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Perspectivas em análise do comportamento

versión On-line ISSN 2177-3548

Perspectivas vol.6 no.2 São Paulo  2015

http://dx.doi.org/10.18761/pac.2015.019 

ARTIGO

DOI: 10.18761/pac.2015.019

 

Extinção operante e suas implicações: uma análise do uso em um episódio do programa Supernanny

 

Operant extinction and its implications: an analysis of the use in an episode of Supernanny

 

Extinción operante y sus implicaciones: un análisis de la utilización en un episodio del programa Supernanny

 

 

Fernanda Resende MoreiraI; Joana Singer VermesII

I Paradigma Centro de Ciências do Comportamento
II Paradigma Centro de Ciências do Comportamento, Instituto de Psiquiatria – HCFMUSP e NECIP-USP

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O uso clínico de procedimentos de extinção operante tem um importante papel na redução de comportamentos-problema. Porém, o potencial aversivo deste procedimento foi demonstrado experimentalmente, implicando em padrões semelhantes aos das condições aversivas, indicando-se, portanto, um uso cauteloso. Com o intuito de discutir a aplicação deste procedimento na clínica infantil, foi realizada a análise de um episódio do programa de televisão Supernanny. Buscou-se descrever e avaliar o uso desses procedimentos sob a ótica interpretativa das autoras e das diretrizes indicadas no Manual de Análise do Comportamento Aplicada para a utilização desses procedimentos. Foram analisadas as estratégias para redução de birras e para instalar o comportamento de dormir da criança. Os resultados mostraram que as técnicas empregadas corresponderam parcialmente às diretrizes dos autores supracitados. No caso da birra os procedimentos não corresponderam totalmente ao que às descrições da análise do comportamento definem como extinção e reforçamento diferencial. Já no segundo caso (hora de dormir) o procedimento foi bem delineado e atendeu melhor às diretrizes dos autores. Após a análise dos procedimentos, sugere-se que o programa não deva ser utilizado, exclusivamente, como orientação para resolução de problemas de comportamento de crianças para os telespectadores.

Palavras-chave: extinção, reforçamento diferencial, Supernanny, terapia analítico-comportamental infantil.


ABSTRACT

The clinical use of operant extinction procedures plays an important role in reducing behavior problems. However, the aversive potential of this procedure was demonstrated experimentally, resulting in similar patterns to the aversive conditions, indicating thus a cautious use. In order to discuss the application of this procedure in children's clinic, the analysis of an episode of the television program Supernanny was conducted. It was attempted to describe and evaluate the use of these procedures in the author's interpretative perspective and the guidelines set out by the Applied Behavior Analysis Manual for using these procedures. Strategies for reducing tantrums and installing child sleep behavior were analyzed. Results showed that the techniques employed corresponded partially to the above author's guidelines. Tantrum procedures did not fully correspond to how descriptions of Behavior Analysis define extinction and differential reinforcement. On the other hand, bedtime procedure was well designed and best met the author's guidelines. After the procedures analysis it is suggested that the program should not be used only as a guideline for solving child behavior problems for TV viewers.

Keywords: extinction, differential reinforcement, Supernanny, child behavior analytic therapy


RESUMEN

El uso clínico de los procedimientos de extinción juega un importante papel en la reducción de los comportamientos. El potencial aversivo de este procedimiento se demostró experimentalmente, lo que resulta en patrones similares a las condiciones aversivas, se indicando un uso prudente. Para discutir la aplicación de este procedimiento en la clínica de los niños, se llevó a cabo el análisis de un episodio del programa de televisión Supernanny. Si trató de describir y evaluar el uso de estos procedimientos en la perspectiva interpretativa de los autores y directrices establecidas en el Manual de Análisis del Comportamiento Aplicada. Se analizaron las estrategias para la reducción de las rabietas y instalación del comportamiento del sueño infantil. Los resultados mostraron que las técnicas empleadas corresponden parcialmente con las directrices de los autores mencionados. Los procedimientos para rabieta no correspondían plenamente a las descripciones del Análisis del Comportamiento que define extinción y refuerzo diferencial. En el segundo caso el procedimiento fue bien diseñado y mejor cumplía con los lineamientos de los autores. Tras el análisis de los procedimientos, se sugiere que el programa no debe ser utilizado exclusivamente como una guía para la resolución de problemas de comportamiento infantil a los espectadores.

Palabras-clave: extinción, refuerzo diferencial, Supernanny, terapia analítico-comportamental infantil.


 

 

Ao longo da vida, indivíduos aprendem a se comportar a partir das consequências produzidas pelas suas respostas e como essas consequências retroagiram sobre tais organismos (Skinner, 1957). Muitas relações de reforçamento são duradoras e se mantêm ao longo do tempo. Um exemplo é a criança que aprende a se comunicar a partir da interação com o mundo, desde seu nascimento. Essa aprendizagem se dá a partir das consequências reforçadoras que a sociedade provê: atendimento de necessidades, solução de problemas, obtenção de informações importantes, dentre outros. Por outro lado, algumas respostas podem deixar de produzir as consequências anteriormente produzidas, interrompendo o processo de reforçamento, diminuindo a probabilidade desta classe de operantes ser emitida no futuro (Skinner, 1953/2003).

Neste caso, toma-se como exemplo uma criança que fazia birra e esse conjunto de respostas era reforçado por atenção dos pais. Quando esta pessoa se torna um adulto e passa a trabalhar em uma empresa, essa classe de comportamentos de birra, que agora pode ser chamada de "chilique", passa a não ter efeito sobre as pessoas e vai perdendo sua força, além de poder produzir consequências diferentes: a punição (por exemplo, uma demissão). Assim, mesmo que uma resposta seja reforçada aumentando sua probabilidade de emissão, se o reforço não está mais presente, o comportamento pode voltar a seus níveis anteriores à introdução do reforçamento, rapidamente ou lentamente, dependendo da história de reforçamento. Este processo não afeta apenas a classe de respostas reforçada, mas também uma faixa de outras respostas que serão abordadas ainda nesta introdução (Catania, 1998/1999).

 

Extinção operante.

De acordo com Catania (1998/1999), o procedimento de extinção é definido como a suspensão da liberação do reforço. Como resultado desta operação, o responder é enfraquecido e retorna para os níveis prévios, anteriores ao reforçamento. Milenson (1967) destaca que, para que haja o procedimento de extinção, primeiramente é necessário que uma resposta seja fortalecida, permitindo então que o reforçador deixe de ser liberado. Desse modo, há uma interrupção abrupta da conexão de uma resposta operante e uma consequência reforçadora. Há, portanto, um processo de enfraquecimento desta classe de respostas e, como resultado, a relação de contingência da resposta e sua consequência é degenerada e o responder retorna aos padrões comportamentais observados anteriormente ao fortalecimento da resposta. Tal resultado vai de encontro à afirmação de Skinner (1953/2003) de que a extinção é um procedimento efetivo para remover um comportamento operante.

Catania (1999/1998) ressalta duas propriedades diferentes da extinção: a quebra da relação de contingência entre a resposta e a consequência reforçadora e a ausência do estímulo reforçador. Cada uma dessas propriedades tem efeitos diferentes no responder do sujeito que se sobrepõem no processo de extinção.

A quebra da relação de contingência resposta-consequência tem como efeito mais específico a redução do responder, pois implica em uma contingência que não funciona mais. Já a propriedade de descontinuar a apresentação do reforçador modifica não só a resposta a qual se pretende reduzir a frequência, mas também uma faixa de respostas do repertório do sujeito (Catania, 1998/1999). Quando o reforço é suspenso, respostas que não haviam sido reforçadas tendem a ocorrer em topografias diferentes (variabilidade comportamental) e em alta frequência, o que implica em um comportamento emocional muitas vezes denominado por raiva (Milenson, 1967), frustração ou cólera (Skinner, 1953/2003).

