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Analytica: Revista de Psicanálise

On-line version ISSN 2316-5197

Analytica vol.6 no.10 São João del Rei Jan./June 2017

 

ARTIGOS

 

A psicanálise como crítica da metafísica em Lacan

 

 

Christian Ingo Lenz Dunker

Psicanalista, professor titular do Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IPUSP). AME da Escola de Psicanálise dos Fóruns do Campo Lacaniano-Brasil. Rua Abílio Soares, 932 - Paraíso. 04005-003 São Paulo - SP

 

 


RESUMO

Neste artigo examinamos o estatuto da antifilosofia em Lacan de modo a mostrar como ela representa um método crítico da metafísica e uma forma de aproximação com o campo da ciência. Considerando comparativamente a posição de Freud e de Lacan diante da ciência, mostramos como Psicanálise é uma prática que se aproxima da atitude de Espinosa ao criticar a metafísica como discurso que encobre o buraco constitutivo da política.

Palavras-chave: Lacan. Antifilosofia. Ciência. Crítica.


ABSTRACT

In this article we examine the scope of anti-philosophy in Lacan in order tho explain how it acts as a method of critics of metaphysics and a way to come near Science as an epistemological position. We compare the position of Freud and Lacan in relation to Science claiming that psychoanalysis is a kind of a practice that is close to Espinosa's position as a critics of metaphysics as a discourse that covers the hole that constitute the field of politics.

Keywords: Lacan. Anti-philosophy. Science. Critics.


 

 

1 Posição do Problema

Freud e Lacan concordam em uma mesma atitude irônica diante a Filosofia. O filósofo é aquela pessoa que com seu roupão rasgado vaga no escuro tentando tapar os buracos do mundo.

Do filósofo, conheço apenas uma definição, aquela de Henri Heine, aceita por Freud, que diz: "Com suas toucas noturnas e os farrapos de seu roupão, ele tapa os buracos do edifício universal". A função do filósofo, aquela de suturação, não lhe é peculiar. O que, aqui, caracteriza o filósofo como tal é a extensão do seu campo, extensão do edifício universal. O que importa é que vocês estejam persuadidos de que, e em seus níveis, tanto o linguista quanto o lógico suturam. (Lacan, J. 2010 [1964-1965], p. 164)

Lacan, em sua recontagem, inclui o linguista e o lógico, bem como subtrai um detalhe importante: o fato de que se o filósofo está de roupão sugere que é noite. Se é noite ele precisa de uma vela ou lanterna para praticar seu ofício de tapar buracos. Wittgenstein parece ter captado esse detalhe para devolver-nos a imagem invertida do psicanalista como aquele que está preso em um quarto, de olhos vendados, procurando um gato preto que não está lá. A imagem, que reaparece em Machado e Guimarães Rosa, foi empregada pela primeira por Voltaire para definir a metafísica (Voltaire, 1774).

Popper avançou no diagnóstico da Psicanálise ao determinar, no interior da genealogia teórica a nossa família metafísica de origem.

Durante o verão de 1919, comecei a me sentir cada vez mais insatisfeito com estas três teorias: a teoria marxista da história, a Psicanálise e a Psicologia individual; passei a ter dúvidas sobre seu estatuto científico. [... ] Por que serão tão diferentes da teoria de Newton e especialmente da teoria da relatividade? [... ] Sentia que as três teorias, embora se apresentassem como ramos da ciência, tinham de fato mais em comum com os mitos primitivos do que com a própria ciência, que se aproximavam mais da astrologia do que da astronomia. (Popper, 1982, p. 223)

Isso significa que estaríamos jogando a terceira divisão do campeonato epistemológico. Nossa teoria não é lógico-matemática nem empírico-científica, mas apenas e tão somente filosófico-metafísica. Não conseguimos apresentar critérios de verificabilidade ou refutação, portanto, nossas proposições não são verdadeiras nem falsas. Diante disso, somos apenas uma visão de mundo, mais ou menos poética, mais ou menos mítica, que ao tentar compreender tudo nada consegue explicar.

Ironicamente, se olhamos para Totem e Tabu (Freu, 1988 [1913)]), ele parece concordar com a geografia desse jogo, ainda que discorde de nossa posição, na hierarquia das formas de pensamento, que começava no estágio mágico-animista, evoluem para a dimensão metafísico-religiosa e culminam na visão de mundo científica. Estão aqui os três grandes temas da metafísica: alma, Deus e mundo expressos em uma hierarquia tipicamente metafísica.

Grünbaum (1984), concordando com essa partição, mostrou como os argumentos psicanalíticos padecem de um defeito crônico, tipicamente encontrado nas concepções metafísicas, ou seja, o recurso aos argumentos por correspondência. Nesse caso os fatos são ajustados aos conceitos, assim como os conceitos são ajustados aos fatos, de forma que no fim estamos imersos em uma grande tautologia.

Recentemente a imputação metafísica contra a Psicanálise recebeu uma nova configuração com as considerações, ainda que simpáticas, de Eric Kandel. Patrono e pioneiro da nova Neurociência, ele argumenta que a Psicanálise, como método de tratamento baseado na escuta cuidadosa de pacientes, é uma prática consistente, ainda que padeça de um problema de justificação teórica e metodológica.

