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Revista Psicologia e Saúde

versão On-line ISSN 2177-093X

Rev. Psicol. Saúde vol.7 no.2 Campo Grande dez. 2015

 

ARTIGOS

 

Vivências e estratégias de enfrentamento em uma família com doente crônico com câncer

 

Experiences and coping strategies in a family with chronic sick with cancer

 

Experiencias y estrategias de afrontamiento en una familia con crónica enfermo con cáncer

 

 

Cleber Lizardo de Assis; Gislene Fátima Alves

Faculdades Integradas de Cacoal - UNESC

 

 


RESUMO

Os familiares de um paciente com doença crônica câncer adoecem junto com seu membro, se encontram emocionalmente abalados e precisando de tempo para elaborar esse estado. Analisou-se os impactos do adoecimento e as estratégias de enfrentamento junto a uma família com doente crônico com câncer. Método: amostra de 05 sujeitos, membros da família e cuidadores, idade entre 16 e 70 anos; para a coleta de dados, foram aplicadas entrevistas semiestruturadas e tratamento pela Análise de Conteúdo, criando categorias e subcategorias. Resultados e Discussão: As dificuldades mais vivenciadas foram as questões agrupadas nas seguintes categorias: relacionais/ sociais, psicológicas, jurídicas, deslocamento geográfico e financeiro; quanto às estratégias de enfrentamento da família, além de enfrentamento nas categorias mencionadas, identificou-se a busca religiosa; Conclusão: Verificou-se que toda a família passa por mudanças gerais em sua dinâmica, como se todos estivessem doentes, mas percebeu-se a busca de adaptação e de estratégias de enfrentamento junto ao adoecimento de seu membro.

Palavras-chaves: Psicologia hospitalar; Doenças crônicas; Enfrentamento; Câncer; Família.


ABSTRACT

The family of a patient with chronic-cancer disease becomes ill with his member family. They find themselves emotionally shaken and needing time to comprehend this disease. This article analyzes impact of illness and coping strategies with a family with chronic ill with cancer. The sample consisted of five individuals, family members and caregivers, aged between 16 and 70 years. For data collection semi-structured interviews were applied, and for the data treatment was used content analysis, creating categories and subcategories. The more experienced difficulties were the questions grouped in the following categories: relational/social, psychological, legal, geographical and financial displacement. As family coping strategies beyond those mentioned categories, it was identified the religious quest. One can see that the whole family goes through changes in their dynamics, as if everyone was sick, but realized the search of adaptation and coping strategies from your member of illness.

Key-words: Hospital psychology; Chronic diseases; Coping; Cancer; Family.


RESUMEN

La familia de un paciente enfermo crónico con cáncer, también se enferma emocionalmente, aunque se encuentre sacudido y con necesidad de desarrollar este estado. Se analizó el impacto de la enfermedad y las estrategias de afrontamiento con una familia con enfermedad crónica de cáncer. Método: Muestra de 05 personas, familiares cuidadores, con edades entre los 16 y 70 años; para recoger datos, se aplicaron entrevistas semiestructuradas y procesados por el Análisis de Contenido, con la creación de categorías y subcategorias. Resultados y Discusión: Las dificultades más experimentadas eran las cuestiones agrupadas en las siguientes categorías: relacionales/ sociales, psicológica, jurídica, geográfica y financiera; la familia buscó las estrategias de afrontamiento anteriores, y principalmente la búsqueda religiosa; Conclusión: Se encontró que toda la familia pasa por cambios generales en su dinámica, como si toda ella estuviese enferma, pero se dio cuenta de la búsqueda de estrategias de adaptación y afrontamiento de la enfermedad por sus miembros.

Palabras-clave: Psicología hospitalar; Enfermedades crônicas; Afrontamiento; Cáncer; Familia.


 

 

INTRODUÇÃO

As preocupações com o processo de hospitalização devem favorecer ao paciente e a sua família, um ambiente de proteção para que ele consiga enfrentar as perdas eminentes que ocorrem durante o tratamento, posto que podem aparecer situações de desajuste familiar por não conseguir enfrentar o problema recente ocasionado pela doença e, com isso, afetar e trazer danos comprometedores para todo o processo de tratamento (Angerami-Camon, Trucharte, Knijnik & Sebastiani, 1984).

Diante disso, o desenvolvimento da pesquisa fica justificado em benefício da atualidade do tema e da necessidade de desenvolvimento nesse âmbito, que poderá contribuir para a sociedade, com novas informações e na colaboração aos familiares que estão diante de um diagnóstico de uma doença crônica, além de favorecer o seu aprendizado de estratégias de enfrentamento adequadas diante do processo de adoecimento de seu membro.

Psicologia Hospitalar e Doença Crônica

Para Sebastiani, (2003, in Castro & Bornholdt, 2004) a Psicologia Hospitalar no Brasil está ligada ao hospital desde a década de 40, onde seu alvo era a atenção às necessidades secundárias que estão ligadas aos programas assistenciais e a atendimentos clínicos. Segundo as autoras, neste período os atendimentos nos hospitais não preconizavam o atendimento à saúde sanitária e por este motivo passou a ser considerada uma referência para a saúde na atualidade, tornando conhecida como Psicologia Hospitalar e considerada uma estratégia da Psicologia da Saúde (Chiattone, 2000).

