SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
 número24“¿Sabe Usted que está haciendo su hijo en este momento?”: Políticas de la última dictadura argentina hacia la Infancia y la juventudSíntomas del malestar en la universidad brasileña: ¿dónde estamos y para dónde vamos?: Mesa redonda del “Ciclo de Debates: Subjetividad, Descolonialidad y Universidad” índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Desidades

versión On-line ISSN 2318-9282

Desidades  no.24 Rio de Janeiro jul./set. 2019

 

TEMAS EM DESTAQUE

 

Análise da produção bibliográfica em livros sobre a infância e a juventude na América Latina: atualizações e novos horizontes

 

Analysis of the bibliographical production of books on childhood and youth in Latin America: updates and new horizons

 
Análisis de la producción bibliográfica sobre infancia y juventud en América Latina: actualizaciones y nuevos horizontes

 

 

Juliana Siqueira de LaraI, Luísa PrudêncioII, Paula Pimentel TumoloIII, Renata Tavares da Silva GuimarãesIV, Sabrina Dal Ongaro SavegnagoV, Sofia HengenVI, Lucia Rabello de CastroVII

Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil.

 

 


RESUMO

O presente artigo é uma atualização acerca de algumas tendências observadas nas publicações em formato de livros sobre a infância e juventude na América Latina, nas áreas das Ciências Humanas e Sociais, através da análise dos levantamentos bibliográficos do periódico DESidades, ao longo de 2015 a 2018. Seus resultados revelam um número expressivo de obras lançadas no continente latino-americano e apontam a área da Educação como a que mais concentra as publicações nesses campos. As temáticas educacionais do ensino/aprendizagem e propostas curriculares são aquelas que se destacam nas obras encontradas, que majoritariamente não mencionam as crianças e jovens como objeto de sua discussão e análise. Nesse sentido, o estudo interroga a invisibilidade dada à subjetividade daqueles que caracterizam os campos da infância e juventude. Observou-se, também, a pouca notoriedade dada a determinadas temáticas, tais como crianças indígenas e quilombolas, no campo de estudos da infância e juventude da América Latina.

Palavras-chave: produção bibliográfica, infância, juventude, América Latina.


ABSTRACT

The present article is an  analytical update on some of the tendencies observed in the publication of books on childhood and youth in Latin America, in the areas of Human and Social Sciences, through the examination of the bibliographical survey conducted by the journal DESidades from 2015 to 2018. The results reveal a significant number of works published in the latin-american continent and point to Education as the area which concentrates most of these publications. The educational themes of teaching and learning, and curricular proposals are the most featured in the publications, which mainly don’t mention children and young people as an object of discussion and analysis. As such, the study interrogates the invisibility of the subjectivity of those who characterize the fields of childhood and youth. Also, the lack of such themes as indigenous and quilombola children was noted in the field of child and youth studies in Latin America.

Keywords: bibliographical production, childhood, youth, Latin America.


RESUMEN

El presente artículo es una actualización acerca de algunas tendencias observadas en las publicaciones en formato libro sobre la infancia y la juventud en América Latina, en las áreas de las Ciencias Humanas y Sociales, a través del análisis de los levantamientos bibliográficos de la revista DESidades, a lo largo de un periodo que va desde el 2015 al 2018. Sus resultados revelan un número expresivo de obras lanzadas en el continente latinoamericano, destacándose el área de la Educación como la que concentra un mayor número de publicaciones en estos campos. Las temáticas educaciones sobre la enseñanza-aprendizaje y las propuestas curriculares son aquellas que se destacan entre las obras encontradas, que mayoritariamente no hacen referencia a niños y jóvenes como objeto de su discusión y análisis. En este sentido, el estudio cuestiona la invisibilidad dada a la subjetividad de aquellos sujetos característicos de los campos de la infancia y juventud. Se observó también la poca notoriedad dada a determinadas temáticas, tales como niños indígenas o quilombolas, en el campo de estudios de la infancia y la juventud en América Latina.

Palabras-clave: producción bibliográfica, infancia, juventud, América Latina.


 

 

Introdução

Ao longo da última década, os campos de estudos da infância e o da juventude contribuíram, especialmente, para que as crianças e jovens não sejam apenas “sujeitos em formação para o futuro” ou “cidadãos do amanhã”, posição que lhes foi destinada pelas instituições escolares, políticas públicas e pela sociedade civil desde a modernidade. Na história recente, principalmente no âmbito das Ciências Sociais e Humanas, muitos dos esforços teóricos e metodológicos que se voltam à infância e juventude procuram trazer à luz que crianças e jovens são atores com papel significativo na construção das sociedades onde vivem e do mundo. Sob essa orientação, observa-se o aumento de pesquisas científicas de cientistas sociais na América Latina dedicadas à compreensão das realidades vividas por esses sujeitos, bem como um movimento de busca de ressignificação de seu papel e posição no mundo contemporâneo.

Tal movimento de produção propiciou o surgimento de diversos periódicos científicos latino-americanos que se dedicam aos estudos da infância e juventude. Cita-se com relevância os periódicos Última Década e Revista Infancia, Educación y Aprendizaje, do Chile; Revista Latinoamericana de Ciencias Sociales, Niñez y Juventud e Infancias Imágenes, da Colômbia; Childhood & Philosophy, do Brasil; e a Revista Argentina de Estudios de Juventud, da Argentina. Desde 2013, o Periódico DESidades também tem por objetivo difundir publicações sobre infância e juventude no âmbito das Ciências Sociais e Humanas e se propõe, trimestralmente, a lançar artigos, entrevistas, resenhas e um levantamento de livros publicados sobre a infância e juventude latino-americanas.

No momento, destaca-se a relevância das publicações em formato de livros por sua extensão, construção, investimento e difusão de uma reflexão a longo prazo, fundamental para o desenvolvimento das Ciências Sociais e Humanas (Franchetti, 2018). Levando em consideração tal importância, o periódico DESidades publica, desde o seu lançamento, em 2013, uma lista trimestral que contempla o levantamento de obras latino-americanas das Ciências Sociais e Humanas relativas à infância e juventude publicadas no trimestre anterior. Essa realização proporciona visibilidade a temas, discussões e pesquisas que possuem circulação menos acessível, tal como a de periódicos científicos.

