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Psicologia Ensino & Formação

versão impressa ISSN 2177-2061

Psicol. Ensino & Form. vol.4 no.1 Brasília  2013

 

RESENHA

 

História da profissão de Psicólogo no Brasil

 

 

Rita de Cássia VieiraI; Marina Castana FennerII; Laís Gonçalves de SouzaII; Ellen Rose Fernandes FigueiredoII

IFaculdade de Educação da UFMG. Doutora em Educação (UFM). ritav@ufmg.br
IIUniversidade Federal de Minas Gerais. Graduanda em Psicologia.

 

 

Resenha do livro intitulado Escritos sobre a profissão de psicólogo no Brasil, organizado por Oswaldo H. Yamamoto e Ana Ludmila F. Costa, publicado em Natal, Rio Grande do Norte (Brasil), pela Editora da UFRN/ EDUFRN, em 2010 (274 páginas, ISBN 978-85-7273-668-8).

YAMAMOTO, O. H.; COSTA, A. L. F. (Org.) "Escritos sobre a profissão de psicólogo no Brasil". Natal: UFRN/EDUFRN, 2010. 274p.

 

HISTÓRIAS DA PROFISSÃO DE PSICÓLOGO NO BRASIL

As reflexões que acompanharam a comemoração dos cinquenta anos da regulamentação da profissão de psicólogo no Brasil, em 2012, incluem a necessidade de se resgatar e sistematizar os estudos sobre a profissão no país, na tentativa de se contar a(s) história(s) recente(s) da Psicologia como ciência e profissão.

O livro Escritos sobre a profissão de psicólogo no Brasil foi organizado por Oswaldo Hajime Yamamoto e Ana Ludmila Freire Costa. Foi com base em seu amplo domínio sobre o tema que os organizadores inspecionaram um corpus bibliográfico de quase cinquenta anos desde a regulamentação das atribuições do psicólogo, trazendo fontes importantes para o conhecimento da profissão, bem como da produção a respeito dela.

A publicação objetiva delinear a produção a respeito da profissão de psicólogo desde a sua regulamentação no Brasil, pela lei federal nº 4.119 em 1962, fornecendo bases para a promoção dos debates sobre o passado da ocupação, para que possamos, então, lançar luz sobre o futuro da Psicologia.

A obra divide-se em duas partes, sendo que a primeira é produto do projeto de pesquisa Historiografia da produção sobre a profissão de psicólogo no Brasil, concluído em 2010 pelo GT-POT1. Nesse primeiro momento, é apresentado um breve detalhamento da pesquisa e dos seus resultados. Já na segunda parte, em forma de coletânea, é feita a reprodução de textos que exemplificam o que foi produzido acerca da já regulamentada profissão, seguidos pelo post-scriptum dos próprios autores ou de convidados. Essa divisão do livro permite ao leitor primeiramente conhecer de forma mais enxuta a produção a respeito da profissão de psicólogo ao longo de cinco décadas, considerando-se a diversidade de natureza, focos de análise, tema e abrangência geográfica desses estudos. Só a partir daí o leitor entra em contato com textos que fizeram parte dessa história, estando então instrumentalizado para compreender o contexto no qual cada um foi escrito.

A parte I se inicia com o capítulo Estudando a profissão de psicólogo no Brasil: introdução de Yamamoto e Amorim. Nesse capítulo é exposta, com muita propriedade, uma visão geral da produção sobre a profissão no País, visão essa comprometida com a cientometria – análise quantitativa de como o conhecimento foi produzido, difundido e utilizado durante o período estudado. Os dois capítulos seguintes, de Costa, A., Amorim e Costa, J. e de Seixas, Coelho-Lima e Costa, A., respectivamente, ocupam-se do detalhamento das produções publicadas em periódicos, e daquelas desenvolvidas no contexto da pós-graduação. Terminado o detalhamento da análise, o capítulo 4, de Yamamoto, Costa, A., Seixas e Amorim sintetiza com perícia os principais resultados da pesquisa. Os autores verificaram que: (1) a produção sobre a profissão de psicólogo cresceu muito nos últimos anos; (2) que os estudos concentram-se nas subáreas mais tradicionais da Psicologia e (3) que os autores centralizam-se tanto geográfica quanto institucionalmente. O tema parece estar enraizado no meio acadêmico (o que é corroborado tanto pelo número de artigos publicados quanto pelo volume de teses e dissertações), enquanto o papel do profissional resume-se à condição de sujeito de pesquisa. Além disso, a maioria dos autores tem apenas um estudo sobre a profissão de psicólogo no País, o que confirma a idéia de que o tema não está entre as preocupações centrais dos pesquisadores. Esses resultados indicam a necessidade de uma maior interação entre psicólogos e acadêmicos para que os primeiros possam também produzir conhecimento e fomentar discussões e reflexões sobre o tema que lhes diz respeito. Os autores ressaltam os modos de veiculação dos conhecimentos produzidos pelos acadêmicos e a necessidade de que os resultados desses estudos tenham seu alcance ampliado para outros públicos que possam deles usufruir, como, primordialmente, os psicólogos em campo. Podemos afirmar que o próprio livro propõe-se como um movimento nessa direção, já que busca renovar o circuito de comunicação de achados científicos por meio da publicação eletrônica em site de acesso público2, sob a licença Creative Commons. O Creative Commons é um projeto sem fins lucrativos que permite que autores autorizem alguns usos dos seus trabalhos por parte da sociedade, de forma que a obra seja livremente circulada pela Internet, o que facilita uma distribuição mais ampliada das criações intelectuais. Fazse necessário destacar a importância desse tipo de pesquisa, em vista da sua função de indicador de possíveis déficits na formação e atuação dos profissionais da área.

