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Analytica: Revista de Psicanálise

On-line version ISSN 2316-5197

Analytica vol.11 no.20 São João del Rei Jan./June 2022

 

ARTIGOS

 

Anorexia em histéricas: o desejo em questão

 

Anorexia in Hysterics: The Desire in Question

 

Anorexie chez les hystériques: le désir en question

 

Anorexia em histéricas: el deseo en cuestión

 

 

Nara Pillar Maia Couto e Silva*; Rogério de Andrade BarrosI, II, III**

IUniversidade Estadual de Feira de Santana – UEFS – Brasil
IIEscola Brasileira de Psicanálise – EBP - Brasil
IIIAssociação Mundial de Psicanálise - AMP

 

 


RESUMO

Este trabalho objetiva compreender a especificidade da construção sintomática da anorexia mental em histéricas, partindo da constituição do desejo na concepção da psicanálise de orientação lacaniana. Para isso, foi trazido o conceito de desejo e sua relação com o Outro, identificando no sintoma anoréxico a recusa como sua mais aparente manifestação. Em seguida, apontamos as nuances presentes na anorexia mental, que se apresentam difíceis de serem submetidas a um processo de análise, configurando-se como sintoma espesso, afeito ao imaginário do corpo, distanciado do circuito da linguagem e da ordem simbólica. Concluímos que a psicanálise de orientação lacaniana traz a especificidade da anorexia localizada em um campo mais complexo que a ilusão imaginária, sendo dadas, dessa forma, indicações clínicas a partir da inserção possível da divisão subjetiva no processo de análise.

Palavras-chave: Anorexia mental, Histéricas, Desejo, Divisão subjetiva.


ABSTRACT

This paper aims to understand the specificity of the symptomatic construction of mental anorexia in hysterics, starting from the constitution of desire in the conception of psychoanalysis of Lacanian orientation. For this, the concept of desire and its relationship with the Other was brought, identifying in the anorexic symptom the refusal as its most apparent manifestation. Then, we point out the nuances present in mental anorexia that are difficult to undergo an analysis process, configuring themselves as a thick symptom, used to the imaginary of the body, distanced from the language circuit and the symbolic order. We conclude that Lacanian oriented psychoanalysis brings the specificity of anorexia located in a more complex field than the imaginary illusion, thus being given clinical indications from the possible insertion of the subjective division in the analysis process.

Keywords: Mental anorexia, Hysterical, Desire, Subjective division.


RÉSUMÉ

Ce devoirs vise à comprendre la spécificité de la construction symptomatique de l'anorexie mentale en hystérique, basée sur la constitution du désir dans la conception de la psychanalyse de l'orientation lacanienne. Pour cela, le concept de désir et sa relation avec l'Autre a été apporté, identifiant dans le symptôme anorexique le refus comme sa manifestation la plus apparente. Ensuite, nous soulignons les nuances présentes dans l'anorexie mentale qui sont difficiles à subir un processus d'analyse, devenant un symptôme épais, habitué à l'imaginaire du corps, éloigné du circuit du langage et de l'ordre symbolique. Nous concluons que la psychanalyse orientée lacanienne apporte la spécificité de l'anorexie située dans un domaine plus complexe que l'illusion imaginaire, recevant ainsi des indications cliniques de l'insertion éventuelle de la division subjective dans le processus d'analyse.

Mots-clés: Anorexie mentale, Hystérique, Désir, Division subjective.


RESUMEN

El objetivo de este trabajo es comprender la especificidad de la construcción sintomática de la anorexia mental en la histérica, a partir de la constitución del deseo en la concepción del psicoanálisis de orientación lacaniana. Para esto, se trajo el concepto de deseo y su relación con el Otro, identificando en el síntoma anoréxico el rechazo como su manifestación más aparente. Luego, señalamos los matices presentes en la anorexia mental que son difíciles de someter a un proceso de análisis, configurándose como un síntoma espeso, acostumbrado al imaginario del cuerpo, distanciado del circuito del lenguaje y el orden simbólico. Concluimos que el psicoanálisis de orientación lacaniana aporta la especificidad de la anorexia localizada en un campo más complejo que la ilusión imaginaria, por lo que se le dan indicaciones clínicas de la posible inserción de la división subjetiva en el proceso de análisis.

Palabras clave: Anorexia mental, Histérico, Deseo, División subjetiva.


 

 

Introdução

Apesar da recusa alimentar já ter sido identificada historicamente na prática religiosa (Bidaud, 1998), atualmente a anorexia adquire novos contornos, fazendo-nos interrogar sobre a sua função e especificidade na dinâmica subjetiva. O considerável aumento de casos de anorexia e bulimia que chegam aos consultórios de psicanalistas, bem como aos equipamentos de saúde públicos e privados, levam a considerá-los, assim como as toxicomanias, depressões e ataques de pânico, como as novas patologias do século XXI (Fuks & Pollo, 2010).