Eu acreditava, e acredito ainda mais hoje em dia que a biologia pode ser capaz de delinear a base física de diversos processos mentais inconscientes, o determinismo psíquico (o fato de que nenhuma ação ou comportamento, nenhum lapso verbal são completamente aleatórios ou arbitrários), o papel do inconsciente na psicopatologia (isto, é a ligação dos eventos psicológicos, mesmo os disparatados no inconsciente) e o próprio efeito terapêutico da Psicanálise. (Kandel, 2006, p. 397)

Portanto, há um formato histórico e recorrente pelo qual a Psicanálise se aproxima da metafísica, e essa é a mesma chave que a separa da ciência. Porém, todos esses diagnósticos assumem um mesmo ponto de partida: a unidade da Psicanálise. No entanto, é trivial observar que Wittgenstein, Popper e Kandel têm para si uma versão da Psicanálise que não é absolutamente concorde com a tradição lacaniana. A genealogia traçada por Kandel ou por Popper parte do campo insólito que agrupa Freud, Adler e o marxismo. Ela se expande em uma superfície formada por Hartmann, Lowenstein e Kris, envolvendo Anna Freud e chegando ao improvável Aron Beck (pai da psicoterapia cognitivo comportamental) e ao virtual programa de uma neuropsicanálise. Com escalas em René Spitz, Harlow e Bolwby, essa antípoda lacaniana deve ser considerada como parte do que chamamos de campo psicanalítico, ou não? Como mostramos em outro lugar (Dunker, Paulon e Milán, 2016) o problema da cientificidade da psicanálise se decompõem no problema da própria definição discursiva e histórica do que significa psicanálise, mas também do que significa ciência, no sentido da estrutura e das ciências da linguagem, ou da topologia e da lógica, depois de Lacan.

Em que termos se poderia tornar a psicanálise um campo unitário e homogêneo, coerente e concorde, em intenção e extensão, para ser avaliado por parâmetros epistemológicos, metodológicos ou ontológicos? Presumir que o problema pode ser resolvido por uma estratégia de purificação de textos ou força depositada em regras de leitura é tão ingênuo quanto presumir que a ciênca ou a filosofia seriam campo assim unitários e consistentes. Teriam tais campos assim defindos uma autofundamentação ou dependeriam eles de outros saberes para justificar-se como tal?

É verdade que Lacan muitas vezes identifica metafísica e ontologia como o discurso do ser e do ente (Lacan, 1976) 1, mas notemos que ele o faz, geralmente, para criticar o uso dessa unidade como fundamento dogmático, solo (Grund) ou ponto de saída evidente, sob o qual se erigiria a Psicanálise. Disso não se deduz que a ontologia não importa ou, pior, que seja possível prescindir dela, mas, como pretendemos mostrar, que a ontologia pode ser o efeito da crítica da metafísica e seu ponto de chegada, ainda que provisória. Lembremos que a noção de fundamentação é o ponto de partida tanto da ciência quanto da ontologia e retenhamos esta afirmação de Lacan: "Ela [a Psicanálise] só dará fundamento científico à sua teoria e à sua técnica ao formalizar adequadamente as dimensões essenciais de sua experiência, que são, juntamente com a teoria histórica do símbolo, a lógica intersubjetiva e a temporalidade do sujeito." (Lacan, 1988 [1953], p. 257)

Estão sintetizadas aqui as quatro questões que convocam a Psicanálise a explicitar sua ontologia 1. Que tipo de fundamentação empregamos; 2. Qual a relação entre ser e linguagem; 3. Que tipo de formalização lógica convém ao conceito de sujeito; e 4. Como o tempo participa de nossa teoria. O fundamento, o logos, a transmissibilidade do saber e a transformação no tempo são as quatro questões ontológicas primárias. Observemos que todas elas dependem de uma ambiguidade incontornável do entendmento de logos como discurso, ser ou razão.

 

2 Antifilosofia e Antipsicologia

Os contrários podem se tocar. A antifilosofia e antipsicologia lacaniana são no fundo parte da Psicanálise, como todos os antifilósofos retóricos e sofistas da antiguidade, trágicos como Lucrécio e Pascal, iconoclastas como Nietzsche e Sade e os antiphilosophes do século XVIII são parte da Filosofia. A anti-filosofia não é portantolago como um camo externo à filosofia, mas uma attitude que questiona e critica a própria unidade deste campo, seus fundamentos ou anda seu lugar social. É neste sentido que Badiou (1988) considera Lacan um anti-filósofo e também por razões análogas que ele entende que o discurso da matemática é a ontologia como crítica da metafísica.

Convém lembrar em segndo lugar que Lacan dizia-se também que a Psicanálise é uma anti-psicologia. Também a Análise Experimental do Comportamento, de Skinner, e a Fenomenologia, de Husserl, são casos consagrados de antipsicologias que fazem parte da Psicologia. Não adianta nada nos perfilarmos na antifilosofia achando que com isso estaríamos livres da Filosofia e dispensados da crítica da metafísica, na qual esta se especializou.

Mas em nenhum lugar Lacan afirma que a Psicanálise é uma anti-ciência. Psicanálise e Filosofia estão unidas em um abraço que pode levar ambas ao fundo do poço da ciência. O problema é saber se antes disso a Psicanálise vai conseguir livrar-se do abraço narcísico e metafísico com ela mesma.

Portanto, o primeiro mito diante do qual deveríamos nos acautelar, para examinar as incidências metafísicas na Psicanálise, é o mito da unidade da Psicanálise. Há escolas e autores que estão muito mais distantes da Psicanálise do que o próprio pensamento de Lacan está da Filosofia, e dentro do lacanismo a unidade está longe de ser a regra.

