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Revista Subjetividades

versão impressa ISSN 2359-0769versão On-line ISSN 2359-0777

Rev. Subj. vol.15 no.2 Fortaleza ago. 2015

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Ocio e cultura na (re)construção identitária de pessoas idosas institucionalizadas

 

Idleness and culture in identity (re)construction of institutionalized elderly

 

Ocio y cultura en la (re)construcción de identidad de ancianos institucionalizados

 

Osiveté et culture dans la (re)construction identitaire des personnes âgées institutionalisées

 

 

Jenny Gil SousaI; Maria Manuel BaptistaII

IDoutora em Estudos Culturais pelas Universidades de Aveiro e Minho - Portugal. Professora na Escola Superior de Educação e Ciências Sociais do Instituto Politécnico de Leiria - Portugal. Investigadora do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade
IIDocente e investigadora em Estudos Culturais no Departamento de Línguas e Culturas da Universidade de Aveiro e Directora do Programa Doutoral em Estudos Culturais da Universidade de Aveiro / Universidade do Minho

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A velhice é uma etapa da vida marcada por múltiplas perdas simbólicas eou concretas que, embora se apresentem inelutáveis e façam parte integrante do ciclo de vida, são, para o sujeito que as vivencia, experiências penosas, que obrigam a uma adaptação à nova realidade, ou seja, a novas formas de existir. Esta problemática, que toca de forma bastante profunda as dimensões simbólicas da práxis quotidiana dos indivíduos que vivem em estruturas residenciais, reflete-se, em especial, na (re)construção da identidade dos sujeitos. Nestes contextos específicos, as práticas sociais e culturais, enquanto dimensões-chave potenciadoras de momentos de ócio, assumem uma notória relevância na forma como é feita a adaptação à perda e a (re)construção do eu é realizada. Tendo como base estes pressupostos, o presente artigo está estruturado em duas partes fundamentais: numa primeira parte, faremos um enquadramento teórico, analisando a velhice contemporânea sob pontos de estruturação diversos, mas interrelacionados, em que será dado especial relevo às dimensões social e cultural deste fenómeno; será, ainda, realizada uma abordagem ao luto, analisando-o enquanto tarefa de desenvolvimento, destacando a relação existente entre o contexto cultural e as práticas de adaptação à perda; por fim, estudaremos a relação existente entre ócio, cultura e temporalidade no desenvolvimento da pessoa idosa institucionalizada. Na segunda parte, iremos discutir os resultados obtidos numa investigação qualitativa e exploratória por nós conduzida junto de idosos institucionalizados em Portugal. Assim, através da utilização de histórias de vida, percebemos as representações dos participantes do estudo relativamente à influência que as atividades culturais, quando transformadas em experiências de ócio, detêm na adaptação à perda emocional profunda e na (re)construção da identidade, sobretudo em contextos específicos de institucionalização.

Palavras-chave: velhice; institucionalização; perda; ócio; cultura


ABSTRACT

Old age is a stage of life marked by multiple symbolic and / or concrete losses, although they are ineluctable and part of a life cycle, they are for the subject that live them, painful experiences, which require an adjustment to the new reality, namely, to new forms of existing. This problem, which plays quite deeply symbolic dimensions of everyday praxis of individuals living in residential structures is reflected in particular in the (re) construction of the subject's identity. In these specific contexts, social and cultural practices, while potentiating key dimensions of idleness time, taking a notorious importance in the way is made to adapt to loss and the self (re) construction is performed. Based on these assumptions, this article is structured in two main parts: in the first part, we will make a theoretical framework, analyzing contemporary old age under different points of structure, but interrelated, which will be given special attention to the social and cultural dimensions of this phenomenon; An approach to mourning, will be also carried out analyzing it as a development task, highlighting the relationship between the cultural context and adaptation practices to loss. Finally, we will study the relationship between idleness, culture and temporality in the development of institutionalized elderly. In the second part, we will discuss the results of a qualitative and exploratory research conducted by us with institutionalized elderly in Portugal. Thus, through the use of life stories, we see representations of the study participants regarding the influence that cultural activities, when transformed into entertainment experiences, hold in adapting to profound emotional loss and the identity (re) construction especially in specific contexts of institutionalization.

Keywords: old age; institutionalization; loss; leisure; culture


RESUMEN

La vejez es una fase de la vida marcada por múltiples pérdidas simbólicas y/o concretas que, aunque se presenten ineluctables y hagan parte del ciclo vital, son, para el sujeto que las vivencia, experiencias lastimadoras, que obligan una adaptación a la nueva realidad, es decir, a nuevas formas de existir. Esta problemática, que interfiere de forma bastante profunda en las dimensiones simbólicas de la praxis cotidiana de los individuos que viven en residencias de ancianos, se refleja, especialmente, en la (re)construcción de la identidad de los sujetos. En este contexto, las prácticas sociales y culturales, mientras dimensiones-clave potenciadoras de momentos de ocio, asumen gran relevancia en la forma como se hace la adaptación a la pérdida y la (re)construcción del yo es realizada. Teniendo como base estos presupuestos, el presente artículo se estructura en dos partes fundamentales: en la primera parte haremos un encuadramiento teórico, analizando la vejez contemporánea bajo diversos puntos de estructuración, más interrelacionados, en la cual se dará enfoque a las dimensiones social y cultural de este fenómeno; también discutiremos el duelo, evaluándole mientras tarea de desarrollo, enfocando la relación existente entre el contexto cultural y las prácticas de adaptación a la pérdida; al final, estudiaremos la relación entre ocio, cultura y temporalidad en el desarrollo del anciano institucionalizado. En la segunda parte, discutiremos los resultados obtenido en una investigación cualitativa y exploratoria conducida por nosotros junto a los ancianos institucionalizados en Portugal. Así, por medio de la utilización de relatos de vida, percibimos las representaciones de los participantes de la investigación relativamente en la influencia que las actividades culturales, cuando transformada en experiencias de ocio, presentan en la adaptación a la pérdida emocional profunda y en la (re)construcción de la identidad, especialmente en contextos específicos de institucionalización.