Se outrora a purificação, realizada pelo jejum, permitia um encontro com o divino (Weinberg & Cordás, 2006), atualmente, o uso do corpo se modifica, revelando uma dinâmica pulsional curto-circuitada, especialmente na sua relação com o Outro. Nesses casos, ao contrário de apresentar uma sintomatologia simbólica, que permitiria ressaltar a função do objeto da satisfação localizada no Outro, representante da linguagem, evidenciamos casos em que a demanda de nada se encontra no centro da questão, fazendo ver a sua precariedade simbólica e gerando obstáculos no tratamento analítico (Santos & Zanotti, 2016).

Termo usual da contemporaneidade, a anorexia traz à tona diversas discussões sobre a imagem. Alguns campos do saber chegam a restringir a concepção da anorexia apenas da ordem dismorfobófica, revelada por meio de uma disfunção que se presentifica na recusa de alimento, tendo, por efeito, a redução do peso corporal (Alvarenga, 2003).

A anorexia foi descrita e incluída na nosologia psiquiátrica por Charles Lazègue, em 1873. Na sociedade hodierna, a psiquiatria, conforme o DSM-V (2014), traz alguns dos critérios diagnósticos para a anorexia nervosa, tais quais o medo de ganhar peso e a influência do peso na autoavaliação, além de ter o peso como parâmetro para avaliar o nível de gravidade nesses casos. É perceptível que os critérios utilizados são medidos tendo como parâmetro o corpo e a percepção do sujeito sobre sua imagem, classificando a anorexia como um transtorno alimentar. Para a psiquiatria estadunidense, o negativismo da conduta anoréxica é resultado defensivo de um Eu fraco (Consenza, 2018), incapaz de barrar a exigência de satisfação, recorrendo à construção sintomática como solução subjetiva. Nessa perspectiva, o diagnóstico de anorexia pauta-se no corpo entendido a partir de sua imagem, dando maior ênfase à recusa do alimento.

Para a psicanálise de orientação lacaniana, adota-se, a partir de Lacan (1995/1956-1957), o termo anorexia mental, exposto com base em sua observação de um caso do psicanalista Ernst Kris, no qual o paciente se queixa de ser desprovido de ideias e ser um plagiador. No entanto, com o passar das sessões, descobre-se que ele não rouba ideias, permitindo a Lacan demonstrar que se trata aí de um caso de anorexia mental. Isso implica dizer que não é que o paciente não rouba ideias, já que o que se encontra revelado no caso é que ele rouba, propriamente, nada. Reconhece-se, assim, que as anoréxicas não são passivas em suas pulsões, elas se endereçam ao nada como um objeto.

Segundo Santiago (1998), a anorexia foi um termo retomado por H. Huchard, em 1983, não se tratando apenas de uma questão com a imagem do corpo e não se restringindo a uma questão alimentar. Segundo Consenza (2018, p. 43, tradução nossa), "a anorexia é contemplada por Lacan, sobretudo, em sua vertente histérico-dialética, como posição que desmarca radicalmente o funcionamento do desejo do campo da necessidade". Dessa forma, compreende-se a anorexia como uma construção sintomática que se constitui como uma resposta ao real. Esse sintoma se faz na peculiaridade do encontro com o Um pela grande consistência, representado na sua completude, não permitindo que a falta advenha, fazendo obstáculo para que o sujeito se constitua. Como efeitos, vemos as dificuldades do sujeito se tornar desejante e os impasses diante do próprio corpo, fazendo com que os psicanalistas interroguem a sua própria prática (Pencak & Bastos, 2009).

 

O desejo insatisfeito e o outro

O desejo, na teoria psicanalítica, é um conceito fundamental para compreender a constituição do sujeito. Apesar de não ter sido formalizado por Freud, Lacan (1999/1957-1958) recupera sua função para, a partir disso, delimitá-lo e compreendê-lo em experiência analítica. Ao fazer uma releitura do que Freud trouxe a respeito do sonho, especialmente na sua tese de que se trata da realização do desejo inconsciente (Freud, 2014/1900), Lacan (1999/1957-1958) esclarece a função do desejo na produção onírica, articulando-o a um caso paradigmático freudiano de histeria, conhecido como "A bela açougueira". O sonho é descrito pela paciente da seguinte maneira:

Quero oferecer um jantar, mas a única coisa que tenho na despensa é um pouco de salmão defumado. Penso em fazer compras, mas me lembro que é domingo à tarde, quando todos os lugares estão fechados. Quero telefonar para alguns entregadores, mas o telefone está com defeito. E assim preciso renunciar ao desejo de oferecer um jantar. (Freud, 2014/1900, p. 168).

Ao relatar seu sonho para Freud, a paciente o confronta a respeito de sua afirmação de que o sonho seria a realização do desejo inconsciente, visto que no sonho seu desejo de realizar o jantar é frustrado. No entanto, Freud (2014/1900), ao analisar o sonho, o relaciona com o que fora trazido por ela em análise e faz duas interpretações que se sobrepõem. A primeira é de que o sonho é a realização do desejo de não engordar a amiga, que, segundo ela, associou em análise, havia perguntado quando iria oferecer um jantar em sua casa, pois lá se come bem. Essa amiga também havia recebido elogios de seu marido, porém tem um corpo franzino e magro, sendo que o desejo dele se direciona à apreciação de formas opulentas. Dessa forma, no sonho da paciente de Freud, constata-se o desejo de não ter o jantar, realizando o desejo inconsciente de não engordar a amiga por ciúmes do marido.