Ao analisarmos alguns conceitos da Psicologia Hospitalar, nos deparamos com a importância de sua especialidade, uma vez que o psicólogo se difere pelo seu olhar que transmite ao paciente segurança e habilidade em perceber os aspectos psicológicos da doença e não somente as suas causas orgânicas; ele está ali para cuidar do doente no processo de adoecimento e do processo de hospitalização, como também da sua família (Moretto & Simonetti, 2006; Simonetti, 2004; Angerami-Camon et al, 1984; CFP, 2001).

Diante da hospitalização o paciente passa por um "processo de adaptação", que segundo Angerami-Camon et al (1984), deverá aprender a lidar com situações estressantes, que o deixa com um sentimento de impotência diante dos procedimentos e não tendo, às vezes, mais o direito de escolha, uma vez que sua existência está atrelada a hospitalização, o que deve ser considerado em atendimento psicológico no hospital e junto à família.

Segundo Simonetti (2004), faz-se necessário também "uma escuta" diferenciada para que, a partir dela, o psicólogo perceba os significados do que tem a dizer o paciente - o que sabe em relação a sua nova condição, quais seus medos e seus anseios, não procurando a veracidade desse discurso e sim a sua "subjetividade", os seus sentidos. Corroborando tal perspectiva, Messa (2003) compreende que no setor hospitalar, há a necessidade em se trabalhar não somente com o doente como fazem os "profissionais da área médica", lembrando que cabe ao psicólogo atender as necessidades psicológicas tanto do paciente como dos familiares, sendo que, com este suporte o acompanhante ficará mais fortalecido para ajudar o paciente a enfrentar o processo de adoecimento e de hospitalização.

Para Messa (2003) e Bomfim, Bastos & Carvalho, (2007) ao se descobrir a enfermidade crônica na família, percebe-se que acontece uma desestruturação não somente ao paciente portador deste diagnóstico, mas ocorre um abalo em todos os membros da família, surgindo o temor às frustrações e certa impotência perante alterações que ocorrem, sendo que, segundo Minuchin (1976, in Macedo, 1994) para a psicologia, a "família tem um papel importante como facilitadora do processo de desenvolvimento de seus membros".

A atuação do psicólogo junto à família, poderá, nesse sentido, proporcionar um equilíbrio, auxiliando-a na reorganização de suas emoções, sua angústia e dor diante da enfermidade de seu membro, posto que em muitas famílias o trabalho de cuidar de alguma pessoa adoentada torna-se responsabilidade de um de seus componentes (Simonetti e Ferreira, 2007). Salientamos ainda que essa pessoa também ocupa o cargo de ponte entre todos os outros envolvidos no processo de tratamento e para exercer essa função de cuidador, ele necessita estar bem física e mentalmente diante de uma função que exige dele disponibilidade e entrega.

Para Telelbom (1993, in Vieira & Lima, 2002) a "doença crônica" é avaliada como sendo uma enfermidade que demanda um longo tratamento, podendo proporcionar problemas de aceitação diante do processo de adoecimento, impossibilitando-o doente de executar as atividades de seu dia-a-dia em decorrência do período imprescindível para o tratamento. Já para Pless & Dougla (1971, in Silva, 2001), a "doença crônica é vista como uma condição clínica", podendo proporcionar cura, que muitas vezes não o leva a morte, com prevalência que varia de três meses no mínimo, a anos, sem mencionar as enfermidades que precisam ser acompanhadas por um máximo período, como no caso de "doenças congênitas" que não podem ser avaliadas como enfermidade recorrente (Silva, 2001). Nesta questão da temporalidade de tratamento, segundo World Health (2005, in Malta et al, 2011) as "doenças crônicas não transmissíveis" (DCNT) são as que mais colaboram para um prejuízo na qualidade de vida e em alguns casos causam mortes e as não transmissíveis são as doenças que mais crescem no Brasil.

Neste contexto das doenças crônicas, a etiologia da palavra "câncer" é oriunda do latim, referindo-se ao caranguejo, sendo que sua comparação é referente ao formato das patas do caranguejo e que, a partir desta configuração, pode proliferar-se, espalhando-se para outros órgãos o que recebe o nome de metástase. Como subtipo de câncer, para Hoffmann, Müller & Rubin (2006) o "câncer de mama" aparece devido a uma irregularidade e um desenvolvimento de células, sua origem pode ser de "ordem genética, nutricional, ambiental, entre outros".

No Brasil, as estimativas para o ano de 2013 apontam a ocorrência de aproximadamente 518.510 casos novos de câncer, incluindo os casos de pele de tipo não melanoma, reforçando a magnitude do problema do câncer no país.. Os tipos mais incidentes serão os cânceres de pele não melanoma, de próstata, de pulmão, de cólon e reto e de estômago para o sexo masculino; e os cânceres de pele não melanoma, de mama, de colo do útero, de cólon e reto e de glândula tireóide para o sexo feminino (INCA 2012)

Segundo Porto (2004, in Silva, Aquino & Santos, 2008) o câncer causa uma carga emocional avassaladora, porque a partir de seu diagnóstico, o indivíduo passa por um processo onde todos os seus sentimentos ficam comprometidos, proporcionando-lhe uma sensação de fraqueza diante da doença, sentimentos como temor, ira e insegurança, pois passa a não ter mais autoridade sobre suas vontades e desejos; pode ainda, segundo Knapp (2004, in Silva, Aquino & Santos, 2008) sofrer uma "distorção em sua cognição" e um processo de "catastrofização".