O processo de extinção é longo e pode se estender por muitas horas (Milenson, 1967). Skinner (1953/2003) afirma que este processo ocorre de maneira mais lenta que o de condicionamento operante e vai depender de como foi a história de condicionamento deste comportamento. "A uma longa história de reforço, segue-se uma extinção procrastinada" (p. 77). O mesmo funciona para uma história de reforçamento intermitente.

Em suma, Milenson (1967) descreve o processo de extinção em três partes: 1) declínio gradual e irregular na taxa de respostas e aumento progressivo de períodos sem emissão da resposta operante que havia sido reforçada; 2) aumento na variabilidade de topografia e magnitude da resposta; 3) quebra gradual da relação de contingencia entre o operante e o reforçador.

 

Potencial aversivo da extinção operante

Ao discutir sobre o uso da extinção na prática clínica, Bravin e Gimenes (2013) descrevem vários achados experimentais que chamam a atenção para as evidências funcionais, topográficas/estruturais e biológicas de que a extinção de comportamentos mantidos por reforçamento positivo é um procedimento aversivo.

Com relação às evidencias funcionais, estudos experimentais demonstram que animais em uma condição de extinção tendem a emitir comportamentos que eliminem ou adiem esse tipo de contingência, o tempo gasto para emitir tais comportamentos é menor do que se comparado a grupos-controle e há supressão dos comportamentos que produziam o reforço. Já as evidências topográficas/estruturais se baseiam nos achados de que a extinção produz padrões de resposta de mesma topografia que aqueles produzidos em condições de estimulação aversiva (Bravin & Gimenes, 2013). Dentre tais padrões de respostas emocionais estão, por exemplo, os comportamentos agressivos de atacar outro animal (Azrin, Hutchinson & Hake, 1966). Por fim, as evidências biológicas retratam que sistemas neurobiológicos semelhantes são ativados em condições de extinção e de estimulação aversiva. Infere-se, portanto, sobre um potencial aversivo da extinção (Bravin & Gimenes, op cit).

 

O uso da extinção operante no contexto clínico

Conte e Silveira (2004) asseguram que a extinção é uma das principais operações promotoras de mudança na prática clínica. As autoras consideram a existência dos efeitos colaterais indesejáveis no processo de extinção e indicam a combinação com esquemas de reforçamento como forma de amenizá-los, ressaltando também a importância de reforçamento positivo no setting terapêutico quando há a suspensão de uma contingência (configurando um processo de extinção). Diante disso, não recomendam que os pais sejam orientados a simplesmente deixarem de reforçar os comportamentos inadequados dos filhos se ainda não possuem habilidades necessárias para reforçar respostas que sejam mais adequadas e desejadas. Por fim, as autoras concluem que o papel da extinção na aplicação clínica é aumentar a probabilidade da emissão de respostas diferentes e mais adequadas do que as respostas problemáticas do sujeito, tornando-se possíveis de serem fortalecidas e concorrerem com as últimas.

 

Reforçamento diferencial

O reforçamento diferencial é um procedimento que envolve a extinção de uma classe de operantes concomitantemente ao reforçamento de outra classe de operantes e, por esse motivo, não tem apenas o objetivo de reduzir um comportamento, mas também de modelar comportamentos novos (Cooper, Heron & Heward, 2007). O reforçamento diferencial é o procedimento comportamental menos intrusivo no sentido de seu potencial aversivo, se comparado à extinção pura, punição e time out1 e, por isto, muito popular entre os analistas do comportamento. No entanto, ainda assim, é possível de se verificar a ocorrência de episódios emocionais devido aos momentos de extinção (Cowdery, Iwata & Pace, 1990).

 

Diretrizes para o uso de extinção

Cooper, Heron e Heward (2007) propõem algumas diretrizes gerais sobre os cuidados ao se aplicar na prática o procedimento de extinção, que serão explicitados em seguida e utilizados ao longo deste artigo para a análise dos dados:

1. Suspender todos os reforçadores mantenedores do comportamento-problema: é necessário identificar quais são os estímulos reforçadores mantenedores do comportamento alvo da extinção para que todos sejam suspensos, pois a suspensão de apenas alguns deles produz pouca mudança comportamental. Os autores exemplificam uma criança que tem seu comportamento de fazer "palhaçadas" em sala de aula mantido por reforçamento social dos colegas e da professora, se apenas a atenção da professora é suspensa, é pouco provável que o comportamento da criança diminua.

2. Suspender consistentemente os reforçadores: a suspensão dos reforçadores deve acontecer em todas as ocasiões em que o comportamento-alvo for emitido, caso contrário não haverá eficácia no procedimento. Para exemplificar, toma-se uma criança que quebra os objetos do quarto quando é colocada de castigo dentro dele, produzindo a liberação do castigo por parte dos pais. Ao optar por implementar a extinção, é provável que a criança aumente a frequência deste comportamento quebrando ainda mais os objetos, bem como varie a topografia rabiscando as paredes (efeitos da extinção). Se os pais permitem que a criança saia do castigo para evitar depredar os objetos em algumas situações como, por exemplo, quando estão exaustos para suportar a bagunça da criança, a resposta de quebrar objetos com função de esquiva do castigo continua a ser reforçada de forma intermitente, perdendo-se assim a efetividade do procedimento2 .

3. Utilizar a extinção combinada com outros procedimentos: o uso da extinção pura envolve problemas tais como efeitos colaterais indesejados, não ensina um comportamento mais adequado e envolve questões éticas. Diante disso, os autores recomendam o uso do reforçamento diferencial para reduzir comportamentos-problema, que são procedimentos derivados da extinção, mas que utilizam também do reforçamento positivo. Rehfeldt e Chambers (2003) utilizaram, com sucesso, reforço diferencial de comportamentos alternativos para reduzir comportamento verbal perseverante (repe2 Exemplo das autoras. tição sobre os mesmos conteúdos) em um adulto com autismo por meio da suspensão da atenção quando tais falas eram emitidas, ao passo que reforçavam positivamente com atenção falas mais apropriadas do sujeito. Assim, verificaram que as falas perseverantes reduziram de frequência, enquanto outros tipos de falas, mais adequadas e não perseverantes aumentaram.

4. Descrever a contingência de extinção: o processo de extinção pode ser mais rápido quando acompanhado da descrição de que tal procedimento será iniciado como, por exemplo, o professor dizer para os alunos que enquanto estiver explicando a atividade para um grupo de trabalho, não irá responder às dúvidas dos demais alunos até que termine sua explicação para aquele grupo.

5. Planejar o manejo dos efeitos colaterais da extinção: é importante haver o planejamento de como os efeitos colaterais na forma de comportamentos emocionais serão manejados, para que tais comportamentos não sejam reforçados, por exemplo, com atenção. Alguns exemplos desses comportamentos são hetero e auto agressividade, tais como bater a cabeça na parede, danificar objetos ou xingar. É importante que o sujeito que aplica o procedimento tenha claro quais desses efeitos poderão ser ignorados, quais não poderão e como irá lidar com eles. Os autores citam o exemplo da professora que ignorava (procedimento de extinção) uma aluna que fazia perguntas enquanto ela dava instruções para outros alunos. Quando a garota começou a perturbar seus colegas, a professora se voltou para ela e, mesmo em tom de repreensão, respondeu à sua pergunta para que ela parasse de atrapalhar os pares. Assim, a professora não só falhou na tentativa de reduzir o comportamento de pedir informações em momentos inadequados, como reforçou outro comportamento indesejável (atrapalhar os colegas).