Na segunda interpretação, Freud (2014/1900) traz à tona a identificação histérica da "Bela açougueira" com a amiga, visto que ela "estaria empenhada em arranjar um desejo frustrado na realidade (o pão com caviar). A amiga também manifestou um desejo, a saber, de engordar" (p. 170). Dessa maneira, como é seu desejo que o desejo da amiga não se satisfaça, pois assim ela despertaria o interesse de seu marido, pela via da identificação histérica, ela trouxe no sonho seu próprio desejo insatisfeito.

Valendo-se dessa experiência freudiana, Lacan (1999/1957-1958) avança trazendo a questão do significante em sua interpretação do sonho. Para ele, no sonho da "Bela açougueira", há uma identificação histérica da paciente quando ela relata o desejo insatisfeito, presente no sonho de realizar um jantar, condizendo com o que fora relatado por ela em análise sobre o desejo insatisfeito da amiga. No entanto, a insatisfação trazida pela não realização do jantar é a significação do desejo de comer sanduíche de caviar, que ela, por sua vez, insistia em não ser realizado com a explicação de que não queria que o marido gastasse, por caviar ser um alimento caro, mesmo o marido podendo realizá-lo, pelo fato de ser açougueiro e estar disposto a satisfazer todos os seus desejos. Desse modo, no sonho, ela realiza o seu desejo de ter um desejo insatisfeito. É por esse ponto que Lacan (2014/1999) aponta a especificidade do desejo na histérica, quando conclui que "o desejo com que nos deparamos desde os primeiros passos, e a partir do qual se desenrola a solução do enigma, é o desejo como insatisfeito" (p. 376).

O desejo insatisfeito, que aparece sob o significado metaforizado1 do salmão no sonho, e que, metonimicamente, articula-se ao significante que representa essa insatisfação fora do sonho, o caviar, encontra lugar na sua dependência com o Outro que, nesse caso, está representado pela amiga da bela açougueira. Essa é a grande questão no que concerne à constituição da histérica como sujeito do inconsciente: sua relação com o Outro, no nível do desejo e da sua significação. "A histérica vive inteiramente no nível do Outro. A ênfase, para ela, é estar no nível do outro, e é por isso que lhe é necessário um desejo do Outro" (Lacan, 1999/1957-1958, p. 412).

No entanto, esse emparelhamento não se dá simplesmente assim, com poucos elementos. O desejo, como conceito psicanalítico, surge articulado com outras noções que ajudam a compor a relação do sujeito com o Outro desde o princípio: a necessidade e a demanda.

 

Demanda, desejo e amor

Inicialmente aparecendo em uma relação de objeto, a necessidade vem introduzir o primeiro ponto de endereçamento ao Outro. Como afirma Lacan (1999/1957-1958), a necessidade tem o alcance limitado no ser de fala, devendo passar inevitavelmente pela linguagem para poder ser significada. O falante, então, no momento em que demanda que sua necessidade seja satisfeita, a transforma em demanda incondicional de amor. Isso implica dizer que a necessidade passa pelo reconhecimento, inscrevendo-se numa relação dual, mais precisamente entre a criança e o primeiro Outro. O amor, nessa perspectiva, articula-se ao reconhecimento, retirando o ser de fala da relação direta com o objeto da sua satisfação, introduzindo o significante como representação. Desse modo, "o que se manifesta como necessidade tem de passar pela demanda, isto é, endereçar-se ao Outro" (Lacan, 1999/1957-1958, p. 378). É exatamente nesse espaço entre a necessidade e a demanda de amor que se situa o desejo.

Essa relação é explicitada por Lacan (1998/1966) quando ele revela que a bela açougueira não quer ser satisfeita em suas verdadeiras necessidades, porque o que está coberto pelos significantes trazidos no sonho é um ponto que se localiza além da demanda, ultrapassando também a necessidade, que é lugar do desejo. Nesse caso, a necessidade aparece como um engodo. É pelo limbo deixado pela necessidade que a demanda faz surgir posteriormente o desejo, elemento sem objeto definido e palpável que transcende ao sujeito para dar conta justamente do que ele não consegue alcançar nem definir. É sob uma possível falha da necessidade que a demanda faz apelo ao Outro por meio de uma pergunta ( Che vuoi ?– O que quer você?) sem resposta, conduzindo o sujeito no caminho do seu próprio desejo (Lacan, 1998/1966).