Neste momento crítico em que o paciente está vivendo é necessário, segundo Lugton (1997, in Hoffmann, Müller & Rubin, 2006), que ele seja cercado de cuidados das pessoas que fazem parte de sua vida, pois precisa estar bem emocionalmente e com uma estrutura afetiva adequada, uma vez que estes vínculos afetivos fazem a diferença diante da situação vivida (Sluzki, 1996 in Hoffmann, Müller e Rubin (2006).

Por este motivo, ao se deparar com a doença crônica, o indivíduo sente-se acometido por situações que poderão leva-lo a um período em que tenha que ficar sem poder exercer atividades costumeiras, além de essa nova condição poderá lhe causar estresse, uma vez que sua rotina sofre mudança, ele também poderá sofrer mudanças na maneira de se perceber e de se portar diante das pessoas que o cerca. (Taylor, 1992 & Moos, 1982, in Martins, 2002; Silva, 2005; Araújo & Fernandes, 2008; Silva, Aquino & Santos, 2008).

Referindo-se às mudanças, mediante a revelação diagnostica de uma doença crônica os familiares também se encontram emocionalmente abalados e precisando de tempo para elaborar essa notícia, sendo que esse "abalo moral" se manifesta carregado de sentimento de impotência diante do medo do desconhecido e consequentemente da morte. Ou seja, ao iniciar o tratamento do membro doente, requerer-se-á um manejo de todos e uma nova estrutura familiar (Rolland, 1995; Bervian & Girardon-Perlini, 2006; Santana, Zanin & Maniglia, 2008; Hoffmann & Macedo, 2009).

Estratégias de Enfrentamento/cop/Mg

Para os autores Lazarus & Folkman (1984, in Dell' Aglio, 2000), coping é considerado um "conjunto de esforços cognitivos e comportamentais" que faz com que o indivíduo perceba e saiba como amenizar os estímulos estressores que ocorrem na doença ou mesmo nas situações sociais, favorecendo-lhe uma melhor qualidade de vida.

Complementando, Nunes (2011), afirma que a intervenção psicológica torna-se possível a partir da interpretação sobre os meios utilizados pelo indivíduo diante a um evento ou situação estressora e, nesse sentido, a Psicologia da Saúde pode acompanhar e promover junto ao indivíduo que se encontra em tratamento, bem como a seus cuidadores, estratégia de enfrentamento visando um melhor desempenho durante esse processo (Matarazzo, 1980, in Kohlsdorf & Costa Junior, 2008).

É necessário saber que, ao se deparar com o diagnóstico médico de uma enfermidade, o indivíduo encontra-se em um processo de estresse e este momento é marcado por vários "sintomas físicos e psicológicos", diante dos quais ele tem que buscar "estratégias" que o levem a um provável ajustamento. Para Lorencetti & Simonetti (2005), o coping passa a ser uma forma de "manejo do indivíduo em busca de uma acomodação ao meio familiar e social, procurando um equilíbrio psicológico para impedir ou conter os episódios que podem levá-lo a situações que o ameaçam.

Para Lazarus e Folkman (1984 in Vilhena, 2007) coping não pode ser avaliado como um método de adequação ao "estímulo apresentado" e sim como uma habilidade do sujeito ante a "carga emocional, social ou física" que podem ser o máximo que ele suporta. Nesse sentido, Lazarus & Folkman (1984, in Vilhena, 2007) classificam as estratégias de coping em duas grandes categorias:

As estratégias de coping centradas no problema correspondem aos esforços desencadeados para alterar ou gerir aspectos percepcionados como geradores de stress, no indivíduo, no meio ou na relação entre ambos. Elas são direcionadas, por exemplo, para gerar soluções alternativas ou para pesar os custos e os benefícios. Por sua vez, as estratégias de coping centradas nas emoções referem-se aos esforços desencadeados pelo indivíduo para regular (aumentar ou diminuir) as emoções resultantes da situação geradora de stress (Lazarus e Folkman, 1984, in Vilhena, 2007, p. 23).

 

MÉTODO

Este estudo pode ser classificado da seguinte forma: Quanto à natureza é uma pesquisa aplicada, pois objetiva gerar conhecimentos para aplicação prática, dirigidos à elaboração de enfrentamento/ coping; quanto ao tipo, é uma pesquisa qualitativa, exploratória e de campo (Gil, 1999).

É ainda um estudo de caso, onde utilizamos para o levantamento de dados a entrevista com uma família, com perguntas elaboradas que buscaram investigar junto às famílias quais as vivências e as estratégias usadas neste processo de adoecimento e dor em um de seus membros.

Participantes

Quanto ao perfil dos sujeitos, foram entrevistadas 05 (cinco) pessoas membros da família, com idade entre 16 e 70 anos, sendo: Sujeito 1-Esposo, Sujeito 2-Filho, Sujeito 3-Irmão, Sujeito 4-Sobrinha e Sujeito 5-Sogra.

Instrumentos e Procedimentos

Quanto aos instrumentos utilizados, foram criados: 1 - Um questionário de entrevista semiestruturada, composta por cinco perguntas abertas; 2- O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), em duas vias de igual teor, sendo uma do participante da pesquisa e outra dos pesquisadores, sendo que o documento foi elaborado conforme a Resolução Nº 196 de 10 de Outubro de 1996, do Conselho Nacional de Saúde.(Brasil, 1996).