Recentemente nosso Alfredo Eidelsztein (2015) publicou um excelente trabalho sobre a metafísica psicanalítica, mostrando como a unidade entre Freud e Lacan está mais para uma quimera do que para um campo harmonioso. Goldenberg, comentando este trabalho afirma:

Não se trata de propor outra filosofia mais verdadeira, mais acorde com os avanços da ciência, mas servir-nos da crítica á filosofia para situar o alcance e a potência do campo analítico. Este trabalho crítico seria a anti-filosofia. (Goldenberg, 2016)

Em que pese a indeterminação relativa da noção de verdade presente em tal afrmação, ela acaba por ignorar que filosofia e ciência nunca aparecem dissociadas em Lacan e que a crítica de ambas, que define a prática metódica da anti-filosofia, não serve apenas à expansão do campo psicanalítico ou à delimitação de suas fronteiras, mas também e essencialmente para a transformação e criação de novos conceitos em Psicanálise, como argumenta Iannini (2012) e Safatle (2006).

As diferenças epistemológicas entre um e outro seriam de tamanha magnitude que se deve proceder a uma escolha admitindo uma diferença irredutível. Nesse sentido, o campo psicanalítico comportaria epistemologias diferentes ou uma multiplicidade de formas em uma mesma unidade?

O argumento poderia se desdobrar no interior da própria obra lacaniana em suas diferentes e infinitesimais versões, primeira, última, ultimíssima e assim por diante. Deveríamos incluir como parte da unidade do campo da Psicanálise autores pós-lacanianos como Jacques Alain Miller, Colete Soller, Piere Lebrun que tem desenvolvido uma obra própria, com novos conceitos que gradualmente se independem de seu ponto de partida? Por que eles se diferenciariam de autores que produtivamente concorrem para a renovação de conceitos e discursos psicanaliticos como Slavoj Zizek, Alain Badiou ou Barbara Cassin?

Em parte a dificuldade de caracterizar o campo da Psicanálise e daí contrastá-lo com a Psicologia, com a Filosofia ou com a Psiquiatria decorre da própria ampliação do que devemos chamar de Psicanálise promovida por Lacan. Se Freud (1988 [1917])) definia o campo da Psicanálise pela prática de um método de tratamento e investigação, e por uma teoria (ou doutrina) de tipo kantiana cuja função é fazer convergir conceitos e experiências, Lacan acrescentou a isso dois pontos cruciais: a Psicanálise é também uma ética (Lacan, 1986 [19591060]) e um discurso (Lacan,1992 [1969-1970)].

Portanto, a partição entre Psicanálise pura (teoria e conceitos) e Psicanálise aplicada (tratamento de pacientes), ainda que apresentada por Lacan, simplesmente não alcança a realidade mesma da existência de uma pluralidade de psicanálises. Nada mais equívoco do que pensar que o conceito que tenho de inconsciente antecede sua prática:

A clínica portanto, resulta da psicanálise pura e não o contrário. Com efeito dependendo do conceito que eu tiver de inconsciente vou tratar meus pacientes de um modo ou de outro. E do modo de trata-los dependerá o tipo de inconsciente que faço existir. (Golderberg, 2016, p. 4)

Contudo, fazer e justificar o que se faz são dois processos diferentes. Como mostrou Ian Hacking (2002) a ciência e seus procedimentos conexos, como a clínica, não apenas descrevem ou representam fenômenos existentes em um universo finite e fechado, ela também cria fenômenos e efeitos, que se acrescentam à realidade ultrapassando seu contexto de produção original. A Psicanálise pura resulta também da clínica. Não é também apenas o modo com trato que que determina a existência do inconsciente, pois não se trata de uma via de mão única na qual a prática determina o conceito, mas conceito não determina a prática. Daí que o primeiro conceito que deveríamos expor ao escrutínio crítico e verificar seu teor metafísico é exatamente o conceito de conceito. Quando se afirma "o inconsciente que faço existir", como se ele não houvesse fora do seu contexto de aplicação, justamente incorremos em uma solução para o problema histórico da ligação entre conceitos e existência. Qual conceito de existência temos aqui? Como existência, um termo de linhagem ontológica, liga-se com conceito, um termo de linhagem epistemológica?

Um conceito em Psicanálise não é um análogo da sua representação textual nos escritos de Freud ou Lacan. Em Freud essa fixação conceitual decorre da comparação e modificação por novas experiências, ao modo de uma convenção ou um conceito prático [Prakticherbegrieff].

Portanto elas [as ideias que se tornarão conceitos] tem o caráter de conceções, embora seja o caso de dizer não são escohidas de modo arbitrário, mas sim determinadas por significatvas relações com o material empírico [Empirischen Stoffe], relações estas que imaginamos poder adivinhar antes mesmo que as possamos reconhecer e demonstrar. Apenas após uma exaustiva investigação do campo de fenômenos [Erscheinungsgebiete] que estamos abordando, podem-se apreender de forma mais precisa seus conceitos científicos fundamentais [wissenschaftliche Grundbegrieffe] progressivamente modificá-los, de modo que eles se tornem utilizáveis em larga medida e livres de contradições. (Freud, 1917, p. 15-17)

Em Lacan é o próprio conceito de transferência que representará este ponto de passagem entre noções e conceitos, entre práticas e suas repersentações.