É neste ponto que está localizado o gozo do imaginário, um gozo presente na relação especular que se caracteriza como "lugar da fala, lugar da linguagem, lugar da estrutura e lugar de todos as determinações do sujeito" (Miller, 2012, p. 4). É desse lugar imaginário que o sujeito vai dirigir a demanda, o que quer dizer que a demanda se dirige a um objeto que se localiza no outro, inicialmente representado por uma imagem (Lacan, 1985/1964). É nessa correspondência entre o outro e o objeto contido nele que a linguagem vai homologar uma significação, culminando em um desejo de reconhecimento que equivale a uma satisfação da ordem da comunicação, alçando, assim, o campo simbólico (Miller, 2012). A solidez e fixação marca o gozo inicial, imaginário, resultado da relação especular com o primeiro Outro. Esse é um ponto-chave para compreender a anorexia como sintoma.

Para que a pergunta endereçada ao Outro não tenha resposta e para que o desejo do sujeito esteja condicionado nessa relação, é preciso que o Outro seja faltante e que essa falta seja marcada para o sujeito. É necessário que, no campo do Outro, não haja correspondência entre a exigência pulsional e o objeto que garanta a satisfação, para que a significação tome o significante como metáfora. Nesse momento, entra em jogo um elemento importante: a significação fálica, a qual surge no momento da castração. Por meio do falo, significante do desejo, opera-se uma barra sobre o Outro, perturbando a relação, até então, especular. Assim, "o falo é o significante que marca o que o Outro deseja, na medida em que ele mesmo como o Outro real, Outro humano, está, em sua economia, marcado pelo significante" (Lacan, 1999/1957-1958, p. 378). Nessa perspectiva, Lacan ainda elabora que "é na medida em que o desejo do Outro é barrado que o sujeito vem a reconhecer seu desejo barrado, seu próprio desejo insatisfeito" (p. 379).

É preciso, em algum momento, que a criança deixe de ser objeto que completa imaginariamente a falta do Outro, momento esse que ocorre só quando o Outro materno busca o que lhe falta alhures da relação dual com o filho, posicionando-se como faltante. Assim, ele passa a ser sujeito, pois também é marcado pela falta. Não confundir o dom de cuidar com o dom de amar (Lacan, 1998/1966) é o que possibilita essa transição, já que o dom de amar introduz a falta, ao passo que o dom de cuidar tampona os espaços possíveis para ela ser inserida.

O desejo, metonímia da falta-a-ser (Lacan, 1998/1966), não tem objeto concreto, e é isso que torna o sujeito do inconsciente ser faltante, o que só é possível com o advento da lei, mas não é qualquer lei. Trata-se da lei do pai, Nome-do-Pai, que permite a metáfora do gozo, introduzindo, no campo simbólico, uma resposta significante ao enigma do desejo materno. Em termos lacanianos, "a fala da mãe responde à demanda, numa primeira etapa. Essa própria fala tem uma relação com uma lei que está além, encarnada pelo pai. É isso que constitui a metáfora paterna" (Lacan, 1999/1957-1958, p. 379). Essa metáfora, barra no sujeito, pela via do Outro, vai dar ao gozo uma consistência simbólica. Assim, "a significantização do gozo, que se demonstra equivalente ao significado de uma cadeia significante inconsciente cujo vocabulário seria constituído pela pulsão. É o que Lacan chamou de desejo" (Miller, 2012, p. 9).

É nesses termos que o desejo entra em questão, sendo definido por Miller (2012, p. 9) como um conceito em "que se conclui, que se realiza, que se efetua a significantização do gozo". Isso é propriamente o que parece operar de maneira falha nos casos de anorexia, especialmente as anorexias histéricas. Nos termos de Cosenza (2018, p. 91), "é justamente a conexão do Outro simbólico sobre o corpo do sujeito que encontra uma dificuldade especial na clínica da anorexia mental". É possível pensar que, nesses casos, a anoréxica se fixa no gozo imaginário, distante do desejo, distante da significantização do gozo, mas perto da satisfação mortífera presente na apatia que a recusa em assumir ao desejo pode trazer.

 

A anorexia e a recusa do outro

Mesmo na histeria, quando a significação fálica é precária, não abrindo a possibilidade para ser trazida à tona a falta do Outro, inviabilizando o surgimento do desejo, há um aprisionamento no Eu que faz com que o sujeito fique às voltas com o gozo imaginário, não dialético. Prisão que não surge necessariamente no Eu, mas que se dá por uma inscrição simbólica problemática (Consenza, 2018). Esse é o possível novelo que compõe a sintomaticidade da anorexia mental: um gozo que não advém da linguagem, mas que procede do Eu, como instância regulatória do gozo (Miller, 2012).

A função significante, intermediada pelo Outro, revela ter um estatuto diferente nas anoréxicas histéricas. Há uma recusa à chamada do Outro, fazendo com que o sujeito encontre na relação especular uma forma de negar o desejo, restando o seu impasse perante o gozo, que se detém arraigado no imaginário. Isso permite a Soria (2001) identificar, na anorexia, uma inspiração de existir como pura imagem.