Sobre os procedimentos de coleta, a entrevista foi agendada com os participantes e realizada individualmente em visita domiciliar, onde foi escolhido um local em que a pessoa ficasse sozinha com a pesquisadora, em horários e dias diferentes. A aplicação do questionário foi efetuada individualmente e antes de iniciar a aplicação do questionário, foi realizado um rapport e explicado clara e detalhadamente aos sujeitos, de forma individual, sobre os objetivos da pesquisa, sobre o procedimento de gravação em áudio da entrevista e da garantia ao anonimato e sigilo.

Após a explicação, foi entregue aos participantes um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), seguido da aplicação da entrevista semiestruturada, onde os sujeitos puderam responder livremente às perguntas. Durante a coleta de dados, cada entrevista foi gravada em equipamento de áudio, em aproximadamente 30 minutos, seguida de uma posterior transcrição para documento word.

Estratégias Análise dos dados

Os dados coletados foram analisados qualitativamente através da Análise de Conteúdo de L. Bardin (1977), sendo que esta técnica é um instrumento de análise interpretativa e tem como objetivo compreender de maneira crítica o conteúdo das falas, de maneira que se reduzam as informações contidas a algumas características particulares. Nesta técnica é possível fazer inferências sobre os dados alcançados através de perguntas e observações (Franco, 2008).

A Análise de Conteúdo é constituída por três fases distintas: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados obtidos (Bardin, 1977) e organiza-se ainda em Definição das unidades de registro: A partir da análise dos dados, a opção que se mostrou mais conveniente para o propósito do estudo foi o uso de frases, palavras ou grupo de palavras que descrevessem a importância de determinado elemento para o sujeito-participante (apoio social, por exemplo).

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO:

A Análise de Conteúdo foi realizada por categorias e subcategorias temáticas (Tabela 1), a partir de relato verbal do sujeito, com ênfase nos Temas: 01 - Vivências e Modificações Ocorridas na Dinâmica Familiar; Para este Tema foram propostas as seguintes categorias e subcategorias a priori e a posteriori: Questões Relacionais/ Sociais, Mudança no estilo de vida e nas prioridades familiares e Relacional/ Conjugal; Questões Psicológicas: Medo da Perda, Desorganização Familiar quando da irrupção da doença e Adoecimento da Família junto com o Doente; Questões Jurídicas: Burocracia em Saúde Pública; Questões de Deslocamento Geográfico/ transporte/Tempo; Questões Financeiras.

Quanto ao Tema 02: Estratégias de Enfrentamento Adotadas por membros da Família, foram propostas as seguintes categorias e subcategorias: Apoio relacional/Social: Pessoas com Experiências Similares, Informações sobre a Doença, Dialogo com a própria Paciente, Colaboração da Paciente, Apoio de Amigos e Pessoas Próximas e Reaproximação Familiar; Apoio e Ações jurídicas: Conhecimentos e Informações sobre a legislação e Acionamento de Órgão e Serviços Jurídicos; Apoio/Ações Psicológicas: Reorganização cognitiva de prioridades pessoais/ familiares e existenciais e Sentido da doença; Apoio/ações Religiosas/Espiritualidade: Apego a Crenças; Apoio/ações Financeiras: Busca de ajuda financeira.

Analisando os relatos do sujeito, referente ao tema 01: Vivências e Modificações Ocorridas na Dinâmica Familiar, refere às Questões Relacionais/ Sociais, há o fato de ser realizado o tratamento em outro estado, afetando assim um maior convívio entre seus familiares. Destacamos ainda que as dificuldades diante ao diagnóstico de qualquer doença levam o sujeito a refletir sobre sua vida, pessoal e familiar. A partir da verbalização do sujeito 1, o tratamento de sua esposa exigiu dosar a necessidade de viajar longas distâncias e reorganizar o amparo necessário para estarem juntos. Na verbalização do sujeito 3, só o fato da irmã se distanciar de seus filhos para realização do tratamento, passa a ser um problema familiar; Diante dos relatos dos sujeitos da pesquisa podemos perceber o que Bomfim, Bastos & Carvalho, (2007) comentam que diante do adoecimento, algumas famílias encontram-se fragilizadas a este processo, sobre o qual são necessários manejos diversos para uma adaptação frente a este momento vivido.

Referente à subcategoria Mudança no estilo de vida e nas prioridades familiares, o sujeito 1, faz uma reflexão em relação ao seu estilo de viver, posto que antes pensavam em criar bens e que diante da doença do membro, passaram a ver vida de maneira diferente, se preocupando em estudar os filhos e em ter uma vida mais tranquila. No sujeito 1, percebe a necessidade de adaptação e de escolhas, priorizando a vida de todos os membros de sua família e que, mesmo com todo esse desequilíbrio no estilo familiar, busca um reequilíbrio, preferindo abrir mão muitas vezes de seus projetos para proporcionar ao doente um pouco de tranquilidade; o sujeito 3 consegue perceber que ocorreu mudanças no estilo de vida familiar e com essa mudança de comportamento, percebe-se que todos aprendem a priorizar a coisa que mais acha importante na vida, a família; Também no sujeito 4 percebe-se a importância em mudar os hábitos de vida diante a doença de um de seus familiares. Segundo a literatura (Elsen et al, 2002, in Cattani & Girardon-Perlini, 2004) a família é constituída pela união de pessoas que aprendem como lidar com situações do dia-a-dia, conhecimentos e experiências adquiridos com base em sua cultura e contexto familiar, sendo que esses fundamentos lhes dão força, coragem e capacidade para cuidar de alguém de sua família diante de um diagnóstico de doença crônica.

