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Revista Subjetividades

versión impresa ISSN 2359-0769versión On-line ISSN 2359-0777

Rev. Subj. vol.21 no.spe Fortaleza  2021

http://dx.doi.org/10.5020/23590777.rs.v21iesp1.e9459 

ESPECIAL: PSICOLOGIA & FENOMENOLOGIA

 

Pequenos exercícios experimentais da liberdade: articulações entre arte, clínica e política

 

Small Experimental Exercises in Freedom: Articulations between Art, Clinic and Politics

 

Pequeños Ejercicios Experimentales de la Libertad: Articulaciones entre Arte, Clínica y Política

 

Petits Exercices Expérimentaux en Liberté : Articulations entre Art, Clinique et Politique

 

 

Alice Vignoli ReisI; Mônica Botelho AlvimII

IPsicóloga formada pela Universidade de São Paulo (USP). Doutoranda em Psicologia no Programa de Pós Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)
IIPsicóloga, Gestalt-Terapeuta, doutora em psicologia e pós-doutorado em filosofia contemporânea pela Universidade Paris 1, Panthéon-Sorbonne. Docente no Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ)

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente trabalho apresenta uma articulação teórica, com um referencial interdisciplinar, que põe em diálogo os campos da arte, da clínica e da política. Tal articulação foi desenvolvida ao longo de uma pesquisa-ação com jovens em favelas cariocas que tinha como mote central a indagação sobre as possibilidades de reinvenção de um espaço urbano fortemente fragmentado e estratificado, demarcado pela segregação socioespacial. A constatação de que a fragmentação urbana característica das grandes cidades no contexto do capitalismo produz diferentes modos de vida e formas de subjetivação, estabelecendo fronteiras de convívio e afetando o estabelecimento de relações de alteridade, nos conduziu a pensar as possibilidades de reconfiguração sensível do mundo comum. Nesse sentido, nossas explorações teórico-práticas deram-se nessa articulação interdisciplinar em torno das temáticas do corpo, da experiência sensível e intercorporal, da alteridade e da criação como invenção e reinvenção da vida, apontando para o entrelaçamento de suas dimensões ética, estética e política. O artigo apresenta, em primeiro plano, o recorte teórico da pesquisa, discutindo uma perspectiva fenomenológica da subjetividade como corporeidade, ancorada no pensamento de Merleau-Ponty, assim como o trabalho clínico inspirado nessa perspectiva, em suas interfaces com o campo da arte e seu caráter de ação política. A partir de um breve olhar para a experiência com os jovens nessa pesquisa-ação, conclui-se considerando que o diálogo da psicologia com a arte tem a potência de ativar a dimensão lúdica, propiciar a criação de uma linguagem comum, permitindo a criação de dispositivos clínico-artísticos que possibilitam a recriação de si e das relações de alteridade na vivência do espaço urbano, atualizando possibilidades de reconfiguração sensível. O corpo teórico de ideias, inseparável de uma ação prática de pesquisar com os jovens, possibilitou criar uma metodologia lúdica de pesquisa e intervenção no espaço urbano.

Palavras-chave: ética; estética; clínica; política; fenomenologia.


ABSTRACT

The present work presents a theoretical articulation with an interdisciplinary framework, which brings the art, clinic, and political fields into dialogue. Such articulation was developed during the action research with young people in Rio de Janeiro slums whose central theme was the question of the possibilities of reinventing a strongly fragmented and stratified urban space demarcated by socio-spatial segregation. The observation that the urban fragmentation characteristic of big cities in the context of capitalism produces different ways of life and forms of subjectivation, establishing boundaries of coexistence and affecting the establishment of alterity relationships, led us to think about the possibilities of sensitive reconfiguration of the ordinary world. In this sense, our theoretical-practical explorations took place in this interdisciplinary articulation around the themes of the body, sensitive and intercorporeal experience, otherness, and creation as an invention and reinvention of life, pointing to the intertwining of its ethical, aesthetic, and politics. The article presents, in the foreground, the theoretical framework of the research discussing a phenomenological perspective of subjectivity as corporeity, anchored in the thought of Merleau-Ponty, as well as the clinical work inspired by this perspective in its interfaces with the field of art and its character of political action. From a brief look at the experience with young people in this action research, it is concluded that the dialogue between psychology and art has the power to activate the playful dimension, providing the creation of a common language, allowing the creating of clinical-artistic devices that enable the recreation of the self and the relations of alterity in the experience of urban space, updating possibilities for sensitive reconfiguration. The theoretical body of ideas, inseparable from a practical action of researching with young people, made it possible to create a playful research and intervention methodology in the urban space.

Keywords: ethics; aesthetics; clinic; politics; phenomenology.


RESUMEN

El presente trabajo presenta una articulación teórica, con un referencial interdisciplinar, que pone en diálogo los campos del arte, de la clínica y de la política. Tal articulación fue desarrollada a lo largo de una investigación-acción con jóvenes en favelas cariocas que tenía como lema central la indagación sobre las posibilidades de reinvención de un espacio urbano fuertemente fragmentado y estratificado, demarcado por la segregación socio espacial. La constatación de que la fragmentación urbana característica de las grandes ciudades en el contexto del capitalismo produce diferentes modos de vida y formas de subjetivación, estableciendo fronteras de convivencia y afectando el establecimiento de relaciones de alteridad, nos condujo a pensar las posibilidades de reconfiguración sensible del mundo común. En este sentido, nuestras investigaciones teórico-prácticas ocurrieron en esta articulación interdisciplinar en vuelta de las temáticas del cuerpo, de la experiencia sensible e intercorporal, de la alteridad y de la creación como invento y reinvento de la vida, indicando el entrelazamiento de sus dimensiones ética, estética y política. El artículo presenta, en primer plano, el recorte teórico de la investigación, discutiendo una perspectiva fenomenológica de la subjetividad como corporeidad, anclada en el pensamiento de Merleau-Ponty, así como el trabajo clínico inspirado en esta perspectiva, en sus interfaces como el campo del arte y su carácter de acción político. A partir de un breve vistazo en la experiencia con jóvenes en esta investigación, se concluye considerando que el diálogo de la psicología con el arte tiene el poder de activar la dimensión lúdica, propiciar la creación de un lenguaje común, permitiendo la creación de dispositivos clínico-artísticos que posibilitan la recreación de uno mismo y de las relaciones de alteridad en la experiencia del espacio urbano, actualizando posibilidades de reconfiguración sensible. El cuerpo teórico de ideas, inseparable de una acción práctica de investigación con los jóvenes, posibilitó crear una metodología lúdica de investigación e intervención en el espacio urbano.