Palabras clave: vejez; institucionalización; pérdida; ocio; cultura


RÉSUMÉ

La vieillesse est une étape de la vie marquée pour pertes symboliques et/ou matérielles qui, bien qu'elles se présentent et fassent partie du cycle de vie, sont pour le sujet qui l'épreuve des expériences douloureuses qui l'oblige à l'adaptation à la nouvelle réalité, c'est-à-dire, à nouvelles manières d'exister. Cette problematique touche profondement les dimensions symboliques de la praxis quotidienne des individus qui vivent dans des structures d'habitation, se réverbère, spéciallement, dans la (re)construction de l'identité des sujets. Dans ces contextes spécifiques, les practiques sociaux et culturelles, pendant que les dimendions-clés potentialisatrices au moment de l'osivité ont une très importante pertinance dans la manière comme l'adaptation à la perte est faite et la (re)construction du Je est réalisée. Basé sur ces propositions, cet article est composé de deux parties fonfamentaux: en première, on fera un cadrement théorique, en analisant la vieillesse contemporaine à partir des divers points de structuration mais inter-relationés auxquelles on donnera importance spéciale aux dimensions sociale et culturelle de ce phenomène; on fera, encore, une considération au deuil en l'analisant comme activité de développemnt en détachant la relation entre le contexte culturel et les practiques de l'adaptation à la perte; enfin, on étudera la relation entre osiveté, culture et temporalité dans le développement de la personne âgée institutionalisée. À la deuxième partie de l'article, on discutera les résultats obtenus dans une recherche qualitative et exploratoire qu'on a réalisé avec des personnes âgées institutionalisées au Portugal. Ainsi, à partir des leurs histoires de vie, on a aperçu que les représentation des participants à l'étude relationées aux activitées culturelles, quand celles-là sont transformées en expérience d'osivité, détiennent influence sur l'adaptation à la perte émotionelle profonde et dans la reconstruction de l'identité, surtout dans des contextes spécifiques d'institutionalisation.

Mots-clés: vieillesse; institutionalisation; perte; osiveté; culture


 

 

Uma incursão teórica pelas epistemologias contemporâneas do envelhecimento leva-nos a perceber que estamos perante uma mudança de paradigma no que se refere à velhice, muito por causa das renovadas conceções que emergiram das disciplinas biológicas, psicológicas e sociais. Contudo, as sociedades contemporâneas ainda se veem emaranhadas no processo de adaptação ao envelhecimento e à velhice, cujos próprios sujeitos idosos se deparam com dificuldades em encontrar o seu lugar e o(s) seu(s) papel(is) socia(is) neste sistema moderno.

Na verdade, as pessoas idosas contemporâneas estão envolvidas em múltiplas interrelações, absorvidas numa realidade muito mais complexa do que aquela na qual nasceram e cresceram, sendo as suas vivências constantemente condicionadas pelas mudanças progressivas e, por vezes, frenéticas da modernização (Santos & Encarnação, 1998; Sousa & Baptista, 2015).

Todavia, a modernidade não trouxe só alterações para os mais velhos. As próprias sociedades passaram a deparar-se com um fenómeno que foi tomando um lugar cada vez mais preponderante, não só no seio das reflexões científicas, mas também no dia a dia de todos os cidadãos, o fenómeno da velhice.

Na verdade, o fenómeno do envelhecimento é um tema que adquire cada vez maior vitalidade no contexto presente, tal como revelam os dados do último censo português (INE, 2011). Segundo as informações mais atuais, há uma evidente propensão de crescimento no número de pessoas com idade superior a 65 anos e que ultrapassa os jovens, intensificando a tendência dos censos de 2001. A esperança média de vida continua a crescer, situando-se agora nos 79,2 anos (Paúl & Ribeiro, 2012).

Portugal é, hoje, um dos países com maior tendência de envelhecimento de toda a Europa, o que origina profundas metamorfoses na paisagem social e cultural, bem como, no papel da velhice e das pessoas idosas neste país pós-tradicional (Dias & Rodrigues, 2012).

Se os sujeitos idosos não produzem, nem possuem valor na perspetiva hegemónica, então são vistos, simplesmente, como encargos. Esta preocupação económica encontra significação política, influenciando a opinião pública, nomeadamente ao nível dos programas e políticas gerontológicas. As políticas são débeis e sem solidez, reflexo da pouca informação existente sobre o papel da velhice na sociedade contemporânea (Simões, 2010). Na verdade, para a maioria da população, a idade expropria a pessoa de si mesma, encaixando-a numa categoria independente e desagregada do resto da sociedade, num coletivo homogéneo sem direitos sociais e políticos; o indivíduo idoso, que passa a ter uma existência com caraterísticas de generalidade, torna-se invisível e ausente da sociedade (Vaz, 2001). Perde a identidade e morre socialmente.

 

Ser Idoso: Vida Social e(Re)organização no Espaço e no Tempo

A Identidade da Pessoa Idosa na Contemporaneidade

A identidade pessoal é um fator extremamente importante quando procuramos compreender a complexidade e variabilidade do processo de envelhecimento. A identidade pessoal é, no entender de Santos e Encarnação (1998), a procura incessante de o sujeito se encontrar a si mesmo na esfera das relações pessoais sendo, ainda, na opinião de Giddens (1994), a identidade que protege o sujeito nas suas interações com a realidade quotidiana.

Efetivamente, a identidade pessoal é o aspecto referencial, que ajuda o indivíduo a reconhecer-se enquanto tal, ao longo do tempo e do ciclo de vida. Na identidade, encontram-se posicionados os predicados do sujeito, quer sejam corporais ou psicológicos (Valentim, 2008). Não obstante, o que está em causa na identidade de uma pessoa não é tanto a permanência e a monotonia de atributos, mas antes a referência a si ao longo do tempo. É o poder de autorreferência, que implica da parte do indivíduo um conhecimento claro não só de si mesmo mas do mundo que o rodeia (Giddens, 1994; Valentim, 2008).

