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Desidades

versão On-line ISSN 2318-9282

Desidades vol.1  Rio de Janeiro  2013

 

INFORMAÇÕES BIBLIOGRÁFICAS

 

Participação política entre jovens: reinvenções e utopias.

“Juventude no século XXI: dilemas e perspectivas", de Heloisa Dias Bezerra e Sandra Maria Oliveira.

 

Edwiges Conceição Carvalho CorrêaI

IFaculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Brasil.



 

 

Esta obra organizada por Heloisa Dias Bezerra e Sandra Maria de Oliveira trata da temática da participação política da juventude. Essa tem provocado inúmeros questionamentos e estudos por parte de acadêmicos e organizações nacionais e internacionais. Há sempre a tentativa de identificar elementos de mobilização e politização no comportamento juvenil em suas variadas nuances no âmbito institucional – identificado em várias pesquisas como arcaico e desacreditado pelos jovens – e, principalmente, em outros espaços de integração e socialização, como grupos religiosos, culturais, de ação voluntária, e outros. Na sociedade brasileira, no período de redemocratização, a juventude ganhou especial destaque, ao receber direito de voto aos dezesseis anos, podendo ser percebida como um agente importante no contexto das mudanças políticas.

Este livro trata dessa temática a partir de artigos de pesquisadores contemplando discussões atuais e relevantes sobre a juventude brasileira. Nos artigos que o compõem são tratados temas e enfoque teóricos que tratam do ativismo político juvenil e do empoderamento de grupos que estão ou não alinhados ao sistema político-partidário, assim como a adesão e a apatia dos eleitores jovens em relação aos sistemas eleitorais institucionalizados. Trata também da discussão em torno do papel do Estado na fomentação e execução de políticas públicas pertinentes a essa fase etária.

No prefácio, escrito pela professora da UFG, Dalva Borges de Souza, evidencia-se que o livro é importante para aqueles que pretendem compreender a juventude contemporânea, sobretudo neste momento da vida política brasileira, renovada inclusive pelas manifestações de junho de 2013. Pode-se considerar que o livro traz pistas para a compreensão desse momento de efervescência, desconstruindo o estereótipo da juventude apática e desinteressada à participação política. Interessante frisar que os artigos que compõem esta coletânea partem de pesquisas empíricas realizadas em várias cidades e em espaços de atuação diversos. Também estão desprovidos de interpretações pré-concebidas em que a juventude é tratada com saudosismo, cobranças e censuras.

Conceição Firmina Seixas Silva e Lucia R. de Castro, a partir de pesquisas empíricas com jovens da cidade do Rio de Janeiro que participaram de projetos comunitários, fazem uma análise sobre a falta de motivação dos jovens pela política em ambientes institucionalizados.  Para sustentar a tese de que apenas a participação institucional é insuficiente para a compreensão do ativismo político, as autoras fazem um histórico do campo de atuação político juvenil no Brasil desde o processo de abertura política até a inserção nos chamados novos movimentos sociais. A inserção da participação juvenil em “grupos fluidos” na área da educação, meio-ambiente e cultura, se encaixa nos anseios da juventude de se distanciar das formas convencionais de participação política. O ambiente não hierarquizado desses grupos é muitas vezes fomentado pelos próprios jovens e visa atender demandas locais e atuação por diversas causas. Para tanto o trabalho contempla duas análises, sendo a primeira de discussão sobre o cenário social e político latino-americano cujas condições possibilitaram o surgimento de ativismos fora das formas instituídas de participação, e a segunda  dedicada à relação entre juventude e política no atual contexto social brasileiro, focando em ativismos não convencionais.

Paula Novaes Ramos observou como o poder pessoal e o poder social podem se manifestar perante o que se pode definir como “ajuda” no desencadeamento de um processo de empoderamento pela via da autoexpressão diante das condições materiais. O estudo foi feito tendo como referencial o projeto “Músicos do Varjão” que objetivava fomentar a autoexpressão dos participantes de forma integrada visando fortalecer a afirmação dos jovens em um cenário democrático. Visava também, fortalecer a identidade da comunidade, bem como sua autoestima.   A discussão teórica se norteia na noção de poder social desenvolvida por Max Weber que parte do pressuposto de que a autoexpressão de individualidades não se configura egoísmo ou individualismo. A autoexpressão seria assim uma forma de manifestar o empoderamento de indivíduos e grupos através da expressão política e da arte, sendo também responsável pela interação de segmentos sociais de níveis sócio-políticos diferenciados, com diferentes acessos a bens e recursos. A autora discute teoricamente as diferenças entre os conceitos de “cuidado” e “ajuda” para a compreensão do processo de empoderamento.