É que este manejo da transferência é idêntico à noção dela, e por menos elaborada que seja esta prática, ela só pode incluir-se nas parcialidades da teoria." (Lacan, 1958, pág. 609) Aqui intervém de modo decisivo a noção de práxis, popularizada por Lukács e Gramsci, no século XX, mas reinventada por Hegel e Marx, no século XIX, a partir da classificação aristotélica dos tipos de saber. Tal noção invalida a subordinação entre as duas versões do conceito, teoria e prática, assim como repudia a noção kantiana de "aplicação". É tendo em vista tal noção que Lacan (1948) definiu, no começo de seu ensino, a Psicanálise como práxis dialética. Ora, o que caracteriza a práxis como tal não é a complementaridade entre prática e teoria, mas uma relação específica entre elas, ou seja, a crítica e o trabalho com a contradição.

As expressões crítica dos conceitos ou crítica aparecem reiteradamente nas várias edições que Lacan propõe para organizar sua Escola ou para descrever a formação do psicanalista, por exemplo:

Pode ela [a Escola] constituir o ambiente de experiência e crítica que estabeleça e faça sustentar as melhores condições de garantia. [... ] Aos AEs chamados analistas de escola, lhe corresponderia o dever da instituição interna que submete a uma crítica permanente a autorização dos melhores. (Lacan, 2001 [1967], p. 249)

O que a Psicanálise tem em comum com a ciência e com a Filosofia é o método crítico, não apenas e eventualmente teses metafísicas ou evidência empíricas. Freud e Lacan não apenas "garimparam" conceitos teóricos em outras áreas, mas também importaram conceitos práticos, como hipnotismo, sugestão e diagnóstico, práticas epistemológicas como método clínico e demonstração e observações empíricas como atos falhos e sintomas. Além disso, ambos tentaram forjar algumas classes especiais de conceitos, como os conceitos fundamentais (Grunbegrieffen) em Freud e os conceitos cruciais (concept cruciale) em Lacan. Freud aprendeu e assimilou fazeres como a interpretação de sonhos (Artemidoro), a leitura de acontecimentos políticos (Le Bon, McDougal), o uso de hipóteses e observações antropológicas (Darwin, Smith), reutilizou métodos filológicos (Paul, Abel) derivou técncias de leitura estética (Morelli) e de crítica da cultura (Roland). A própria ideia ideia inaugural de catarse foi absorvida ao helenista e teórico da literatura, tio de sua esposa Martha Bernays (Langhof, 1990).

Lacan valeu-se de métodos lógicos, (diagonal de Cantor), antropológicos e linguísticos (análise estrutural) e matemáticos (topologia combinatória) que não foram, absolutamente, inventados pela Psicanálise. Ambos, Freud e Lacan, praticaram o método clínico derivado da Medicina. Ambos, Freud e Lacan tentaram fundar a Psicanálise em métodos, conceitos e práticas atinentes à ciência, mas também em conceitos derivados de muitas outras disciplinas. Ora, esta deriva epistêmica sugere uma espécie de critério espontâneo por meio do qual se pode identificar a pertinência da importação de conceitos. Se não queremos pensar a epistemologia apenas a partir de critérios convencionais de demarcação, que analisam teorias reduzindo-as a proposições e depois estabelecendo critérios sobre o tipo de conhecimento envolvido, tais como verificação, falseabilidade, coerência, evidência, como quer uma certa tradição consagrada por Popper, devemos estar dispostos a mostrr que a deriva de conceitos imoprta e tem efeitos também para o seu capod e origem. Considerando este critério de externalidade se perceberá que a Psicanálise de Freud mostrou-se produtiva para a chamada teoria social crítica do pós Guerra (Adorno, Marcuse, Habermas, mas também Norbert Elias e Lasch), assim como recentemente a Piscanálise de Lacan apresenta um diálogo consistente com a filosofia social crítica (Zizek, Laclau, Badiou). Por outro lado a Psicanálise de Freud trouxe efeitos reversos sobre a prática psiquiátrica até os anos 1970, assim como a teoria de Lacan vem se colocando como força de renovação para práticas clínicas em contexto social. Estes sistemas de circulação dependem, em todos os quarto casos da incidênca da psicanálise como prática e conceitografia crítica, assim como de uma posição intervalar, entre ciência e filosofia.

Ao que tudo indica, algo mudou de 1980 para cá de tal forma que, a despeito de sua disseminação universitária, a Psicanálise passou a relutar, cada vez mais, a participar do debate científico, aceitando passivamente a crítica popperiana e o rótulo de pseudociência. Por outro lado a filosofia tem se desligado da formação dos psicanalistas, assim como, para muitos, o pendor crítico associado com a experiência lacaniana teria declinado nas instituições herdeiras de seu pensamento.

