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Desidades

On-line version ISSN 2318-9282

Desidades vol.4  Rio de Janeiro  2014

 

EDITORIAL

 

 

À crescente visibilidade que a juventude parece ter no cenário público, mais claramente se impõe a constatação da diversidade da experiência de ser jovem através dos diferentes grupos sociais, culturais e econômicos.  Ser jovem não corresponde a compartilhar os mesmos tipos de experiência com todos aqueles que, coincidentemente, têm a mesma idade; e nem, muito menos, significa poder agir, sentir e valorar, da mesma forma, as relações com os pares, com os mais velhos, o sentido de futuro e os deveres de pessoa e cidadão.
Nesta edição da DESidades, as seções do Espaço Aberto e Temas em Destaque focalizam aspectos diversos da temática da juventude, apontando, principalmente,  para as descontinuidades que existem na experiência de ser jovem no contemporâneo.  A experiência de ser jovem indígena Chibuleo, no Equador, por exemplo, está marcada pelas tensões entre o mundo comunal indígena em que ele nasceu e vive, e a crescente “descomunalização”  de sua experiência, frente ao processo crescente de urbanização e o movimento de migração para as cidades.  Por outro lado, para os jovens urbanos das classes médias, seja no Brasil ou no Canadá, é a perspectiva de se inserir plenamente na sociedade por meio da obtenção de uma posição de trabalho na estrutura laboral que marca sua experiência de ser jovem.  Obter um trabalho que possibilite reconhecimento,  felicidade e auto-realização dá sentido e formata suas ações como jovem.  São experiências bem distintas – a dos jovens indígenas equatorianos, e a dos jovens brasileiros e canadenses de classes médias.  Elas são marcadas por valores e tensões diferentes que produzem sujeitos jovens cujos ideais, valores e maneiras de ser podem ser radicalmente díspares.
A experiência de ser jovem indígena no Equador nos é trazida por dois eminentes pesquisadores equatorianos, René Unda e Maria Fernanda Solórzano, no artigo “Jovens indígenas na Sierra Central do Equador.  Elementos para pensar suas práticas comunitárias”.  Estes pesquisadores nos alertam para o fato de que a noção de “juventude indígena” não existe como um conceito dado a priori, mas este só pode ser verificado a partir de estudos que retratem quem são estes jovens, o que fazem e como vivem no atual cenário político e social em transformação do Equador.  Estes estudos, afirmam os pesquisadores, ainda são escassos, mas de sua ampliação depende o processo de aprofundamento democrático no Equador.
No artigo “A importância do trabalho na transição para a vida adulta”, ainda na seção Temas em Destaque, a pesquisadora e professora Renata Alves Monteiro traz a questão do trabalho como aspecto que marca e modeliza a experiência de viver a juventude para os jovens pesquisados no Brasil e no Canadá.  A centralidade do trabalho, em um contexto em que os jovens são os mais atingidos pelo desemprego, nos faz indagar sobre o que é feito para minimizar os efeitos corrosivos do desemprego, ou da falta de emprego, para os jovens.  Para a autora, não se constituem saídas satisfatórias o retardamento do ingresso no mundo laboral – no caso, sobretudo, dos jovens de classes médias – ou, a simples qualificação profissional que não vise a inclusão real dos jovens em posições qualificadas de trabalho.
Na seção Espaço Aberto, a experiência dos jovens é apresentada sob o manto de uma tragédia: a do incêndio ocorrido em uma boate no Sul do Brasil que levou à morte cerca de 200 jovens em 2013.  Na entrevista em que a editora associada da DESidades, Sonia Borges,  faz ao psicanalista Volnei Antonio Dassoler, a vivência  deste evento traumático de enorme proporção permanece até hoje como enigma a ser compreendido e assimilado.  O processo de luto dos jovens que sobreviveram à tragédia continua a se processar, atravessado pela culpa, pelos transtornos psicológicos e físicos.  Neste cenário, o entrevistado aponta para a importância da disponibilização de uma escuta profissional destes jovens e de suas famílias.  Um trabalho difícil, tentativo e paciente construído pela tessitura dos laços que se fazem pela demanda de compreender o trágico inusitado, elaborar o sofrimento intenso e ser escutado por alguém.  O psicanalista Volnei Dassoler nota também que os espaços da cidade e as relações entre os jovens, mesmo os que não sofreram os efeitos diretos da tragédia, se modificam.  Os bares e as boates se esvaziam, enquanto as ruas, as praças e os calçadões se tornam os pontos de encontro dos jovens que buscam retomar seus vínculos e reconstruir suas expectativas de futuro.
Enfim, na seção de Informações Bibliográficas, apresentamos a resenha do livro “Jóvenes investigadores en infancia y juventud, desde una perspectiva crítica latinoamericana: aprendizajes y resultados”, organizado por Sara Victoria Alvarado e Jhoana Patiño, resenha feita por Danay Nedelcu; e, a outra, do livro de autoria de Rosana Barros, “Adoção e família – a preferência pela faixa etária, certezas e incertezas”, resenha feita por Angela D’Incao.  Nesta seção, ainda trazemos o Levantamento Bibliográfico das publicações em livros nos países latino-americanos no campo da infância e juventude nas áreas de ciências humanas e sociais durante o período de junho a setembro deste ano.

Lucia Rabello de Castro Editora Chefe

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