Palabras-clave: ética; estética; clínica; política; fenomenología.


RÉSUMÉ

Le présent travail présente une articulation théorique, avec un cadre interdisciplinaire, qui fait dialoguer les domaines de l'art, de la clinique et de la politique. Une telle articulation a été développée lors d'une recherche-action avec des jeunes qui habitent des bidonvilles à Rio de Janeiro. Le thème de la recherche est la possibilité de renouveler un espace urbain qui est fortement fragmenté et stratifié, délimité par la ségrégation socio-spatiale. Nous avons vu que la fragmentation urbaine caractéristique des grandes villes dans le contexte du capitalisme produit des modes de vie et des formes de subjectivation différents. Cela génère des frontières de coexistence et en affectant l'établissement de relations d'altérité, nous a amenés à réfléchir aux possibilités de reconfiguration sensible du commun monde. En ce sens, nos explorations théorie-pratiques se sont déroulées dans cette articulation interdisciplinaire autour des thèmes du corps, de l'expérience sensible et intercorporelle, de l'altérité et de la création comme invention et réinvention de la vie, en pointant vers l'imbrication de leurs dimensions éthiques, esthétiques et politiques. L'article présente, au premier plan, le cadre théorique de la recherche, en montrant une perspective phénoménologique de la subjectivité comme corporéité, basée sur la pensée de Merleau-Ponty. Le travail présente, aussi, le travail clinique inspiré par cette perspective, montrant ses interfaces avec les domaines de l'art et son caractère d'action politique. À partir d'un bref aperçu de l'expérience avec les jeunes dans cette recherche-action, il est conclu que le dialogue entre la psychologie et l'art a le pouvoir d'activer la dimension ludique, fournissant la création d'un langage commun, en rendant possible la conception de dispositifs clinique-artistiques qui permettent la recréation du soi et des relations d'altérité dans l'expérience de l'espace urbain, en mettant à jour les possibilités de reconfiguration sensible. Le corpus théorique, indissociable de l'action pratique de recherche avec les jeunes, a permis de créer une méthodologie de recherche et d'intervention ludique dans l'espace urbain.

Mots-clés: éthique; esthétique; clinique; politique; phénoménologie.


 

 

Este artigo propõe uma tessitura teórica entre os campos da estética, da clínica e da política, articulando psicologia, arte e filosofia para pensar a ação clínica e as concepções acerca dos processos de produção de subjetividades que lhe são subjacentes. Considerando a clínica para além dos modelos clássicos de consultório e tendo como referência os modelos clínicos que se voltam para práticas mais engajadas com a transformação social, assumimos em nosso horizonte a compreensão de que esse deslocamento guarda uma dimensão política que é indissociável da dimensão estética e da dimensão ética, como pretendemos argumentar aqui. O corpo e a dimensão sensível, o outro e a criação se constituem como elementos centrais para nossa reflexão.

Apresentamos um recorte de uma pesquisa mais ampla, no contexto de um projeto de pesquisa-ação com crianças e jovens moradores de favelas cariocas, em torno do tema do corpo no espaço urbano e o direito à cidade. O projeto era interdisciplinar, articulava fenomenologia, Gestalt-terapia e arte contemporânea, e propunha experimentações artísticas multiculturais com as crianças e adolescentes, visando trabalhar os processos de produção de subjetividades a partir de uma proposta clínica transdisciplinar que acolhesse as questões emergentes naquele tempo-espaço singular. As oficinas realizadas com os jovens eram pensadas a partir de uma questão orientadora: "Como é ser criança/adolescente na favela da Mangueira?". A exploração dessa questão estabeleceu um campo de experimentações, no qual, aos poucos, a temática das fronteiras urbanas foi se delineando como uma questão contundente a ser trabalhada. As ações dessa pesquisa passaram por aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O projeto teve registro CAAE 5082481500005582, tendo sido aprovado pelo Parecer n.º 1.359.063.

Compreendemos que a fragmentação urbana que experimentamos nas grandes cidades - intrinsecamente relacionada ao nosso modo de produção econômica - produz diferentes modos de vida e formas de subjetivação, estabelecendo também fronteiras de convívio e impossibilidades de estabelecimento de relações de alteridade. Compreendemos ainda que estamos cotidianamente construindo a cidade a partir das nossas práticas, percursos e discursos. Essas constatações nos levaram a indagar, junto aos jovens, quais seriam as possibilidades de reinvenção desse espaço urbano fortemente fragmentado e estratificado, indagação que passou a orientar nossas pesquisas ao longo dos anos de 2015 e 2016.

O processo investigativo e de criação que vivemos com as crianças e adolescentes e a equipe pedagógica da ONG parceira Arte de Educar nos levou a criar dispositivos de investigação e experimentação do espaço urbano, que consistiram na instauração de pequenos espaços criativos de circulação e convivência na cidade. Inspirados na noção de "exercício experimental da liberdade" (Brett, 2005), que o crítico de artes Mário Pedrosa usava para se referir aos trabalhos dos artistas brasileiros Lygia Clark e Hélio Oiticica, chamamos esses laboratórios urbanos de "pequenos (e acadêmicos) exercícios experimentais da liberdade" (Reis, 2017, p. 55). Esses dispositivos de pesquisa-ação inspiraram-se no referencial teórico da performance e tinham a intenção de instaurar espaços que permitissem revolver os sedimentos do corpo, promover a estranheza sobre as formas naturalizadas e habituais de circular e de habitar na cidade. Apostávamos que o espanto provocado pelo inusitado abriria nossas possibilidades de pensamento sobre o espaço urbano e as formas possíveis de reinventá-lo. A criação desses dispositivos orientou-se pela ideia central da convivência, devido à constatação de que é por ela que se torna possível a abertura ao contato sensível ao outro, à produção do comum (Hardt & Negri, 2004), e de que essa ação está cada vez mais impedida pelo processo de fragmentação urbana e pelo imperativo capitalístico de circulação.