A renúncia se configura como um movimento que pretende salvar o próprio sujeito de um Outro que não o reconhece, como demonstra Recalcati (2007), ao relatar sua experiência clínica com grupos monossintomáticos que se apresentam como anoréxicos. A recusa à chamada do Outro é também uma recusa ao próprio desejo, já que, como foi trazido anteriormente, é na relação com o Outro que vem à tona o desejo no sujeito. Mesmo havendo uma demanda do sujeito, essa demanda não é claramente direcionada e se apresenta vazia. Essa demanda "parece se fechar em si mesma e, portanto, exclui a natureza dialética da demanda como chamada dirigida ao Outro" (Recalcati, 2007, p. 105, tradução nossa).

Nesse sentido, o modo de gozar do sujeito na anorexia mental aponta para uma consistência fixa, como traz Miller (2012), ao explicar o gozo imaginário em um dos paradigmas do gozo. Em seus termos, "o gozo do imaginário não é intersubjetivo, mas intraimaginário. Ele não é dialético, mas é constantemente descrito por Lacan como permanente, estagnante e inerte" (p. 5). Essa impossibilidade de dialética se revela na maneira em que a anoréxica se apresenta, identificada ao significante "anoréxica", sem permitir um deslizamento metonímico na cadeia. Esse significante único e paralisante, que parece ser uma substituição precária, revela uma identificação imaginária, resposta à inoperância do Nome-do-Pai em metaforizar o gozo, alçando o estatuto simbólico (Dafunchio, 2010). Assim, "sou anoréxica" indica uma modalidade de apresentação do sujeito que anula sua divisão (Recalcati, 2007). Dessa forma, o sintoma anoréxico teria um duplo estatuto, uma solução sobre o desejo do Outro e o gozo em si (Consenza, 2018).

Apesar de existente, a metáfora paterna, na anorexia mental em histéricas, parece falha, não havendo uma divisão subjetiva que permita uma possibilidade de dialética no sujeito2. O que para Recalcati (1997), citado por Consenza (2018), teria como resultado um desejo fraco e teria como manifestação uma inclinação holofrásica. Com a recusa a entrar no campo do Outro, há uma debilidade simbólica e, dessa forma, o sujeito cria alternativas para tentar uma nomeação. Sem o nome do pai simbólico, o sujeito encontra-se, na neurose, em deficiência.

Nas formalizações teóricas dos casos clínicos sobre esses sujeitos, cujas estruturas o Nome-do-Pai é quase nulo, especialmente no trabalho da prática psicanalítica com crianças, propõe-se que a operação de alienação não foi efetivamente operada – o que quer dizer que esses sujeitos se localizam numa posição de reserva com relação à operação de alienação ao campo significante. (Guimarães, 2014, p. 92).

É nesse momento que surge a identificação com o sintoma, que se coloca como um possível Nome-do-Pai, imaginário, que vem para dar conta da precariedade da metáfora paterna no campo simbólico. Trata-se de uma identificação imaginária que serve a muitos, sem passar pela singularidade do caso a caso (Dafunchio, 2013). Assim, institui-se uma lei particular que perde a dialética com o Outro (Recalcati, 2007).

Identificado ao sintoma da anorexia mental, o sujeito reproduz um discurso uniforme e imutável. Esse discurso, que parece se distinguir do que comumente aparece nas histerias, assume uma forma fixa, configurando-se como uma holófrase (Lacan, 1985/1964). Nesses casos, os significantes primordiais da cadeia apresentam-se em bloco, fazendo com que o sujeito sintetize toda a cadeia em apenas um significante, visto que a holofrasização do discurso "implica uma densidade asséptica em uma palavra" (Recalcati, 2007, p. 98, tradução nossa).

Além da impossibilidade de divisão subjetiva, reduzir-se ao "sou anoréxica" promove um apagamento da singularidade, deixando o sujeito às voltas com um gozo mortífero. Nesse sentido, o sujeito reduzido se identifica a um universal que vai lhe servir como uma espécie de armadura contra o desejo. Assim, "o sintoma anoréxico cobre em seu aparente monocromatismo o modo de gozo próprio de cada sujeito" (Recalcati, 2007, p. 105, tradução nossa). Longe da viabilidade de surgimento do desejo, o empuxo ao gozo age como um imperativo que imobiliza. "O caráter de gozo subtrativo da anoréxica se manifesta como gozo nirvânico da privação, como aplicação extremista do princípio do prazer: a tendência a redução das tensões, se tornando uma nova tensão: um empuxo a morte, a neutralização das sensações, a negação da vida" (Recalcati, 2007, p. 99).

O corpo magro da anoréxica é a via pela qual o sujeito revela seu sintoma fixo, não dialético. Sem possibilidade de construir um sintoma classicamente histérico que passe pela via da linguagem e da significação do Outro, o corpo surge como cenário no qual se realiza uma possível resposta ao Outro. Dessa forma, se "na histeria a imagem do corpo pode vir como substituto à falta significante que representa o sujeito no Outro" (Alvarenga, 2018, p. 1), nas anorexias histéricas isso se faz de maneira mais contundente.

