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Psicologia Ensino & Formação

versão impressa ISSN 2177-2061versão On-line ISSN 2179-5800

Psicol. Ensino & Form. vol.6 no.1 Brasília  2015

 

ARTIGO

 

Autoeficácia ocupacional e interesses percebidos por estudantes do Ensino Médio público

 

Occupational self-efficacy and perceived interests of students from public high schools

 

 

Marilda Aparecida DantasI; Roberta Gurgel AzziII

IUniversidade Estadual de Campinas. Doutora em Psicologia Educacional. marildapsi@uol.com.br
II
Universidade Estadual de Campinas. Pós-doutora em Psicologia (UFSCar).
azzi@unicamp.br

 

 


RESUMO

Com o presente estudo - de caráter exploratório – objetivou-se identificar e analisar as percepções de autoeficácia ocupacional de formação e os interesses de um grupo de estudantes da segunda série do Ensino Médio público. Participaram 198 estudantes do Ensino Médio de duas escolas públicas do Estado de São Paulo, de ambos os sexos, com média de idade de 15,63 anos. Os participantes responderam ao Questionário de caracterização e à Escala de autoeficácia ocupacional de formação e interesses. Os resultados identificaram percepções dos estudantes quanto à capacidade para concluir com sucesso a formação necessária para atuar em determinadas ocupações e interesses, refletindo coerência teórica. Os dados indicaram a possibilidade de haver falta de informações a respeito das ocupações para o desenvolvimento de carreira. Recomenda-se a realização de pesquisas que investiguem os demais construtos da Teoria Social Cognitiva de Carreira e envolvam a participação de estudantes de todas as séries do Ensino Médio.

Palavras-chave: autoeficácia ocupacional; interesses; Ensino Médio.


ABSTRACT

This exploratory study aimed to identify and analyze the perceptions of occupational self-efficacy training and interests of a group of junior students from public high schools. The participants were 198 high school students, both male and female, from two public schools in the state of São Paulo with an average age of 15.63 years. The participants answered a characterization questionnaire and the scale of occupational self-efficacy of training and interests. The results identified the perceptions of students as to the ability required to successfully complete the training necessary to work in certain occupations of interest, reflecting theoretical coherence. The data indicated the possibility of limited information about the occupations for career development. We recommend further research to investigate other constructs of social cognitive theory of career and involving the participation of students of all years of high school.

Keywords: self-efficacy, occupational interests, high school.


 

 

INTRODUÇÃO

As crenças de autoeficácia são "crenças sobre as capacidades para organizar e executar o curso de uma determinada ação para produzir realizações" (BANDURA, 1997, p.3) que, ao serem percebidas pelos indivíduos, podem influir na escolha, na motivação, na cognição e nos estados afetivos, de modo que as pessoas tenham algum grau de controle sobre seus pensamentos, sentimentos e ações. As crenças de eficácia pessoal são essenciais para o exercício de controle e realização pessoal, cultural e social (PAJARES e OLAZ, 2008), ocupando um papel de preditora motivacional do comportamento, em que pode influenciar a pessoa quanto à condição de aumentar, diminuir ou manter a motivação. As crenças de autoeficácia, inseridas na abordagem psicológica da Teoria Social Cognitiva de Carreira (TSCC), contribuem para compreender, analisar, discutir e intervir no campo de desenvolvimento de carreira, influindo nos interesses e escolhas acadêmicas e ocupacionais dos indivíduos (LENT et al., 1994). A partir das considerações referentes ao construto da autoeficácia e do contexto de desenvolvimento de carreira, o presente estudo, de caráter exploratório, teve como objetivo identificar e analisar as percepções das crenças de autoeficácia ocupacional de formação e os interesses de um grupo de estudantes do Ensino Médio público.