Segundo Menandro et al (2011), na área da Psicologia, assim como em outras áreas das Ciências Humanas, são vários os pesquisadores que ainda escoam parte importante da sua produção na forma de livros. Embora em decréscimo nos últimos anos, a importância dessa modalidade de produção acadêmica é indiscutível. Os autores trazem alguns argumentos que reforçam a visão de que livros e periódicos são igualmente importantes na veiculação de produções científicas, apesar do destaque cada vez maior que tem se dado aos periódicos. Coloca-se a questão dos limites impostos ao tamanho dos artigos, que podem forçar simplificações dos relatos de pesquisas que, quando produzidas a partir de colaboração interinstitucional, podem resultar muito mais completas e significativas quando reunidas em livro, em comparação com a publicação de diversos artigos distribuídos em diferentes periódicos.

Em 2015, Castro, Vieira, Lara, Bello e Savegnago analisaram os levantamentos bibliográficos realizados pelo Periódico DESidades no período de 2013 a 2015, da 1ª à 7ª edição. O balanço permitiu construir um olhar analítico e crítico sobre a caracterização e as tendências dessa produção, que se mostrou incipiente no contexto da América Latina. Os resultados encontrados apontaram para a pouca atratividade do mercado editorial em relação à publicação de obras científicas sobre a infância e/ou juventude, sendo o Brasil, Argentina, México e Chile os países que tiveram os maiores percentuais de obras publicadas sobre esses campos. Além disso, constatou-se que a infância e a juventude aparecem como campos eminentemente transdisciplinares, uma vez que as obras, em sua maioria, pertenciam a duas ou mais áreas das Ciências Humanas e Sociais. Naquela ocasião, a área da Educação, de forma isolada, apontou significativa prevalência na publicação de livros sobre infância e juventude. No entanto, destacou-se que os livros levantados nessa área não mencionam em seus resumos os termos “infância” e “juventude”, o que resulta na invisibilização dos sujeitos crianças, adolescentes e jovens frente à discussão dos aspectos do ensino-aprendizagem (Castro et al, 2015).

Assim como o estudo de Castro et al. (2015), outros estudos vêm empreendendo análises do estado da arte da produção do conhecimento nos campos da infância e juventude. Podemos citar o estudo de Stengel e Dayrell (2017), que analisa e sistematiza o uso das categorias “adolescência” e “juventude” na produção de teses e dissertações em Psicologia, entre os anos de 2006 e 2011, e as temáticas recorrentes. Os autores identificaram que aproximadamente 10% do total das produções trabalharam com a temática da adolescência/juventude, número que consideram significativo. Apontam também o expressivo número de categorias temáticas e, dentre essas, a grande pluralidade de subtemas presentes.

Hayashi, Hayashi e Martinez (2008), por sua vez, empreenderam um levantamento da produção científica sobre os jovens e a juventude no Brasil, a partir de dissertações e teses defendidas em programas de pós-graduação nacionais, no período de 1989 a 2006. Os autores verificaram uma expressiva produção de conhecimento nesse campo, no âmbito dos programas de pós-graduação brasileiros, majoritariamente ligada às áreas da Educação e das Ciências Sociais – incluindo Sociologia, Antropologia e Ciência Política –, e uma presença tímida de estudos vinculados à Psicologia e ao Serviço Social.

Destacamos também a pesquisa de Voltarelli (2017), que realizou um mapeamento dos estudos da infância na América do Sul a partir da perspectiva da Sociologia da Infância, considerando o período de 2010 a 2013, e as produções de autores sul-americanos hispanofalantes. A autora aponta a influência que as produções europeia e norte-americana tiveram na realização de estudos científicos nos países investigados, mas destaca que os movimentos próprios do campo podem estruturar outros caminhos para as produções e teorizações da infância no hemisfério sul, de modo que se possa aprender a partir do Sul e com o Sul.

O presente artigo trata de uma atualização do estudo anterior (Castro et al, 2015) após três anos de sua publicação. A atualização desse balanço se mostra importante, tendo em vista que mudanças sociais, culturais e políticas atravessam constantemente as preocupações e questões a serem investigadas nos campos da Infância e da Juventude. Os contornos de uma perspectiva analítica e metodológica nunca se encerram no meio científico e, portanto, a garantia de um saber sobre crianças e jovens também não. Dessa forma, o balanço atual, que se dedica ao trabalho realizado pelo próprio periódico ao longo de 2015 a 2018, é uma contribuição que aponta e avalia o que, como e quem tem publicado em livros nos campos da infância, adolescência e juventude na América Latina.

 

Metodologia

A análise do balanço empreendido neste artigo se voltou para os dados dos levantamentos bibliográficos1 publicados na revista DESidades no período de setembro de 2015 a março de 2018, da 8ª à 18ª edição do Periódico. O recorte foi estabelecido de modo a dar continuidade à análise da produção bibliográfica em livros sobre a infância e a juventude na América Latina realizada em artigo anterior (Castro et al, 2015). A periodicidade dos levantamentos utilizados nesta análise foi trimestral, seguindo a publicação de cada edição da revista, que conta com quatro edições ao longo de um ano, e com uma equipe de assistentes2 que trabalhou para a realização das buscas.

O trabalho empreendido por essa equipe se debruçou ao longo dessas onze edições em uma listagem de editoras de língua portuguesa e espanhola da América Latina e seus respectivos sites eletrônicos. A composição da lista de editoras se deu a partir de buscas virtuais em associações de editoras e presenciais, em livrarias brasileiras.

Na 8ª edição do levantamento bibliográfico, contou-se com uma listagem de 99 editoras brasileiras e 254 editoras de outros países latino-americanos, distribuídas da seguinte forma: Argentina (92 editoras); Bolívia (2 editoras); Chile (23 editoras); Colômbia (6 editoras); Costa Rica (3 editoras); Cuba (10 editoras); Guatemala (4 editoras); México (44 editoras); Nicarágua (1 editora); Paraguai (20 editoras); Peru (30 editoras); Uruguai (10 editoras) e Venezuela (2 editoras).

Já na 18ª edição, a listagem contemplou 131 editoras brasileiras e 180 editoras de outros países da América Latina: Argentina (40 editoras); Bolívia (2 editoras); Chile (18 editoras); Colômbia (14 editoras); Costa Rica (8 editoras); Cuba (8 editoras); Guatemala (4 editoras); México (48 editoras); Nicarágua (1 editora); Paraguai (13 editoras); Peru (17 editoras) e Uruguai (7 editoras).