6. Aumentar os episódios de extinção: para acelerar o processo de extinção os autores propõem o manejo de contingências para evocar os comportamentos-problema que serão alvo da extinção como, por exemplo, criar situações cotidianas para seguimento de regras, se a criança inicia comportamentos disruptivos nesses contextos e assim, poder implementar o procedimento de extinção em uma frequência maior.

7. Incluir todas as pessoas de importante convívio diário na aplicação do procedimento: todas as pessoas que ocupam um importante papel na vida do sujeito deverão aplicar o procedimento de extinção para os mesmos comportamentos, evitando que eles sejam reforçados inapropriadamente. Desta forma, os autores exemplificam que se um professor planeja extinguir determinados comportamentos da criança, ele deve orientar os pais, irmãos, terapeutas, dentre outros, para que todos consequenciem o comportamento da mesma maneira.

8. Não extinguir comportamentos adequados: os autores chamam a atenção para a prática comum de estar sob controle dos comportamentos-problema que são alvo da extinção e, acidentalmente, acabar extinguindo outros comportamentos que inclusive podem ser adequados. Eles ressaltam que, no contexto escolar, é comum os professores darem mais atenção àqueles que estão causando tumulto do que aqueles que estão desempenhando a atividade corretamente. De acordo com os autores, este pode ser um exemplo de extinção de um comportamento adequado caso esteja sob controle de reforçamento social.

9. Não utilizar de extinção em algumas situações específicas: não é recomendável o uso da extinção de comportamentos que sejam importantes para outros sujeitos no sentido de que poderiam ser imitados e de comportamentos graves que gerem agressão direcionada ao próprio sujeito, a outros ou a alguma propriedade. Pinkston, Reese, LeBlanc e Baer (1973) descrevem a condução do tratamento para reduzir comportamentos hetero agressivos de um garoto através de extinção desses comportamentos, pela suspensão da atenção da professora, combinada com reforçamento positivo de demais comportamentos adequados. Além disso, o colega que era agredido era acolhido e liberado para brincar com um brinquedo. Como resultado, os comportamentos de agressão de fato diminuíram segundo os autores, principalmente ao reforçamento de comportamentos concorrentes.

 

Reforçamento diferencial de comportamentos incompatíveis (DRI) e reforçamento diferencial de comportamentos alternativos (DRA)

O reforçamento diferencial de comportamentos incompatíveis, correspondente ao termo em inglês differential reinforcement of incompatible behavior (DRI), consiste em reforçar respostas que são impossíveis de ocorrerem ao mesmo tempo em que os comportamentos-problema estejam ocorrendo e, concomitantemente, aplica-se a extinção aos comportamentos-problema. Já o reforçamento diferencial de comportamentos alternativos, termo em inglês differential reinforcement of alternative behavior (DRA), consiste no reforçamento de comportamentos desejáveis que sejam alternativos aos comportamentos problemáticos, mas não necessariamente incompatíveis como no primeiro caso. No DRA, pode haver tanto os comportamentos-problema quanto os alternativos ocorrendo juntos, mas a probabilidade do comportamento-problema ser emitido é reduzida (Cooper et al., 2007).

Cooper et al. (2007) ressaltam alguns requisitos que aumentam a efetividade dos procedimentos de DRI e DRA e que serão utilizados ao longo desse artigo para a análise dos dados tais como:

1. Selecionar um comportamento alternativo ou incompatível que já exista no repertório do sujeito, que tenha um custo de resposta igual ou menor que o comportamento a ser extinguido e que seja emitido em uma frequência razoável e que seja reforçado naturalmente no ambiente do sujeito: desta maneira as chances de manutenção e generalização do comportamento reforçado são ainda maiores. Quando não há comportamentos desse tipo no repertório do sujeito, é aconselhável escolher um comportamento de fácil ensino ou considerar outro tipo de esquema de reforçamento. Webber e Scheuermann (1991) criaram uma tabela com problemas comportamentais comuns nas salas de aula e comportamentos alternativos/incompatíveis tais como, por exemplo: bater e expressar raiva verbalmente; não fazer a tarefa e olhar para o livro, escrever; conversar fora de hora e levantar a mão para falar.

2. Utilizar de reforçadores importantes para o sujeito e que possam ser de fácil liberação por parte da pessoa que aplica o procedimento. Além disso, quando possível, manipular operações motivadoras que aumentem o valor desses reforçadores: ao utilizar da técnica de economia de fichas para reduzir comportamentos que faziam parte da classe de operantes de comportamentos hiperativos e impulsivos, Robert (2005) utilizou como consequência reforçadora brinquedos e reforçamento social. A escolha dos brinquedos utilizados como reforçadores foi realizada a partir da investigação em entrevista com os pais da criança e na observação direta de preferências da criança em sessão.

3. Liberar e suspender os reforçadores de maneira consistente e imediata: esta operação pode ser considerada mais importante até mesmo que a magnitude do reforçador. Neves e Calais (2012), ao relatarem um caso de encoprese de um adolescente, investigaram sua história de treino ao toalete quando criança e verificaram que as contingências de reforçamento foram programadas de maneira inconsistente e independentes do comportamento de defecar adequado do garoto, influenciando no quadro atual de déficit nesse repertório.

4. Liberar os reforçadores em esquema de reforçamento contínuo (CRF) e, após o comportamento estabelecido no repertório do sujeito, passar para um esquema de reforçamento intermitente: Para ilustrar, imagina-se que os pais de uma criança foram orientados a reforçar a resposta dela de barganhar após ter algum desejo seu negado (CRF), como comportamento alternativo a se isolar. Após um tempo de aplicação do DRA e a verificação de que o comportamento de isolamento diminuiu ao passo que o de barganhar aumentou, orienta-se aos pais que mantenham o procedimento, liberando o reforçador apenas uma vez ao dia (reforço intermitente)3 .

5. Reforçar os comportamentos alternativos ou incompatíveis em uma taxa maior do que os comportamentos indesejáveis são reforçados: a suspensão total dos reforçadores dos comportamentos inadequados seria o ideal, delineando-se um procedimento de extinção. Vollmer, Roane, Ringdahl, e Marcus (1999) testaram a eficácia do tratamento com reforçamento diferencial de comportamentos alternativos, na redução de comportamentos problemáticos, realizado de forma parcial, ou seja, em que nem todos os comportamentos alternativos eram reforçados e nem todos os comportamentos-problema eram extinguidos. Os autores constataram uma maior eficácia na implementação total do tratamento e uma redução da eficácia se o esquema de reforçamento tender para os comportamentos inadequados, sendo estes mais reforçados. Contudo, vale ressaltar que é possível atingir bons resultados na redução de comportamentos-problema a partir de um esquema de reforçamento diferencial que tende para o comportamento indesejado, dependendo de algumas condições descritas e hipotetizadas pelos autores em seu trabalho e que não serão explicitados aqui por necessitarem de serem mais bem discutidos.

6. Utilizar outras técnicas em conjunto com o DRA/DRI quando o comportamento a ser reduzido envolve algum risco para si ou para outros, já que se deseja suspender as consequências para estes comportamentos: outros procedimentos a serem utilizados em concomitantemente podem 3 Exemplo das autoras.ser: time out, fading, bloqueio de resposta, dentre outros. Patel, Piazza, Kelly, Oschsher e Santana (2001) aplicaram DRA juntamente com o procedimento de fading para tratar da resistência ao tomar líquidos diferentes de água de uma criança de seis anos de idade, com o objetivo final da aceitação da ingestão de leite contendo um produto em pó com alto valor calórico, necessário para a dieta da criança. Assim, juntamente com o DRA para o comportamento de beber líquido, o fading consistiu em aproximações sucessivas do líquido final, passando pelas fases de ingestão de apenas água, água com o produto e finalmente leite com o produto.