 

3 Mais Além da Oposição Metafísica e Ciência: a Crítica

A análise crítica de conceitos, práticos e teóricos exige método, e esse método não é endógeno nem espontâneo à Psicanálise, ainda que esta o pratique desde o início como método de tratamento e de investigação, o conceito mesmo de método adquiriu sua forma moderna com Kant. Lembremos que seu gesto inicial foi tentar reduzir a metafísica aos limites da razão, começando por dividi-la entre metafísica da natureza e metafísica dos costumes:

Pode-se denominar empírica toda filosofia que se apoia em princípios da experiência; e pura, a que deriva suas doutrinas exclusivamente de princípios a priori. Esta, quando simplesmente formal, chama-se Lógica; mas, se for circunscrita a determinados objetos do entendimento, recebe o nome de Metafísica. Deste modo, surge a ideia de uma dupla metafísica: uma Metafísica da natureza e uma Metafísica dos costumes. A Física terá pois, além de sua parte empírica, uma parte racional . Outro tanto sucede com a Ética; embora, aqui, a parte empírica possa denominar-se particularmente Antropologia prática, e a parte racional receber o nome de Moral. (Kant, 1954 [1785], p. 234)

A capacidade de reconstruir as condições transcendentais dos enunciados da razão pura e da razão prática, estabelecendo limites, objetivo e subjetivos para o conhecimento cria um modelo de pensamento e de crítica dos conceitos cuja fronteira fundamental jaz justamente entre metafísica e ciência. Mas a Filosofia, ela mesma, não é nem ciência nem metafísica, mas eventualmente a crítica desses dois campos. A proximidade entre Psicanálise e Filosofia não se dá, portanto, apenas na adesão de teses e conceitos, mas pela proximidade com o método crítico. Aliás, é esse o ponto que nos faz entender a diferença entre as matérias que Freud recomendava para a formação do psicanalista (história da cultura, mitologia, história da literatura e filosofia das religiões) em contraste com a propedêutica lacaniana (Lacan, 1978), apresentada na abertura do primeiro curso universitário de Psicanálise em Vincennes (linguística, lógica, topologia e antifilosofia), ou seja, uma variância de métodos, e não de conteúdos.

Faz parte seminal deste método a análise dos conceitos, se eles são analíticos ou sintéticos, se eles provêm do entendimento ou da sensibilidade, se eles servem ao conhecimento ou à ação. Kant não elimina a metafísica, mas restringe seu campo a três ideias das quais não conseguimos nos livrar e ao mesmo tempo não podemos propriamente conhecer: Deus, alma e mundo. Freud formula sua teoria em franca proximidade com o método especulativo de Kant (Fulgêncio, 2015).

Aqui temos uma diferença epistemológica fundamental entre Freud e Lacan. A crítica de Lacan2 a Freud é análoga à crítica de Hegel a Kant, ainda que seu método e seu entendimento do que é um conceito divirjam. Para Kant e para Freud, o conceito é uma espécie de síntese entre representações, uma unidade formada pelo encontro entre categorias da sensibilidade (tempo e espaço) e categorias do entendimento (modo, relação, quantidade e qualidade). Hegel e Lacan3 não aceitam essa redução do funcionamento da razão, da qual decorre a fronteira entre conceitos referidos aos fenômenos (ciência) e conceitos referidos à Coisa em si (metafísica), por isso partilham de uma ontologia diferente da de Freud. Ele propõe uma modificação crucial aqui ao propor que a razão tem uma historicidade, ela se altera por movimentos de reconhecimento e alienação, ela não opera por categorias fixas, que quando tomadas dessa maneira tornam-se metafísicas4.

Para Hegel, assim como para Lacan, o conceito é uma articulação momentânea do Real uma efetuação (Wirklichkeit) não apenas uma representação (Vorstellung). O conceito é o tempo, não a sua fixação definicional ou apenas um desenvolvimento (Etwicklung) da ideia ele é um processo ou um "momento" que requer, a cada vez sua própria ontologia e sua própria linguagem:

Trata-se de saber se a função do conceito é a de dominação do mundo ou a de transformação dos entido - e qual é a questão que ele autoriza: a questão apressada (Que interpretação -dialética - propõe você para o acontecimento?") ou a questão paciente ("Que linguagem você ainda está falando, você que pretende compreender esse acontecimento? (Lebrun, 2000, p. 367)

Uma obra de arte é um conceito, ainda que seja incapaz de pensar-se a si mesma como tal. Termos como "psicose", "família" ou "sintoma" são momentos conceituais no interior de uma teoria, por isso eles funcionam como constelações covariantes de alta dosagem contextual. Conceitos se transformam, por isso podemos comparar proposições como "o sintoma é uma mensagem do Outro" (Lacan, 2016 [1959]) e o "sintoma é um acontecimento de corpo" (Lacan, 2016 [1975]) sem que isso represente apenas um desenvolvimento definicional ou uma pré-formação da coincidência entre o lógico e o real. É o trabalho freudiano da contradição interna e externa do conceito. Há conceitos que funcionam como crítica da metafísica no interior de dispositivos práticos5, orientadas por um mesmo fim ou princípio, por exemplo, o conceito de "palavra" e sua relação com o amor em Direção da Cura e os Princípios de seu Poder ou a associação livre no interior do conceito de resistência. Há ainda enunciados de discurso que pretendem considerar o conjunto de teorias, práticas e dispositivos organizados por uma mesma episteme, por exemplo, "o sujeito da Psicanálise é o sujeito da ciência" (Lacan, 1998 [1966]).