Nota-se que o número total de editoras incluídas na tabela de trabalho da equipe variou ao longo das 11 edições. As editoras de língua espanhola, especialmente as da Argentina, tiveram seu número reduzido e as brasileiras, aumentado. No que tange às de língua espanhola, essa redução ocorreu, pois a equipe observou que muitas das buscas em diversos sites eletrônicos estavam sendo improdutivas, isto é, não ofereciam nenhuma obra que pudesse ser incluída no levantamento bibliográfico. Dessa forma, foram retiradas da listagem as editoras que não tinham nenhum lançamento de publicação sobre infância e/ou juventude há mais de dois anos, as que possuíam sites desativados e as que não tinham publicado até o momento nenhuma obra que envolvesse temáticas relativas à infância e a juventude na área das Ciências Humanas e Sociais.

Concomitantemente ao filtro realizado, que gerou a redução de editoras de língua espanhola, a equipe, ao longo das edições, também se dedicou a encontrar novas editoras que pudessem fazer parte da listagem de trabalho. Por ter um acesso mais direto às associações de editoras, eventos literários e livrarias provenientes do Brasil, acredita-se que foi mais fácil para a equipe incluir editoras brasileiras na listagem final do que editoras de outros países latino-americanos. Tal diferenciação revela a dificuldade com que a equipe se deparou nas buscas por editoras que não fossem brasileiras e que fossem compatíveis com os critérios estabelecidos pela equipe da DESidades. A comparação do número de obras encontradas por país nos sites das editoras se revelou discrepante, sendo o Brasil o país que obteve o maior número das produções levantadas, 53,4% do total.

Assim como na análise empreendida até a 7ª edição da revista (Castro et al, 2015), as 11 edições que se sucederam também foram atravessadas por dificuldades referentes às informações sobre as obras anunciadas nos sites das editoras. Destaca-se, por exemplo, que muitos sites não disponibilizam todas as informações sobre a publicação, tendo a equipe que recorrer a buscas paralelas em outros sites ou no currículo dos autores para descobri-las. O mês de lançamento da obra continuou a ser a informação mais difícil de ser encontrada, pois a maioria dos sites informa somente o ano de lançamento. O contato com os sites eletrônicos das editoras evidenciou que tais endereços eletrônicos são pouco funcionais, pois a maioria não é muito clara ou didática para quem o está consultando.

Para esse balanço, as autoras do presente artigo classificaram as obras levantadas nas 11 edições em uma tabela com as seguintes informações: título da obra; autores; instituição dos autores; editora; país da editora; cidade da editora; tipo de editora (comercial, universitária ou institucional); tipo de publicação (coletânea ou não-coletânea); área de conhecimento da obra; campo da obra (infância, adolescência, juventude, suas respectivas combinações, além de obras com campo não-declarado); temática e subtemática da obra. A partir dessa sistematização, apresentamos as análises, resultados e discussões que se seguem abaixo.

 

Resultados e discussão

A partir da consolidação dessa tabela, buscou-se compreender algumas ocorrências advindas da classificação e observação do material coletado. Das diversas e possíveis óticas analíticas, optou-se, primeiramente, por destacar e refletir sobre o número total de obras levantadas por edição da revista DESidades, sobre o número de publicações por editoras latino-americanas de língua portuguesa e de língua espanhola, bem como por tipo de editora, se institucional, universitária ou comercial. Seguimos a análise com a incidência de coletâneas dentre as obras levantadas. Assim, buscamos traçar um panorama geral do Levantamento Bibliográfico realizado pela revista nas onze edições a que esse artigo se refere.

Posteriormente, aprofundamos nossa análise a partir da caracterização dessas obras levantadas conforme seus campos, áreas, temáticas e subtemáticas. Em relação às temáticas em que foram divididas as obras, duas concentraram a maioria dos títulos – Educação e Infâncias e/ou Juventude e Cultura. Portanto, optamos por destacá-las e analisá-las a partir de uma avaliação de suas subtemáticas. A última parte de nossa análise se refere à filiação institucional dos autores das obras levantadas.

A discussão de resultados será trabalhada a partir da análise de gráficos, visando à compreensão sobre quais campos, áreas, temáticas e interfaces têm se destacado na produção bibliográfica latino-americana sobre infância e juventude nas áreas humanas e sociais.

 

Figura 1: Número de obras publicadas por edição

 

Nesta figura, é possível verificar o número total de obras levantadas por edição e fazer, a partir daí, alguns questionamentos. Desde a oitava edição, o número varia de forma irregular, com um pico significativo da 8ª para a 9ª edição. A partir daí, há uma diminuição gradativa até a 15a edição, e um aumento isolado na 16ª. Porém, no total de 294 obras em um intervalo de quase 3 anos, pode-se perceber um decréscimo no número de obras levantadas. Esse fato poderia indicar uma baixa na produção editorial devido a um menor interesse pelos temas da infância e da juventude? É difícil fazer essa correlação direta, pois outras variáveis podem estar implicadas, como o contexto econômico e político dos últimos 3 anos, por exemplo. Ainda assim, essa pergunta já indica uma inquietação sobre a ausência relativa desses campos de saber na produção bibliográfica dos países latino-americanos.

 

Figura 2: Número de publicações por editora

 

É interessante perceber que a figura 2 mostra uma concentração significativa de publicações em uma editora. Essa editora publicou 54 no total de 294 obras, enquanto as demais apresentam um baixo volume no total de publicações: 112 editoras tiveram até 4 obras publicadas; 1 editora com 10; outra com 13 publicações e 8 editoras tiveram entre 5 e 9 publicações. Esse ponto é relevante para pensarmos o interesse e o investimento na produção bibliográfica sobre a infância e a juventude.

As editoras com maior índice de publicação são a CRV, 54 obras, e a Noveduc, 13 obras, ambas comerciais e localizadas respectivamente no Paraná, Brasil e em Buenos Aires, Argentina. Fundada em 2007, a CRV é uma editora comercial voltada à produção científica, principalmente do Brasil. Em seu site eletrônico, contabilizam-se diversas instituições públicas de ensino às quais a empresa presta serviço3.

Já a editora argentina, Noveduc, conforme informa o seu site, tem como foco a produção científica referente à educação e outras áreas que se entrelaçam, como saúde e psicologia. O público alvo da empresa, assim como o da editora anterior, extrapola o mundo acadêmico e destina-se a professores do ensino escolar, como também a trabalhadores sociais4.