Na proposta teórica, a eficácia percebida contribui para a aquisição de conhecimentos e o desenvolvimento de competências, assim como para a construção de novos padrões de comportamento, a escolha de atividades, a regulação da motivação pelas aspirações e os resultados esperados de seus esforços, embora não produza performances diretamente (BANDURA, 1997). A questão é que se a pessoa pouco acredita que pode produzir efeitos desejáveis sobre suas ações, ela tende a ter pouco incentivo para agir ou para perseverar diante das dificuldades (BANDURA, 1997). A compreensão das crenças de autoeficácia ocorrem por distintos domínios, dos quais o que norteia o presente estudo refere-se à autoeficácia ocupacional de formação, que é conceituada como os julgamentos da pessoa em sua capacidade de completar com sucesso a formação acadêmica necessária para atuar em determinadas ocupações (COIMBRA, 2000).

Na perspectiva da TSCC, a maneira como as pessoas desenvolvem seus gostos ou não gostos pelas atividades acadêmicas e de carreira é reconhecida ao se observarem as influências cognitivas e comportamentais vivenciadas. Entende-se que os indivíduos estão expostos a uma diversidade de atividades (ocupacionais ou não) que realizam ou que veem outras pessoas realizarem, as quais podem funcionar como fontes de informação de autoeficácia, e estas, por sua vez, influenciam o fortalecimento ou enfraquecimento das percepções individuais de eficácia. São reconhecidas quatro fontes de informação: a de experiência direta de domínio, a de aprendizagem vicária, a de persuasão social e a de estados afetivos/ fisiológicos. A experiência direta de domínio é caracterizada pela condição do próprio indivíduo de realizar uma determinada atividade que, a partir dos resultados alcançados, esse indivíduo pode perceber-se ou não capaz de realizar. A aprendizagem vicária consiste em o indivíduo, ao ver alguém de referência realizar uma determinada atividade, sentir-se ou não capaz de fazê-lo também. A persuasão social ocorre quando as pessoas emitem reconhecimento ou não pela realização da atividade feita pelo indivíduo. Quanto aos estados afetivos/fisiológicos, a questão é que a identificação e controle deles podem impactar as percepções de eficácia. Das fontes mencionadas, as experiências diretas de domínios constituem a fonte de informação de eficácia com maior impacto nas percepções dos indivíduos (BANDURA, 1997).

Especificamente no campo do desenvolvimento de carreira, a partir de estudos de metanálises, identificou-se que as percepções de autoeficácia e probabilidade de obter resultados em determinada atividade influenciam na formação de interesses, de modo que as pessoas tenderão a desenvolver seus interesses por atividades em que se sintam mais eficazes (LENT et al., 1994). A importância do desenvolvimento de interesses está em que estes conduzem as pessoas a uma definição mais clara para as suas intenções/objetivos, aumentando a probabilidade de selecionar tarefas relacionadas a elas (LENT et al., 1994; Lent et al., 2001 ; BROWN e LENT, 2006).

O envolvimento em atividades ou práticas específicas conduz à produção de realizações que podem caracterizar sucessos ou falhas, resultando na revisão da percepção das crenças de autoeficácia e em expectativas de resultados estimados para si. Assim, o processo é retroalimentado em diferentes proporções, as quais podem se modificar ou não em intensidades e frequências ao longo do tempo (LENT et al., 1994; BROWN e LENT, 2006). A figura 1 apresenta o modo como os processos cognitivos estão interligados.

 

 

Segundo Brown & Lent (2006), os interesses tendem a manter-se estáveis, mas são passíveis de mudança quando as crenças de autoeficácia e de expectativas de resultados são alteradas. A mudança é explicada pela exposição a novas aprendizagens ou observações como, por exemplo, avanços tecnológicos, capacitação ou reestruturação para o trabalho, que podem ser configurados pelas fontes de informações de eficácia (BANDURA, 1997) e retroalimentam as percepções das crenças de eficácia. A previsão de mudanças ao longo do tempo, em especial quanto às possibilidades de opções de carreira, na perspectiva da TSCC é um ponto que merece ser destacado, pois permite considerar a diluição da visão naturizadora das ocupações.