Na subcategoria Relacional/Conjugal, o sujeito 1, percebe-se que, mesmo com todo sofrimento vivido, consegue se expressar de maneira a contribuir com a paciente, na elaboração de acordos entre ambos para proteger sua relação conjugal, bem como familiar, pois uma é consequência da outra. O sujeito 2 percebe a importância em de apoiar sua mãe, mesmo tendo que abrir mão de sua opinião em relação a problemas de relacionamento com o pai. Para o sujeito 3, 4 e 5, a família se uniu mais e "passou a conviver mais junto".

Em relação à segunda categoria Questões Psicológicas, no que se refere à subcategoria Medo da perda, o sujeito 1 demonstra estar no estágio de negação ou mesmo de barganha, pois mesmo diante da dor e do sofrimento acredita que o paciente tem mais força que ele para enfrentar a doença; o sujeito 2 verbalizou a " preocupação em relação aos irmãos pequenos e de como ele sofre só em pensar neles". Para o sujeito 3, esse medo existe, uma vez que a doença, segundo ele, pode vir acompanhada pela tragédia, o que lhe causa muito medo; o sujeito 4 também experimentou alguns sentimentos como a tristeza, o medo e a preocupação. Para o sujeito 5, ao se deparar com o diagnóstico da doença, experimenta os mais diferentes sentimentos, sob a expressão "abalado". Percebe-se que os sujeitos membros da família passam pelos estágios da doença como o paciente, em acordo com estudos sobre vivência diante de diagnóstico de uma doença grave (Kubler-Ross, 1985, in Volpini, 2007) em que o paciente vivencia cinco estágios a partir do diagnóstico da doença: Negação, raiva, barganha, depressão e aceitação. Diante da hospitalização de uma pessoa da família, esta passa por um processo de adaptação diante do desconhecido, despertando os mais variados pensamentos e atitudes que a leva a vivenciar sentimentos nunca vividos (Pinto, Ribeiro & Silva, 2005, in Silva, Andrade, Barbosa, Hoffmann & Macedo, 2009).

Na subcategoria Desorganização familiares quando da irrupção da doença, diante do diagnóstico da doença, o sujeito 1 verbaliza que sua família ficou desequilibrada, que se "perde o chão, você perde o sentido". Para o sujeito 2, sua tristeza e o choque que toda sua família viveu diante do diagnóstico da doença de sua mãe: "Acho que é meio difícil voltar o que era antes"; O sujeito 3 percebe a falta que a irmã faz para os filhos, o que causa sofrimento. Diante do diagnóstico da doença, os sujeitos verbalizaram que ocorre desorganização de sentido, bem como no funcionamento cognitivo tanto individual como familiar, em acordo com os que aponta Messa (2003).

Na subcategoria Adoecimento Familiar junto com o doente, para o sujeito 1, a família encontrase também no processo de tratamento e do adoecer, necessitando de conforto e força para ajudar o paciente e que toda "a família passa a viver com a doença não é só o paciente é toda família". Para o sujeito 2, estão passando por momentos "difíceis sem abaixar a cabeça". O sujeito 3 nota que o adoecimento passa ser de toda a família, mas mesmo diante do sofrimento, verbaliza que a doença acaba trazendo coisas boas e que sua família percebe isso. O sujeito 4, sinaliza que o adoecer de um de seus familiares faz com que todos fiquem doente e "mesmo a família adoecendo junto o sentimento maior é de esperança". Para o sujeito 5, há preocupação em saber que nesse processo de tratamento, a família toda parece que também está doente, uma doença do coração, porque todos "se entristecem com o sofrimento da mãe e com a sua ausência".

Na terceira categoria Questões jurídicas, na subcategoria: Burocracia em Saúde Pública, os sujeitos 1 e 4, referem-se às suas dificuldades encontradas para o tratamento no estado onde reside, e apresenta as exigências da legislação e a falta de informações de como elaborar os processos burocráticos para o tratamento distante de casa. O sujeito 2 apresenta que foi necessário muita disciplina para aprender e conhecer os caminhos, em especial em conseguir ajuda para o Tratamento Fora de Domicílio (TFD). O sujeito 3 fala sobre dificuldades encontradas para se conseguir ajuda do estado e do aprisionamento às burocracias da saúde.

Para a quarta categoria foi levantada as Questões de deslocamento geográfico/transporte/tempo, sendo que o sujeito 1, aponta a dificuldade encontrada diante da distância geográfica entre Cacoal a São Paulo que, segundo o mapa são de 2.834 km, mesmo recebendo ou comprando as passagens aéreas. Para o sujeito 3, essas condições atrapalham o tratamento e que "se ela pudesse fazer esse tratamento mais próximo da família, dos filhos eu acho assim, a própria recuperação seria melhor".

Na quinta categoria Questão financeira, para o sujeito 1, o tempo exigido e despesas financeiras são grandes; o sujeito 2, fala dos esforços em busca de auxílio ao "Tratamento Fora de Domicílio (TFD)". O sujeito 3, lembra que têm prejuízo financeiro, uma vez que tem que se ausentar do trabalho para acompanhar a paciente até São Paulo. Para o sujeito 4, além da necessidade financeira, a família passa pela dificuldade em trilhar os caminhos burocráticos para se conseguir ajuda "como várias outras famílias".