Em Hegel os conceitos metafísicos correspondem a um momento do método dialético, ambos formando parte da ciência da lógica (Hegel, 1993) ou da ciência do real (Hegel, 1995):

A característica central da Spekulation no uso de Hegel é que ela unifica pensamentos (e coisas) opostos e aparentemente distintos. Assim, em contraste com o entendimento analítico, é semelhante à imaginação poética e ao misticismo, mas difere destes na medida em que é conceitual e pressupõe o trabalho do entendimento. Discorda totalmente do dogmatismo da metafísica pré-kantiana, que insiste em aplicar um par de predicados contrastantes a objetos, insistindo que o mundo é ou finito ou infinito e não pode se ambos. (Inwood, 1997, p. 115)

Se admitimos essa diferença, o segundo mito que devemos colocar em suspenso é o de que os problemas metafísicos, injetados em Lacan, vêm de fora de seu texto e são exteriores à Psicanálise. Ora, não é na observação interna dos conceitos em sua pureza (Reine Vernunft) que se poderá dizer que eles são metafísicos ou não, mas na relação entre o espírito que os enuncia e a lógica que os tornou possível e necessários. De certa forma o debate contemporâneo entre neo-kantianos (que defendem a persistênca de Freud em Lacan), os neo-hegelianos (que advogam uma ontologia negativa), os neo-espinozianos (que defendem um naturalismo do gozo) e os logicistas (que imaginam-se livres dos problemas metafísicos) é um debate sobre qual modelo crítico seria mais eficaz para a pensar e para praticar a psicanálise. O tipo de materialismo que concerne à linguagem torna-se assim uma questão estratégica porque ela permite distinguir qual é a proveniência do modelo crítico que se tem em mente: Kant ou Hegel, Espinoza ou Frege (Johnston, 2014).

Portanto, o texto de Freud ou de Lacan não são só metafísicos ou críticos em si, eles só pertencem ao campo da Psicanálise ou da Filosofia secundariamente, antes disso eles pertencem à razão. Diante disso, a estratégia que pretende dirimir ingredientes metafísicos erguendo fronteiras e escorando-se no resgate textual não é incorreta, mas um tanto limitada. Um momento bastante hegeliano em Freud, que permite exemplificar como campos particulares sempre se referem a experiências universais, cujo trabalho de contradição nos leva ao momento de singularidade, é a comparação que ele faz entre modalidades de sofrimento e figuras da cultura. A neurose obsessiva foi assim definida como uma religião particular, a histeria apresenta seus sintomas como obras de arte e a paranoia se assemelha a um sistema filosófico ou psicológico para perceber que a metafísica faz parte de nosso cotidiano clínico e ela não se reduz nem a uma visão de mundo (Weltanschauung) religiosa, política ou científica, nem a uma ideologia e muito menos se presta a ser sucedâneo histórico de filosofia eleata. Como mostrou Cassin (2012) a crítica da linguagem em Lacan é ao mesmo tempo crítica da metafísica.

Para a crítica kantiana, trata-se apenas de analogias ou metáforas para falar do que não podemos dizer; para Lacan ou Hegel, ao contrário, metáforas têm valência ontológica (Safatle, 2005). Aliás, nesse ponto o autor da Fenomenologia do Espírito tem sido reabilitado não mais apenas como um teórico teleológico da história, mas como um renovador da filosofia da linguagem (Surber, 2015; Pipin, 2005). É nesse sentido que lemos a afirmação de Lacan de que todos temos nossa metafísica, que ela é uma espécie de negação da contradição do ser, e que ela se expressa como "miragem metafísica da harmonia universal" (Lacan, 1938, p. 114). Mas é nesse sentido que a crítica da metafísica pode ser renovada, como o fez recentemente Van Heaute (2013) ao mostrar como a metafísica edipiana atravessou tendencialmente a leitura de Freud e de Lacan, antecipando sua presença textual onde ele - o Édipo - ainda não está. Daí a importância em criticar nossa adesão aos sistemas religiosos, estéticos e filosóficos, que nossos analisantes praticam com seus fantasmas, em nossa teorização sobre eles. Também o trabalho recente de Alfredo Eidelsztein é um esforço expressivo para mostrar a emergência de uma metafísica do gozo e de uma naturalização do Real no pensamento pós-lacaniano (Eidelsztein, 2015).

Se a Psicanálise é um discurso e uma prática ética, não só um sistema de teses e proposições, devemos reenviar os efeitos de leitura e desvio, suas variantes e apropriações, como efeitos de verdade ou de alienação desse mesmo discurso. Não há essência, unidade ou referência comum ao "campo psicanalítico", porque se isso existisse seu conceito mesmo estaria imune à sua efetuação histórica, sua identidade mesma seria dada definicionalmente e se assim fosse teríamos fracassado em fazer a crítica materialista do idealismo psicanalítico. A crítica filosófica e cietífica da Psicanálise é o que a impede que seu campo se reduza a um condomínio de clínicos experientes. Neste caso bastaria tomar os analistas um a um como casos particulares de uma referência universal. Seria como dizer que "se os anjos descessem a terra não haveria mais metafísica". Verdadeiro, mas improvável.

Aqui comparece o terceiro aspecto do conceito de conceito que Lacan valoriza insistentemente, ou seja, as teses não devem ser dissociadas dos seus modos de expressão, o matema e o poema não são elimináveis nem redutíveis. Por esse princípio de método a noção de estilo prende-se, como mostrou Iannini (2014), indelevelmente, à crítica lacaniana da metalinguagem e a sua concepção de verdade.

Portanto, diante da pergunta apressada: qual metafísica para a Psicanálise é preciso perguntar, pacientemente: qual crítica da metafísica queremos?