Pesquisas empíricas internacionais com estudantes de diferentes níveis de ensino apontaram que as crenças de autoeficácia ocupacional são preditoras do interesse e das escolhas ocupacionais (LENT et al., 2001, 2003; LENT et al., 2010, COIMBRA e FONTAINE, 2010). Estudantes com percepções mais elevadas de eficácia em ocupações técnicas/científicas também apresentaram maior persistência ao longo do curso de formação (LENT et al., 1984), maior desempenho e engajamento em atividades acadêmicas e aumento das opções de carreira (LENT et al., 1986 ; 1987), bem como correlações positivas entre autoeficácia em Matemática e interesses em ocupações que exijam a Matemática (LENT et al., 1991; LOPEZ et al., 1997). A percepção de apoios e/ou barreiras está correlacionada à percepção das crenças de eficácia (LENT et al., 2001 ; 2003). No contexto brasileiro, pesquisas empíricas que abordaram o construto da autoeficácia relacionada à ocupação apontaram relações entre as atividades ocupacionais e suas fontes de informação (NUNES, 2007) e entre as percepções de eficácia em atividades ocupacionais e de interesse (NUNES e NORONHA, 2011).

Quanto às condições de desenvolvimento de carreira, no Brasil, a escolha acadêmica e profissional tem sido um processo desafiador para os estudantes (SEMENSATO, 2009; HIRT e RAITZ, 2010). Esse desafio é motivado pelas recorrentes mudanças no mundo do trabalho (ANTUNES, 2009; LUNA, 2012, GUICHARD, 2012), pela falta de informação (SPARTA et al., 2005), ou ainda por informações estereotipadas sobre as profissões divulgadas pela mídia (SILVA, 2004) e pela distribuição dos postos de trabalho na sociedade, a qual é multideterminada por sua estrutura social (MUNHOZ e MELO-SILVA, 2011).

As expectativas dos estudantes ao ingressarem no Ensino Médio são de que neste nível de ensino haja suporte que os ajude a preparar-se para o mundo do trabalho e a escolha de uma carreira profissional (RIBEIRO, 2003; CORTI et al., 2008). Além disso, o trabalho tem sido considerado como princípio educativo pela LDB 9.394 (MEC, 1996) e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio (MEC, 2000). Estes documentos legais propões que a formação do estudante o prepare para o mundo do trabalho mediante o desenvolvimento de competências para seu aprimoramento profissional. Apesar de haver a intenção e iniciativas que voltadas ao estudante do Ensino Médio, estas parecem não ter sido suficientes diante das necessidades apontadas para a inclusão, na grade curricular do Ensino Médio, de intervenções explícitas neste campo, como a orientação profissional e educação para a carreira buscada (COSTA, 2007; BOCK, 2008; HIRT e RAITZ, 2010; MANDELI et al., 2011; MUNHOZ e MELO-SILVA, 2011; RIBEIRO, 2011 ; VALLORE e CAVALETT, 2012).

É esperado que por meio de intervenções no campo da orientação profissional haja ampliação da consciência dos estudantes, que eles identifiquem os determinantes dos contextos em que estão e possam ser instrumentalizados para exercer o protagonismo de suas vidas (MANDELLI et al., 2011: SOUZA et al., 2009). A Psicologia, enquanto conhecimento científico, tem trazido contribuições para a construção de processos voltados ao desenvolvimento de carreira dos estudantes. Entre as abordagens teóricas identificadas na literatura, pretende-se destacar a Teoria Social Cognitiva de Carreira, que segundo Teixeira (2008), propõe estimular o desenvolvimento de estratégias que permitam ao estudante enfrentar as situações do mundo contemporâneo com a as crenças de autoeficácia.

Diante dos aspectos que foram expostos sobre a temática, a hipótese da presente investigação consistiu em identificar convergências entre as crenças de autoeficácia ocupacional de formação e os interesses nas respostas dos participantes. A seguir são apresentados o método utilizado para verificação da hipótese, os resultados, a discussão e as considerações finais.