Referente ao segundo tema: Estratégias de Enfrentamento Adotadas por Membros da Família, na primeira categoria Apoio/ações relacionais/Sociais, a subcategoria Pessoas com Experiências Similares aparece como primeiro elemento de enfrentamento apontado por todos os sujeitos, ou seja, a busca de apoio social, de pessoas que vivenciaram situação similar diante de uma total inexperiência e desamparo/ despreparo diante do inusitado; a troca experiência ocorre como mecanismo de aprendizagem de ação junto ao doente e à doença, bem como vinculação por identificação: "A gente passou a conviver com várias pessoas também com tratamento de câncer, então a gente tá lá conversando com um e com outro" (sujeito 1). Podemos fazer uma relação às verbalizações dos sujeitos da pesquisa com a literatura, pois, neste momento em que o paciente está vivendo, é necessário que ele seja cercado de cuidados das pessoas que fazem parte de sua vida, quando ele precisa estar bem emocionalmente e com uma estrutura afetiva adequada, uma vez que estes vínculos afetivos constituem uma "Rede de Apoio Social" (Lugton,1997, in Hoffmann, Müller & Rubin, 2006).

Na subcategoria Informações sobre a doença, os sujeito 1, passam a buscar informações relevantes ao diagnóstico, ajudando a si e ao paciente, onde a troca de experiência ocorre como mecanismo de aprendizagem de ação junto ao doente, à doença e a si próprio; Notase que, de inicialmente confusos (porque a "família não tem um conhecimento especifico de como lidar), eles "procuraram informações sobre a doença e como era o tratamento" (sujeito 2), de modos que essa busca de informações contribui para a adaptação em que se encontra a família diante da hospitalização (Pinto, Ribeiro & Silva, 2005, in Silva, Andrade, Barbosa, Hoffmann & Macedo, 2009).

Para a subcategoria Diálogo com a própria paciente, para os sujeitos tal hábito lhes dão força, coragem e capacidade para cuidar de alguém de sua família diante de um diagnóstico de doença crônica; O diálogo entre o casal e os membros da família com a paciente é um aprendizado que colabora para o fortalecimento da relação, onde "manter contato né, pra que ela se sinta confiante no tratamento" (sujeito 3) e "ficar mais perto, conversar mais, tentando aproveitar mais esse tempo, tentando entender mais essas pessoas, puxando para um lado mais é assim viver mesmo a vida" (sujeito 4), o que destaca o papel da família como constituída pela união de pessoas que aprendem como lidar com situações do dia-a-dia, através de conhecimentos e experiências adquiridos e forjados dinamicamente, além do diálogo que fortalece esses conhecimentos, experiências e vínculos dos familiares com o doente (Elsen et al, 2002, in Cattani & Girardon-Perlini, 2004).

Na subcategoria Colaboração da Paciente, apareceu que a "força" (de enfrentamento) pode estar no paciente, assim, quando os membros da família procuram buscar forças uns nos outros, "ela transmite uma energia muito forte ela não é uma pessoa que você tá cuidando e a pessoa por si só tá só se desanimando dizendo ái, eu, não vou conseguir... não pelo contrário, ela é o tempo todo alto astral" (sujeito 1) e que mesmo a pessoa doente e tendo a noção da gravidade de sua doença sabe que "a vida e a morte elas andam muito próximas né, então ela diz pra gente que o momento em que a gente tá com saúde têm que aproveitar, pra não ter surpresas" (sujeito 3). Ou seja, a própria paciente está passando pelo processo de adaptação diante do adoecimento, o que vai depender muito do modo como o sujeito doente vive, onde ele está inserido e qual sua história de vida (Lorencetti & Simonetti, 2005).

Com a subcategoria Apoio de Amigos/Pessoas Próximas, os sujeitos falam da importância do apoio dos amigos e da importância das relações sociais: "A gente sempre contou muito com ajuda, quando você vê que realmente tem um ciclo de amizade grande e principalmente no início do tratamento dela, o que tinha de gente ligando, tô indo pegar seus filhos pra ir brincar" (sujeito 1); do fortalecimento de laços afetivos entre os membros da família: "todo mundo né se voltou pra ela, não só a família, mas também os amigos" (sujeito 3) e "acredito que a pessoa se sente mais segura, ela não desiste, ela vai até o objetivo né, que é o termino do tratamento". (sujeito 4). Tais verbalizações apontam a importância de o paciente estar cercado de cuidados das pessoas que fazem parte de sua vida, com uma estrutura afetiva adequada, uma vez que estes vínculos afetivos fazem a diferença diante da situação vivida (Lugton, 1997, in Hoffmann, Müller & Rubin, 2006).