Neste artigo discutiremos o corpo teórico de ideias que entretecemos para dar sustentação a esse processo de pesquisa e intervenção no espaço urbano, deixando, entretanto, espaço para pequenos diálogos com a ação prática de intervenção na pesquisa de campo. Durante o processo, algumas questões fundamentais orientavam nosso pensamento: como se dá a relação entre corpo e cidade e, por consequência, entre corpo e espaço? Como a segregação socioespacial atua na produção de corporeidades? Como se delimitam as fronteiras urbanas? Essas questões, de alguma forma, respondiam a um anseio de pensar em como é possível produzir comum na cidade, estabelecer formas de comunicação entre habitantes de territórios estrangeiros - atuar em favorecimento do que Hélio Oiticica (1986) chama de "descondicionamento social" (p. 29). Foi o processo reflexivo desencadeado por essas perguntas que nos conduziu à necessidade de pensar na imbricação entre arte, clínica e política enquanto dimensões da existência humana que se articulam em torno da possibilidade de reconfiguração de nossas cartografias subjetivas.

 

Uma Perspectiva Fenomenológica da Subjetividade

Um ponto de partida importante para a reflexão que propomos aqui é a circunscrição, ainda que breve, da forma como compreendemos e abordamos o que se convencionou chamar, no ambiente acadêmico, de processo de produção de subjetividades. Um dos autores centrais que orienta nossa compreensão nesse sentido é o filósofo francês Maurice Merleau-Ponty, autor do campo da fenomenologia, para quem a existência humana é fundamentalmente corporal. O filósofo (Merleau-Ponty, 1945/1999) entende o corpo como "nó de significações vivas" (p. 210), resultante das correlações complexas entre corpo e ambiente. Esse conceito de corporeidade busca avançar sobre as noções clássicas do pensamento cartesiano de separação entre res cogitans (mente) e res extensa (corpo), e propõe o corpo como sujeito da experiência, em contraposição à ideia clássica e cartesiana do corpo que embute uma dicotomia entre sujeito e objeto. De acordo com Merleau-Ponty (1945/1999), o corpo, imbricado ao mundo, constitui-se junto com ele, em um processo de produção permanente de possibilidades de existência inaugurado pelas faculdades perceptivas de um sujeito.

De acordo com Alvim (2014), na perspectiva de Merleau-Ponty, o papel do corpo - considerado estruturante do espaço - é operar, por meio da percepção, uma síntese de transição que nos permita compreender o mundo de dentro dele, numa relação com as coisas do mundo que se dá pelos movimentos do corpo, que avança e recua, dá voltas, reúne perspectivas. Essa compreensão se dá a partir não de uma operação reflexiva, mas por um sentimento de poder/possibilidade dado pela inserção no campo em que se localizam as sensações. Um bebê que é colocado frente a um prato de comida vê o prato, sente o seu odor e seu corpo tem a possibilidade de agir de diferentes maneiras a partir dessas afetações - dirigir seu corpo ao prato, tatear a comida, leva-la à boca, sentir sua textura e temperatura ou também afastar-se do prato, ir em busca de outras fontes sensoriais. De qualquer forma, naquele momento, seu mundo constitui-se em um mundo no qual há um prato de comida à sua frente, com certas cores e sabores, com o qual ele se relaciona de maneira primordialmente sensível. A capacidade de sentir não seria uma reação, mas uma copresença com as coisas; o mundo pensado das ideias, das representações, se construiria sobre o mundo pré-reflexivo da experiência.

A partir das afetações perceptivas, da sua imbricação ao mundo, o corpo age e, ao agir, formula conhecimento e produz significado, em uma operação que o filósofo denomina de praktognosia. A transposição desse conhecimento motor, de forma renovada, para outras situações configura o hábito. "A síntese de transição - espacial - temporal - acontece a partir da articulação que o corpo faz do hábito com a situação da experiência atual no mundo e aquilo que vislumbro como possibilidade futura, constituindo um campo de presença" (Alvim, 2014, p. 281). Todo o passado de um aprendizado prático inscrito no corpo aparece na forma do hábito e se atualiza no momento presente, em virtude daquilo que o sujeito vislumbra como possibilidade de ação. Dessa forma, uma vez que concebe o gesto do corpo, ação humana, como síntese entre um passado e um horizonte de porvir, Merleau-Ponty ressalta um caráter eminentemente temporal da existência.

Essa temporalidade tem um caráter ambíguo: ao mesmo tempo em que é pessoal - ligada à existência singular de um ser no tempo - é impessoal, uma vez que há uma temporalidade do mundo que transcorre à revelia da nossa existência singular e nos coloca um caráter transcendente de nossa existência. O corpo, imbricado no mundo, realiza a todo o momento sínteses de horizontes temporais, tanto entre passado, presente e futuro quanto entre o caráter pessoal e impessoal da existência.

Para adivinhar essa existência informe que precede minha história e a terminará, só preciso observar em mim este tempo que funciona por si só e que minha vida pessoal utiliza sem mascará-lo inteiramente. Porque sou mantido na existência pessoal por um mundo que não constituo, todas as minhas percepções se perfilam sobre um fundo de natureza. Enquanto percebo, e mesmo sem nenhum conhecimento das condições orgânicas da minha percepção, tenho consciência de integrar "consciências" sonhadoras e dispersas, a visão, a audição, o tato, com seus campos que são anteriores e permanecem estranhos à minha vida pessoal. O objeto natural é o rastro dessa existência generalizada. E, em primeiro lugar, todo objeto será, em algum aspecto, um objeto natural. Ele será feito de cores, de qualidades táteis e sonoras, se ele deve poder entrar em minha vida. (Merleau-Ponty, 1945/1999, p. 465)

Em sua ontologia da carne, o filósofo (Merleau-Ponty, 1964/2000) aprofunda o caráter de generalidade das dimensões sensíveis - a possibilidade de ver e ser visto, tocar e ser tocado, ouvir e ser ouvido - que nos coloca no âmbito de uma existência anônima, universal, dada pela "certeza injustificável da existência de um mundo sensível, comum a todos nós" (Merleau-Ponty, 1964/2000, p. 23), dimensão da consciência que Merleau-Ponty denomina como fé perceptiva. O filósofo ressalta que se não é de todo surpreendente que as funções sensoriais e perceptivas depositem diante de si um mundo natural anônimo e universal, uma vez que elas são pré-pessoais, podemos nos admirar com o fato de que os objetos culturais também trazem esse rastro de uma vida anônima ao trazerem, implicitamente, a marca da ação humana a qual servem, de forma que no objeto cultural sentimos, "sob um véu de anonimato, a presença próxima de outrem" (Merleau-Ponty, 1945/1999, p. 466).