Nesse sentido, na formação da identidade pessoal tomam especial importância os aspetos sociais, uma vez que as caraterísticas dos indivíduos são (en)formadas pelas relações sociais, pela pertença ao(s) grupo(s) (Giddens, 1994).

Na (re)construção da identidade, a representação que se tem de si próprio é um eixo basilar. Esta imagem não diz apenas respeito ao reflexo espelhado de si próprio, mas também se refere à imagem percecionada no contexto relacional (Carr & Bodnar-Deren, 2009).

Assim, o processo de (re)construção da identidade na velhice pode ser especialmente difícil para a pessoa idosa contemporânea uma vez que, tal como referimos no ponto anterior, a sua existência se debate num plano de generalidade, sem respeito pela vivência de sentimentos próprios (Angus & Reeve, 2006).

Este aspeto é particularmente sensível nas pessoas idosas institucionalizadas, uma vez que a institucionalização obriga a uma descontextualização da identidade, a um rompimento com o enquadramento protetor da comunidade e da tradição, que são substituídos por estruturas impessoais: "as instituições modernas provocam efeitos debilitantes sobre a autoexperiência e as emoções () (e) nesta medida, a autoidentidade do sujeito moderno torna-se problemática e acometida de profundos sentimentos de perca e de ansiedade" (Santos & Encarnação, 1998, p. 109). Se à institucionalização se juntar a viuvez, estamos perante as duas principais causas de estresse na velhice.

Perda e Institucionalização

Segundo os autores Montório e Fernandez (1998), existem na velhice dois tipos de eventos causadores de stress que podem condicionar amplamente a qualidade de vida das pessoas idosas - os acontecimentos de vida e as situações crónicas estressantes.

Os acontecimentos de vida estressantes - são aqueles que, segundo os autores, ocorrem com maior probabilidade na idade avançada e dizem respeito à perda de papéis sociais e de status, concretamente relacionados com a entrada na reforma, com os problemas de saúde, mas também, e principalmente, com a morte de pessoas próximas, nomeadamente o cônjuge ou parceiro.

Apesar de, no imaginário social, a morte estar relacionada com a velhice - o que poderia levar a acreditar que a viuvez nesta fase da vida é vivida com placidez -, a verdade é que o desaparecimento do(a) companheiro(a) de vida provoca, de igual forma, um dilaceramento profundo. Na realidade, para muitas pessoas idosas a morte do cônjuge amado conduz à rutura do ego, a uma lesão do self e a uma fragmentação da identidade. A morte daquela que era a única figura de vinculação escolhida transforma a vida da pessoa sobrevivente de múltiplas formas e em variadíssimas dimensões (Mcgoldrick & Walsh, 1998).

Worden (1998) chama a atenção para os padrões de luto, que se podem analisar junto das pessoas de idade avançada. Evoca, logo numa primeira instância, a interdependência. Os casamentos longevos provocam nos cônjuges ligações profundas e, inclusivamente, imbricação de papéis. Destarte, quando desaparece um dos cônjuges, o enlutado - altamente dependente para alguns papéis e atividades - sente maior dificuldade de adaptação à perda (Ha, Carr, Utz, & Nesse, 2006; Sousa & Baptista, 2015).

Para além disso, é na velhice que ocorre um número inegavelmente maior de perdas, muitas vezes em períodos temporais bastante curtos, o que "pode provocar uma sobrecarga e não permitir o luto. Junto com a perda de amigos, familiares e membros da família estão as perdas pelas quais a pessoa de idade pode ter passado" (Worden, 1998, p. 148), o que pode provocar uma diminuição na habilidade de elaborar o luto e levar, consequentemente, à solidão.

A solidão, sintoma presente num processo de luto normal, acaba por se intensificar na velhice se, após o falecimento do cônjuge, as pessoas idosas enlutadas forem obrigadas a abandonar o espaço que partilharam com o companheiro de vida (Parkes, 1998; Rebelo, 2009; Worden, 1998). Estamos, destarte, perante o segundo tipo de eventos causadores de stress: situações crónicas stressantes.

As situações crónicas stressantes fazem referência a situações que se instalam e persistem ao longo do tempo (Montório & Fernandez, 1998). Estas situações podem ser consequências de alterações biológicas, psicológicas ou sociais e originam no indivíduo um sentimento de insegurança em relação às condições e ao meio ambiente que o envolve: um exemplo claro desta situação é a institucionalização permanente numa estrutura residencial de apoio a pessoas idosas.

Deixar o lar, espaço de recordações e de recortes de significados, de conforto emocional e de identidade, é mais um golpe pungente, uma perda com repercussões dantescas (McGoldrick & Walsh, 1998). Ao serem forçadas a sair dos seus lares - devido a motivos que vão desde a inabilidade de morar sozinho, à falta de condições monetárias para manter a casa ou até à falta de condições da própria habitação -, as pessoas idosas abandonam o ambiente que era do casal, a última ligação ao ente querido falecido e o próprio sentido da pessoa de self (Oliveira & Lopes, 2008).

Segundo Machado Pais (2006), ao entrar para a estrutura residencial, para aquela que será, em princípio, a última morada antes da morte, a pessoa idosa é invadida por uma desmesurada sensação de perda. Não admira, pois, que a institucionalização seja um dos maiores fatores de estresse na vida das pessoas idosas, pois implica a separação dos familiares, dos vizinhos e conhecidos, a rutura com as atividades comunitárias e consigo próprio: "os rituais de internamento constituem marcos angustiantes de perda. Neste momento, o idoso despoja-se da quase totalidade dos seus papéis" (Santos & Encarnação, 1998, p. 248).

Aquando da institucionalização, as relações afetivas com os espaços são quebradas e a organização do tempo, os recursos e as relações sociais são profundamente transformadas: "o idoso, tomado na sua conversão à racionalidade institucional, passa a estar sujeito à objetivação; isto é, a mudar da condição de sujeito incondicionado a objeto de condicionamentos, perpetrados em nome de uma uniformização funcional que mascara as suas diferenciações identitárias" (Santos & Encarnação, 1998, p. 169).

