinamento profissional necessário para prestar atendimento a uma pessoa com AIDS.

Sobre as questões relacionadas às atitudes positivas em relação a AIDS, 62,49% dos acadêmicos responderam como verdadeiro que não teriam nenhum problema em se relacionar profissionalmente com um companheiro (a) de uma pessoa com AIDS e 95,45% dos acadêmicos responderam como "definitivamente falso" a questão que afirma: "quem tivesse AIDS deveria ser colocado num lugar isolado".

Para as questões relativas à possibilidade de atitudes negativas, quase 40% acreditam que o governo não está informando tudo o que sabe sobre a AIDS e 36,36% afirmam que se tivessem escolha prefeririam não trabalhar com a AIDS. Aproximadamente 30% dos estudantes afirmaram não ter medo de pegar AIDS e não estar preocupados em serem contaminados.

 

Discussão

A maioria, 72,52% dos acadêmicos, apresentou um bom conhecimento em relação às medidas de prevenção. Entretanto, apenas 18,18% dos participantes consideraram a questão de conhecer a vida sexual do (a) parceiro (a) como sendo uma medida "nada eficaz". Esses percentuais são preocupantes porque podemos questionar até que ponto é possível conhecer realmente a vida sexual do parceiro e, ainda, quando consideramos o número de portadores do HIV que não sabe que estão vivendo com o vírus.

Essa percepção aparece em outras pesquisas, como é o caso Camargo et al. (2010) que aponta para a vulnerabilidade de adolescentes por praticarem sexo sem camisinha principalmente por associarem que o namoro pode ser uma situação que os protege contra a transmissão de doença, já que conhecem seu parceiro ou parceira. Resultados semelhantes são encontrados por Oltramari e Otto (2006) onde universitários que vivem em relacionamento de conjugalidade e coabitação apresentam dificuldade em ter uma percepção de risco pessoal à AIDS, uma vez que se consideram protegidos por confiarem nos parceiros. Além disso, o tempo de relacionamento e a confiança também interferem na percepção de risco, pois o grupo acredita que quando a relação é estabelecida os corpos se tornam um e o risco desaparece.

Destaca-se aqui a necessidade comentada por Rebello et al. (2011) de se aprofundar a própria discussão sobre prevenção, para que não se cometa o erro de reduzi-la à evitação da doença. Afinal, o campo da prevenção é muito mais amplo e envolve a promoção de práticas afetivas sexuais mais saudáveis que considerem as dimensões do prazer e dos direitos sexuais das pessoas.

A diminuição progressiva do conhecimento sobre o uso da camisinha nas relações sexuais vaginal, anal e oral, nos faz refletir sobre que tipo de informações esses jovens estão tendo que não são capazes de ampliar seus conhecimentos sobre "usar camisinha nas relações sexuais vaginais" para outros tipos de práticas sexuais como a anal e a oral. Resultados semelhantes foram encontrados com outros profissionais de saúde em Colussi e Coêlho (2003, 2005). Como Marques Junior et al. (2012) afirmam é necessário superar a lógica mecânica da mensagem do uso do preservativo e incorporar as dimensões que permeiam a decisão sobre esse uso.

Os participantes revelaram conhecimento nas questões sobre a identidade do HIV. No entanto, os participantes se mostraram confusos em relação à não existência de uma vacina. Esses dados revelam que as pessoas podem ter uma compreensão equivocada quanto à existência de uma vacina, que não se mobilizam para buscar novas informações, e, por isso, não se preocupam com a prevenção.

As pesquisas sobre a percepção de risco das pessoas com relação ao HIV/AIDS devem ser ampliadas a fim de contribuir com as estratégias adotadas pelas agências de saúde para a prevenção. Com essas pesquisas, podemos identificar as fantasias em relação ao HIV/AIDS e os sentidos dados ao conhecimento construído socialmente. Esse dado pode corroborar com os resultados de pesquisas como a Natividade e Camargo (2011), que identificaram que os jovens têm procurado como fonte de informação os profissionais de saúde e estão apresentando conhecimentos científicos insatisfatórios.

De acordo com as normas de precauções universais, do Ministério da Saúde, "no ambiente de instituições de saúde, deve-se considerar todos os pacientes como potencialmente portadores de HIV". O fato de apenas 38,63% dos participantes responderem como verdadeiro a essa afirmação, demonstra a vulnerabilidade desses futuros profissionais de saúde e da população por eles atendidos em relação ao HIV/AIDS.

Resultados semelhantes foram encontrados por Pinelli et al. (2011) com estudantes de odontologia que disseram tomar mais cuidado quando atendem um paciente que eles sabem estar infectado. Isso indica a insegurança nesse atendimento, uma vez que a obediência aos protocolos não é uma rotina. Isso representa um ponto de vulnerabilidade para infecção e contágio na área. As precauções padrão parecem não ser compreendidas claramente pelo grupo quando analisadas as práticas das mesmas. Treinamentos, esclarecimentos e incentivos são importantes para adesão ao uso.

Outra questão associada a essa diz respeito à preparação profissional para atender as pessoas vivendo com HIV/AIDS. É preocupante que apenas 11,36% dos alunos, responderam como verdadeiro que tinham treinamento profissional necessário para prestar atendimento a uma pessoa com AIDS. É necessário que os cursos de saúde não considerem apenas o corpo humano em sua função biológica e sim de forma biopsicossocial.