Ao analisarmos os temas dos livros sobre infância e juventude publicados pela editora CRV e levantados no período em questão, as temáticas em educação se destacaram, representando 81,5% das obras. Em relação à editora Noveduc, 69,2% dos títulos sobre infância e juventude referem-se a temáticas em educação.

Em relação às editoras universitárias, destacam-se a EdUFSCAR e a EDUFBA, ambas pertencentes a Universidades Federais brasileiras, apresentando um total de seis e cinco publicações, respectivamente. A primeira localiza-se em São Carlos, São Paulo, e foi fundada em 1993. Ela publicou mais de 350 livros e materiais didáticos de diversas áreas e temáticas, ganhou 6 prêmios Jabutis5 e obteve reconhecimentos importantes da Câmara Brasileira do Livro (CBL), bem como de outras associações literárias6. Lançada no mesmo ano, a EDUFBA já publicou mais de 800 títulos em múltiplas áreas do conhecimento, com distribuição interna e externa à instituição de ensino a qual faz parte7.

Segundo Franchetti (2018), o questionamento sobre “por que devem existir editoras universitárias?”, e mais especificamente, “por que devem existir editoras universitárias vinculadas a universidades públicas?”, é apresentado por gestores públicos e pela rede comercial de produção, divulgação e venda de livros. A resposta a essas questões tem urgência, sobretudo no âmbito das universidades públicas, principalmente no momento atual, quando as verbas de custeio e investimento tornam-se mais escassas. O autor enfatiza a importância das editoras universitárias, baseando-se na finalidade acadêmica destas, em contraponto ao retorno financeiro que é esperado pelas editoras comerciais. Ao passo que as primeiras baseiam-se na expansão e no fortalecimento de campos de saber, apostando, muitas vezes, em perspectivas ainda em formação, assim como no impacto e na relevância científica da produção a ser propagada, as segundas priorizam o retorno financeiro do investimento.

Por isso, ressaltamos a atuação da EDUFBA e da EdUFSCAR como editoras universitárias que se destacaram pelo volume de publicação e, ao mesmo tempo, chamamos atenção para a diferença significativa entre o número de publicações destas e das editoras comerciais, no intento de levantar a questão do investimento público injetado na publicação de livros:

 

Figura 3: Número de publicações segundo o tipo de editora

 

Em relação ao número de títulos publicados por tipo de editora, a maioria das obras, 69,4%, sobre infância e juventude levantadas no período analisado foi publicada por editoras comerciais, 25,5% por editoras universitárias e 5,1% por editoras institucionais. Classificamos como editoras institucionais aquelas ligadas a instituições não-universitárias, como conselhos, organizações não-governamentais e fundações. Dentre as editoras institucionais, destacou-se a editora internacional CLACSO – Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais, com 9 publicações (60% das obras publicadas por editoras institucionais), sendo 6 dessas 9 obras lançadas pela CLACSO Argentina, 2 pela CLACSO Colômbia e 1 pela CLACSO Equador. Outra editora institucional que apareceu com frequência em nossas buscas foi a UNESCO, com livros que se dedicavam a discutir e informar, principalmente, sobre temáticas relacionadas à infância, juventude e direitos humanos.

Nota-se, a partir das figuras 2 e 3, um número menor de publicação de obras nos campos da infância e juventude de editoras universitárias em comparação com as comerciais. No entanto, é importante lembrar que a editora com maior volume de publicações dentre os levantamentos, a CRV, é comercial, e sua inclusão infla consideravelmente a categoria nesta análise. Mesmo com 14 anos a menos de existência que a EdUFSCAR e que a EDUFBA, a CRV hoje apresenta um volume de publicação 9 vezes maior que essas. Cabe aqui problematizar o fato de que autores acadêmicos dedicados aos campos da infância e juventude publicam com maior frequência em editoras comerciais, em detrimento de universitárias; e, ainda, o papel que caberia às editoras universitárias para a construção e disseminação de conhecimento científico desses campos.

Podemos especular que seja mais fácil, mesmo para autores vinculados às Universidades, publicar suas obras a partir de editoras comerciais. É possível que haja, em muitas universidades, um investimento menor do que o necessário para o escoamento das produções acadêmicas. Também é importante notar que editoras comerciais possuem plataformas de acesso e divulgação ao público mais amplas e acessíveis do que as editoras universitárias.

Na figura 4, interessou-nos verificar a distribuição de obras levantadas de acordo com a caracterização coletânea/não-coletânea. Consideramos como coletânea a compilação de diferentes textos e autores em uma única obra:

 

Figura 4: Distribuição da frequência de títulos publicados segundo o tipo de publicação

 

Destaca-se que, das 294 publicações computadas nos levantamentos bibliográficos, 56,5% não são coletâneas. Ainda que a maioria das obras levantadas seja de livros escritos integralmente por um ou mais autores, a quantidade de coletâneas é bastante elevada. Como discutido em Castro et al (2015), o formato de livro inteiro permite que os autores possam explorar seus temas de forma mais extensa, em relação aos artigos publicados em revistas periódicas. Por sua vez, a forma de coletânea, que aglutina vários autores em torno de uma mesma temática, nem sempre alcança uma organicidade do conjunto, ainda que tenha a vantagem de reunir várias perspectivas autorais diferentes.

A figura 5 mostra a distribuição das publicações de acordo com os campos Juventude, Infância e Adolescência e suas respectivas combinações. Tais campos foram determinados de acordo com as informações dadas nos títulos, resumos e sumários das publicações. As obras sem campo declarado se referem àquelas que não mencionavam os termos “crianças”, “adolescentes” e “jovens” em seus títulos, resumos ou sumários.

 

Figura 5: Distribuição da frequência de títulos publicados segundo o campo

 

A maior parte das obras foi categorizada como não tendo mencionado, em seus títulos e resumos, a infância, adolescência ou juventude como objeto direto da publicação – 42,2% do número total de publicações levantadas. Com isso, queremos dizer que tais resumos não se referem explicitamente às crianças, adolescentes e jovens como objeto de seu interesse e análise, sem mencionar, portanto, essas palavras como descritoras da obra publicada. Entretanto, essas obras foram incluídas nos levantamentos realizados pela revista a partir de determinadas palavras-chave e temáticas apresentadas em seus resumos que tangenciam a vida das crianças, adolescentes e jovens, tais como “educação”, “escola”, “sala de aula”, “estudantes”, “brincadeira”. A decisão de incluir tais obras se deu pela relevância dessas discussões para o campo da infância, adolescência e juventude. Nesse sentido, chama a atenção que o maior número percentual de obras levantadas se enquadra justamente nessa configuração: a de obras cuja abordagem incide sobre a vida de crianças, adolescentes e jovens, sem considerar a importância de mencionar esses sujeitos explicitamente.