Ao discutir o problema do outro, Merleau-Ponty (1945/2011) tece considerações a respeito da possibilidade de estabelecermos relações de alteridade e concebermos a existência de outrem em nossas vidas. Para o filósofo, se parto de uma perspectiva cartesiana de subjetividade como cogito - a subjetividade como algo que se constitui a partir do pensamento - a existência do outro se torna algo impossível e contraditório, uma vez que, se constituo o mundo com meu pensamento, sou sujeito e o outro se figura a mim como objeto. Desse modo, não poderia ser ele mesmo um sujeito, porque aí teria que ele também constituir um mundo no qual eu figuraria como objeto.

[Para o pensamento objetivo] existem dois e somente dois modos de ser: o ser em si, que é aquele dos objetos estendidos no espaço, e o ser para si, que é aquele da consciência. Ora, diante de mim outrem seria um em si, e todavia ele existiria para si, para ser percebido ele exigiria de mim uma operação contraditória, já que ao mesmo tempo eu devo distingui-lo de mim, portanto situá-lo no mundo dos objetos, e pensa-lo como consciência, quer dizer, como uma espécie de ser sem exterior e sem partes ao qual só tenho acesso porque ele sou eu, e porque nele se confundem aquele que pensa e aquele que é pensado. Portanto no pensamento objetivo não há lugar para outrem e para a pluralidade de consciências. Se eu constituo mundo, não posso pensar uma outra consciência, pois seria preciso que ela também o constituísse e, pelo menos em relação a esta outra visão sobre o mundo, eu não seria constituinte. Mesmo se eu a pensasse como constituindo mundo, seria eu ainda que a constituiria como tal e, novamente eu seria o único constituinte. (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 468)

Haveria aí uma contradição que só poderia ser solucionada ao voltarmos a atenção ao âmbito primordialmente intersubjetivo e intercorporal da existência, à percepção do outro enquanto percepção sensível, e não como uma percepção que se dá a partir de um pensamento desconectado de sua dimensão corpórea. Nessas condições, segundo o filósofo, as antinomias do pensamento objetivo desapareceriam: "Pela reflexão fenomenológica, encontro a visão não como 'pensamento de ver', segundo expressão de Descartes, mas como olhar em posse de um mundo visível, e é por isso que aqui pode haver para mim um olhar de outrem" (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 471) - ao que ele continua, afirmando o caráter essencialmente cognoscente do corpo: "este instrumento expressivo que chamamos de um rosto pode trazer uma existência assim como minha existência é trazida pelo aparelho cognoscente que é meu corpo" (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 471).

Contudo é importante frisar que a percepção de outrem não aparece por meio de uma espécie de "raciocínio por analogia": não reconheço os movimentos e afetos de outro corpo porque os imagino similares aos meus - na verdade, a percepção do corpo de outrem precede e possibilita a constituição mesma daquilo que reconheço como meu corpo, minhas expressões emocionais. Merleau-Ponty traz o exemplo de um bebê de quinze meses, que embora quase não tenha visto seu rosto em um espelho e haja uma grande diferença entre os seus dentes e os de um adulto, "abre a boca se por brincadeira ponho um de seus dedos entre meus dentes e faço menção de mordê-lo" (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 471).

Isso ocorre porque sua própria boca e seus dentes, tais como ele os sente do interior, são para ele imediatamente aparelhos para morder, e porque minha mandíbula, tal como ele vê do exterior, é para ele imediatamente capaz das mesmas intenções. A "mordida" tem para ele imediatamente uma significação intersubjetiva. Ele percebe suas intenções em seu corpo, com o seu corpo percebe o meu, e através disso percebe em seu corpo minhas intenções. (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 471)

Portanto, para Merleau-Ponty, entre o meu corpo fenomenal e o corpo do outro visto do exterior, existe uma relação interna que faz outrem aparecer como um "prolongamento miraculoso" de minhas próprias intenções, "uma maneira familiar de tratar o mundo" (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 474), de forma que sua evidência é possível porque eu não sou transparente a mim mesmo e minha subjetividade "arrasta seu corpo atrás de si" (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 472). O aprendizado prático que se dá no encontro entre meu corpo e o corpo do outro, situados no mesmo mundo, nos coloca defronte um certo caráter impessoal da existência: aprendo que neste mundo bebe-se, come-se, senta-se, cumprimenta-se, ama-se, dança-se, dimensão habitual do corpo que nos insere no mundo da cultura e nos permite compartilhar um plano comum de experiência. Esse compartilhamento de "formas corporais e gestuais sedimentadas na cultura como um fundo anônimo" (Alvim, 2018, p. 345) revela um caráter essencialmente intersubjetivo da existência, dimensão originária que é, ao mesmo tempo, de todos e de ninguém, com a qual entramos em contato através da experiência de ser um corpo vivo no espaço:

como as partes de meu corpo em conjunto formam um sistema, o corpo de outrem e o meu são um único todo, o verso e o reverso de um único fenômeno, e a existência anônima da qual meu corpo é a cada momento o rastro habita doravante estes dois corpos ao mesmo tempo. (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 474)

O comportamento do corpo de outrem, esse estranho a si mesmo com o qual o sujeito se depara, seria o primeiro de todos os objetos culturais e aquele através do qual todos os outros existem (Merleau-Ponty, 1945/1999). Seria na relação com outrem que o sujeito completa a si como existência objetiva, que passa de uma consciência de mundo escorregadia, um sentimento de poder em relação ao mundo, a uma concretude da realização daquilo que sente. A constatação da existência do outro é uma operação corporal, empática, e conduz ao que o filósofo compreende como intercorporeidade, uma espécie de generalidade do sentir, uma sensibilidade em geral que partilhamos com o outro. Digo que o outro é um segundo eu mesmo, em primeiro lugar, porque seu corpo vivo tem a mesma estrutura que o meu. Antes de percebê-lo como um ser pensante, o percebo como um ser percipiente (Merleau-Ponty, 1945/2011). Abandona-se a visão objetivista do outro corpo como um "simples fragmento do mundo", de forma que ele passa a ser o "lugar de uma certa elaboração e como que de uma certa 'visão' do mundo" (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 474) que compartilho com o outro.