Assim, o problema da fundamentação da Psicanálise assume dimensões enciclopédicas. Para enfrentá-lo precisaríamos de uma atitude que admitisse que no mundo há buracos (que o filósofo com seu roupão rasgado pretende tapar), que estamos procurando um gato vazio ou indeterminado (como o de Schrödinger), que nossa teoria presume uma metafísica (um sistema interligado de mitos) e que a cientificidade de nossa prática envolve nossa relação com outras disciplinas (Linguística, Biologia, Sociologia, Antropologia). Para tanto, deveríamos explicitar melhor qual é o conceito de conceito que estamos a empregar a cada momento de nosso discurso, qual nossa teoria da verdade e quais critérios de demonstração ou assentimento levamos em conta em nosso campo.

Há um último motivo pelo qual a crítica da metafísica é decisiva para a Psicanálise, qual seja, as relações imanentes entre ontologia e política, cujo ponto de partida é a crítica de Espinosa (2010), no século XVII, em seu Tratado Teológico Político. Considerando-se apenas o escopo da metafísica da natureza, somos facilmente levados à conjectura de que as "coisas" são independentes da forma como nós falamos delas, seguindo leis às quais nos submetemos. Dessa conjectura somos levados à implicação de que tais leis sobre a natureza, incluindo suas estratégias de formalização, nomeação e descrição, nada mais são do que modos de usar a linguagem. Como o assunto psicanalítico é a linguagem falando sobre a própria linguagem, nada nos interessaria na problemática da quididade da coisa, da natureza ou da res extensa. Quando dizemos que não se pode falar (representar, pensar, etc.) sobre algo sem a linguagem é uma condição epistemológica, análoga à imposta por Kant para a formação das representações, que só pode ocorrer sob certas condições (tempo, espaço, etc.). Disso não se deduz nem se implica nada sobre a natureza ontológica, se há ou se não há ser, se existe ou não existe mulher, homem ou anjos, outros, gozos e quejandos. Há, portanto, uma falha básica nesse argumento que conduz a Psicanálise ao idealismo.

Não penso que Lacan concordaria com esse silogismo e por isso retorna em vários momentos de seu ensino o vocabulário e as questões ligadas à metafísica da natureza: causalidade, leis de determinação, a Coisa, a não identidade da realidade a si mesma. Aliás é neste espaço entre a causalidade metafísica e a causalidade científica que Lacan posicionou o problema da causa em Psicanálise, desde o início de seu ensino (Lacan 1946). Também é neste espaço que tradicionalmente se colocou o problema da ética do desejo e onde Dunker (2012) formulou a hipótese de uma ontologia política para a Psicanálise a partir da arqueologia das práticas de cura, tratamento e terapia que a constituiram historicamente.

Mas o ponto central, a partir de Espinosa, é que a relação que fazemos, a cada momento histórico, entre metafísica da natureza e metafísica dos costumes é uma relação política. Não é que a natureza esteja em si dotada de "valores", nem que os valores tenham algum tipo de fundamento natural, mas que a relação discursiva entre eles envolve sempre um programa político6, como mostrou Espinoza. E a crítica, como explicitação desse programa político é a crítica da metafísica. Há, portanto, uma ontologia política na Psicanálise que envolve, por exemplo, que a forma como acolhemos e tratamos, diagnosticamos 7, formalizamos ou descrevemos o sofrimento psíquico8, tanto como discurso quanto como clínica, possui implicações políticas. Frequentemente a metafísica nada mais é do que política disfarçada de outra coisa: teologia, ciência, moral, linguística, e assim por diante. Por que a Psicanálise estaria isenta dessa contingência? Aqui Lacan9 é lapidar em seu espinosismo: "Quanto a meu 'amigo' Heidegger, evocado acima em nome do respeito que lhe tenho, e que ele tenha a bondade de se deter um instante [... ] na ideia de que a metafísica nunca foi e não poderia prolongar-se a não ser ao se ocupar de tapar o furo da política." (Lacan, 1975, p. 550)

Dito isso, deveríamos perguntar como a Psicanálise pode participar do debate público, expandindo o universo da falta e não deixando-se permanecer "tapada" na metafísica privada, própria dos condomínios de psicanalistas. Retornando a Freud: o antifilósofo não é aquele que com seu roupão rasgado vai dormir na cama quente, mas aquele que tenta deixar aberto, e por vezes iluminar, os buracos do mundo.

 