 

MÉTODO

Participantes

Foram participantes desta investigação 198 estudantes de cinco turmas de segunda séries do Ensino Médio de duas escolas públicas do Estado de São Paulo, das quais uma esta localizada no Interior (n=152) e a outra na Região Metropolitana de São Paulo (n=46). Desses estudantes, 58,08% (n=115) eram do sexo feminino e 41,92% (83) do masculino. Suas idades variaram entre 15 e 18 anos, com média de 15,63 anos. Em sua maioria (117, ou 59,39%) eram estudantes do turno da manhã, e 78 (40,61%) eram do noturno. 171 (88,60%) estudantes nunca repetiram uma série escolar. Quase todos os estudantes (99,49% - n= 196) pretendiam concluir o Ensino Médio e 94,33% (n= 183) deles tinham planos de ingressar no Ensino Superior. 49,48 % (n= 96) exerciam trabalho remunerado, dos quais 32,47% (n= 30) o faziam em período integral, 51,65% (n= 47) em apenas um período do dia e 15,38% (n= 14) em períodos alternados.

Material

Para a coleta de dados junto aos estudantes foram utilizados o Questionário de Caracterização Sociocultural e a Escala de Autoeficácia Ocupacional (formação) e Interesses.

1) O Questionário de caracterização sócio-cultural visa obter informações sobre características pessoais como idade, gênero, trajetória escolar, atividade ocupacional, aspectos familiares e outras (GUERREIRO-CASANOVA et al., 2010).

2) Escala de Autoeficácia Ocupacional (Formação) e Interesses, e COIMBRA (2000) adaptada para uso no Brasil por DANTAS (2013), é composta por duas subescalas, cada uma delas com 51 itens (ocupações). Foram consideradas as ocupações descritas na escala de origem portuguesa e adaptadas semanticamente para o contexto brasileiro. A primeira subescala refere-se à autoeficácia ocupacional de formação do respondente que corresponde à crença sobre capacidade de completar com sucesso a formação acadêmica necessária para atuar em cada ocupação. O respondente tem duas opções de resposta: "Sim" ou "Não". Ao optar pela alternativa "Sim", o respondente indica, numa escala tipo Likert de 1 a 10, até que ponto se sente capaz para cada ocupação. A segunda subescala refere-se aos interesses dos respondentes quanto a cada uma das ocupações mencionadas e apresenta três possibilidades de respostas: "Não gosto", "Indiferente" e "Gosto". Além das ocupações descritas na escala, o respondente descreveu outras nas quais tivesse interesse ou não.

Procedimento

O presente estudo exploratório é parte de um estudo maior em que se investigou o desenvolvimento da carreira de estudantes do Ensino Médio público em que se realizou um projeto de intervenção voltado ao desenvolvimento de carreira. O projeto de pesquisa foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, o qual o aprovou mediante o documento CAAE n. 09248912.0.00005404. Duas escolas públicas de Ensino Médio participaram da pesquisa, ambas localizadas no Estado de São Paulo. Foram contatadas as direções das instituições e apresentados os objetivos da pesquisa e a programação da coleta de dados. Os estudantes participaram voluntariamente da pesquisa e para isso receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido para assinatura dos pais ou responsáveis, caso tivessem menos de 18 anos. Os estudantes responderam coletivamente aos questionários em sala de aula, com a presença da pesquisadora para orientação e possível suporte em caso de dúvidas. Não houve limitação de tempo para o preenchimento dos questionários, mas estimou-se um tempo médio de 50 minutos para preenchê-lo. Os dados coletados dos instrumentos foram transcritos num banco de dados do programa Exccel e posteriormente transferidos para o programa estatístico The Statistical Analysis System (SAS), versão 9.8.

 

RESULTADOS

Os dados foram submetidos às análises descritivas de frequência e porcentagem, de acordo com o objetivo proposto. Quanto às alternativas de respostas da Escala de crenças de autoeficácia ocupacional de formação, foram consideradas somente as opções de "Sim" e "Não" dos participantes para a questão "Se sente capaz de completar com sucesso a formação necessária para atuar como (ocupação x)?". Sobre as alternativas de respostas da segunda subescala, de Interesses ocupacionais dos estudantes, foram consideradas as alternativas indicadas em "Não Gosto", "Indiferente" e "Gosto".