O presente artigo apresenta uma análise interpretativa do uso de estratégias de extinção operante, realizadas em um episódio do programa de televisão Super Nanny, com o objetivo de verificar se esses procedimentos respeitam as diretrizes indicadas pelo Manual de Análise do Comportamento Aplicada de Cooper et al. (2007) e propor uma reflexão sobre a utilização desse programa ao cumprir a função de orientação de pais e cuidadores de crianças.

 

Método

Material

Para o desenvolvimento do presente artigo foi selecionado o sétimo episódio da primeira temporada do programa de televisão Supernanny – "The Gorbea Family" , que apresenta a orientação/utilização de técnicas aplicadas a uma criança de aproximadamente três anos, realizadas pela apresentadora do programa (Jo Frost) e pela mãe da criança. A família apresentada é composta pela criança em questão, mãe, pai e dois irmãos de oito e nove anos de idade. A dinâmica familiar é caracterizada por uma grande demanda de atenção da criança com relação a mãe e pouco envolvimento do pai no que diz respeito as tarefas de casa e interação com os filhos, resultando em uma sobrecarga de tarefas domésticas para a mãe e pouca disponibilidade de atenção para os demais filhos. Os comportamentos-alvo incluíram birra e o dormir na própria cama. Define-se birra como uma classe de comportamentos operantes composta por gritar, chorar, se debater, agarrar as pernas da mãe, elevar os braços em direção ao colo da mãe na ausência de sua atenção. Define-se dormir na própria cama como passar a noite deitado, sozinho, em sua cama.

Para a coleta dos dados, foi necessário um computador com acesso à internet e, para o registro das técnicas empregadas foi utilizado um quadro de avaliação funcional na qual as contingências foram desenhadas pela primeira autora do artigo no esquema Estímulos discriminativos – Respostas – Consequências.

Procedimento de coleta

Os fragmentos do vídeo mostrando o uso/orientação desses procedimentos e o trecho que retrata a linha de base dos comportamentos da mãe com relação à criança nos momentos de birra e hora de dormir foram selecionados para a análise funcional em forma de quadro.

Procedimento de análise

Os procedimentos de extinção e/ou reforçamento diferencial foram analisados criticamente a partir da avaliação funcional delineada pela primeira autora, demonstrando as relações funcionais do comportamento da mãe com a criança.

A análise se dividiu em três partes. Uma primeira parte diz respeito à descrição das contingências dispostas no quadro de avaliação funcional da linha de base dos comportamentos da mãe diante do problema de birra e de hora de dormir. A segunda parte traz a descrição das contingências dispostas no quadro de avaliação funcional com a intervenção de Supernanny, juntamente com análises críticas realizadas pelas autoras baseadas no conhecimento teórico sobre o procedimento de extinção e na própria prática clínica. Uma terceira parte refere-se à análise do procedimento orientado por Supernanny à luz das diretrizes propostas por Cooper et al. (2007). Os autores são expoentes importantes na área acadêmica, pois construíram um manual amplamente utilizado por aplicadores da análise do comportamento, o Applied Behavior Analysis. A partir desse material, foram analisados se os pré-requisitos para a implementação de tais procedimentos foram respeitados na aplicação prática transmitida por Supernanny e,a partir de tais resultados, propor discussões sobre lacunas e perigos na aplicação e, principalmente, orientação de técnicas da análise do comportamento sem o devido cuidado.

 

Resultados e discussão

A seguir serão apresentados os resultados e a discussão concomitantemente, devido ao caráter interpretativo do trabalho. Fez-se tal escolha para tornar a compreensão do leitor mais clara enquanto acompanha a descrição das contingências juntamente com as suas análises, tendo em vista que o material analisado não é apresentado por ter o caráter de vídeo. Sugere-se que antes de prosseguir neste trabalho o leitor assista ao episódio de Supernany que será analisado. O episódio mostra a família Gorbea, a criança em questão chama-se Adam e tem aproximadamente 2 anos de idade e a mãe chama-se Evelyna. Vale ressaltar que em todos os quadros de análises funcionais as setas representam contingências entrelaçadas, enquanto sua ausência representa contingencias independentes.

Birra

Objetivo das intervenções de Supernanny: reduzir o comportamento de birra.

Linha de base

Análise dos comportamentos-alvo da mãe (dar atenção diante das birras) antes da intervenção de Supernanny. (Figura 1)

 

 

Nota-se que Adam emite as respostas de agarrar as pernas da mãe, gritar, chorar e elevar os braços em direção ao colo da mãe com a função de receber a sua atenção na forma de colo, o que possibilita a definição desta classe de respostas como birra. Para Evelyna, a mãe, esses comportamentos compõem uma estimulação aversiva que sinaliza a possibilidade de um reforçamento negativo (interrupção da birra), caso ela dê atenção ao filho, como pegar no colo. Diante disso, observa-se que o comportamento da mãe de carregar o filho em seu colo tem a função de esquiva das birras, mantendo, portanto, o comportamento birrento de Adam.

Intervenção

Análise dos comportamentos da mãe para reduzir as birras da criança, a partir de duas orientações de Supernanny que envolvem procedimentos de extinção e suas derivações. (Figura 2 e 3)

 

 

 

1ª Orientação de Supernanny: a mãe deve abaixar até a altura da criança, olhar nos olhos e, com tom de voz ameno, dizer para a criança sentar-se e comer ou ir brincar, acalmar-se e parar de chorar.

Interpretação do procedimento envolvido na orientação: descrição de regra sobre uma contingência de reforçamento diferencial de comportamentos incompatíveis (DRI).

Análise crítica: Esta proposta de Supernanny envolve fornecer regras que descrevem contingências concorrentes com o comportamento de birra de Adam. Como o alvo da intervenção é reduzir as birras, infere-se que o objetivo de tais descrições seja o de produzir um comportamento incompatível, ou seja, ao seguir a regra de se sentar e comer sanduiche, brincar, se acalmar e parar de chorar, Adam não seria capaz de emitir comportamentos de birra. Como consequência das intervenções, Adam permanece emitindo comportamentos de birra, o que demonstra que a intervenção não funcionou.

É importante frisar que não há a contingência de reforçamento diferencial, pois a mãe não atua nas consequências do comportamento de birra e sim nos antecedentes, fornecendo uma regra. As regras têm função de estimulação suplementar para evocar alguns comportamentos esperados, mas é necessário que haja outros estímulos presentes na contingência, principalmente quando a resposta que se espera é alternativa a uma resposta que foi fortemente reforçada na história de vida do sujeito, tendo baixo potencial de concorrência. Além disso, o comportamento de seguir regras dependerá de como foi a história prévia de reforçamento desta classe comportamental, instalando de maneira fraca ou forte esse padrão de comportamento. Neste procedimento de redução de birra, a mãe não manipulou o ambiente para criar estimulação discriminativa que aumentasse a probabilidade da emissão de respostas concorrentes à birra como, por exemplo, deixar à disposição da criança o sanduiche ou o brinquedo. Esperou-se que apenas diante de uma regra a criança emitisse uma resposta concorrente. Diante disso, conclui-se que apenas a regra como estimulação antecedente não produziu mudança comportamental nesta contingência analisada.

Como uma regra que suplementa a contingência, esta orientação de Supernanny apresenta alguns problemas que podem, juntamente com outras variáveis do ambiente, justificar a falha do procedimento. A regra descrita apenas apresenta qual resposta deve ser emitida pela criança (comer, brincar, se acalmar e parar de chorar), mas não descreve qual consequência reforçadora será liberada pela mãe (atenção).

Ainda que a orientação de upernanny não se restringisse apenas a descrição da regra de uma contingência de reforçamento diferencial e tal contingência de fato fosse implementada, haveriam obstáculos na arquitetura do procedimento. Pelo caráter do objetivo do presente trabalho, esta orientação de Supernanny será analisada como se de fato houvesse uma contingência de reforçamento diferencial de comportamentos incompatíveis à luz de Cooper et al. (2007).