Entretanto o lugar que o outro habita no mundo, sua forma singular de se apropriar desse fundo anônimo da cultura, nunca vai ser inteiramente coincidente com meu estilo pessoal de existir neste mundo em geral, com a posição de onde vejo, percebo e sinto: embora saiba o que é sentir cólera, nunca saberei qual é a sensação da cólera experimentada pelo meu amigo - para usar um exemplo dado por Merleau-Ponty. Dessa maneira, o reconhecimento da dimensão intersubjetiva e intercorpórea, ao mesmo tempo que nos coloca em um plano comum de experiência, nos coloca frente à tensão viva do contato com a diferença apresentada pelo outro. "Importante lembrar que o intersubjetivo não é consciência coletiva: a intersubjetividade envolve relação viva e tensão, uma vez que não é separada da subjetividade como singularidade que cria, gerando diferença e movimento no campo" (Alvim, 2018, p. 345).

Ao longo do desenvolvimento de sua obra, Merleau-Ponty (1964/2000) deixará aos poucos o ponto de vista de um corpo-sujeito para enfatizar a noção de carne, propondo uma espécie de passividade do eu ao campo, a um "Ser Bruto" que comporta eu e outro, cultura, historicidade e temporalidade. A crítica a uma consciência transparente em si e para si mesma, capaz da posse intelectual do mundo posto por ela como articulação de conceitos e também a uma concepção do corpo como pura exterioridade das coisas, como composição ou mosaico de partes isoláveis (Chauí, 2008), conduz o pensamento do filósofo a propor um campo primordial, indiferenciação original de onde brota o sentido e a partir do qual se tece o sujeito como diferença. Essa concepção traz em si um aprofundamento do movimento de descentramento da noção de subjetividade - não é possível pensar em um sujeito que se constitui a partir de um interior psíquico individual, afirmando-se em contrapartida o sujeito como aquele que se constitui na tensão entre o singular e o universal, que se diferencia em relação a um fundo comum, mas que traz, em cada gesto singular, elementos desse fundo carnal vivido de modo intercorporal. Também não é possível pensar em um sujeito descolado do mundo, descolado da historicidade inscrita em seus hábitos corporais, inscrita em seu discurso, inscrita na linguagem que o constitui.

O "Ser Bruto" descrito pelo filósofo (Merleau-Ponty, 1964/2000) comporta um fundo invisível que sustenta o aparecimento dos visíveis - gestos, expressões do corpo, objetos naturais e culturais. A fala, por exemplo, emerge como visível do fundo invisível da linguagem. Esse invisível comporta sempre o estranho, o não conhecido, cujo contato provoca estremecimento e convoca à criação de novos sentidos, experiência de descentramento que Merleau-Ponty descreve como um movimento arrebatador que ocorre na relação com outrem, movimento

de um eu conhecido e visível em mim e no outro, quando reconheço nele gestos humanos familiares, a um invisível que se põe a partir de uma diferença que sinto que me lança no terreno da dúvida, me desorienta, obrigando a um trabalho que transforme diferenças opacas em sentido. (Alvim, 2014, p. 292)

A instituição de sentido se faz enquanto expressão, práxis corporal que se dá na tensão do contato com a diferença e nos dá a possibilidade de ser. Eu estou "ultrapassado de todos os lados por meus próprios atos, afogado na generalidade, todavia sou aquele por quem eles são vividos" (Merleau-Ponty, 1945/2011, p. 480) - se, de um lado, todos os meus gestos constituem-se de tecido de mundo, pertencem a uma generalidade do humano; por outro, a mim me é dada a possibilidade de diferir, criar modos singulares de expressão. O corpo como um eu posso - capacidade criativa - não me deixa cair absolutamente no campo da generalidade:

(...) com minha primeira percepção foi inaugurado um ser insaciável que se apropria de tudo aquilo que pode encontrar, a quem nada pode ser pura e simplesmente dado porque ele recebeu o mundo em partilha e desde então traz em si mesmo o projeto de todo ser possível, porque de uma vez por todas este foi cimentado em seu campo de experiências. (Merleau-Ponty, 1945/1999, p. 480)

A partir dessa discussão, podemos circunscrever a nossa compreensão da produção de subjetividades-corpos como algo que se dá no campo, no entrelaçamento entre corpo e mundo; produção que tem o sensível como caráter originário e se dá a partir da intercorporeidade; que se revela enquanto expressão do corpo que, sustentada por um fundo invisível de historicidade, natureza, cultura, instaura um espaço-tempo, institui novos sentidos.

 

Ética, Estética, Clínica e Política

A tessitura intersubjetiva do mundo apresenta um complexo entrelaçamento de forças políticas, históricas, biológicas, tecnológicas, econômicas etc, que fica inscrito na corporeidade de uma pessoa. Os hábitos do corpo carregam uma historicidade que ultrapassa a história individual de um sujeito, ao mesmo tempo em que se constroem de forma singular dentro do tempo de uma existência pessoal. O sentido de possibilidade dado pelo corpo - esta capacidade criativa e singular de cada composição corporal/subjetiva - coloca-nos na posição de ser mais ou menos inventivos em relação a este mundo que constituímos e que também nos constitui, estar mais ou menos enredados nas formas já instituídas de experiência.