No entanto, essa precarização da metáfora paterna, apresentada na sintomatologia da anoréxica histérica, se distingue da ausência da metáfora paterna presente na vertente psicótica da anorexia, pelo fato de o nada ter em estatuto diferente do que o presente na psicose. Como traz Consenza (2018), citando Recalcati (2002, p. 151-152),

Os dois "nada" da anorexia, que Recalcati articula apoiando-se numa distinção de Serge Cottet entre clínica da falta e clínica do vazio, remetem, por um lado, ao nada como significante do desejo, baseado numa clínica do nada como falta – variante dialético-neurótica do nada –, e, por outro lado, ao nada como vazio, puro gozo que não pode assujeitado à simbolização, fundamento da vertente psicótica da posição anoréxica.

 

"Comer nada", sintoma em ato

Além de se revelar como um corpo magro, a anoréxica na histeria manifesta seu sintoma por meio do ato de comer nada. Seu sintoma, então, situa-se mais em ato do que nas palavras faladas (Gorski, 1998). Apesar de parecer uma posição passiva, a recusa na anoréxica tem um status de ato, substituindo a palavra recalcada, sem nada dizer (Consenza, 2009).

Essa posição em que o sujeito se encontra vem como resposta a um Outro consistente, sem faltas. Desse modo, sua necessidade se transforma em demanda direcionada, não havendo possibilidade de encontrar a falta possível para fazer surgir o desejo. O ato da recusa, nessa perspectiva, parece ser uma tentativa de demandar a falta, demonstrando que os objetos que o Outro oferta no cuidado não respondem ao vazio que inaugura o desejo. Desse modo, podemos entender na anorexia histérica que a recusa funciona como "[...] demanda inconsciente e interpela o Outro no nível do desejo. O que o sujeito demanda nesse apelo é saber qual é o seu lugar no desejo do Outro" (Consenza, 2009, p. 1).

O caminho que a necessidade percorre até o desejo parece encontrar obstáculos que impedem que a falta se revele no Outro. Sem a descoberta da falta não há possibilidade da inscrição no sujeito de um significante que o organize. Concordamos com Consenza (2009, p. 60) quando ele afirma que "quando o Outro não se inscreve no corpo do sujeito organizando-o simbolicamente, este não está em condições de poder encontrar uma posição de desejo próxima e autônoma".

Dessa forma, o sujeito se coloca numa relação de objeto em que se encontra desde o princípio, quando vive uma relação dual com a mãe, configurando a chave que Lacan (1995/1956-1957) coloca no seio da anorexia mental. Essa trama é tecida desde o momento em que o sujeito se encontra no campo da necessidade, quando a mãe, antecipando-a, tenta atendê-la de pronto. No entanto, há um momento em o que o sujeito quer é justamente o que o Outro não tem. Na peculiaridade das anorexias, aí onde deveria advir a falta, o Outro "empanturra-a com a papinha sufocante daquilo que ele não tem, ou seja, confunde seus cuidados com o dom de seu amor" (Lacan, 1998/1966, p. 634). O Outro, na tentativa de tamponar a falta, oferece objetos, enquanto o sujeito demanda o que o Outro não tem e não o é, na forma de amor. O signo de amor, nesse momento, para o sujeito, é o espaço para a falta, aí onde o Outro interpreta, consistentemente, como demanda de objeto.

O amor requer a falta e a "papinha sufocante", termo usado por Lacan (1995/1956-1957) para designar os objetos excessivos da demanda, que no caso da anorexia encontra sua representação na comida, cobre os espaços possíveis para a falta. Dessa maneira, a mãe, que para entrar no circuito do desejo, precisa ser faltosa, encontra completa, como uma totalidade disposta a responder todas as interpelações da criança. Como explicita Lacan (1995/1956-1957, p. 190),

Quando se encontra em presença desta totalidade sob a forma do corpo materno, ela deve constatar que ela não lhe obedece. Quando a estrutura especular reflexa no estádio do espelho entra em jogo, a onipotência materna só é refletida, então, em posição claramente depressiva, e aí surge o sentimento de impotência da criança.

É movida por esse sentimento de impotência que a criança lança mão da recusa como um artifício para dar conta da totalidade que a mãe apresenta para ela. Essa recusa não surge em ato, o de comer nada, como traz Lacan (1995/1956-1957, p. 190) quando afirma que "não é no nível da ação e sob a forma de negativismo que se elabora a resistência à onipotência na relação de dependência, e sim no nível do objeto que nos aparece sob o signo do nada". Diferentemente do que é trazido na explicação da psiquiatria, a anorexia não advém de uma posição passiva de não comer, mas sim de comer nada, um objeto que tenta restituir a falta na relação com o Outro materno (Lacan, 1995/1956-1957).