Análise crítica a partir das diretrizes de Cooper et al. (2007): Os comportamentos de sentar, comer e brincar, inicialmente selecionado para concorrerem com a birra, já existem no repertório da criança, têm baixo custo de resposta (pois são fluentes em seu repertório), são emitidos frequentemente em seu cotidiano e produzem reforçadores naturais, o que vai de encontro às sugestões de Cooper et al. (2007). No entanto, as consequências reforçadoras de comer e brincar são de pequena magnitude frente a atenção da mãe no contexto apresentado e, principalmente, se a criança estiver saciada de comida e de brincadeira. Além disso, os comportamentos selecionados não são incompatíveis aos comportamentos de birra, pois a criança pode tanto comer quanto brincar fazendo birra – ex: jogar a comida e os brinquedos, chorar e comer ao mesmo tempo. Já em um segundo momento, Supernanny seleciona os comportamentos de ficar calmo e parar de chorar, que são incompatíveis com a birra. Ficar calmo remete a uma redução do comportamento motor e emocional e parar de chorar implica em se comportar de forma contrária a um dos comportamentos da classe operante de birra – o choro. Contudo, há um alto custo na emissão destas respostas tendo em vista que a criança está passando por efeitos emocionais produzidos pelo procedimento de extinção delineado pela suspensão da atenção da mãe (colo) que faz parte da contingência de DRI. Esses efeitos, por sua vez, são incompatíveis com os comportamentos respondentes de se acalmar e parar de chorar.

Infere-se que a consequência reforçadora para os comportamentos incompatíveis com a birra seja a atenção e contato físico liberado pela mãe. Os autores orientam a utilização de reforçadores importantes para o sujeito, de fácil liberação e que seu valor possa ser aumentado a partir da manipulação de operações motivadoras. Neste sentido, o reforçador está adequado, pois atenção é uma classe operante que envolve muitos comportamentos e de fácil liberação tais como olhar, abraçar, beijar, tocar, carregar no colo. Apesar de este procedimento envolver a suspensão da consequência reforçadora (atenção), o que poderia aumentar seu valor reforçador, Supernanny orienta a mãe a abaixar-se e olhar para a criança enquanto descreve a contingência de reforçamento diferencial para ela.

Considera-se que a mãe, portanto, está privando a criança de apenas uma topografia de atenção carregar no colo e não das demais topografias. Assim, as operações motivadoras poderiam ser mais bem manipuladas, por exemplo, se a mãe descrevesse a contingência de reforçamento para a criança apenas uma vez, permanecesse em pé e sem fazer contato ocular com a mesma. Observase, portanto, que apenas a consequência reforçadora de carregar no colo é suspensa de forma consistente e imediata enquanto outros comportamentos da mãe com função de atenção são liberados de forma incontingente ao comportamento da criança.

Os autores sugerem ainda outras diretrizes que não foram avaliadas por não terem sido observadas nesse trecho do vídeo e, por isso, não serão explicitadas.

2ª Orientação de Supernanny: ignorar quando a criança fizer birra, abaixar e pedir para ela dizer o que quer sem chorar.

Interpretação do procedimento envolvido na orientação: extinção dos comportamentos de birra e descrição de regra sobre uma contingência de reforçamento diferencial de comportamentos alternativos (DRA).

Análise crítica: neste momento do vídeo, Supernanny inicia um procedimento de extinção. Ao orientar a mãe a ignorar a birra de Adam, sugere que seja suspensa a atenção que dava ao filho quando este emitia comportamentos de birra. Como consequência disso, nesse primeiro momento Adam emite um conjunto de respostas que, no passado, foi altamente reforçado pela mãe (tentar subir em seu colo, gritar e chorar). À medida que a mãe mantém o procedimento de extinção o comportamento da criança intensifica: ela grita e chora em tom mais elevado e, neste momento, Supernanny orienta a mãe a se abaixar, olhar nos olhos da criança e com tom de voz ameno pedir para Adam dizer o que quer sem chorar. Como consequência, as respostas de Adam intensificam-se ainda mais. Em seguida, Supernanny retoma a orientação de suspender a atenção e repetir os passos de se abaixar e conversar com a criança quantas vezes for necessário. Ao orientar para que a mãe pergunte à criança o que ela quer, infere-se que Supernanny tem o objetivo de fazer a criança emitir um comportamento verbal vocal (mando) dizendo o que ela deseja de forma adequada. Essa nova topografia deveria concorrer com a birra, lembrando que o objetivo final do procedimento era eliminá-las. Entende-se que tal orientação pode ser uma tentativa de criar uma condição de reforçamento diferencial de comportamentos alternativos por meio de regras sobre como a criança deve se comportar para ser reforçada. Conclui-se que tal procedimento não funcionou já que Adam não emitiu o comportamento de pedir à mãe o que deseja ao invés de chorar.

Algumas partes do procedimento não são mostradas no programa, pois há uma lacuna entre o momento em que Adam está gritando, agarrando as pernas da mãe e esperneando e o momento em que ele já está mais calmo, chorando em menor intensidade. Neste segundo momento, a mãe pergunta o que Adam quer e ele descreve "sanduiche de amendoim", mas ainda emite o comportamento problema em pequena intensidade (choro). Apesar de a criança ter emitido a resposta exigida pela mãe, ela não é reforçada, pois a mãe continua suspendendo a atenção em forma de colo e contato físico. Em seguida, a mãe descreve uma nova contingencia de reforçamento pedir o que quer sem chorar – e a criança emite respostas diferentes das especificadas. Observa-se que este não pode ser considerado um procedimento de reforçamento diferencial, pois apesar de haver a extinção de uma classe de comportamentos e a tentativa de reforçamento de outra classe de comportamentos adequados, não há a modelagem através de aproximações sucessivas do comportamento final que se deseja produzir na criança. Se o objetivo de Supernanny é que Adam peça o que deseja de maneira adequada ao invés de fazer birra, seria mais adequado que o procedimento envolvesse reforçamento diferencial do comportamento de solicitação da criança.

No vídeo, percebe-se que apesar de Adam responder que quer sanduiche, o reforçador final do procedimento é o abraço da mãe, sendo assim seria importante a mãe descrever para Adam que o que ele está querendo é a atenção dela. Adam chora não porque está com fome e sim porque a mãe deixou de lhe fornecer atenção em forma de colo, principalmente.

Mais uma vez há um corte no vídeo entre este último momento e o ponto em que Adam já não chora, apenas choraminga, e agarra o pescoço da mãe tentando subir em seu colo. Diante disto, a mãe descreve algo que sugere uma nova contingência de reforçamento diferencial: lhe dará beijos e abraços, mas não quando ele estiver chorando – e contém fisicamente a resposta da criança de subir em seu colo. Como consequência, Adam segue a regra. A criança solta o pescoço da mãe, para de choramingar, fica na frente da mãe calado e, em seguida, a mãe reforça suas respostas lhe dando um abraço. Ainda assim, não se pode dizer que houve um procedimento de reforçamento diferencial já que não houve modelagem de respostas sucessivamente mais próximas a pedir por atenção de maneira adequada, sem chorar. O resultado final deste procedimento é a criança cessar os comportamentos de birra e parece ter relação muito mais com a contingência de extinção. Não há aprendizagem de um comportamento socialmente adequado e sim a quebra da relação entre fazer birra e receber a atenção da mãe (em forma de colo e contato físico, na referida contingência).