Rosana Kátia Nazzari e Thaís Damaris da Rocha Thomazini analisaram a compreensão, o questionamento e a reflexão dos jovens no processo de auto-reconhecimento, enquanto sujeitos capazes de agir politicamente no contexto social em que vivem: especialmente em processos de socialização que objetivam integrar o jovem com a política contribuindo para a formação de sua cidadania, forjando cidadãos capazes de participar de processos de tomada de decisões políticas - relatados a partir do programa “Câmara Jovem” implementado pela prefeitura da cidade de Cascavel. Ao apresentar o histórico e o modelo do referido programa, as autoras embasam uma discussão teórica sobre juventude e participação política, bem como as formas de participação popular frente aos problemas sociais. Afirmam também que o programa é objeto de análise por ser compreendido como o único espaço essencialmente político que tem como objetivo integrar o jovem com a política. A partir das entrevistas as autoras buscaram identificar a concepção dos jovens sobre o programa, sua interação com os demais estudantes e a percepção acerca do papel político que desempenham.

Ana Karina Brenner faz uma reflexão sobre a história da filiação partidária, bem como uma definição teórica sobre a direita e a esquerda no país, demonstrando em que nível se encaixam PT, PC do B, PDT, PSOL e PSTU, partidos a que os jovens são filiados.  A partir da análise de entrevistas a autora consegue traçar o perfil da atuação juvenil nos partidos e sua relação com a militância no movimento estudantil.  Outro aspecto apresentado é a percepção dos jovens no que concerne ao espaço de participação partidária.  Fica perceptível a dificuldade de militância pelo que a autora identifica como tensionamentos intergeracionais que incluem problemas referentes aos discursos e as práticas partidárias de acordo com a percepção dos próprios jovens.

Heloisa Dias Bezerra, Sandra Maria de Oliveira, Milka de Oliveira Rezende, Sandra Regina Alves pesquisaram o problema da percepção de jovens de baixa renda em relação ao mundo da política, e, principalmente, como se reconhecem enquanto sujeitos da política. Abordam o problema da adesão ou apatia aos processos democráticos traçando um mapa da participação dos jovens em processos eleitorais e, complementarmente, apresentam um levantamento de dados e questões sobre políticas públicas para a juventude.

Flávio Munhoz Sofiatti apresenta uma avaliação da ação do Estado no que tange a produção e implementação de políticas públicas para a juventude brasileira. Mapeando as ações políticas intentadas no período de 1995 a 2010, nos governos Fernando Henrique Cardoso e Luiz Inácio Lula da Silva, faz um diagnóstico critico dos avanços e limites das políticas governamentais buscando acompanhar os motivos do fracasso ou do sucesso de muitas das políticas lançadas no período.

Revalino Antonio de Freitas analisa a condição atual da juventude no Brasil, considerando aspectos relativos ao mundo do trabalho e proteção social.  A legislação brasileira conforma uma ideia de juventude por faixa etária e limitada a idade de 29 anos, com preocupação perene quanto a condição do jovem enquanto sujeito ativo na cadeia produtiva do país. Novas institucionalidades e novos arranjos sociais e vínculos de solidariedade vão surgindo em um terreno marcado ambiguamente por adversidades e solidariedade.

Dijaci David de Oliveira analisa uma série de dados sobre violência contra pessoas jovens no Brasil, mostrando que o aparato repressivo do estado tem incidido negativamente sobre as taxas de homicídio para esta população. Comparando os índices do Brasil, da Região Centro-Oeste e do Estado de Goiás, identifica percentuais alarmantes em relação a Goiás, especialmente em casos envolvendo ações marcadas por violência policial.

Eduardo Sugizaki analisa uma série de textos de autoria de Michel Foucault (livros, artigos, aulas, conferências) para debater aspectos sobre soberania e biopolítica, temas caros à política contemporânea e que dizem respeito ao modo como o Estado se relaciona com a sociedade, no geral, e com o indivíduo, em particular. Direito(s), liberdade(s), vida e morte, Foucault permanece como o grande mestre de um pensamento critico devotado ao entendimento do poder do Estado e de suas múltiplas possibilidades de transformação da política em mecanismo de opressão e ou libertação.

As pesquisas ora apresentadas revelam as tensões da vida cotidiana inerentes às relações sempre em construção entre, por um lado, o Estado compreendido em seus arranjos institucionais e forças,  ou interesses manifestos por meio das forças políticas, e, por outro lado, a sociedade em sua infinitude de interesses individuais e coletivos, não necessariamente congruentes ou complementares.



Referências

BEZERRA, Heloisa dias. OLIVEIRA, Sandra Maria (orgs.). Juventude no século XXI: dilemas e perspectivas. Goiânia, Canône Editoria, 2013.         [ Links ]


Professora da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Doutoranda em sociologia pela Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Universidade Federal de Goiás.

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