As ocupações descritas na escala foram organizadas em quatro blocos, nos quais foram agrupadas de acordo com o nível de competência formalizado pela Classificação Brasileira de Ocupações para Pesquisas Domiciliares (COD), cujo gerenciamento é realizado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O COD utilizado é referente à última versão, a do ano 2002, e é uma adaptação da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), sendo esta gerenciada pelo Ministério do Trabalho e Emprego. O nível de competência da ocupação, de acordo com o COD refere-se à complexidade, amplitude e responsabilidade das atividades desenvolvidas, e pontua-se mais por esses critérios do que pelo nível de escolaridade (CBO, Mt, acesso em janeiro de 2014). Os quatro níveis de competência indicam que quanto maior o número, maior a competência exigida, exceto para a competência 0, na qual não há definições. No quadro 1 é possível visualizar a distribuição dos níveis de competências das ocupações de acordo com os grandes grupos que classificam as ocupações.

 

 

A partir do COD, as ocupações que compõem a Escala de autoeficácia ocupacional de formação foram classificadas em função de sua nomenclatura por meio da indicação do primeiro dígito do código numérico da divisão de grandes grupos. Posteriormente, as ocupações foram distribuídas em função dos níveis de competência especificados no quadro 1. Desta organização, os resultados de cada bloco das ocupações agrupadas foram submetidos à verificação da consistência interna, na quase obtiveram índices de alpha de Crombach que variaram entre 0,63 a 0,89 - considerados adequados para a exploração dos dados. Foram elaboradas quatro tabelas, conforme o nível de competência das ocupações, nas quais se apresentam os dados das frequências de cada uma delas, destacando-se os valores de porcentagens nos quais houve maiores concentrações das respostas dos participantes, nas percepções tanto da primeira quanto nas da segunda subescala.

As análises descritivas das ocupações agrupadas pelo nível de competência 0 são apresentadas na tabela 1. Para o nível de competência 0 são agregadas as ocupações relacionadas a membros das Forças Armadas, policiais e bombeiros, e membros superiores do Poder Público. É possível identificar que em cinco das sete ocupações listadas neste bloco as respostas estão concentradas na alternativa "Não", indicando que a maior parte dos estudantes não se percebe capaz de completar com sucesso a formação necessária para atuar nela. Na segunda parte da tabela 1, notou-se que a concentração das respostas sobre os interesses/preferências dos estudantes, para cada ocupação, tende a se manter na opção "Não gosto". A ocupação de diretor/gerente foi aquela em que a maior parte dos estudantes se apontaram como capazes de concluir a formação e da qual também gostavam. Na ocupação de comerciante, mesmo a maior parte dos participantes tendo respondido que sentir-se capaz de concluir a formação, a maioria dos estudantes não respondeu que gostava da ocupação. As respostas dos participantes de que se sentem capazes se dividem, em sua maioria, entre "Indiferente" e "Gosto".

 

 

Na tabela 2 são descritos os resultados das ocupações categorizadas pelo nível de ocupação 2. Este nível de competência de ocupação abarca atividades de serviços administrativos, de serviços do comércio, de trabalhadores agropecuários e de produção de bens e serviços, de reparação e manutenção. Ao observar a concentração das porcentagens das respostas, notou-se que em apenas uma ocupação, a de Assistente administrativo, a resposta foi em "Sim", o que indica que o respondente sente-se capaz de completar com sucesso a formação necessária para atuar nela. Para as demais ocupações, as respostas dos estudantes concentraram-se em "Não". A segunda parte da tabela, em que se apresentam os interesses/preferências dos estudantes, observou-se que as respostas se concentraram em "Não gosto", inclusive no tocante à ocupação "Assistente administrativo".

 

 

A tabela 3 reuniu as ocupações de nível de competência 3, em que são inseridas ocupações técnicas e de nível médio. Os resultados mostraram que a concentração de respostas para a primeira parte da escala está em "Não" se sentem autoeficazes para completar com sucesso a formação necessária para atuar, exceto em Técnico em informática. Na segunda parte da escala, sobre os interesses/ preferências, as respostas se concentraram em "Não Gosto" para todas as ocupações, inclusive para a de Técnico de informática.