Análise crítica a partir das diretrizes de Cooper et. al (2007): de acordo com as diretrizes dos autores para a realização do procedimento de extinção, Supernanny não seguiu a proposta de suspender todos os reforçadores mantenedores do comportamento-problema nesta segunda orientação, pois manteve o pedido de que a mãe se abaixasse, olhasse nos olhos da criança e em tom ameno perguntasse o que ela quer – comportamentos que compõem uma classe comportamental da mãe com função de atenção. O único reforçador suspenso de forma consistente é o colo da mesma, no entanto, os outros reforçadores são liberados de maneira intermitente, principalmente quando o comportamento da criança é intensificado logo no início do procedimento. Um reforçamento intermitente tem maior poder reforçador do que um reforçamento contínuo e, portanto, este delineamento de não suspender consistentemente pode até mesmo fortalecer ainda mais os comportamentos de birra e selecionar esses comportamentos em maior intensidade efeitos próprios do processo de extinção. Caso isto aconteça, a criança poderá iniciar as birras já em alta intensidade.

Os autores frisam a importância da utilização de outros procedimentos concomitantes à extinção. Ao final do procedimento a mãe, apoiada pelas instruções de Supernanny, descreve que dará beijos e abraços em Adam quando este não estiver chorando. Esta descrição é uma regra que pode suplementar a contingência em vigor e foi feita de maneira correta, pois descreveu que ele deveria parar de se comportar (resposta esperada) e quais seriam as consequências reforçadoras. Uma das funções da regra é conseguir produzir um comportamento em outro sujeito sem que este precise aprender a partir da experiência direta com a contingência que, no caso, é de extinção, poupando o sujeito de possíveis riscos de integridade física e de tempo de aprendizagem. Esta regra foi descrita apenas ao final do procedimento quando o comportamento de birra já estava bastante reduzido, mas poderia ser emitida desde o início do procedimento.

Além disso, não houve nenhum planejamento sobre o manejo dos efeitos colaterais: não há, durante todo o episódio, algum tipo de preparação da mãe realizada por Supernanny antes de iniciar o procedimento de extinção. Seria muito importante que a apresentadora tivesse explicado o objetivo para a mãe, especificado as respostas a serem ignoradas, os possíveis efeitos colaterais e como ela deveria agir diante desses efeitos. No momento em que a criança, olhando para a mãe que está abaixada à sua frente, chora de maneira menos intensa e abre seus braços como um pedido de abraço, a mãe descreve estar quase abandonando o procedimento.

Outro ponto sugerido pelos autores é que comportamentos adequados não sejam extintos de maneira acidental. Em um procedimento de extinção haverá variação dos comportamentos do sujeito devida à suspensão dos reforçadores e comportamentos novos serão emitidos. Alguns desses comportamentos poderão ser formas alternativas de se comportar que são mais adequadas para se conseguir o reforçador que foi suspenso e, em um procedimento de extinção, serão ignorados. Deste modo, perde-se a oportunidade de fortalecer uma resposta adequada. No procedimento de Supernanny a mãe pede para que a criança diga o que quer e, quando Adam responde "sanduiche de amendoim", o pedido não é reforçado. A mãe perdeu a oportunidade de ter selecionado um comportamento que está dentro da classe comportamental de pedidos e, portanto, ensinar ao filho a solicitar sua atenção ao invés de fazer birra para obtê-la. Nesse caso, os autores sugerem a utilização de reforçamento diferencial para que comportamentos adequados não sejam extintos. Os autores também propõem tal sugestão como forma de instalar um repertório novo e, ainda, conter os efeitos colaterais da extinção.

Por fim, Cooper et al. (2007) sugerem aumentar os episódios de extinção para acelerar o processo de quebra da relação entre o comportamento e as consequências reforçadoras, incluir todas as pessoas de importante convívio diário na aplicação do procedimento e não utilizar de extinção em algumas situações específicas. O procedimento foi realizado apenas com a mãe, mas não é retratado que Adam se comporta da mesma maneira com as outras pessoas da família (irmãos e pai), o que talvez minimize a necessidade da aplicação deste procedimento por essas outras pessoas de acordo com o que foi evidenciado no vídeo. Na ausência de Supernanny houve a oportunidade de a mãe colocar em prática as orientações da apresentadora, mas a mãe não emitiu os comportamentos adequados para a aplicação do procedimento. Em outro momento, Supernanny orienta novamente a mãe diante dos mesmos comportamentos-problema da criança e, ainda assim, grande parte das críticas levantadas acima acerca da aplicação do procedimento de extinção são encontradas.

Quanto às situações específicas, são citadas extinção de comportamentos que são importantes para outros sujeitos do grupo social e que gerem agressão, entretanto o caso explicitado não atende a nenhum desses critérios.

Apesar de Supernanny ter alcançado seu objetivo final, que era reduzir a birra de Adam, todo esse procedimento durou cerca de 45 minutos, com muitos obstáculos. Pode-se dizer que este procedimento foi aversivo tanto para a criança quanto para a mãe com presença dos efeitos colaterais da extinção. Além disso, em alguns momentos do procedimento, Adam emitiu respostas diferentes das quais estava emitindo no início da extinção como, por exemplo, espernear. Não foi possível verificar qual a consequência fornecida pela mãe neste momento do vídeo, mas vale ressaltar que se ela seguir as orientações de Supernanny de se abaixar e conversar com a criança (atenção), poderá selecionar uma variação topográfica do comportamento de birra, fortalecendo ainda mais esta classe comportamental. Apesar de ter mostrado que o resultado final foi o término da birra, não significa que Adam deixará de emitir esse tipo de comportamento, pois o procedimento deverá ser replicado algumas vezes até que, diante das mesmas condições de suspensão da atenção da mãe, Adam não emita nenhum tipo de comportamento de birra, garantindo que a relação de contingência entre birra e atenção foi quebrada. Inclusive, quando a mãe replica o procedimento, mesmo na presença de Supernanny, nota-se que há certa dificuldade para conseguir com que Adam pare de fazer birra.

Hora de dormir

Objetivo das intervenções de Supernanny: fazer com que a criança passe a dormir no próprio berço ao invés de dormir na cama dos pais.

Linha de base

Análise dos comportamentos-alvo da mãe (colocar a criança para dormir) antes da intervenção de Supernanny. (Figura 4)

 

 

As análises funcionais mostram que Adam emite comportamentos de gritar, chorar e agredir a mãe quando é levado por ela para dormir. Quando isso acontece a mãe se comporta no sentido de eliminar tais comportamentos do filho, o que demonstra que esses comportamentos da criança constituem estimulação aversiva para a mãe. Ao se comportar com função de esquiva dos comportamentos de contrariedade do filho em ir dormir, a mãe acaba por reforçar tal padrão comportamental. Ao final da cadeia comportamental, além de evitar dormir, Adam ainda recebe tempo livre para assistir TV e atenção da mãe como consequência de seus comportamentos, fortalecendo o padrão de emitir comportamentos de contrariedade na hora de dormir. A criança apenas emite comportamentos direcionados para o dormir após algum tempo assistindo TV e quando a atenção da mãe é diminuta, pois ela apenas o acompanha sentada no sofá da sala, interagindo pouco com ele. Levanta-se a hipótese de que Adam se saciou de assistir televisão e não há outros estímulos reforçadores concorrentes com ir dormir já que a mãe, neste momento, fornece pouca atenção. Quando Adam decide ir dormir, a mãe o leva diretamente para o quarto do casal e o coloca para dormir junto de si e seu marido. Observa-se que não há nenhuma tentativa de colocá-lo em seu berço. Infere-se, portanto, que houve uma história pregressa na qual Adam rejeitou dormir no berço em seu próprio quarto, ao passo que aceitou dormir junto dos pais, selecionando o comportamento da mãe de levá-lo diretamente para o quarto do casal com função de esquiva dos comportamentos disruptivos típicos da criança que não aceita dormir sem a presença dos pais.