A parte II é composta por cinco textos, acompanhados dos post-scripta referentes a cada um deles. Essas produções datam de diferentes épocas e, portanto, ilustram a construção e a reconstrução contínua do discurso acerca da profissão de psicólogo. São os post-scripta (capítulos 6, 8, 11 e 13) que tornam a discussão atual por meio de apontamentos sobre a evolução ao longo das décadas dos pontos abordados pelos autores na época da publicação de cada texto. O capítulo 5, A situação atual da profissão de psicólogo no Brasil, de Azzi, foi escrito em 1963, um ano depois da regulamentação da profissão, e debate as questões que rondavam a Psicologia na sua condição incipiente – como a adequação da formação desse profissional e as consequências do estabelecimento de um código de ética. O capítulo 6, Enzo Azzi (1921-1985), um médico italiano na psicologia brasileira, escrito por Guedes, discursa sobre as contribuições de Azzi para o estabelecimento da Psicologia no Brasil. O Capítulo 7 é composto pelo texto Psicologia: Características da profissão, escrito por Mello. O texto data de 1975 e sintetiza os resultados de uma pesquisa de 1972 sobre a posição da Psicologia em São Paulo. No capítulo seguinte, Por que escrevemos antes, por que escrevermos agora?, Mello retoma esse estudo trinta anos após tê-lo realizado e faz algumas considerações acerca do lugar que o psicólogo ocupava e ocupa na sociedade brasileira. O Capítulo 9, A quem nós, psicólogos, servimos de fato?, de Botomé, incluiu comentário do próprio autor, além de modificações no conteúdo do texto originalmente publicado na revista Psicologia. O texto discursa a respeito da elitização da Psicologia e é uma adaptação da fala de Botomé na VIII Reunião Anual de Psicologia da Sociedade de Psicologia de Ribeirão Preto em 1978. O tema abordado esteve em evidência após a regulamentação da profissão e permanece ainda atual. O Capítulo 10, A função social do psicólogo, de Campos, é uma adaptação de uma apresentação em um encontro do Conselho Regional de Psicologia, 4ª Região, em 1982, publicada posteriormente na revista Educação e Sociedade. O texto aborda as mudanças no fazer psicológico da época, que passa a confrontar-se não mais com a elite, mas com as classes menos favorecidas da população. O capítulo posterior, Reflexões sobre a evolução e tendências contemporâneas na historiografia da psicologia educacional no Brasil, escrito pela mesma autora, faz referência às fases de desenvolvimento da área de psicologia educacional no País. Por fim, o capítulo 12, O Psicólogo Brasileiro: Sua Atuação e Formação Profissional, escrito por Bastos e Gomide, sumariza os pontos de maior importância da pesquisa feita pelo Conselho Federal de Psicologia em 1986, publicada dois anos depois no livro Quem é o psicólogo brasileiro? (CFP, 1988). A pesquisa foi um dos primeiros projetos que objetivaram mapear a situação da profissão de psicólogo no País como um todo, e não mais em regiões separadas. Em 2006 teve início outro projeto nacional, coordenado pelo GT-POT, transformado no livro O trabalho do psicólogo no Brasil (BASTOS; GONDIM, 2010). O postscriptum do capítulo traz sumarizadas as modificações encontradas por esse grupo no cenário nacional ao longo dos anos.

O livro de Yamamoto e Costa é útil a todos aqueles que se interessam pela história da Psicologia e pelos caminhos que a profissão deveria seguir futuramente. A obra alcança aqueles leitores que começam agora a se interessar pelas características da profissão e de seus profissionais. Atinge também os pesquisadores da área, atraídos pelas atualizações no mapeamento dela, e pela reprodução de textos seminais e de acesso restrito. Além disso, o livro torna claros os desafios da ocupação e fragmentos da realidade social que cerca o psicólogo desde 1962.

Os organizadores não caem na armadilha de acreditar que os textos escolhidos representam a única e irrevogável história a respeito da profissão durante as últimas cinco décadas, deixando claro que estes são alguns exemplos de textos clássicos, mas que os estudos sobre o tema não se resumem a eles ou à sua abordagem. Na realidade, o produto da organização do livro, a partir de textos de diferentes autores, é uma obra recheada de uma rica gama de informações que a valoriza e oferece diferentes visões para os leitores sobre a história da Psicologia.

Por fim, pode-se dizer que a estratégia criada pelos organizadores de convidar os autores desses clássicos e autores relacionados para comentarem os textos foi bem sucedida ao ampliar as fronteiras da análise sobre o trajeto da Psicologia desde os contextos sócio-históricos em que eles foram originalmente publicados até a atualidade. Além disso, a bem costurada publicação da coletânea parece tornar-se conveniente na medida em que comemoramos recentemente os cinquenta anos da regulamentação da profissão de psicólogo, já que a cada ano cresce em progressão geométrica o número de psicólogos e de instituições de formação desse profissional.

 

 

1 Pesquisa realizada com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) / Grupo de Trabalho Psicologia, Organizações e Trabalho da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Psicologia, ANPEPP.
2 http://www.cchla.ufrn.br/bvpropsi

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