Como Subcategoria: Reaproximação Familiar, os sujeitos podem perceber a importância de se unirem em prol da pessoa doente, sendo que essa aproximação fará bem a ela e fortalecerá os laços familiares: "a gente busca assim, estar sempre próximo um do outro entendeu" (sujeito 1), "fico muito feliz num certo ponto em ver o que a minha família já se "encaixou" o que a família fez pra lutar, pra ajudar ela e fico muito triste com o que aconteceu, poderia não ter acontecido, mas já que aconteceu como eu falei, a gente tem que se animar pra se organizar" (sujeito 2), "um teve que ajudar mais o outro né, uma união maior porque agora tem um fator mais importante para você tá tentando driblar, passar, tentar curar que no caso a doença dela, então mais união, essa é a palavra, união, é boas conversas também quando em reuniões de família, a gente ficou mais próximo um do outro" (sujeito 4). Podemos perceber que eles estão mais unidos e fortalecidos, e para Salto (1998) o doente e a família fazem parte deste contexto que segundo a autora, é construído a partir das relações existentes entre esses membros, relações essas cheias de emoções e significados, que se tornam resignificadas e fortalecidas diante da doença. Para a subcategoria Divisão Familiar de Tarefas de Cuidado, percebe a necessidade em dividir as tarefas e da importância da família e dos amigos, e que a divisão de tarefas passa a ser necessária diante da situação em que a família está vivendo no momento: "ficava em casa sozinho com as crianças, então eu fui tomando responsabilidade mais um pouco mais..." (sujeito 2).

Referente à segunda categoria Apoio/Ações Jurídicas, os sujeitos, mesmo tendo conhecimento de experiências similares, buscam se informar sobre os trâmites legais para se conseguir os recursos necessários para o tratamento de seu membro: "a gente foi também no decorrer desses seis anos indo e vindo de São Paulo, a gente foi conhecendo os caminhos a percorrer" (sujeito 1); "muito esforço correndo atrás de coisa pública, até hoje minha mãe, é muito difícil, todo mundo acha que conseguiu lá"(sujeito 2). Na subcategoria Acionamento de Órgão e Serviços Jurídicos, os sujeitos denunciam os descasos jurídicos e o despreparo familiar diante das leis, mostrando a necessidade de conhecimento do que é seu direito, diante de processos demorados que dificultam o cotidiano da família e da pessoa que já passa pelo sofrimento: "esforço que fez antes de ir, antes de estar lá, teve que fazer relatório, fazer um monte de coisa" (sujeito 2).

Na quarta categoria Apoio/Ações Psicológicas, em se tratando de Reorganização Cognitiva de Prioridades Pessoais/ Familiares e Existenciais, os relatos verbais dos sujeitos expressam a sua aprendizagem, uma vez que aprendeu a conduzir a situação como ela se apresenta, priorizando os valores humanos, dando menor valor aos bens materiais, sabendo diferença entre ambos, com maior atenção aos aspectos da vida que não só da doença; os sujeitos apresentam toda uma reorganização familiar a partir de pensamentos e avaliações referentes a este convívio: "o que a pessoa mais precisa não é nem tanto do remédio, mas é o apoio de alguém, ela tem que ter esse apoio, se ela não tiver esse apoio ela não resiste, assim chegou um momento da vida, entendeu, que é nós paramos, eu falei vamos parar porque ou a gente faz isso ou a gente vai ficar sem ela" (sujeito 1), e ainda: "quando a gente está mais próxima da família quando descobre, quando a gente dá mais assistência eu acredito que a pessoa se sente mais segura, ela não desiste ela vai até ao objetivo né, que é o termino do tratamento" (sujeito 4). Para os autores Lazarus & Folkman (1984, in Dell' Aglio, 2000), coping é considerado um "conjunto de esforços cognitivos e comportamentais" que faz com que o indivíduo perceba e saiba como amenizar os estímulos estressores que ocorrem na doença ou mesmo situações sociais, favorecendo a ele uma melhor qualidade de vida.

Na mesma categoria, na subcategoria Sentido da doença, os sujeitos buscam uma forma de dar sentido à doença, em especial, ao fortalecer a relação familiar: para o sujeito 1, a doença não veio de Deus, mas é uma 'cruz' não para o doente, mas para a família. Uma "prova"? Enfim, uma forma de dar sentido à doença, em especial, ao fortalecer a relação familiar, "porque é através da doença que você realmente vai descobrir se a sua família é unida ou não... eu vejo dessa forma". Para o sujeito 3, a doença é vista como "um percalço da vida que pode acontecer no dia-a-dia, e uma vez acontecendo na família, tem todo o lado assim trágico, o lado do medo", mas acrescenta que consegue ver que tem "os dois lados, e que a gente tem que tirar essas coisas boas também disso". Relacionado a essa subcategoria, na quinta categoria Apoio/Ações Religiosas/Espiritualidade, os sujeitos buscam na religião/espiritualidade os recursos de enfrentamento ao processo de doença na família: "temos buscado mesmo na parte espiritual, entendeu? É a força que a gente acha mesmo nessas horas (sujeito 1), "....eu conversava muito com Deus...."(sujeito 2), "Deus dá força pra gente e a gente cuida, e eu posso cuidar dela também (sujeito 5). Diante de todas as verbalizações dos sujeitos da pesquisa podemos verificar que somente um deles não fez referência à religiosidade, o que, portanto, remetenos a Pargament (1997, in Paiva, 2007) segundo o qual os seres humanos utilizam vários meios para lidar com o adoecimento, sendo corporal, intelectual ou espiritual; ou seja, nota-se a importância do coping espiritual como enfrentamento à doença, adotado pelos familiares.

Referente à sexta categoria Apoio/ações Financeiras, para a família, as questões financeiras são percebidas como possibilidade de conhecimento do meio onde estão inseridos, porque demonstra a possibilidade de poder buscar ajuda com outras pessoas/como disse "e ter que dar meu jeito" (sujeito 1),"se eu tenho condições eu vou... fazer relatório, fazer um monte de coisa" (sujeito 2).