Esse movimento faz o sujeito instituir uma demanda reversa que pode acompanhar sua relação com o Outro durante muito tempo. Um circuito que faz com que o Outro demande do sujeito o tempo todo, já que, "graças a esse nada, ela faz a mãe depender dela" (Lacan, 1995/1956-1957, p. 188). A reversibilidade da demanda, primeiro, evidencia-se na recusa e o ato de comer nada do sujeito; em seguida, surge um Outro que demanda que ele coma o alimento, e esse círculo mantém o sujeito arraigado de gozo imaginário, em que o alimento representa imaginariamente o objeto do desejo do Outro. Uma resposta da criança em relação à mãe não faltosa, onipotente, entendida como uma tentativa de empreender aí um furo, dando espaço à invenção de um objeto que corresponda a essa falta.

A onipotência com a qual a criança pode se deparar diante desse Outro que é a mãe pode ser resultado de uma relação que permanece oferecendo uma totalidade não barrada. Para que isso ocorra, a metáfora paterna é crucial em um segundo momento da criança. É a partir da barra, posta pela significação fálica, que se marca a falta no primeiro Outro, tornando-o desejante, mais precisamente, de algo que está além da relação mãe-criança. É nesses termos que Miller (2014) esclarece que esse além está localizado na divisão desse Outro em mulher e mãe, sendo que essa segunda função "só é suficientemente boa se não o é em demasia, se os cuidados que ela dispensa à criança não a desviam de desejar enquanto mulher" (p. 2-3).

É a partir da entrada de um terceiro na relação especular que a mãe é dividida, quando até então a criança ocupava o lugar de objeto para ela, para onde é direcionada toda a sua atividade. No caso da anoréxica, que permanece nesse lugar, prevalece uma tentativa, pela mãe, de atendimento de todas as suas demandas, impossibilitando que sua falta seja marcada. Nesse ponto, é possível identificar, na anorexia, que a mãe não tenha desejado um além da relação com a criança, fazendo ver que a significação fálica opera de maneira falha. Tendo isso em vista, se não há a possibilidade de a criança dividir a mãe, ou ela sucumbe como dejeto do par parental ou permanece nessa relação dual (Miller, 2014). Ao permanecer na relação especular, o sintoma do sujeito não se estabelece a partir da lei da linguagem, instituída a partir da metáfora paterna. Por essa razão, o sintoma anoréxico apresenta consistência fixa e imutável, incorporado como uma resposta à totalidade materna.

 

Divisão subjetiva: um tratamento possível na psicanálise

É na inscrição precária da metáfora paterna nas anoréxicas histéricas que reside a dificuldade de intervenção psicanalítica. Como é preciso a mediação da linguagem no processo de análise, visto que é necessário que o Outro seja submetido à castração, interrogamos os limites do tratamento realizado pela palavra na anorexia mental, na qual a significantização do gozo parece não ocorrer (Miller, 2014). No entanto, mesmo o sintoma se apresentando indiferente à intervenção simbólica, quando ele resulta da fantasia da mãe, como afirma o mesmo autor, a posição do analista pode se apresentar como um elemento impotente na construção dialética. É pela via da divisão subjetiva que a consistência maciça da sintomatologia da anorexia mental pode vir a se "dissolver" e entrar no circuito da cadeia significante.

Se é mediante uma pergunta – "Che vuoi? (Que quer você?)" – que o sujeito é inserido no caminho de seu desejo, é também pela via do questionamento que o analista caminha com a anoréxica histérica no curso do tratamento. Sendo assim, é se colocando no lugar de um terceiro que o analista vai possibilitar que a anoréxica encontre a fala (Lacan, 1998/1966). De pronto, uma questão ressoa para nós: como pode se dar o processo de tratamento pela via da linguagem se a significação fálica opera de maneira frágil na anorexia?

Preso num gozo imaginário, submetido de maneira prevalente pela relação especular, é apenas a demanda de ajuda que é direcionada pelo sujeito para o analista, que quase sempre tem sua resposta na mão do Outro (Consenza, 2009). Será pela aposta na palavra que vislumbraremos a transformação da demanda em sintoma, não sem antes passar pela emergência da angústia, afeto inicial que surge no momento mesmo da procura por tratamento. Pela figura do analista, abrimos a possibilidade de, no lugar de um Outro consistente, apontar para uma falta possível para que o sujeito possa reconstruir algo da sua fantasia.

A função do analista é crucial, porque é com a transferência, que faz do analista um Outro, que se pode diferenciar o seu lugar, não mais como o primeiro Outro, total e onipotente, mas um que possibilite a falta, fazendo o sujeito questionar sua angústia, favorecendo a sua transformação em um sintoma histérico (Consenza, 2009). Quando a demanda é transformada em sintoma, a palavra vai reduzir o gozo mortífero presente na anoréxica, podendo simbolizar o seu sintoma, destituindo-o de um sentido que, até então, era incorporado e fixo.

Ao se utilizar dessa via de tratamento, Recalcati (2007) traz, com sua experiência com grupos monossintomáticos de anoréxicas e bulímicas, o caminho percorrido de maneira inicial em atendimento a esses casos. Ele se utiliza da configuração grupal como uma porta de entrada para uma intervenção pela via da palavra, visto que "compartilhar o mesmo sintoma gera um fenômeno de pertencimento" (p. 102, tradução nossa).