Intervenção

Análise dos comportamentos da mãe para colocar a criança para dormir sozinha, a partir das orientações de Supernanny que envolvem procedimentos de extinção e suas derivações. (Figura 5)

 

 

Orientação de Supernanny: a mãe deve levar Adam até seu quarto, criar um ambiente bom e tranquilo, ler uma história, dar beijos e carinhos, levá-lo para o berço e dizer "boa noite". Em seguida, deve afastar-se a uma pequena distância do berço, sentar-se no chão e abaixar a cabeça sem fazer contato ocular com a criança. Caso Adam saia do berço, a mãe deve recolocá-lo imediatamente e apenas dizer "é hora de dormir". Se continuar a sair do berço, deve continuar redirecionando-o, mas suspender as falas.

Interpretação do procedimento envolvido na orientação: extinção e redirecionamento de comportamentos incompatíveis com dormir e fading out da atenção fornecida pela mãe.

Análise crítica da autora desta monografia: A presente proposta de Supernanny é iniciada com a suspensão de alguns reforçadores que mantinham a criança acordada durante o momento de ir dormir, tais como entretenimento (brincar e ver TV) e atenção da mãe (colo da mãe). Contudo, a mãe ainda fornece algum tipo de atenção quando conversa com a criança ao colocá-la no berço, seguindo a orientação da apresentadora do programa. Como consequência, Adam sai do berço e vai até a mãe no sentido de produzir esses reforçadores que lhe foram suspensos, mas Evelyna repete o mesmo procedimento anterior redirecionando a criança para o local em que ele deve permanecer (berço), suspendendo também a atenção na forma de conversa e novamente afasta-se da criança. Adam, desta vez, reage de forma mais intensa, o que fica claro observando-se a latência de tempo dessa resposta: ele desce do berço e sobe no colo da mãe mais rapidamente. Esta mudança na velocidade do comportamento pode ser considerada um leve efeito inicial do processo de extinção na qual o sujeito se comporta ainda sob controle de uma história de reforçamento pregresso.

A criança novamente desce do berço e abraça a mãe e, neste momento, Evelyna abraça a criança de volta, faz carinho em sua cabeça e demora um pouco mais para redirecionar a criança para o berço. Tais comportamentos podem ter função de atenção para Adam e reforçar as respostas que ele emite para tentar produzir atenção de uma forma ainda mais refinada como, por exemplo, sair rapidamente do berço. Além disso, a liberação de reforçadores de forma assistemática durante um procedimento de extinção pode acabar reforçando intermitentemente comportamentos indesejáveis da criança e selecionando um padrão ainda mais refinado de comportamentos disruptivos. Neste momento Supernanny orienta a mãe a redirecionar Adam imediatamente, o que é bastante adequado. Contudo, não aponta para a mãe os motivos da inadequação de abraçar e fazer carinho em seu filho durante tal procedimento. Nesse sentido, talvez não tenha ficado claro para Evelyna que o problema naquele momento não era apenas a latência em colocar o filho no berço, mas também a liberação dos reforçadores de atenção. Não compreendendo isso, o risco é que a mãe emita tais comportamentos quando repetir o procedimento na ausência da apresentadora como, por exemplo, colocar a criança imediatamente no berço ao mesmo tempo em que a afaga ou a abraça.

A partir deste momento, Adam apresenta uma variação sutil em seu comportamento que se segue progressivamente – mais um efeito da extinção comportamental. Ele fica em pé no berço, o que é mais adequado do que descer dele, mas passa a gritar em forte intensidade. Tal comportamento mobiliza tanto a mãe que ela reage chorando e tampando seu rosto. Supernanny, então, se aproxima dela e pede para que pare de chorar e tire as mãos do rosto. Esta orientação é de grande importância já que pode haver uma relação na história de interação mãe-filho em que estes comportamentos da mãe podem ter se tornado estímulo discriminativo para o filho, que sinaliza que a mãe irá ceder e reforçar suas respostas. Logo em seguida, Adam desce do berço e emite um novo comportamento, que é se jogar na frente da mãe, o que pode fortalecer a hipótese descrita.

O vídeo mostra, de maneira incompleta, uma série de tentativas de Adam descendo do berço e a mãe o redirecionando. Observa-se a variabilidade de comportamentos emitidos por Adam tais como gritar, descer mais rapidamente do berço, pular no colo da mãe, beliscá-la, bater e puxar seu cabelo. Esses se configuram mais claramente como efeitos emocionais da extinção, principalmente a agressividade. Entende-se, portanto, que Adam está sob estimulação aversiva.

Após os episódios descritos acima, o vídeo mostra Adam deitado no berço, chorando em menor intensidade. Infere-se que houve uma redução comportamental gradual dos episódios anteriores até este ponto do vídeo, que não foi mostrado. A mãe, juntamente com Supernanny, permanece no mesmo local suspendendo os reforçadores até que a criança durma. Considera-se, portanto, que o procedimento funcionou já que atingiu o objetivo final: redução dos comportamentos disruptivos (incompatíveis com o sono) de Adam, na hora de dormir. O resultado é, enfim, Adam dormindo em seu berço.

Análise crítica a partir das diretrizes de Cooper et al. (2007): logo no início do procedimento, Supernanny orienta a suspensão dos reforçadores mantenedores dos comportamentos contrários aos de dormir que se configuram em assistir à TV e brincar no geral, ficar no colo da mãe e dormir com ela, mas pede que a mãe converse com a criança dizendo "boa noite" ao colocá-la no berço. Apesar de este comportamento da mãe fazer parte da classe funcional de atenção para o filho, a orientação de Supernanny é adequada nos parâmetros dos autores, pois esta atenção é retirada quando o procedimento é repetido, configurando-se como um procedimento de fading out da atenção (interação verbal). Esta estratégia vai de encontro à outra diretriz de Cooper et al. (2007) que indica a utilização de outros procedimentos que podem minimizar a aversividade do procedimento de extinção. Apesar disto, apenas o fading out não foi suficiente para atingir tal propósito já que se observa uma série de efeitos colaterais tais como aumento da intensidade dos comportamentos-problema, variabilidade comportamental e agressividade. Os autores sugerem o uso de reforçamento positivo para comportamentos adequados, o que não foi realizado em nenhum momento do procedimento como objetivo de reforçar comportamentos sucessivamente mais próximos do comportamento de dormir. Por outro lado, isso seria inviável como, por exemplo, a mãe fornecer atenção para o filho quando este permanece dentro do berço ou deitado já que a interação com a mãe competiria com o comportamento de dormir. Além disso, não há como reforçar o comportamento final que é dormir.

A suspensão dos reforçadores mantenedores foi orientada e realizada consistentemente na maior parte das vezes. Após este procedimento realizado com a mãe, mostra-se o mesmo procedimento sendo realizado pelo pai, o que vai de encontro à orientação dos autores sobre incluir outras pessoas de importante convívio do sujeito no procedimento de extinção. Assim, a criança aprende a generalizar os comportamentos aprendidos na relação com a mãe na hora de dormir.

Os autores indicam que a contingência de extinção seja descrita para o sujeito submetido ao procedimento como forma de acelerar o processo, o que não é orientado no programa de televisão. Outra diretriz que não se fez presente neste procedimento de Supernanny foi o planejamento do manejo dos efeitos colaterais da extinção. Aqui também não houve nenhum tipo de preparação da mãe, aplicadora do procedimento, no sentido de informá-la dos possíveis efeitos colaterais da extinção e do quão importante é ela não reforçar tais comportamentos neste momento ou abandonar o procedimento, correndo o risco de selecionar topografias de comportamento de não dormir ainda mais refinados e até perigosos como, por exemplo, o comportamento agressivo.