 

 

Na tabela 4 são apresentados os resultados das ocupações de nível de competência 4, abarcando as ocupações de profissionais das ciências e das artes, sendo esta a de maior nível de competência. Observou-se que, em relação à capacidade de completar com sucesso a formação necessária para atuar na ocupação, as respostas se concentraram na alternativa "Não" na maioria das ocupações, exceto nas de psicólogo, engenheiro e fotógrafo. Para a ocupação de contabilista, as respostas foram divididas em 50% para "Sim" e 50% para "Não". Na segunda parte da escala as respostas estão concentradas na alternativa "Não gosto", exceto nas ocupações de advogado e fotógrafo. A ocupação de fotógrafo foi aquela em que a maior parte dos estudantes respondeu sentir-se capaz para concluir a formação e também que gostavam dela. Para as ocupações de psicólogo e engenheiro as respostas de autoeficácia ocupacional de formação se concentraram na alternativa "Sim", e na segunda parte da tabela, as respostas se concentraram na alternativa "Não Gosto".

 

 

Vale lembrar que, ao responderem à escala, os estudantes poderiam indicar outras ocupações que não estivessem descritas na lista daquela escala. Dos 198 participantes, apenas 38 (19,19%) indicaram uma ou mais ocupações não mencionadas na escala. Os demais estudantes não indicaram novas ocupações. O quadro 2 a seguir apresenta a descrição das ocupações citadas por eles.

 

 

Observou-se que a descrição nem sempre foi da nomenclatura da ocupação, em alguns casos foram citados os nomes dos cursos de formação para exercer a ocupação que foram considerados da mesma forma como possibilidade de desenvolvimento de carreira. Para as ocupações citadas, os estudantes indicaram "Sim", sentindo-se capazes para completar com sucesso a formação necessária para atuar nela. Notou-se que as ocupações apontadas são diversas em relação à formação acadêmica, variando entre nível técnico, superior e curso de qualificação.

 

DISCUSSÃO

Os resultados encontrados possibilitaram conhecer as percepções dos estudantes a respeito de diversas ocupações. Diretor/gerente foi a ocupação em que a maioria dos estudantes responderam perceber-se autoeficazes (66,67%, n=132) e também a de que mais gostam (47,71%, n=92). Barbeiro foi a ocupação com menor número de respostas em autoeficácia ocupacional de formação (13,71%, n=27), e também a menos preterida dos estudantes (89,74, n=173). A ocupação de Secretário (a) foi a mais apontada como "Indiferente" (33,68%, n=65) para eles, e a de advogado foi a ocupação em que a maioria dos respondentes apontaram não sentir-se capazes (50,51%, n=100), mas também a de que a maior parte indicou gostar (37,11%, n=72).

A tendência observada pela concentração das respostas dos participantes em "Não" se sentirem eficazes para concluir com sucesso a formação para atuar e "Não" terem preferências/interesses pelas respectivas ocupações reflete certa coerência teórica. Como aponta a literatura, as pessoas tendem a desenvolver interesses em ocupações que se sentem mais eficazes para realizar (LENT et al., 1994). Como as crenças de autoeficácia são preditoras motivacionais e comportamentais (BANDURA, 1997), e especialmente as crenças de autoeficácia ocupacional são preditoras do desenvolvimento de interesses (LENT et al., 2003; LENT et al., 2010, COIMBRA e FONTAINE, 2010), ressalta-se sua importância como abordagem teórica para o desenvolvimento de carreira dos estudantes, sobretudo quanto à possibilidade de alterações nos interesses quando modificadas as percepções de autoeficácia por meio de fontes de informação (BROWN e LENT, 2006), o que possivelmente influirá nas seleções de metas e realizações dos estudantes. Como visto nos resultados em que houve a coerência teórica, espera-se que a condição educacional seja um fator facilitador para o desenvolvimento de autoeficácia e interesses ocupacionais.