É a institucionalização da anomia (Bourdieu, 1989), o controle rígido da vida de cada pessoa idosa como fundamento essencial do todo organizacional: "os idosos objetivam-se pela transformação operativa das instituições. Nesta aceção, as administrações incorporam objetos" (Santos & Encarnação, 1998, p. 176) e o poder estará sempre do lado de quem gere, de quem alimenta as simbologias dominantes.

O poder institucional e os micropoderes, que se legitimam numa lógica institucional, vão eliminando os comportamentos diferentes, desfasados do restante grupo, dentro de uma harmonia de tratamento coletivo (Bourdieu, 1989).

Desapossado do reconhecimento social enquanto pessoa, o indivíduo idoso institucionalizado vê-se como um ser sem capacidade de decisão, um ser que passa à categoria de objeto. Subtilmente, dá-se a desestruturação identitária (Santos & Encarnação, 1998).

Este ambiente castrador é especialmente pernicioso se a institucionalização tiver tido como causa a morte do cônjuge. Tal como já foi referido no ponto anterior (Santos & Paúl, 2006; Sousa & Baptista, 2015; Vaz, 2001), a perda do companheiro de vida fere abissalmente o cônjuge sobrevivente e quando este ingressa numa estrutura residencial está num estado emotivo de tal forma frágil que carece, acima de tudo, de um ambiente familiar e facilitador de estratégias de superação do pesar, onde possa desenvolver e experimentar um conjunto de respostas adaptativas, descobrindo e realizando as suas próprias possibilidades (Born, 2002).

Na verdade, estas grandes perdas não têm de provocar, forçosamente, um final irreversível de entropia, o que pode "ser explicado pelas estratégias de coping, resiliência e normatividade" (Afonso, 2012, p. 164), bem como pelo sentimento de controlo, que as pessoas idosas conseguem desenvolver e que podem dar origem a adaptações bem-sucedidas à perda.

Com efeito, segundo a literatura da especialidade (Afonso, 2012; Santos & Paúl, 2006), o efeito do aumento de controlo tem repercussões profundas no bem-estar das pessoas idosas institucionalizadas. Em situações de estresse, como são a institucionalização e a viuvez, o controlo é uma estratégia de enfrentamento essencial uma vez que está diretamente relacionado com os comportamentos de resiliência e coping perante as perdas e as vulnerabilidades. Por isso, compete aos profissionais das instituições contrariar situações de dependência, de uniformização e de objetivação e facilitar o sentimento de identidade, permitido ter um espaço e atividades próprias - que favorecem a ponte com a vida passada -, bem como favorecer o poder de decisão e de controlo (Fonseca, 2005; Lima, 2010).

Ócio, Cultura e Temporalidade

O ócio é uma experiência de vivência plena da cultura, em íntima relação com o tempo, numa perspetiva de desenvolvimento pessoal. O tempo de ócio é, assim, um tempo de reivindicação da pessoa através do autoconhecimento e da potencialização de ocasiões de encontro de valores e de sentidos, como fonte de desenvolvimento da identidade pessoal e social (Cuenca, 2008).

Entendemos, desta forma, o ócio numa perspetiva humanista e criativa e, em íntima relação com a palavra grega scholé, de desenvolvimento do indivíduo contemporâneo (Aquino & Martins, 2007; Baptista, 2013; Cuenca, 2002, 2009, 2012, 2013). Muito mais do que um tempo de descanso, o tempo de ócio é, na realidade, um espaço de infinitas possibilidades, é uma verdadeira experiência de desenvolvimento e de participação, que pode ser vivida calcorreando múltiplos caminhos.

Assim, este estudo tem como eixo estruturador o ócio, enquanto experiência privilegiada de (re)construção da autoidentidade, de (re)elaboração da temporalidade, de aprendizagem e de desenvolvimento humano; em rigor, enquanto elemento estruturador da "construção da identidade e atualização do Self, [que] facilita o autorreconhecimento e formação da autoimagem ou autoconceito" (Pinheiro, Rhoden, & Martins, 2010, p. 1140).

Defendemos aqui, na senda de Cuenca (2002), que o ócio é uma área específica da experiência humana, com os benefícios que lhe são próprios: é um recurso essencial para o desenvolvimento pessoal, social e económico e um aspeto imprescindível à saúde e ao bem-estar. Por isso, o ócio é um direito humano básico, uma vez que é expressão da identidade do indivíduo, onde a subjetividade e a emotividade de cada um assumem exponencial relevo. Segundo Aquino e Martins, o "ócio como experiência humana está relacionado a valores e significados profundos, apenas assim pode o ócio ter sentido enquanto experiência significativa positiva, fonte de desenvolvimento e prevenção à ociosidade negativa, ou ócios nocivos" (Aquino & Martins, 2007, p. 497).

Com efeito, o ócio entendido como participação ativa (Cuenca, 2012) é de primordial importância na qualidade de vida do indivíduo contemporâneo. Só existe uma efetiva vivência do ócio, uma verdadeira realização pessoal, se houver uma participação consciente por parte do sujeito. O conceito de ócio é, assim, um conceito comprometido com o desenvolvimento humano onde sobressaem valores como a liberdade, a igualdade, a solidariedade, o respeito ativo e o diálogo (Cuenca, 2002).

Neste sentido, a vivência do ócio está intimamente relacionada com a cidadania digna e a vivência saudável e construtiva, onde o grupo e a comunidade são importantes meios de realização. Não obstante, o ócio ser uma experiência privada subjetiva, muito ligada à emotividade, este não pode ser separado da trajetória social da comunidade onde está inserido. O ócio pessoal está integrado em contextos culturais e materializa-se em práticas culturais, sociais e comunitárias. O ócio valioso e pessoal é amplamente compatível com a práxis comunitária, com o estar com o outro, em grupo, enfim, em sociedade (Cuenca, 2012).