Destaca-se assim a importância e a responsabilidade das universidades como instituições formadoras em atividades curriculares e extracurriculares que permitam a discussão dessa temática e do preconceito a ela associada (Seidl et al. 2010).

Nas questões relativas aos meios de transmissão, que teve um índice de 68,74% de respostas adequadas, no quesito doar sangue, 67,03% dos alunos mostraram-se confusos em relação à contaminação pelo HIV através deste processo. Esse índice é preocupante uma vez que pode contribuir para a resistência da população a campanhas de doação de sangue.

Um total de 84,09% dos estudantes afirmaram que era muito provável que o filho de uma mãe que tem AIDS tenha o vírus, o que demonstra a necessidade de discussões e esclarecimentos nesse assunto, pois, de acordo com Seidl et al. (2010), o risco de transmissão do vírus da mãe para o bebê que não utiliza nenhum método de prevenção é 30% e cai para 1% quando ações de prevenção são realizadas. Essas ações são oferecidas de forma gratuita pelo governo brasileiro. Seidl et al. (2010), em uma pesquisa com 503 universitários, verificaram que o direito à maternidade de mulheres com HIV/AIDS foi um ponto convergente de preconceito nas diferentes cursos universitários pesquisados. Esse preconceito que nega às mulheres vivendo com HIV/AIDS esta realização nega também a vivência feminina plena, pois em nossa cultura a maternidade está muito ligada ao ser feminino.

A respeito da afirmação "eu não corro risco de pegar AIDS", 45,46% dos participantes responderam como verdadeiro. Tal índice se mostra como um possível complicador para os profissionais que irão intervir nessa área com a prevenção. Esse sentimento de invulnerabilidade ao HIV, na pesquisa de Natividade e Camargo (2011), foi mais presente entre homens, o que esteve associado a não necessidade do uso do preservativo. Uma hipótese levantada pelos autores é a do elemento preservativo ser entendido como valor simbólico que se associa a noções abstratas que não se relacionam a experiência vivida e a situações reais.

O sentimento de invulnerabilidade ao HIV torna a aceitação do diagnóstico mais difícil (Suit & Pereira, 2008). Pode-se inferir que os participantes ainda tenham a idéia errônea de grupos de risco e estereótipos, e, por isso, acreditam que não correm risco de serem contaminados, como ocorre na pesquisa realizada por Oltramari e Otto (2006), em que a idéia de grupo de risco se perpetua entre profissionais de saúde.Destaca-se a importância de campanhas que favoreçam a diluição de estereótipos, uma vez que os mesmos interferem na prevenção, no recebimento do diagnóstico e na vivência da doença.

Os resultados ainda revelam um descrédito quanto às informações passadas pelas instituições governamentais, pois, aproximadamente 40% dos entrevistados afirmaram como verdadeiro que "as instituições governamentais não estão informando tudo o que sabem sobre a AIDS". Esse descrédito associado ao que comentam Seidl et al. (2010), que salientam que as informações transmitidas em campanhas do governo mesmo quando eficazes e esclarecedoras são insuficientes para a mudança de atitudes, indicam que são necessárias outras formas de atuação do governo no combate à AIDS.

 

Considerações finais

Ter o conhecimento adequado a respeito das formas de transmissão do vírus HIV e das formas de prevenção é um fator importante, pois é a partir dele que podemos direcionar os trabalhos preventivos para a mudança dos comportamentos de risco em relação à AIDS. Desta forma, faz-se necessário ampliar as estratégias para a divulgação das informações, para que, assim, além de reforçar os conhecimentos adequados, seja possível esclarecer as dúvidas que a população tem a respeito desse tema.

Conforme visto na pesquisa, a mudança de atitude e a adoção de comportamentos saudáveis em relação a AIDS vão além da questão de se ter informações corretas. Desta forma, faz-se necessária a criação de programas que considerem tanto o aspecto informativo quanto as questões psicossociais, culturais e comportamentais da população.

Os profissionais da saúde, por meio de sua prática profissional, servem como referência à população que tem dúvidas relacionadas à saúde. Logo, eles devem ter o conhecimento sobre o HIV/AIDS, tanto para sensibilizar os usuários quanto à prevenção como para sua proteção pessoal. É necessário que esse assunto seja abordado no período de formação desses profissionais e que trabalhos sejam realizados de forma a incluir outras dimensões, que vão além da prática profissional e que interferem na vulnerabilidade à AIDS, como crenças, valores e representações sobre a transmissão do HIV, considerando a promoção à saúde como algo que vai muito além de evitar a doença.

 

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Recebido: 15/10/2012
Última revisão: 01/10/2013
Aceite final: 08/10/2013

 

 

Sobre os autores:
Dalila Castelliano de Vasconcelos - Psicóloga e Mestre em Psicologia da Saúde pela Universidade Católica Dom Bosco-UCDB, Campo Grande- MS. Especialista em Saúde Pública e Saúde da Família. E-mail: dalila_bal@hotmail.com
Angela Elizabeth Lapa Coêlho - Psicóloga e mestre em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba, com doutorado e pós- doutorado em Psicologia pela University of Manitoba, Canadá. Atualmente, é Coordenadora do Curso de Psicologia do Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ), João Pessoa, PB. E-mail: coelho.angela1@gmail.com

 

 

1 Endereço1: Av. Mato Grosso, 1137, Bairro dos Estados, João Pessoa- PB. CEP: 58030-082.

 

 

A pesquisa teve o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) e da Universidade Católica Dom Bosco, por meio de bolsa de Iniciação Científica.