Quanto às concentrações das respostas dos participantes descritas nas quatro tabelas, vale ressaltar que foram consideradas para efeito comparativo as concentrações de respostas, pois se sabe que não necessariamente refletem todas as respostas dos mesmos sujeitos da primeira subescala para a segunda subescala. Apesar desta condição da análise dos resultados, nota-se que a distribuição das respostas dos itens (ocupações) pelas alternativas permaneceu refletindo a tendência na coerência teórica. Não foi esperado que os participantes se percebessem capazes para completar com o sucesso a formação necessária para atuar em todas ou na maioria das ocupações, tendo-se em vista a diversidade de itens elencados. No que tange à abordagem teórica, não há expectativas de que todos os estudantes se percebam autoeficazes em todas as ocupações, em face da diversidade de domínios das crenças de autoeficácia (BANDURA, 1997).

Quanto às concentrações das respostas, vale apontar o elevado número de ocupações em que os participantes não se sentem capazes de completar com sucesso a formação necessária para a atuação e seu consequente desinteresse pelas ocupações, embora ainda haja respostas de estudantes que se percebem capazes e gostam das ocupações. Apenas nas ocupações de diretor/gerente e fotógrafo é que houve concentração de respostas nas alternativas de autoeficazes e interessantes. Sobre o agrupamento das ocupações de acordo com o nível de competência COD, a análise das respostas dos estudantes, numa comparação entre as quatro tabelas, mostra que esse fator parece não ter sido impactante, uma vez que permaneceu a tendência apontada.

Observou-se que a maior parte dos estudantes não indicou outras ocupações ao responder à escala, o que pode indicar que são escassas as informações dos estudantes sobre as ocupações no contexto brasileiro, como indicaram Sparta et al. (2005) ou que são superficiais as informações divulgadas pela mídia (Silva, 2004), e sobretudo, que é difícil apontar ocupações, até pela possível falta de apoio para realizar esta tarefa. Quanto às ocupações apresentadas pelos estudantes, embora diversificadas, notou-se que pedagogia, medicina, psiquiatra e parteira/médica já estavam contempladas nos itens da escala pelas ocupações de professor e médico, caracterizando alguma desinformação dos participantes. Esses dados reforçam a necessidade de desenvolver estratégias que possam contribuir para que os estudantes busquem informações e possam realizar suas escolhas de modo menos parcial, e em especial, que possam ser inseridas no Ensino Médio (COSTA, 2007; BOCK, 2008; HIRT e RAITZ, 2010; MANDELI et al., 2011; MUNHOZ e MELO-SILVA, 2011; RIBEIRO, 2011 ; VALLORE e CAVALETT, 2012). Além disso, espera-se que as estratégias de intervenção possibilitem aos estudantes p exercício do protagonismo para o desenvolvimento de carreira (MANDELLI et al., 2011: SOUZA et al., 2009).

Este estudo exploratório, por meio do levantamento realizado, permitiu uma aproximação com as percepções dos estudantes do Ensino Médio público sobre aspectos relacionados às ocupações. Os dados aqui apresentados poderão contribuir para o planejamento de intervenções, em especial para compreender os motivos pelos quais os estudantes não se percebem eficazes para concluir a formação necessária em determinadas ocupações e seu consequente impacto nos seus interesses/preferências. Espera-se que o recorte da Teoria Social Cognitiva de Carreira, quanto aos processos cognitivos importantes no que tange à aproximação e evitação comportamentais no contexto em questão, possa contribuir para uma melhor compreensão do desenvolvimento de interesses (LENT et al., 2001, 2003; LENT et al., 2010, COIMBRA e FONTAINE, 2010 ; NUNES, 2007; NUNES e NORONHA 2011), para a persistência no curso de formação (LENT et al., 1984), para o desempenho e engajamento em atividades acadêmicas e para a ampliação das opções carreira (LENT et al., 1986 ; 1987) e a percepção de apoios e/ ou barreiras (LENT et al., 2001 ; 2003).

 

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