Apontando a identificação em massa, uma despersonalização específica do sintoma anoréxico, Recalcati (2007) propõe uma extração da subjetividade da identificação universal da anoréxica. A partir da formação dos grupos, pode-se começar a introduzir uma elaboração simbólica. Isso, que no início se apresenta apenas como uma identificação imaginária, pode se tornar um lugar de fala, no qual a palavra pode operar para trazer um sentido ao sintoma anoréxico, pois, uma vez que o sujeito está inserido no contexto grupal, ele se utiliza do suporte da ilusão do "nós" para avançar. Como a demanda de entrada na instituição é sempre do Outro, os grupos podem ajudar o sujeito a formular uma demanda própria, convidando-o a elaborar sobre o que o levou a pedir ajuda.

A partir do momento em que se estabelece no grupo e o sujeito reconhece uma demanda de ajuda que parta dele e não do Outro, começa a ser construída uma possibilidade de significantizar seu sintoma, iniciando uma perda da sustentação imaginária (Recalcati, 2007). A falta de sustentação com o imaginário causa uma desilusão, uma falta de pertencimento, que se faz presente na interrogação: "Se eu não sou anoréxica, sou o quê?" Essa pergunta pode ser entendida como uma introdução à divisão subjetiva.

Ainda se utilizando do grupo como possibilidade de uma primeira intervenção em anoréxicas histéricas, Recalcati (2007) faz uso da noção de comensalidade, na qual o grupo funciona como uma espécie de mesa na qual o sujeito compartilha uma possibilidade de fala. Trata-se de um lugar onde não está a comida, somente a palavra, longe do sufocamento da papinha oferecida pelo Outro materno. Desse modo, "a mesa do Outro torna-se o lugar possível onde o sujeito parece poder reencontrar, não sem uma certa angústia, seu lugar possível" (Recalcati, 2007, p. 111, tradução nossa). É fundamental marcar que não há possibilidade de um tratamento sem a posição do analista, que, nesse contexto, tem a função de manter aberto o lugar do objeto a. Assim, o desejo do analista faz surgir a falta do Outro, abrindo espaço para que essa falta, mediada pelo objeto, possa ser significantizada.

A via de tratamento por intermédio da divisão subjetiva constituída em análise, tendo como porta de entrada uma demanda grupal ou não, tem o objetivo de fazer com que o sujeito passe do todo homogêneo da identificação para o não-todo da combinação metonímica, em que um significante puxa o outro, formando uma cadeia. Dessa maneira, a direção do tratamento "aponta a desconstruir a identificação coletiva para extrair o nome próprio do sujeito recoberto pela máscara fenomênica da monossintomatissidade" (Recalcati, 2007, p. 116, tradução nossa).

 

Considerações finais

A relação com o primeiro Outro e a maneira que se dá, ou não, a constituição do desejo formam um plano de fundo da sintomatologia anoréxica. Essa trama traz à tona a questão da precariedade da entrada da significação fálica, que tem participação fundante na falta do Outro e, consequentemente, na constituição do desejo no sujeito. Essa é a via pela qual a teoria psicanalítica de orientação lacaniana conduz o manejo clínico.

Destacamos, neste trabalho, levando em consideração a singularidade do caso a caso, o caminho percorrido para a compreensão da anorexia mental em sua especificidade histérica. Apresentando uma via possível de tratamento, distante da posição sufocante que a mãe pode se colocar, em um primeiro momento, para a criança, o analista se coloca na posição de um Outro que deve possibilitar a fundação da angústia, fazendo com que o sujeito questione seu sintoma e, assim, possa colocar o seu desejo numa cadeia significante.

Mesmo não havendo muitos pontos de aprofundamento sobre o tema da anorexia na teoria psicanalítica, sua emergência na clínica da contemporaneidade faz com que sejam necessários avanços, visto que, nesses casos, a função do analista representa um ponto-chave no caminho do tratamento pela restituição simbólica que se dá por meio da divisão subjetiva.

 

 

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*Pós-graduada em Teoria da Psicanálise de Orientação Lacaniana pelo Instituto de Psicanálise da Bahia, Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública. Graduada em Psicologia pelo Centro Universitário Cesmac.
**Doutor em Psicologia. Professor da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS). Coordenador do Laboratório de Pesquisa em Psicanálise (LAPPSI/UEFS). Membro da Escola Brasileira de Psicanálise (EBP) e da Associação Mundial de Psicanálise (AMP).
1Lacan (1998/1966), no texto "A direção do tratamento e os princípios de seu poder", define a metáfora como sendo a substituição de um termo por outro e a metonímia a combinação de um termo com outro. Este trabalho não vai se aprofundar nesses conceitos, no entanto, além do texto citado anteriormente, vale a leitura do texto "A instância da letra no inconsciente", ambos situados nos Escritos (Lacan, 1998/1966).
2Este trabalho se restringe a abordar o sintoma anoréxico na estrutura neurótica, por isso, é colocada a possibilidade de divisão subjetiva. No entanto, não são em todas as anoréxicas que há a metáfora paterna.

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