Suely Rolnik (1996) - que também assume a dimensão sensível como fundamental para os movimentos de produção de subjetividades - afirma que a expansão da vida se dá pela produção de diferenças e a afirmação de novas formas de existência. A autora cria o conceito de corpo vibrátil para se referir ao corpo que, em sua imbricação sensível no mundo, cria novas possibilidades de ser - "potência que nosso corpo tem de vibrar a música do mundo, composição de afetos que toca em nós ao vivo" (Rolnik, 1999, p. 3).

A constelação de tais afetos forma uma realidade sensível, corpórea, que embora invisível não é menos real do que a realidade visível e seus mapas. É o mundo compondo-se e recompondo-se singularmente na subjetividade de cada um. Muda o mundo, muda a consistência sensível da subjetividade, indissociavelmente: entre eu e o outro, desencadeiam-se devires não paralelos de cada um, num processo sem fim. (Rolnik, 1999, p. 3)

Corpo e mundo, dimensões distintas de um mesmo todo, constituem-se mutuamente e reconfiguram-se a todo o momento em um processo que é tenso, pois a criação de novas formas - a expansão da vida - exige a morte de velhas formas, o "enfrentamento cotidiano com o trágico", com a morte de si (Rolnik, 1999). O abismo que representa esse enfrentamento pode levar a subjetividade a estancar em modos estereotipados de produção de si ou então a cair num fosso profundo em que o trágico leva a um vazio, produção da diferença em labirinto, modos nos quais "desativa-se o processo de criação experimental da existência" (Rolnik, 1996, p. 3). Segundo a autora (Rolnik, 1999), esse processo fica particularmente comprometido no modelo de subjetivação característico do modo capitalista de produção - sustentado por uma epistemologia racionalista e dualista - quando há a predominância de um princípio identitário a reger a construção da subjetividade, sob o regime exclusivo da representação. Nesse modelo, o campo da criação, de "enfrentamento com o trágico", fica confinado à esfera da arte, de forma que o homem comum "perde as rédeas desta atividade de criação de valor e sentido para as mudanças que se operam incessantemente em sua existência, e passa a orientar-se em função de cartografias gerais, estabelecidas a priori, a serem passivamente consumidas" (Rolnik, 1999, p. 3). A figura do indivíduo extrai o senso de si "de uma imagem vivida como essência que se mantêm idêntica a si mesma, imune à alteridade e seus efeitos de turbulência" (Rolnik, 1999, p. 3). O poder transformador do contato com a alteridade e a diferença esteriliza-se pelo medo provocado pela ideia ilusória de que o colapso causado pelo enfrentamento com o trágico é o colapso da própria subjetividade em sua essência (Rolnik, 1999).

Esse medo do aniquilamento de si, de que nos fala Suely Rolnik, leva a uma anestesia do sensível, uma vez que este convoca a criação de novas formas. Segundo Alvim (2012) o sentir é pathos de abertura, dimensão pré-reflexiva, "entrega ao campo e ao diferente que me afeta, convoca e anima, fazendo nascer um excitamento e um movimento corporal espontaneamente orientado ao futuro que se avizinha e se liga ao passado, fundo habitual que sustenta a formação de Gestalt" (Alvim, 2012, p. 1009). O distanciamento do caráter sensível da experiência conduz a uma perda de contato com o mundo e um refúgio em representações - ideias já instituídas e cristalizadas. A subjetividade fica enredada em formas corporais automatizadas. A autora afirma que, se olharmos ao nosso redor, veremos que vivemos em uma sociedade na qual os modelos de pensamento estão intensamente perpassados por uma lógica racionalista e dualista, o que conduz à formação de uma sociedade enferma, dicotômica e distanciada da criação espontânea de novas formas (Alvim, 2014).

O resgate da dimensão sensível da experiência apresenta-se, portanto, como tema fundamental da concepção de clínica aqui desenvolvida, referenciada nas propostas de Alvim (2014) e Rolnik (1999). É a sensibilização do corpo que pode ativar o caráter experimental de criação da existência, restituir o fluxo de criação de novas formas, ativar o processo de produção de novos sentidos. Baseadas na perspectiva de Merleau-Ponty (1954-55/2012), compreendemos esse movimento de produção de sentidos não como um movimento que acontece do interior de uma consciência fechada que se direciona para o mundo, ou do encontro de duas consciências fechadas em si, mas como movimento que emerge de um campo, de uma constelação de forças e sentidos que se expressam em nossos corpos: movimento instituinte, prenhe de gestos e acontecimentos matrizes que instauram novos modos de ser, novas modalidades de organização do tempo e do espaço, o que nos remete à noção de instituição proposta por Merleau-Ponty.

Entende-se aqui por instituição aqueles acontecimentos de uma experiência que a dotam de dimensões duráveis, com relação às quais uma série de outras experiências terão sentido, formarão uma sequência pensável ou uma história. Ou ainda os acontecimentos que depositam sentido em mim, não a título de sobrevivência ou de resíduo, mas como apelo a uma exigência de porvir. (Merleau-Ponty, 1954-55/2012, p. 89)

Considerando a intercorporeidade como aspecto central da produção de subjetividade, podemos afirmar que a produção de novos sentidos acontece na expressão espontânea que nasce do contato com outrem, sendo este, ao mesmo tempo, idêntico e estranho a si mesmo. Dessa forma, Alvim (2012) nos convida a conceber uma perspectiva clínica em que o terapeuta convoque, a partir de um trabalho de desnaturalização da percepção, à produção de sentidos que seja desviante em relação à produção automática e repetitiva de sentidos engendrada por um corpo anestesiado e distanciado da experiência do mundo. A autora desenvolve a noção de "desajustamento criador" (Alvim, 2014, p. 299) - ação de produção do contraditório que aciona os sentidos, a corporeidade, remetendo à experiência estética - para que assim abra-se a possibilidade de produção da novidade, da diferença. Uma vez que a existência humana tem um aspecto eminentemente temporal, o trabalho clínico envolve uma atenção ao "fluxo de formação de formas, de sentidos, se fazendo de modo fugaz e efêmero" (Alvim, 2018, p. 346), atenção que se dá em um nível estético, pelo engajamento do corpo na dimensão sensível, solo comum que garante o meu pertencimento com o outro a um mesmo mundo.