Já os resumos das obras que mencionam explicitamente tais sujeitos se distribuíram da seguinte forma: o campo Juventude contou com 19,7% do total de obras; o campo Infância aparece logo em seguida, com 19% desse total; e o campo Adolescência, com 5,1% do total.Muitas obras declararam em seu resumo que tratavam de mais de um campo e geraram as combinações a seguir: Infância, Adolescência e Juventude apareceu declarada em 3,4% das obras; Infância e Juventude, em 4,1%; e Infância e Adolescência, em 4,8%. Destaca-se que a soma dos campos combinados, 14% do total, é uma porcentagem alta e próxima à porcentagem dos campos isolados vistos anteriormente. Essa aproximação revela que infância, adolescência e juventude não aparecem apenas como campos singulares, mas também se apresentam reunidos em um campo mais abrangente.

A figura 6 traz a distribuição das publicações por área de conhecimento. A categorização foi realizada por áreas isoladas e combinadas. Assim, a área de conhecimento da obra foi classificada, primeiramente, a partir da informação da própria editora. Na maioria dos casos, entretanto, essa informação não era declarada, cabendo às autoras do presente artigo a realização da classificação, segundo o conteúdo do resumo da obra e seu sumário e/ou área de formação e atuação do(s) autor(es).

A classificação realizada seguiu a Tabela de áreas do Conhecimento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico do CNPq/Brasil8. Entretanto, pareceu-nos relevante o acréscimo da área nomeada como Psicanálise como área específica e não subposta à Psicologia. Além disso, incorporamos à categoria Ciências Sociais as obras que se referiam às áreas de Sociologia, Antropologia ou Ciência Política. As áreas combinadas foram divididas em Interdisciplinar, Educação e outras, Psicologia e outras, Educação e Psicologia e Outras combinações. As áreas da Educação e da Psicologia apareceram combinadas com diversas outras áreas do conhecimento. Escolhemos agrupá-las em categorias distintas por conta da pouca representatividade quantitativa de cada uma dessas combinações. Já a combinação entre as áreas da Psicologia e da Educação foi isolada em uma categoria por conta de seu número elevado de publicações. A categoria Outras combinações se refere a combinações entre duas áreas de conhecimento além dessas já citadas. Por fim, a categoria Interdisciplinar se refere a três ou mais áreas de conhecimento.

 

Figura 6: Número absoluto de publicações segundo a área

 

A Educação desponta como a categoria com maior percentual de obras, 36,1%. Essa tendência é corroborada com o que se encontrou na análise realizada por Castro et al., em 2015. A seguir, a área de Ciências Sociais contempla 13,3% das obras levantadas. Já a categoria Interdisciplinar e a categoria Educação e outras áreas incluem 11,9% e 9,2% das obras, respectivamente. Observa-se que há um número significativo de publicações, representando 33,7% das obras que foram categorizadas enquanto pertencentes a duas áreas ou mais de conhecimento, nas categorias: Interdisciplinar; Educação e outras áreas; Outras combinações; Educação e Psicologia e Psicologia e outras áreas. Portanto, verificamos que há um número significativo de obras que não se limitam a uma área de conhecimento isolada.

Nas figuras 7, 8, 9 e 10, interessou-nos saber qual é a distribuição percentual de publicação por Área em relação aos campos da Juventude, Adolescência, Infância e Não-declarado, respectivamente:

 

Figura 7: Distribuição de frequência de publicações no campo da Juventude segundo a área disciplinar

 

Figura 8: Distribuição de frequência de publicações no campo da Adolescência segundo a área disciplinar

 

Figura 9: Distribuição de frequência de publicações no campo da Infância segundo a área disciplinar

 

Figura 10: Distribuição de frequência de publicações com campo não declarado segundo a área disciplinar

 

A Figura 7 nos mostra que a área das Ciências Sociais é a que mais publica livros no campo da Juventude, representando 41,4% do total. A segunda área que mais publica nesse campo é a Educação, com 17,2%. O primeiro dado, que aponta a ênfase nas Ciências Sociais como área que se dedica a publicar obras sobre a juventude, relaciona-se com o que Castro (2019) afirma sobre a Sociologia ter sido a ciência que, durante a modernidade, se encarregou do estudo da estruturação das sociedades sob a égide da dinâmica geracional. O estudo das sociedades ao longo do século XX propõe a juventude como categoria social analítica no âmbito da transformação e do progresso social, aspecto amplamente tematizado por sociólogos e cientistas sociais na época moderna. Observa-se que as teorias sobre a sociedade e sua dinâmica constitutiva a partir da analítica geracional têm definido os interesses da pesquisa sociológica no debate sobre a juventude, levando-nos a questionar, acompanhando a autora, sobre como os jovens, para além do enquadre da juventude enquanto categoria social estrutural, se produzem subjetivamente nas circunstâncias em que vivem (Idem).

No que se refere ao campo da Adolescência (Figura 8), a área da Psicanálise, isoladamente, é a que mais publica livros, com 26,7% do total, seguida da Psicologia, com 13,3% do total. Destaca-se também que a área Interdisciplinar publica 26,7% do total, a mesma porcentagem que a Psicanálise. Diferentemente do que vimos no campo da Juventude, a área das Ciências Sociais não é predominante no âmbito da Adolescência. Pelo contrário, as obras acerca da adolescência caracterizadas como sociológicas só aparecem quando combinadas a outras áreas, e não isoladamente. Tal diferença diz respeito a como, historicamente, as disciplinas teóricas foram disputando espaço e construindo seus objetos de estudo. No caso da Adolescência, de acordo com Castro (2017), os interesses de pesquisa da Psicologia e Psicanálise tomaram esta categoria como “conceito que definia uma função psicológica no processo constitutivo da subjetividade moderna em que o se tornar adulto colocava (e ainda coloca) um leque de novas demandas para o sujeito” (Idem, p.10). A Psicologia e a Psicanálise se debruçaram sobre a condição do ser adolescente no âmbito das sociedades modernas e verifica-se que tais áreas mantiveram esse predomínio até os dias atuais. Ainda que algumas teorias psicológicas tenham atribuído um caráter físico e universal à adolescência, especialmente em associação à puberdade, destaca-se, nas obras levantadas, o caráter processual e histórico da categoria Adolescência.