Na verdade, falar de ócio implica ter especial atenção ao ambiente físico e social bem como, às experiências de cada pessoa. De acordo com Cuenca, "o ócio a que nos referimos é algo que se vive com liberdade, gozo e como fim em si mesmo () a experiência de ócio implica uma perceção subjetiva na qual influem tanto a própria vivência pessoal como o ambiente social em que se vive" (Cuenca, 2009, p. 118).

Com efeito, o desfrute e o exercício do ócio estão profundamente dependentes da perceção e da atitude que se tem sobre ele. Amplamente influenciado pela idade, pelo nível de educação e por outras circunstâncias socioculturais, o ócio integra a forma de ser de cada sujeito, sendo expressão da sua identidade, mas, também, espaço de vivências fundamentais para a superação de momentos de crise e de salvaguarda do self, "enquanto corretivo equilibrador de desajustes e carências de tipo pessoal ou social" (Cuenca, 2008, p. 284).

O exercício do ócio é, por isso, uma experiência complexa que requer liberdade, mas também capacidades que não são alheias à cultura. O espaço do ócio é, em rigor, um espaço cultural, contexto privilegiado de relações simbólicas.

Nesta perspetiva, a experiência de ócio é uma experiência cultural de vivência criativa do tempo. Releva-se, assim, a analogia entre temporalidade e ócio. Nesta íntima e profícua relação, o tempo não é percecionado como posse, nem como condição de se ter ou não; não é um recipiente, que se enche com um sem-fim de atividades e que tornam o sujeito contemporâneo ocupado ou detentor de um status (Aquino & Martins,2007; Baptista, 2013). Esta relação - ócio e temporalidade humana - é, na verdade, um aspeto vital do ser humano. É o tempo (re)elaborado numa perspetiva de desenvolvimento, de reflexão e de ação na (re)construção da identidade, aspeto que nos interessa particularmente neste trabalho.

Porém, e tal como já foi referido, para que o ócio possa constituir uma experiência vital do desenvolvimento humano, o indivíduo tem de ter liberdade para exercitar adequadamente o seu direito ao ócio. Mais do que isso, no ato de (re)elaborar o tempo e a identidade, o exercício de reflexão, de questionamento e de transformação pessoal e social é fundamental e deve ser estimulado.

Daqui se depreende que o tempo que se vive nas estruturas residenciais, este tempo que marca a identidade, a relação com os outros mas, sobretudo, consigo próprio, deve ser transformado em experiências de ócio, em espaços de autoconstrução e de desenvolvimento pessoal e social.

Este tempo, que nem sempre as pessoas idosas sabem ocupar de forma satisfatória e enriquecedora, é, na verdade, um espaço privilegiado de resgate da identidade e de promoção dos contactos sociais, sendo, por isso, vital para o bem-estar da pessoa idosa institucionalizada transformar os tempos desocupados em experiências de ócio, erigindo uma nova relação com o tempo, ou seja, (re)elaborando a sua temporalidade.

Em rigor, sendo a institucionalização o ponto máximo da dissocialização da vida ativa, uma nova realidade onde predomina a abundância de tempo disponível, para que o dia-a-dia não seja sentido como um "tempo vazio e não valorizado" (Baptista, 2013, p. 2), a pessoa idosa institucionalizada (re)encontra-se e (re)descobre-se na nova relação com o seu tempo.

Ser-no-mundo é ser-no-tempo (Heidegger, 2005), o que implica, da parte da pessoa idosa institucionalizada, uma reelaboração da sua temporalidade, isto é, "deixar emergir uma temporalidade humana ociosa () promove(ndo) a existência para um outro nível de conhecimento, desenvolvimento e de aproximação do homem de si próprio, na escuta do que lhe é mais íntimo e próprio" (Baptista, 2013, p. 3). É aqui, na (re)construção da identidade através dos tempos de ócio que a cultura e as atividades culturais adquirem especial relevância na quotidianidade das instituições residenciais para pessoas idosas.

 

O Estudo

Os resultados discutidos ao longo deste artigo resultam de uma investigação, elaborada a partir do quadro teórico dos Estudos Culturais, onde tentamos compreender como é que as atividades culturais e as experiências de ócio favorecem a reconstrução identitária da pessoa idosa institucionalizada na adaptação às perdas emocionais profundas. Esta problemática, que toca de forma bastante profunda as dimensões simbólicas da práxis quotidiana dos indivíduos que vivem em estruturas residenciais, reflete-se, em especial, na identidade dos sujeitos.

Assim, neste estudo deu-se especial relevância aos significados profundos dos comportamentos que se constroem no contexto das interações entre os sujeitos, mediados por esquemas culturais e representações sociais diversas.

Por esta razão, e por pretendermos um estudo empírico dos referidos significados, conduzimos uma pesquisa que se insere no paradigma geral de investigação qualitativa, com fortes contornos etnográficos, enriquecido pelas perspetivas humanístico-interpretativa, fenomenológica e simbólica.

Nesse sentido, o método principal de recolha de dados e de produção do acervo fundamental da informação consistiu em "mini-histórias" de vida (O'Neill, 2009), realizadas a quinze pessoas idosas residentes em quatro estruturas residenciais da região de Leiria, Portugal.

A escolha destas quatro estruturas residenciais prendeu-se, essencialmente, com a busca da representatividade social dos sujeitos a estudar. Assim, procurámos instituições que, pelas suas características - quer no que respeita às condições físicas e humanas, quer devido à própria política da instituição - acolhessem indivíduos representativos da diversidade das culturas e das condições socioeconómicas locais.

O estudo teve como principal objetivo compreender como é que as atividades culturais, enquanto contextos privilegiados de experiências ócio, podem auxiliar na reconstrução identitária da pessoa idosa institucionalizada após uma perda emocional significativa, especialmente a morte do cônjuge. Assim, a "perda do cônjuge na velhice" foi o critério de escolha dos nossos sujeitos, tendo sido convidadas a participar todas as pessoas idosas que perderam o cônjuge após os 65 anos e que se enquadrassem num dos dois critérios: cuja perda já tivesse ocorrido na instituição; ou, cuja perda tivesse sido a causa da institucionalização.