 

CONCLUSÃO

Com o presente estudo, é possível fazer uma reflexão sobre as vivências e modificações na dinâmica familiar a partir dos relatos verbais dos sujeitos: as questões psicológicas envolvem o medo da perda, toda a família passa por mudanças emocionais, com medo de perder o "ente querido", demonstram sua impotência diante da morte, preocupação em relação aos filhos pequenos. Essas questões causaram uma desorganização familiar quando da irrupção da doença, como se tivessem "perdido o chão", mas que todos passaram pelo período de adaptação e que hoje conseguem perceber o quanto estão mais seguros em relação ao tratamento, pois no início era como se todos da família estivessem doentes.

Outra dificuldade encontrada pela família, em se tratando das modificações na dinâmica familiar, refere-se às dificuldades para o tratamento no estado de origem onde a pessoa reside, as exigências da legislação e a falta de informações de como elaborar os processos para o tratamento fora do estado. As experiências são adquiridas com o tempo, e que para isso foi necessário muita disciplina para aprender e conhecer os caminhos. E segundo os membros da família, se as leis fossem claras e todos tivessem acesso a ela, não seria difícil conseguir ajuda para qualquer tratamento, quer dentro do estado ou fora dele.

Sendo assim na vivência familiar, ocorreu mudança no estilo de vida e nas prioridades, sendo que para isso a família percebeu a necessidade de adaptação e de escolhas, priorizando a vida de todos os membros de sua família, aproveitando mais esse tempo, tentando entender mais uns aos outros. No que se refere ao relacionamento conjugal, podemos perceber que mesmo com todo sofrimento vivido eles conseguem se expressar de maneira a contribuir com a paciente, na elaboração de acordos entre ambos para proteger sua relação conjugal.

Analisando as estratégias de enfrentamento adotadas por membros da família, podemos perceber que procuram buscar apoio social de pessoas que vivenciaram situações similares, sendo que essa busca da troca de experiência ocorre como mecanismo de aprendizagem, de ação junto ao doente e à doença, bem como vinculação por identificação, sendo relevante ao diagnóstico, ajudando a si e ao paciente. O diálogo com a própria paciente é um aprendizado que colabora para o fortalecimento da relação, assim todos se fortificam através de uma ajuda mútua, diálogo/amizade entre cuidadores e paciente.

As divisões familiares de tarefas de cuidados passam a ser necessário_diante da situação em que a família está vivendo no momento. Diante dos fatos ocorridos os filhos da paciente estão mais responsáveis, e as atividades domésticas passaram a ser de responsabilidades de todos, cabendo ao esposo, à responsabilidade de acompanhar a paciente ao tratamento e ao filho mais velho cuidar dos menores, para isso eles também contam com a ajuda dos tios que moram próximos.

Podemos perceber que diante de todo o processo de tratamento, a família conseguiu uma reorganização, aprenderam ver a vida de maneira diferente e a valorizar as pequenas coisas e o pequeno tempo que têm com a paciente; aprenderam que o ser humano é repleto de sentimentos e emoções e que a família aprendeu a lidar com esses sentimentos, embora essa aprendizagem tenham lhes causado dor e sofrimento; perceberam que o equilíbrio e o fortalecimento dos laços afetivos contribuem para a recuperação da paciente proporcionando a ela uma melhor qualidade de vida.

Quanto ao sentido da doença, os familiares demonstraram que percebem o adoecimento como um percalço da vida que pode acontecer no dia-a-dia, e uma vez acontecendo na família, tem todo o lado trágico, porque está relacionada ao medo, no entanto, acrescentam que conseguem ver a situação em "dois lados" e com ajuda da espiritualidade.

Diante da pesquisa realizada, conclui-se a ocorrência de alterações substanciais na dinâmica familiar de um doente crônico com câncer, mas também do desenvolvimento de diversas estratégias de enfrentamento; podemos perceber a necessidade de novos estudos relacionados a cuidados de pacientes com doenças crônicas, em especial aquelas que são consideradas graves como o câncer e com riscos de morte, em especial sobre o papel que caberia ao psicólogo que pode ser importante neste contexto, auxiliando na elaboração de estratégias com o intuito de adaptação das emoções, da elaboração da angústia e da dor diante do adoecer, proporcionando um ambiente de segurança a todos os envolvidos naquele momento vivido, de auxílio aos cuidadores que na maioria das vezes, se encontram impotentes, fragilizados e desamparados.

 

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Recebido: 28/05/2013
Última revisão: 05/06/2015
Aceite final: 17/06/2015

 

 

Sobre os autores
Cleber Lizardo de Assis- Psicólogo, Mestre em Psicologia/PUCMG, Doutor em Psicologia/USAL-AR; Professor das Faculdades Integradas de Cacoal, UNESC, RO; Pesquisador-coordenador do Grupo de Pesquisa Estudos Psicossociais Regionais/UNESC e integrante do Grupo de Pesquisas Clínica Ampliada da Saúde/PUCMG.
Gislene Fátima Alves- Psicóloga formada pelas Faculdades Integradas de Cacoal, UNESC, RO; Especialista em Psicologia Hospitalar-FUNORTE; Integrante do Grupo de Pesquisa Estudos Psicossociais Regionais/ UNESC.

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