O cruzamento referente à Infância (Figura 9) revela que a Educação é a área que mais publica livros nesse campo, com 26,8% do total. Em segundo lugar, a Psicologia, com 19,6%, e em terceiro, a área Interdisciplinar, com 14,3% do total. Destaca-se também que a combinação entre as áreas Psicologia e Educação possui um número significativo de publicação, apresentando 7,1% do total. A Educação aparece como a área que mais publica na Infância, o que se relaciona à forma com que a infância se institucionalizou na modernidade (Sarmento, 2004).A partir da criação da escola pública e sua expansão, como instâncias de socialização das crianças na modernidade, a disciplina Educação, enquanto prática pedagógica, ocupou-se das exigências e deveres levantados pelo Estado a fim de separar, proteger e preparar as crianças para o futuro produtivo, quando se tornassem adultas (Idem). De forma concomitante, os saberes psicológicos e médicos fizeram das crianças objeto de conhecimento e de práticas que tinham em vista o seu desenvolvimento convencionado como “normal”. Chama a atenção que tais disciplinas, a Educação e a Psicologia, ainda sejam aquelas que estão à frente, até hoje, das publicações acerca da Infância.

No que se refere ao Campo Não-declarado (Figura 10), a Educação é a área que, majoritariamente, não menciona quais são os sujeitos – crianças, adolescentes e/ou jovens – de que a obra trata. Essa área representa, isoladamente, 61,3% das 124 obras do campo Não-declarado, um número muito elevado em relação à quantidade total de obras pesquisadas. A Educação, quando combinada com outra área, vem em segundo lugar, com 17,7% do total, e a categoria Interdisciplinar surge em terceiro, com 8,9% do total. A área da Educação se caracteriza por englobar os processos de ensino e aprendizagem, e o que se verifica é que a tarefa educativa em si se sobrepõe como temática, parecendo desnecessária a menção aos sujeitos educandos. No âmbito do ensino e aprendizagem, o que se destaca é o currículo, a didática e o sistema de interações comportamentais. Dessa forma, esses dados parecem indicar que as pessoas envolvidas no processo educativo, as crianças e os jovens, ao se tornarem sequer mencionados, são invisibilizados como destinatários e co-participantes dos processos educacionais.

 

Figura 11: Distribuição da frequência de títulos publicados segundo a temática

 

A figura 11 aborda a frequência de determinadas temáticas nas publicações. Tais temáticas, trazidas no gráfico acima, foram compiladas a partir da análise dos resumos e dos sumários das publicações. Nota-se que a frequência das Temáticas em Educação (56,1%) é superior à soma de todas as outras temáticas (43,9%). A análise das subtemáticas que compõem essa categoria evidenciou a predominância de obras destinadas ao Ensino e aprendizagem, isto quer dizer publicações que versam sobre métodos pedagógicos, didática, dificuldades de aprendizagem, práticas pedagógicas, relações entre psicologia do desenvolvimento e a aprendizagem e as práticas docentes. Outra subtemática expressiva é aquela que se enquadrava em Educação, cidadania e direitos humanos, reunindo obras que abordam a educação a partir de uma perspectiva cultural, sociológica e antropológica, adotando uma visão ampla da educação como um processo construído e atravessado por vários discursos. Chama a atenção, dentre as subtemáticas encontradas, a pouca frequência de publicações destinadas à educação indígena ou de culturas tradicionais. No total de obras levantadas, nenhum resumo faz referência à experiência de educação quilombola, por exemplo.

Outra temática que se destaca em número de publicação é Infância e/ou juventude e cultura. Esta abarca obras que tratam da relação da infância e/ou juventude com diferentes elementos da cultura, como artes, costumes, história, conhecimentos e relações interpessoais. Dentro dessa temática, a subtemática que apresenta o maior número de obras recebe o nome de Território latino-americano. As publicações dessa categoria incluem questões que tratam da infância e juventude em interlocução com suas questões territoriais, assinalando especificidades regionais ou particularidades dos países que compõem esse continente, além de como essas especificidades impactam na subjetividade da criança e dos jovens.

 

Figura 12: Distribuição do número de autores das obras levantadas segundo a filiação institucional

 

A figura 12 versa sobre a distribuição do número de autores, de acordo com sua vinculação institucional. Um primeiro levantamento revelou o total de 502 autores responsáveis por 294 obras levantadas no período de análise deste artigo. No entanto, na tabela acima, foram registradas apenas as instituições universitárias e não universitárias de pesquisa científica que obtiveram mais de 5 autores dentre as obras levantadas. Esse recorte se deu a fim de otimizar a leitura da tabela e registrar apenas aquelas instituições que mais se destacaram na publicação de obras no campo da infância e juventude.

A busca realizada através do currículo de cada um desses autores apurou 179 instituições de pesquisa às quais os autores estavam vinculados, sendo 151 universitárias e 28 não universitárias. Das instituições que concentram um maior número de autores, destacam-se a Universidad de Buenos Aires (35), a Universidad Nacional Autónoma de México (14), a Universidade Federal do Ceará (13) e a Universidad de Chile (13). A Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura – UNESCO – é única instituição não universitária de pesquisa com mais de 5 autores vinculados e consta na tabela representada na figura 12.

Também cabe apontar que, dentre as instituições brasileiras apresentadas na figura, aquela que mais se destacou foi a Universidade Federal do Ceará, localizada na região Nordeste do País. Em seguida, 8 instituições são do Sudeste do Brasil, sendo 2 privadas e 6 públicas. Tais representações se coadunam com a distribuição do número de faculdades pelas regiões do Brasil9,  já que o Sudeste abarca as maiores concentrações de instituições superiores de educação e de produção científica. Um recente relatório elaborado por Clarivate Analytics a pedido da CAPES10 aponta que o Brasil, no período de 2011-2016, contabilizou que mais de 95% das publicações referem-se às universidades públicas, federais e estaduais. Esse relatório lista as 20 universidades que mais publicam (5 estaduais e 15 federais), das quais 5 estão na região Sul, 11 na região Sudeste, 2 na região Nordeste e 2 na Centro-Oeste.