Um aspeto fundamental para poderem ser participantes do estudo prendia-se com a capacidade de entendimento e comunicação verbal. Atendendo a estes critérios, dos 209 sujeitos residentes nas quatro instituições, foram selecionados 15 indivíduos que passaram a constituir a amostra da nossa investigação.

A Recolha dos Dados

Tendo como pano de fundo os critérios explicados no ponto anterior, o primeiro contacto com os sujeitos foi feito através das direções das estruturas residenciais. Com efeito, em todos os casos foram as direções das instituições que levaram a cabo a tarefa de apresentar os indivíduos participantes do estudo, enquadrando, elas próprias e de uma maneira muito geral, o estudo que se pretendia realizar bem como, o papel de cada um neste estudo. No final, os sujeitos eram convidados a participar na pesquisa. Todos os indivíduos aceitaram, de imediato, colaborar na investigação.

Neste primeiro encontro era agendado, também, o encontro seguinte. O agendamento das entrevistas revelou-se uma tarefa bastante simples, uma vez que havia uma grande facilidade em encontrar horários compatíveis uma vez que os sujeitos possuíam uma grande disponibilidade. Quanto ao local de realização da entrevista, tentou-se, em todos os casos, que estas fossem feitas em espaços privados, preservados da entrada de alguém estranho à investigação. Alguns indivíduos, a entrevista foi efetuada em salas particulares das instituições; noutros casos, os sujeitos preferiram que a entrevista fosse realizada no seu quarto. A justificação destes últimos para que a entrevista se concretizasse no quarto prendia-se com o facto de se sentirem mais à vontade e mais confortáveis; para além disso, estes sujeitos queriam, também, mostrar os seus álbuns de fotografias que se iam convertendo em importantes auxílios na narrativa, tornando mais vívidas as memórias.

Ao longo de todas as entrevistas, foi nosso pressuposto não forçar, não insistir em aspetos acerca dos quais a pessoa não estava preparada para falar naquele momento, até porque, as histórias de vida são um processo de construção, que se nutre com a relação de confiança entre os interlocutores (Bertaux, 1999; Ferrarotti, 2007).

Precisamente por isso, utilizámos a entrevista de caráter semiestruturado, por permitir um desenrolar não diretivo (Poirer, Clapier-Valladon, & Raybaut, 1999) e por ser a "mais importante para a construção de narrativas, já que combina questões pré-fixas com outras emergentes que podem incluir-se, posteriormente, sempre que sejam pertinentes" (Pernas, 2011, p. 358).

Assim, as entrevistas que aplicámos seguiram a estrutura aconselhada por Medrano e Cortés (2007). Neste sentido, e tal como já referimos, havia uma fase prévia à entrevista que consistia na apresentação. Neste primeiro contacto, ficava feito, desde logo, um contrato implícito (Bertaux, 1999). A fase seguinte centrava-se mais em perguntas abertas sobre as experiências de vida, incidindo, sobretudo, na infância e na adolescência. Esta etapa era fundamental para o indivíduo descontrair, reviver momentos significativos, rebuscar e revelar identidades passadas, mas, sobretudo, para se começar a construir a relação de confiança e de empatia entre entrevistado e entrevistadora, aspeto fundamental quando se utiliza histórias de vida (Ferrarotti, 2007).

A fase central da entrevista era a etapa em que se colocavam as perguntas mais complexas e concretas acerca da temática específica. Nestes momentos da narrativa, os sujeitos entrevistados reviviam a vida em comum com os seus cônjuges: as rotinas diárias, as dificuldades, as alegrias, as infelicidades e a sua morte, focando os aspetos mais marcantes da perda daquele(a) com quem partilharam décadas da sua vida. Explicaram a causa da morte, refletiram sobre o próprio falecimento, os sentimentos vividos, os episódios mais relevantes do processo de luto e as práticas de superação. Constatámos que, para muitos dos entrevistados, reviver este processo era muito penoso, sendo as narrativas destes sujeitos particularmente emotivas.

Na última fase da entrevista eram colocadas as questões mais fáceis e tranquilizantes. Quanto às perguntas relativas ao futuro, seguimos o conselho de Medrano e Cortés (2007) e, portanto, decidimos intercalá-las no decurso da entrevista, dada a complexidade e profundidade que poderiam representar para alguns sujeitos.

A duração das entrevistas variou de sujeito para sujeito, influenciada pela "trajetória, convivência e significado que os entrevistados (fizeram) da sua experiência vital" (Pernas, 2011, p. 359). Como cada história de vida é única, foi, pois, a singularidade que foi considerada.

 

A Cultura e o Ócio Na (Re)construção Do Sentido da Vida: Reflexões

As perdas que se fazem sentir na velhice exigem da parte da pessoa idosa, sobretudo da institucionalizada, a aceitação de um novo self e uma redefinição da autoidentidade no sentido de encontrar um equilíbrio satisfatório que permita o seu bem-estar.

Nesse processo, revestem-se de crucial importância as experiências vividas e os relacionamentos afetivo-emocionais bem-sucedidos uma vez que o sentimento que se possui de uma existência própria nos sentimentos e nos pensamentos de outra pessoa são fundamentais para validar o self e para assegurar uma certa perceção de continuidade.

Partindo da análise de conteúdo das 15 "mini-histórias de vida", apresentamos os resultados que têm como eixos estruturais as temáticas que emergiram, transversalmente, nos discursos dos sujeitos do nosso estudo.

Assim, segundo os resultados obtidos nesta pesquisa, falar de adaptação à perda e de (re)construção da identidade na velhice implica ter presente, antes de mais, que o próprio fenómeno não tem o mesmo sentido para homens e mulheres. Na verdade, houve uma tendência, ao longo da análise dos discursos dos sujeitos, para a existência de padrões diferenciados entre as representações masculinas e as representações femininas no que se refere à adaptação à perda. Destarte, os homens parecem possuir uma postura mais positiva de adaptação a eventos stressantes, relacionada com ligações afetivas mais satisfatórias e a uma maior perceção de controlo: "o meu sobrinho costuma vir cá pedir-me opiniões acerca da agricultura, de negócios que está a pensar fazer não me posso queixar da família que tenho!" (Ent. 6); enquanto as mulheres parecem apresentar, tendencialmente, um padrão de maior fragilidade emocional, relações emocionais menos suportivas e uma menor perceção de controlo, que parece influir numa postura com maior propensão para a negação e para a desistência de adaptação à perda: "não tenho ninguém () então fico aqui sozinha desde que fiquei viúva perdi o pio sinto-me muito triste" (Ent. 3).