Duas partes do procedimento de Supernanny abrem espaço para uma discussão quanto a sua adequação ou não às orientações de Cooper et al. (2007). Eles apontam para o cuidado de não extinguir comportamentos adequados emitidos pela criança durante um procedimento de extinção, contudo não há uma especificação sobre o que seria um comportamento adequado. Nesse caso, pode-se considerar que o comportamento de permanecer no berço, independentemente de ser emitido juntamente com outros comportamentos inadequados, é mais adequado do que qualquer outro comportamento emitido pela criança e poderia ter sido reforçado caso houvesse um procedimento de fading combinado. Desse modo, pequenas partes da cadeia comportamental que termina em dormir seriam extintas uma por vez, ao passo que comportamentos mais adequados e próximos ao dormir seriam reforçados. Além disso, os autores frisam a não utilização deste procedimento quando o comportamento alvo é de agressividade. Observa-se na linha de base que a criança emite comportamento de agressividade para evitar ir dormir e que são ignorados durante a extinção, contrariando a sugestão dos autores. No entanto, neste caso talvez este procedimento pudesse se manter, já que a aplicadora do procedimento é a própria mãe da criança, que já está habituada às respostas de agressão do filho, e pela criança ser muito pequena e não apresentar tantos riscos físicos para a mãe.

Por fim, nota-se que a diretriz sobre aumentar os episódios de extinção foi atendida em partes, pois o procedimento é realizado pelo pai e também novamente realizado pela mãe, mas na ausência de Supernanny, ou seja, sem orientação. No caso do pai houve sucesso, já a mãe não conseguiu colocar em prática as orientações de maneira adequada. Pelo pai ter facilmente obtido sucesso, Supernanny ampliou o procedimento acrescentando o fading out da localização do pai como aplicador da técnica: nesse momento o pai coloca a criança em seu berço, sai do quarto e vai para a sala, mesmo que a criança tenha de ser redirecionada para o berço posteriormente.

Analisadas as intervenções de Supernanny executadas pela mãe da criança neste episódio do programa de televisão como um todo, observa-se que há orientações tanto adequadas como inadequadas de acordo com as diretrizes de Cooper et al. (2007). Percebe-se que os procedimentos utilizados para reduzir o comportamento de birra foram mal delineados, já que não cumpriram os critérios do que é considerado um procedimento de reforçamento diferencial de comportamentos incompatíveis e extinção, e muitas das orientações dos autores não foram seguidas. Por outro lado, o procedimento para a hora de dormir cumpriu os parâmetros do que é considerado como extinção pela análise do comportamento aplicada e correspondeu à maioria das diretrizes ofertadas pelos referidos autores.

 

Considerações finais

Baseando-se nas considerações dos autores do manual de Applyed Behavior Analysis (Cooper et al., 2007), um ponto de grande relevância a ser explicitado é a ausência de preparação da mãe para a aplicação dos procedimentos que foram orientados por Supernanny no episódio analisado. A apresentadora em nenhum momento do vídeo informou sobre como funciona um procedimento que envolve extinção de respostas de modo a alertar a mãe sobre o seu potencial aversivo e os perigos de uma manipulação de contingências inadequada.

A aplicação de procedimentos de extinção e derivados é aversiva tanto para a criança que sofre a suspensão dos reforçadores mantenedores de seu comportamento quanto para a própria mãe que é exposta a todos os comportamentos aversivos que o filho emitia no passado e eram terminados com a oferta de sua atenção. Há uma longa história de reforçamento entre mãe e filho que culminou no padrão de relação encontrado por Supernanny quando esta visita a casa inicialmente, o que leva a reflexão de que existe uma função neste modo de se relacionar tanto para a mãe quanto para o filho. Informar que será difícil, que poderá haver aumento inicial da frequência dos comportamentos-problema do filho, variação e agressividade para, finalmente, a taxa de respostas reduzir, poderia ter preparado melhor a mãe para aplicar os procedimentos e para suportar a aversividade de tal contingência. É clara a quase desistência da mãe enquanto aplica os procedimentos orientados por Supernanny. Há momentos em que a mãe chora

na execução do procedimento e, ao final dele, relata estar se sentindo mal, o que indica que mesmo com o sucesso do procedimento a mãe foi punida por suspender os reforçadores do próprio filho. Levanta-se a hipótese de que em outras condições a mãe poderia ter interrompido o procedimento de extinção e reforçado topografias de respostas ainda mais problemáticas da criança para terminar a contingência aversiva de suspender a atenção do filho. A presença de Supernanny durante o procedimento pode ter atuado como operação motivadora que aumentou o valor reforçador da consequência de finalizar o procedimento, mas na sua ausência essa consequência pode perder o valor e os comportamentos-problema da criança não serem mais suficientes para evocar as respostas de suspensão da contingencia pela mãe (procedimento de extinção).

Mediante tal discussão, outro aspecto que merece um olhar crítico é a transmissão de um programa de televisão, amplamente visualizado, que tem como objetivo mostrar intervenções para lidar com comportamentos-problema de crianças. É comum ouvir, tanto no contexto clínico quanto no dia a dia, pais buscando soluções para cessar comportamentos inadequados dos filhos assistindo à Supernanny. Esses pais que não são acompanhados por um profissional da análise do comportamento não têm repertório de observação das contingências suficientes para compreender a função dos comportamentos, os reforçadores mantenedores, as operações motivadoras, dentre outras variáveis de importância para um manejo adequado da contingência. Falta-lhes, também, auto-observação para compreender como o próprio comportamento afeta a criança. Nesse sentido, crê-se que após assistir a este episódio do programa de TV, os pais constroem autorregras sobre como devem lidar com o comportamento de uma criança que faz birra por atenção ou para se manter acordada. A regra que será construída por cada pai telespectador pode ser muito diferente, pois depende de uma série de variáveis envolvidas na história de vida individual, por exemplo, sob controle de quais estímulos o telespectador ficará ao assistir o programa, qual a história de interação com o respectivo filho e seus comportamentos-problema, quão reforçado foi seu repertório de seguir regras.

Para ilustrar, pode se supor algumas autorregras possíveis de serem construídas por pais após assistirem o episódio analisado: "para que meu filho pare de chorar, preciso abaixar, olhar nos olhos dele e pedir que pare", "preciso ignorar sempre que meu filho fizer birra", "tenho que ficar junto com meu filho todas as vezes que ele for dormir daqui para frente". Essas frases não descrevem de maneira correta partes dos procedimentos que deveriam ser realizados no manejo de comportamentos inadequados, mas ainda que descrevessem seriam incompletas, pois um procedimento envolve um encadeamento de respostas por parte do aplicador, objetivos bem definidos e uma análise de contingências cuidadosa sobre cada caso individualmente. Diante das reflexões realizadas a partir do episódio analisado neste artigo, sugere-se que o programa de televisão Supernanny deve ter a função meramente ilustrativa e de entretenimento para telespectadores. Ressalta-se que tais conclusões foram formuladas a partir da análise qualitativa de apenas um dos episódios deste programa de TV.

 

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Endereço para correspondência
Fernanda Resende Moreira
Rua Dr. Silvio Dante Bertacchi, 1116, 55B.
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São Paulo-SP
Email: nandarmoreira@gmail.com

Submetido em: 10/07/2015
Primeira decisão editorial: 30/09/2015
Aceito em: 29/10/2015
Editor associado: Nicodemos Borges

 

 

1 Time out consiste em remoção da oportunidade de emissão de resposta. Por exemplo: uma criança está batendo em colegas em sala de aula, sob controle de atenção da professora. A retirada da criança deste ambiente implica no desaparecimento de estímulos que evocam a resposta que se pretende eliminar (Borges & Cassas, 2012).
2 Exemplo das autoras.
3 Exemplo das autoras.

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