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1 "La philosophie bien sur a embrouillé tout ça, de même qu'elle a fait de l'héritage de la psukê - qui était une vieille superstition, dont nous avons le témoignage dans tous les âges si on peut dire -, de même elle a parlé de l'ontologie comme si l'être à lui tout seul, ça se tenait. Il est certain qu'ici je m'écarte, je m'écarte de la tradition philosophique... je m'écarte de la tradition philosophique et je fais plus que de m'en écarter, je vais jusqu'a mettre en suspens, enfin, tout ce qu'il en est de... de l'ontologie, de la psychologie, de la cosmologie puisque, soi-disant, y aurait un cosmos." Lacan, J. (1976) De James Joyce comme symptôme. Revue Le croquant n ° 28, novembre 2000.
2 "Or on ne peut manquer d'etre frappé par ce qui transparaít constamment dans l'oeuvre de Freud d'une proximi-té de ces problèmes, qui laisse à penser que des références répétées aux doctrines présocratiques ne portent pas le simple témoignage d'un usage discret de notes de lecture (qui serait au reste contraire à la réserve presque mystifiante que Freud observe dans la manifestation de son immense culture), mais bien d'une apprehension pro-prement métaphysique de problèmes pour lui actualisés." Lacan, J. (1954) Réponse au commentaire de Jean Hyppolite. In Ecrits: Paris: Seuil, 2000, p. 375.
3 "C'est le seul levier à pouvoir mettre hors d'état d'y faire couvercle ce qui tourne de la meule : psychologie d'indéchaussable à ce que Kant y relaie Wolff et Lambert, et qui tient en ceci : qu'axée sur le même pivot dont traditionnellement s'embrochent ontologie, cosmologie, sans que théologie leur fasse leçon, l'ame, c'est la con-naissance que le monde a de soi-même, et précisément ce qui pare à être reconnu ainsi, de l'alibi d'une Chose-en-Soi qui se déroberait à la connaissance. À partir de là on ajoute aux fantasmes qui commandent la réalité, celui du contremaïtre. C'est pour ramener à sa férule la révolution freudienne, qu'une clique mandatée pour la lyse-Anna de l'analyse a réédité ce Golem au titre du moi autonome. S'il y a trace chez Kant de l'office qu'on lui impute d'avoir paré à la « cosmologie » newtonienne, c'est à ce que s'y tope quelque part, comme d'une pomme à un poisson, la formule newtonienne, et pour marquer que la Vernunft ou le Verstand n'y ont rien à faire d'a priori. Ce qui est sur non moins de l'expérience dite sensible, ce que je traduis : non avertie encore de la structure." Lacan J. . (1970) Radiophonie. In Autres Ecrits. Paris: Seuil; . p. 403.
4 "Avant que la théorie freudienne ait mis l'accent en somme, avec l'existence du père, sur une fonction qui est, on peut le dire, à la fois fonction de la parole et fonction de l'amour, la métaphysique hégélienne n'a pas hesité à construire toute la phénoménologie des rapports humains autour de la médiation mortelle, et elle est par-faitement concevable comme le tiers essentiel du progrès par oü l'homme s'humanise dans une certaine relation avec son semblable." Lacan, J. (1953) Le mythe individuel du névrosé ou poésie et vérité dans la nevrose. Paris: Seuil, p.123.
5 "Le troisième paradoxe de la relation du langage à la parole est celui du sujet qui perd son sens dans les objecti-vations du discours. Si métaphysique qu'en paraisse la definition, nous n'en pouvons méconnaïtre la presence au premier plan de notre expérience." Lacan, J. (1953) Fonction et champ de la parole et du langage en psychanalyse. Escrits, Seuil.
6 "Pour mon « ami » Heidegger évoqué plus haut du respect que je lui porte, qu'il veuille bien s'arrêter un instant, voeu que j'émets purement gratuit puisque je sais bien qu'il ne saurait le faire, s'arrêter, dis-je, sur cette idée que la métaphysique n'a jamais rien été et ne saurait se prolonger qu'à s'occuper de boucher le trou de la politique." C'est son ressort" Lacan, J. (1973) Introduction à l'édition allemande des écrits. Autres Écrits: Paris: Seuil, p. 554.
7 "L'essentiel de ce qu'a dit Freud, c'est qu'il y a le plus grand rapport entre cet usage des mots dans une espèce qui a des mots à sa disposition et la sexualité qui règne dans cette espèce. La sexualité est entièrement prise dans ces mots, c'est là le pas essentiel qu'il a fait. C'est bien plus important que de savoir ce que veut dire ou ne veut pas dire l'inconscient. Freud a mis l'accent sur ce fait. Tout cela, c'est l'hystérie elle-même. Ce n'est pas un mauvais usage d'employer l'hystérie dans un emploi métaphysique ; la métaphysique, c'est l'hystérie." In. Lacan, J. (1977) Propos sur l'hystérie .staferla
"Et sa portée métaphysique se révèle en ceci que le phénomène de la folie n'est pas separable du problème de la signification pour l'être en général, c'est-à-dire du langage pour l'homme." Lacan, J. (1946) Propos sur la causalité psychique. staferla
8 Lacan, J. (1973) Introdução a edição Alemã de um primeiro volume dos Escritos. In Outros Escritos: Jorge Zahar, pág. 555.
_. "Car vous auriez tort de croire que je me soucie de métaphysique au point de faire un voyage pour la rencontrer. Je l'ai à domicile, c'est à dire dans la clinique oü je l'entretiens dans des termes qui me permettent de vous répondre sur la fonction sociale de la maladie mentale, lapidairement, sa fonction sociale avez-vous bien dit, c'est l'ironie ! Quand vous aurez la pratique du schizophrène, vous saurez l'ironie qui l'arme, portant à la racine de toute relation sociale." Lacan, J. (1966) Réponses à des étudiants en philosophie sur l'objet de la psychanalyse. Autres Écrits. Paris: Seul, p. 203.
9 A tese, com pequena modificação, reaparece na formulação: "la métaphysique n'a jamais rien été et ne saurait en tout cas se prolonger - c'est bien pourquoi il la met en question d'ailleurs - n'a jamais rien été ni ne saurait se prolonger qu'à boucher le trou de la politique." Intervention de Jacques Lacan. Séance du vendredi 2 novembre (après-midi), parue dans les Lettres de l'École Freudienne, 1975, n° 15, pp. 69-80.

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