O processo de (re)construção da identidade na velhice também "não tem o mesmo sentido para todas as classes sociais" (Santos & Encarnação, 1998, p. 139), sendo notórias as diferenças entre estratos sociais. Na ótica de Vaz (2001), se ao longo de toda a vida os modelos culturais foram pobres, conjuntamente com baixos rendimentos, a velhice será bastante mais desvinculada com reflexos profundos na autoestima, na identidade e na capacidade de elaborar o luto. Neste sentido, e segundo os dados do nosso estudo, a condição socioeconómica das pessoas idosas parece estar intimamente relacionada com o nível de educação e alfabetização e, em última instância, com as próprias aptidões cognitivas e sociais dos participantes (Fontaine, 2000). Com efeito, pelas narrativas dos sujeitos participantes parece-nos que, quanto mais elevadas são as condições socioeconómicas, maior aparenta ser a sua perceção de autonomia e controlo, com maior tendência para se considerarem mais enquadrados na sua esfera relacional e com representações mais positivas do seu autoconceito.

Assim, o sentimento de inutilidade, a desocupação, o isolamento e a baixa autoestima é tendencialmente mais frequente nas pessoas idosas das classes com menos rendimentos: "trabalhei muito: trabalhava em limpezas, trabalhava a lavar roupas para fora, a fazer limpezas em lojas, em consultórios, trabalhava noite e dia olhe, trabalhei muito! Hoje estou abandonada" (Ent. 1), do que nas pessoas idosas das classes com mais rendimentos, uma vez que estas detêm meios financeiros e culturais que lhes permite apropriarem-se de instrumentos que os ajudam a reelaborar a sua identidade (Santos & Encarnação, 1998) e a recompor o quotidiano e os projetos de vida: "eu era uma pessoa que andava muito na rua () Então, ainda hoje, gosto de todos os dias sair e dar umas voltas! Ao mesmo tempo que encontro pessoas, converso faz-me bem girar, ir a sítios conhecidos () faz-me muito bem!" (Ent. 9).

As narrativas dos sujeitos permitem-nos perceber que, quer o género, quer as condições socioeconómicas parecem influenciar uma outra variável importante no processo de adaptação à perda: a participação, ou não, em atividades culturais.

A participação em atividades culturais evidenciou-se como sendo um dos aspetos mais importantes na superação do luto na velhice. Assim, entre os sujeitos que participam em atividades culturais e os sujeitos que não participam neste tipo de atividades, parecem existir vários padrões diferenciados, no que se refere à adaptação à perda, nomeadamente no âmbito dos relacionamentos e no sentimento de continuidade da narrativa pessoal.

Na realidade, e conforme sugerem os resultados do nosso estudo, os sujeitos que não participam em atividades culturais parecem revelar uma menor tendência para estar com os outros, ou seja, para a criação de relacionamentos afetivos e emocionais suportivos, influenciando, desta forma, na diversificação das estratégias utilizadas na reconstrução da identidade e na adaptação à perda.

Conforme explicam Santos e Paúl, a participação em atividades culturais permite o "desenvolvimento de estratégias e comportamentos de adaptação () em reposta aos acontecimentos de vida stressantes e ao próprio dia-a-dia" (2006, p. 169) e neste contexto, os dados do nosso estudo parecem revelar uma tendência, nos sujeitos que não realizam este tipo de atividades, para uma postura de negação e um perfil de desistência de reorganização emocional: "Não! Não faço nada! Já não tenho alegria para nada! () Eu sei que até ajudava mas não quero!" (Ent. 4); enquanto os entrevistados que participam em atividades desta natureza parecem apresentar uma postura tendencialmente mais positiva e orientada para a reestruturação da vida quotidiana:

não são só os conselhos e as palavras bonitas que nos dizem que chegam! Nós também temos de ajudar e bastante! Fazer coisas que deem sentido à vida! () Fazer trabalhos manuais, rendas, ir à rua, jogar quando me apetecer () ainda hoje gosto de dançar e dou um pezinho de dança [risos] e acho que faz falta uma ginasticazita! () E depois há também as pinturas nós já tivemos trabalhos nossos expostos no Turismo! (orgulho). (Ent. 8)

Assim, as atividades culturais transformadas em experiências de ócio parecem salientar-se enquanto importantes estratégias de coping, ao moderar a influência do stress no indivíduo e afetando, profundamente, a capacidade de resiliência do sujeito, reduzindo o impacto potencialmente negativo de mudanças e perdas (Afonso, 2012).

Na realidade, as atividades culturais, ao favorecerem experiências de ócio, parecem influir positivamente no desenvolvimento pessoal e social da pessoa idosa institucionalizada em luto. Com efeito, as experiências de ócio têm tendência a favorecer nos sujeitos enlutados o encontro de respostas positivas e criativas perante os problemas e as perdas emocionais profundas:

para não pensar em coisas más tenho de estar entretido então, gosto muito de cantar umas cantiguitas, e ponho-me na sala a cantar uns fados inventados por mim! (risos) Olhe, ainda agora estava lá em cima no quarto e quando me ponho a pensar em coisas más, gosto de escrever poemas ou canções! (tira um conjunto de papéis do bolso) olhe, tenho aqui uma música, quer ouvir? (Ent. 3)

Na verdade, a adaptação à perda implica organizar os múltiplos fatores interindividuais com os aspetos intraindividuais. Cada cultura fornece auxílio no processo de integração da morte e de transformação dos sobreviventes, determinando o significado que o indivíduo dá à morte, à vida e aos modos de adaptação à perda (Papalia, Olds, & Feldman, 2006). Daí que as estratégias utilizadas sejam variadas e de eficácia simbólica.