É porque eu conheço o sentimento da raiva, as afetações que provoca em meu corpo, que posso me conectar - no sentido de acompanhar com o corpo e o olhar - às manifestações de raiva de outrem. Contudo é também porque tenho meu modo singular de experienciar a raiva e de me afetar com as expressões do seu corpo que, ao me engajar nessa dimensão intercorporal, apresento ao outro uma diferença, uma novidade que o descentra de um fluxo de formação de formas e exige dele um trabalho de criação de sentidos. A experiência da alteridade, portanto, implica ambos - paciente e terapeuta - em um processo de transformação, de trânsito da forma.

O contato com o mundo e com o outro que se dá a partir da via da sensibilidade ressalta um caráter ambíguo da experiência, que implica, ao mesmo tempo, operações de identidade e estranhamento - reconheço gestos comuns em mim e no outro, mas nossos mapas cambiantes de composição de mundo, arranjos singulares e constantes do corpo e do ambiente me colocam frente a um "sertão desconhecido, reflexo da inexaurível alteridade do mundo" (Alvim, 2014, p. 279), e implicam um tipo de contato que tem um equilíbrio provisório, ameaçado: "tensões entre planos visíveis e invisíveis, conhecidos e desconhecidos, perfis que me aparecem, outros que aparecem ao outro e que ao comporem a totalidade da experiência não se dispersam, mas se resolvem, se escoram mutuamente dentro do espaço vivido" (Alvim, 2014, p. 279). Durante o processo de "neurotização social", engendrado pela predominância em nossa sociedade ocidental de uma epistemologia que busca uma consciência transparente a si mesma e instaura um tipo de pensamento que é mecanicista, racionalista e dualista, essa noção de ambiguidade teria sido alijada. A retomada da experiência estética resgata o caráter ambíguo da existência, permite que vivamos a poética do estranho, do estrangeiro.

A compreensão de que a instituição de sentido se dá espontaneamente no campo descentra também a concepção acerca da operação criativa, que não se situa em um ou outro indivíduo, mas acontece nesse tecido intersubjetivo e nos garante o pertencimento com o outro a um mesmo mundo. A clínica apresenta-se como um lugar de criação, que visa permitir o nascimento do sentido como fala falante e desviante, um trabalho que se situa no âmbito da poética ao engajar terapeuta e paciente em um processo de "invenção comum de verdade" (Alvim, 2012, p. 1013). A ressignificação da existência - produção de novos sentidos a partir do contato com a diferença - altera os mapas sensíveis do nosso corpomundo, e reinventar as maneiras de ser é também reinventar o mundo, alterar o equilíbrio das forças de subjetivação presentes no campo.

Dessa forma, essa proposta clínica tem um sentido eminentemente político se consideramos a noção de política que nos é apresentada por Jacques Rancière (1996):

A política não é em primeiro lugar a maneira como indivíduos e grupos em geral combinam seus interesses e seus sentimentos. É antes um modo de ser da comunidade que se opõe a outro modo de ser, um recorte do mundo sensível que se opõe a outro recorte do mundo sensível. (p. 368)

O autor propõe a reformulação da noção de política em relação àquelas que são habitualmente aceitas, as quais designariam com a palavra política "o conjunto dos processos pelos quais se operam a agregação e o consentimento das coletividades, a organização dos poderes e a gestão das populações, a distribuição dos lugares e das funções e os sistemas de legitimação dessa distribuição" (Rancière, 1996, p. 372). Segundo Rancière (1996), o discurso atualmente dominante identifica a racionalidade política ao consenso e o consenso ao princípio da democracia. Esse consenso seria regido pela necessidade econômica: em virtude do que seria melhor para "todos" - tendo como base a ideia de que o que é melhor para o desenvolvimento do capital seria o melhor para o desenvolvimento e gestão do social -, estabelece-se uma série de políticas públicas e divisão das funções no espaço social que visam a efetuar a gestão dos bens "comuns". Ele propõe que o conjunto dos processos que efetuam essa divisão não receba o nome de "política", e sim de "polícia", ampliando o sentido habitual dessa noção ao considerar as funções de vigilância e repressão que geralmente são associadas a essa palavra como "formas particulares de uma ordem muito mais geral que é a da distribuição sensível dos corpos numa comunidade" (Rancière, 1996, p. 372).

Os poderes de polícia seriam aqueles que determinam uma ordem "natural" que destina os indivíduos e os grupos ao comando ou à obediência, à vida pública ou à vida privada, designando-os, principalmente, a certo tipo de espaço e tempo, a certa maneira de ser, ver e dizer - lógica dos corpos que tem seu lugar numa distribuição do comum e do privado, que é também uma distribuição do visível e do invisível, da palavra e do ruído (Rancière, 2012). Segundo o filósofo (Rancière, 2012), na divisão das funções no espaço social operada pelos poderes de polícia haveria sempre aqueles que ficam relegados ao campo do invisível, aqueles a quem a palavra e quiçá até a existência é negada, aqueles que não têm as palavras reconhecidas e ouvidas, cuja voz soa como ruído. A verdadeira razão política, para o autor, seria aquela que promove a alteração desses mapas sensíveis, que rompe com a divisão policial das funções e competências.

Rancière (1996) apresenta, portanto, a noção de política como aquilo que provoca uma perturbação no sensível - naquilo que é passível de ser dito, visto, que conta como pertencente a um mundo comum. O autor traz o exemplo corriqueiro de uma manifestação política na rua para ilustrar essa ideia: os manifestantes transformam a rua, que é vista pelos policiais como lugar de passagem, de circulação, em lugar público, de discussão e debate político, atividades que, para os governantes, deveriam estar restritas aos prédios administrativos voltados para esse fim. Nessa situação estaria em operação algo que Ranciére denomina de dissenso - confronto entre diferentes regimes de sensorialidade:

O dissenso tem assim por objeto o que eu chamo de recorte do sensível, a distribuição dos espaços privados e públicos, dos assuntos que neles se trata ou não e dos atores que têm ou não motivos para estar aí e deles se ocupar. (Rancière, 1996, p. 373)

Ao reformular esse recorte policialesco do sensível, os manifestantes instauram uma nova ordem, em que a rua e os cidadãos que nela circulam adquirem outros sentidos e funcionalidades, o que teria como resultado a dissociação de certo corpo de experiência e a constituição de outro corpo que não está adaptado à divisão policial de lugares, funções e competências sociais. Segundo o filósofo, a questão para os dominados nunca foi tomar consciência dos mecanismos de dominação, mas criar um corpo voltado a outra coisa, que não à dominação (Rancière, 2012).