A partir desses dados, podemos nos questionar se a baixa frequência de autores que publicam por universidade no Brasil deve-se ao pouco interesse da temática em nosso país ou, se relacionarmos a figura 2 com esta, também podemos nos perguntar se a baixa na produção brasileira tem a ver com o pouco investimento público nas áreas acadêmicas que se destinam aos estudos da infância e da juventude, geralmente representadas pelas áreas das Ciências Sociais, Humanas, e da Educação.

 

Considerações Finais

A partir da atualização do balanço da produção bibliográfica em livros sobre infância e juventude na América Latina, destacamos alguns pontos relevantes que atravessam o estudo desses campos e suas implicações teóricas, culturais e políticas. Os resultados encontrados no estudo atual corroboram aqueles verificados no estudo anterior (Castro et al, 2015). As dificuldades de acesso às publicações através dos sites das editoras latino-americanas permanecem e, ainda assim, foi possível levantar um número expressivo de obras (294) produzidas nesse território durante as 11 edições pesquisadas. Por serem publicadas em português e espanhol, muitas dessas obras não possuem o alcance de divulgação e leitura em comparação a obras oriundas do Norte do globo, escritas em inglês e que apresentam uma maior difusão em função também da língua. Nesse sentido, parece importante que os pesquisadores de outras partes do globo também se esforcem para conhecer a produção de conhecimento na infância e juventude latino-americana, dado seu volume, extensão e relevância.

No que se refere aos resultados, em relação à distribuição de publicação por editoras, obteve-se que há uma concentração significativa de obras publicadas em apenas uma editora comercial brasileira, que tem como área preponderante a Educação. Em comparação com as editoras universitárias, as comerciais são aquelas que mais publicam livros sobre infância, adolescência e juventude, tanto no Brasil como em outros países latino-americanos. Brasil, Argentina, México e Chile continuam sendo os países que mais publicaram obras levantadas pelo periódico DESidades.

A análise regional das publicações revelou que a região Sul do Brasil é aquela em que se localizam as editoras que mais publicam livros sobre infância e juventude, no âmbito das Ciências Sociais e Humanas. Mesmo levando em consideração as dificuldades encontradas pela equipe dos levantamentos bibliográficos em melhor representar as produções de países latino-americanos hispanofalantes, verificou-se que as instituições que concentram o maior número de autores dedicados à infância, adolescência e juventude estão na Argentina (Universidad de Buenos Aires) e no México (Universidad Nacional Autónoma de México), só em seguida aparecendo o Brasil (Universidade Federal do Ceará).

Acreditamos que esses dados revelam certos descompassos na produção e distribuição de conhecimento acerca dos campos da infância e juventude na América Latina. O primeiro é o fato de o local de produção de conhecimento sobre a infância e juventude advir majoritariamente de instituições de ensino universitário e as publicações ocorrerem em editoras comerciais, e não universitárias. O segundo é a distância geográfica entre as instituições de ensino às quais os autores são vinculados e as cidades onde se localizam as editoras. Conclui-se, assim, que as editoras comerciais estejam investindo mais na área da infância, adolescência e juventude do que as próprias editoras universitárias, que teriam muito mais proximidade geográfica com os pesquisadores e autores que se dedicam a esse assunto.

Além de todo o exposto, a Educação apareceu como a área majoritária de publicações em livros sobre infância, adolescência e juventude. Essa informação sinaliza que as instituições de ensino, especialmente a escola, continuam a ser consideradas os espaços que são alvos de maior interesse na discussão sobre crianças e jovens. Como verificado, a maior parte das obras listadas nesta análise foi categorizada como não tendo mencionado a infância, adolescência ou juventude como objeto da publicação em seus resumos. Essa constatação abre margem para questionarmos, de forma similar à Castro (2019): afinal, falar sobre temáticas afins à infância, adolescência e juventude significaria “também” incluir as crianças, os adolescentes e jovens nessas discussões? As crianças e os jovens estariam implícitos nessas temáticas ou seria necessário explicitar quem são os sujeitos para que eles sejam reconhecidos em suas singularidades? A nossa análise não se propôs a examinar o conteúdo das obras por completo, mas os seus resumos; contudo, nos interessa aprofundar esses indicativos e investigar as noções de infância nesses estudos que não mencionam as crianças nem, tampouco, suas singularidades subjetivas, territoriais, étnico, raciais, sociais e culturais. Em nossa análise, consideramos importante a nomeação desses sujeitos, já que incorporá-los, como também suas especificidades, pode colaborar para a destituição de perspectivas hegemônicas e universalistas que possam vir a encampar as diversas infâncias e vidas das crianças existentes na América Latina.

Ao longo do processo de categorização e análise dos levantamentos bibliográficos realizados pelo periódico, uma interrogação segue nos acompanhando: como se caracteriza a infância e juventude latino-americana? Quem são as crianças e jovens de quem falam essas publicações? Teriam sido os resultados que encontramos, deste modo, similares se analisados a partir de publicações de autores de outros lugares? Deixamos essas perguntas como indicativos da importância de se conhecer a infância e a juventude latino-americana, seus rostos, suas vozes e suas histórias – e o que esses sujeitos têm a nos dizer sobre si e sobre nosso território geográfico, sócio-político e cultural.

 

 

Referências

CASTRO, L. R. Onde estão os (sujeitos) jovens nas teorias da juventude? In: COLAÇO, V. F. R. et al. (Org.). Juventudes em Movimento: experiências, redes e afetos. 1. ed. Fortaleza: Expressão Gráfica Editora, 2019.         [ Links ]

CASTRO, L. R. A infância e seus destinos no contemporâneo. Psicologia em Revista, Belo Horizonte, v. 8, n. 11, p. 47-58, 2002.         [ Links ]

CASTRO, L. R. Da invisibilidade à ação: crianças e jovens na construção da cultura. In: CASTRO, L. R. (Org.). Crianças e jovens na construção da cultura. Rio de Janeiro: NAU, 2001. p. 19-46.         [ Links ]

CASTRO, L, R. et al. Análise da produção bibliográfica em livros sobre a infância e a juventude na América Latina. DESIDADES: Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude, v. 3, n. 9, p. 33-50, 2015.         [ Links ]

FRANCHETTI, P. Editoras universitárias no Brasil. 4 de setembro de 2018. Disponível em: <https://paulofranchetti.blogspot.com/2018/09/editoras-universitarias-no-brasil.html>. Acesso em: 26 fev. 2019.         [ Links ]