A relação com o mundo é sempre mediada pelo simbólico e a adaptação à perda implica, da parte da pessoa idosa, um sentimento de autonomia e controlo. É necessária a (re)criação e (re)elaboração de papéis e o desenvolvimento de habilidades, por forma a aumentar a autoestima, a estabelecer e manter relações sociais que ajudem a suportar os acontecimentos desfavoráveis da vida e a encontrar os recursos necessários para recomeçar (Parkes, 1998; Rebelo, 2009).

Conforme podemos verificar nos discursos dos sujeitos entrevistados e na literatura da especialidade (Born, 2002; Parkes, 1998; Rebelo, 2009), se o meio cultural e social oferecer as condições para que a pessoa idosa enlutada se possa desenvolver, consoante as suas capacidades, interesses e necessidades próprias e específicas, apesar de todos os problemas, as perdas podem ter um efeito de crescimento e maturidade:

eu penso, muitas vezes, que se tivesse em casa não sei o que era de mim! (pausa) A gente aqui sempre se distrai com isto ou com aquilo, a conversar e a fazer coisas! Embora a gente pense e assim, mas é diferente! (Ent. 15)

Descobrindo e realizando as próprias possibilidades, a superação do luto é possível, independentemente da idade:

depois dele morrer fiz várias, várias quadras e rimas e assim e foi no que me apoiei, foi o que eu fiz para não pensar tanto na morte dele! Fiz as quadras, escrevi como se ele estivesse vivo foi a forma que tive para falar com ele e encontrar paz! (Ent. 10)

Neste processo não há receitas, mas um conjunto de respostas adaptativas que podem estar encerradas numa eventual continuação da antiga atividade profissional, na adesão a uma nova atividade, na realização de atividades culturais e artísticas, no reforço das relações familiares e no aumento da vida relacional e associativa (Fonseca, 2005).

Um aspeto crucial é favorecer a preservação da identidade e do autoconceito da pessoa idosa, assim como, a perceção de controlo acerca da sua própria vida e em relação ao meio institucional:

eu, enquanto tenho trabalho aqui na sala, estou sempre entretida porque enquanto não acabo não descanso! (risos) Olhe, ainda ontem à noite a pôr aqui o vermelho (aponta para uma pintura de girassóis) fiquei cá em baixo até tarde porque queria acabar! (risos) eu gosto de fazer estas coisas, sinto-me bem! (Ent. 8)

Já atrás se discorreu sobre a importância do controlo percebido como estratégia de coping na superação das perdas, nomeadamente na adaptação às perdas. Se este aspeto é importante nas pessoas idosas não institucionalizadas, ele assume uma relevância vital para as pessoas idosas que se encontram em estruturas residenciais.

Neste campo, o modelo de intervenção mais enriquecedor e integral é o que é possibilitado pelo ócio ativo, participativo e social, no ócio compartilhado e como convivência, que vê na participação social e na cultura um meio privilegiado de promoção: "não me sinto nada sozinha tenho muitas amigas e farto-me de trabalhar aqui para a casa! Estão sempre a vir ter comigo e a fazermos muitos trabalhos, todos juntos! (risos)" (Ent. 7).

A participação e a cultura permitem que, nas experiências de ócio, as pessoas idosas se (re)inventem, encontrem respostas positivas e criativas perante os problemas e as perdas, mas, sobretudo, que desenvolvam recursos para a mudança, ou seja, para uma nova forma de vida.

 

Conclusões Finais

A partir dos resultados apresentados, percebemos que, em contextos de institucionalização, tanto o género, como as condições socioeconómicas, mas principalmente, a participação, ou não, em atividades culturais têm tendência a influenciar o processo de (re)construção da identidade na velhice, após uma perda emocional profunda.

Na verdade, segundo o nosso estudo, o género e as condições socioeconómicas parecem influenciar as práticas sociais e culturais usadas pelos sujeitos institucionalizados na reinvenção as suas vidas pessoais e sociais e na criação de respostas positivas perante as perdas que os afetam (Cuenca, 2012, 2013). Com efeito, percebemos nas narrativas dos sujeitos entrevistados que a realização de atividades culturais, transformadas em momentos privilegiados de experiências de ócio, parecem influir de forma tendencialmente positiva nas estratégias fundamentais de manutenção de papéis sociais e de ligações às redes de apoio, impedindo o sentimento de rutura social e de corte das relações sociais e comunitárias. Nesta linha de argumentação, as experiências de ócio, proporcionadas pelas atividades culturais, parecem salientar-se enquanto contextos fecundos de estratégias de adaptação à perda, influindo na capacidade de resiliência e de bem-estar do sujeito.

Neste contexto, os resultados do nosso estudo apontam para a importância de, nas estruturas residenciais, as pessoas idosas terem a oportunidade de (re)elaborar os seus tempos, de (re)construir a sua temporalidade, pois só, sob a condição de manter a sua autonomia, conseguirão uma nova apropriação da sua identidade e da sua narrativa pessoal.

Assim sendo, a adaptação à perda parece passar pela transformação dos tempos desocupados em experiências de ócio, tempos de solidão e alienação em tempos de autonomia pessoal e de (re)construção da própria identidade pessoal, cultural e social. Neste sentido, a complementaridade existente na relação entre as atividades culturais e o ócio pode resultar em novas formas de intervir ao proporcionar, ao indivíduo institucionalizado, a vivência da sua temporalidade e novas relações com a perda, impedindo-o de ficar imóvel e ausente num mundo impessoal, fluido, frenético e individualista.

 

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Endereço para correspondência:
Jenny Gil Sousa
Rua Dr. João Soares, apartado 4045, 2411-901
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E-mail: jgil.sousa@gmail.com

Maria Manuel Baptista
Campus Universitário de Santiago, 3810-193
Aveiro, Portugal.
E-mail: mbaptista@ua.pt

Recebido em: 12/03/2015
Revisado em: 15/05/2015
Aceito em: 29/06/2015

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