HAYASHI, M. C.; HAYASHI, C. R.; MARTINEZ, C. M. Estudos sobre jovens e juventude: diferentes percursos refletidos na produção científica brasileira. Educação, Sociedade & Culturas, n. 27, p. 131-154, 2008.         [ Links ]

IBGE. Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2016-2017. Disponível em: <https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101576_informativo.pdf>.  Acesso em: 27 mai. 2019.         [ Links ]

MENANDRO, P. R. R.; YAMAMOTO, O. H.; TOURINHO, E. Z.; BASTOS, A. V. B. Livros à mão cheia: o livro como veículo de produção acadêmica. Psicologia USP, São Paulo, v. 22, n. 2, p. 367-386, 2011.         [ Links ]

SARMENTO, M. J. As culturas da infância nas encruzilhadas da 2ª modernidade. In: SARMENTO, M. J.; CERISARA, A. B. (Org.). Crianças e miúdos: perspectivas sócio-pedagógicas da infância e educação. Porto: Asa, 2004. p. 9-34.         [ Links ]

VOLTARELLI, M. A. Estudos da infância na América do Sul: pesquisa e produção na perspectiva da sociologia da infância. Tese de doutorado. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2017.         [ Links ]

WALSH, C; MIGNOLO, W. Las geopolíticas del conocimiento y colonialidad del poder. Entrevista a Walter Mignolo. In: WALSH, C; SCHIWY, F; CASTRO-GOMES, S. (Org.). Indisciplinar las ciencias sociales. Geopolíticas del conocimiento y colonialidad del poder. Perspectivas desde lo Andino. Quito: UASB/ Abya Yala, 2002. p. 17-44.         [ Links ]

 

 

Data de recebimento: 31/05/2019
Data de aceite: 16/08/2019

 

 

1 A busca por potenciais obras a serem incluídas na lista publicada trimestralmente foi realizada através de palavras-chave no campo de pesquisa dos sites eletrônicos. Palavras como infância; juventude; crianças; jovens; adolescência; adolescentes foram utilizadas nesse procedimento. Também se consultava o campo de lançamentos de cada site eletrônico das editoras, porém, esse recurso nem sempre estava disponível. Destaca-se também que não bastava as obras informarem em seus títulos que se dedicavam a temas relativos à infância e juventude. Foi necessário conferir se essas obras continham todas as informações editoriais publicadas no site da revista, como a autoria, o ISBN, o número de páginas, o ano e o mês de publicação, o seu resumo, a cidade de origem da editora e se o seu lançamento correspondia ao período de três meses da edição do Periódico. Tendo passado por esse filtro, o conteúdo do resumo da obra foi lido e analisado pela equipe, que elegeu ou não a obra como parte da listagem final a ser divulgada no Periódico. Essas obras são resultado de pesquisa científica, ou de reflexão teórica ou metodológica. Excluem-se, portanto, manuais didáticos, pedagógicos, literatura infantil ou juvenil, e especificidades religiosas ou médicas.

2 Agradecemos à equipe de assistentes que compôs este trabalho ao longo das onze edições analisadas neste artigo: Arthur José Vianna Brito, Clara Cascão, Hannah Quaresma Magalhães, Isa Kaplan Vieira, Luciana Mestre, Maria Luiza Vianna Werneck Pereira, Matheus Ferreira Apolinário, Paula Pimentel Tumolo, Priscila Gomes e Yuri do Carmo.

3 CRV. Nossa História, 2016. Disponível em: <https://editoracrv.com.br/nossa-historia>. Acesso em: 27 fev. 2019.

4 NOVEDUC. Quiénes Somos, 2018. Disponível em: <https://www.noveduc.com/quienes_somos/>. Acesso em: 27 fev. 2019.

5 Jabuti é um prêmio brasileiro de literatura que, há 60 anos, premia autores nacionais.

6 EdUFSCar. A editora, 2019. Disponível em: <http://www.edufscar.com.br/a-editora>. Acesso em: 27 fev. 2019.

7 EDUFBA. A editora, 2019. Disponível em: <http://www.edufba.ufba.br/a-editora/>. Acesso em: 27 fev. 2019.

8 Disponível em: <http://www.cnpq.br/documents/10157/186158/TabeladeAreasdoConhecimento.pdf>. Acesso em: 27 fev. 2019

9 IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2016-2017.

10 CROSS, D.; THOMSON, S.; SINCLAIR, A. Research in Brazil: report for CAPES by Clarivate Analytics. 2017. Disponível em: https://www.capes.gov.br/images/stories/download/diversos/17012018-CAPES-InCitesReport-Final.pdf Acesso em: 27 mai. 2019.

 

 

I Juliana Siqueira de Lara: Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Mestra em Psicologia pelo mesmo Programa e graduada em Psicologia pela mesma instituição. Integra o Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC/UFRJ), Brasil. Atua como Editora Assistente no periódico DESidades – Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude. E-mail: j.siq.lara@gmail.com

II Luísa Prudêncio: Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Graduada em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Brasil. Integra o Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC/UFRJ), Brasil. Atua como Editora Assistente no periódico DESidades – Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude. E-mail: luisaevieira@gmail.com 

III Paula Pimentel Tumolo: Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Graduada em Psicologia pela mesma instituição. Integra o Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC/UFRJ), Brasil. Atua como Editora Assistente no periódico DESidades – Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude. E-mail: paulatumolo@gmail.com 

IV Renata Tavares da Silva Guimarães: Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Mestra e graduada em Psicologia pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Brasil. Integra o Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC/UFRJ), Brasil. Atua como Editora Assistente no periódico DESidades – Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude. E-mail: retsg.ufrj@gmail.com

V Sabrina Dal Ongaro Savegnago: Pós-doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Brasil, e graduada em Psicologia pela mesma instituição. Desde 2014, atua como Editora Assistente no periódico DESidades – Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude. E-mail: sabrinadsavegnago@gmail.com

VI Sofia Hengen: Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Graduada em Psicologia pela Universidad del Salvador, Argentina. Integra o Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa e Intercâmbio para a Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC/UFRJ), Brasil. Atua como Editora Assistente no periódico DESidades – Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude. E-mail: sofiahengen@hotmail.com

VII Lucia Rabello de Castro: Professora Titular do Programa de Pós-graduação em Psicologia do Instituto de Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Brasil. Editora Chefe do periódico DESidades – Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude. E-mail: lrcastro@infolink.com.br

Creative Commons License