Rancière (1996) ressalta que o dissenso não é um conflito entre vários pontos de vista, nem mesmo um conflito pelo reconhecimento, mas um conflito pela constituição mesma do mundo comum, sobre o que nele se vê e se ouve, sobre os títulos dos que nele falam para serem ouvidos e sobre a visibilidade dos objetos que nele são designados. Na medida em que os atos de subjetivação política redefinem o que é visível, o que se pode dizer dele e o que os sujeitos são capazes de dizer, revela-se uma face estética da política. Por outro lado, as novas formas de circulação da palavra, de exposição do visível e de produção dos afetos determinam capacidades novas, em ruptura com a antiga configuração do sensível, o que revela uma face política da estética (Rancière, 2012).

Nesse ponto, o autor traça uma relação intrínseca entre arte e política, ambas operações de reconfiguração da experiência comum do sensível. A ação artística, quando regida pelo regime de eficácia estética, teria o potencial de produzir subversões tópicas e simbólicas do sistema, introduzir separação no tecido consensual do real e, por isso mesmo, embaralhar as linhas de separação que configuram o campo consensual do que é dado. O autor ressalta que a relação entre arte e política não é uma passagem da ficção para a realidade, mas uma relação entre duas maneiras de produzir ficções: "Não há mundo real que seja o exterior da arte. Há pregas e dobras do mundo sensível comum nas quais se jungem e desjungem a política da estética e a estética da política" (Rancière, 2012, p. 74). O real seria sempre "uma construção de espaço onde se entrelaçam o visível, o dizível e o factível" (Rancière, 2012, p. 74) e, portanto, objeto de uma produção; a ficção dominante ou consensual, que costuma reclamar para si o status de realidade, estaria, na verdade, negando esse seu caráter ontológico de invenção.

Neste ponto relembramos a afirmação do trabalho clínico como um trabalho de "invenção comum de verdade" e compreendemos que a reconfiguração do sensível é ponto central de articulação entre os campos da estética, da clínica e da política. Essa divisão policial das funções no espaço social nos remete à noção de um corpo social que atua de forma neurótica, automatizada, resistente à configuração de novas formas. Rolnik (1996) nos fala que vivemos em um contexto sociocultural que pretende confinar a operação da criação de novas formas de viver ao campo da arte, o que faria com que essa operação da criatividade fosse vivida de forma traumática no resto da vida social. Ela afirma que tanto na prática clínica quanto na prática artística observa-se a presença de uma mesma dimensão ética: "o exercício do deslocamento do princípio constitutivo das formas da realidade que predomina em nosso mundo" (Rolnik, 1996, p. 7), e ressalta a importância de se desfazer da referência às formas já sem vida, para que a vida possa se constituir "no festim do entrelaçamento entre e vida e morte, ou, nas palavras de Lygia, 'para que tudo na realidade seja processo'" (Rolnik, 1996, p. 7). A hibridização entre arte e clínica revela sua dimensão política na medida em que ambas atuam como forças de resistência à esterilização do poder disruptivo da disparidade entre a infinita possibilidade do corpo de criar novas formas de existência e a finitude das formas já instituídas (Rolnik, 1996). A rigidez da separação entre essas práticas diminuiria as chances de constituirmos territórios que sejam a expressão das diferenças engendradas em nosso corpo próprio e no corpo social, de investirmos na dimensão experimental da vida, na afirmação da sua potência criativa e construção como obra de arte.

Foi com o intuito de investir na potência criativa de uma vida comum que nos lançamos nos "pequenos (e acadêmicos) exercícios experimentais da liberdade" (Reis, 2017, p. 55) junto aos jovens moradores da Mangueira. O percurso de experimentação e pesquisa envolveu muitas etapas e todo um trabalho com o corpo, com o intuito de sensibilizá-lo para que pudesse adquirir ou resgatar uma presença poética e criativa no espaço e, principalmente, para que nossos corpos pudessem estranhar essas rígidas configurações territoriais em que vigora um processo de segregação entre as diferentes classes sociais. Inspiramo-nos no referencial teórico da performance por esta ser uma prática artística que ressalta a força instituinte do gesto. Uma dessas experiências de sensibilização que foi muito marcante e fez emergir pequenos gestos performativos foi quando conduzimos os jovens a andarem vendados pelo metrô, aproveitando um caminho que faríamos da favela onde moravam para o nosso campus universitário. A ideia era que a experiência de estarem vendados ativasse outros sentidos do corpo, mas acabamos fazendo também uma intervenção no espaço e na forma de habitá-lo. Os trechos que se seguem são parte dos relatos de campo da equipe participante do projeto.

Aos poucos, fui percebendo como que a cada passo que dávamos as pessoas iam nos dando passagem. Íamos criando uma coreografia dentro do metrô. Lembrei muito nesse momento do texto do Lepecki. Não sei se porque achavam que eles eram deficientes, ou porque viram que estavam vendados ou com dificuldade para andar... (não diria nem dificuldade, mas andavam de uma maneira diferente, tateando e de forma mais lenta, pouco habitual), mas a questão é que ocorria uma espécie de "abre alas" pra gente. Duas velhinhas se levantaram do assento para idosos e deficientes e nos ofereceram seus lugares. Outras mulheres perguntaram o que era aquilo, e a Teresa1 mesmo respondeu: "É uma pesquisa, nós estamos pesquisando!". (...) Depois, resolvemos todos dar um passeio para o outro lado. A situação começou a ganhar cara de diversão. Olhava para eles rindo, e se segurando nos corrimões acima de suas cabeças, levando sustos com os solavancos que cada parada causava, e pensava na sensação de uma montanha russa que eles deviam estar sentindo. [Caderno de campo]. (Reis, 2017, p. 110)

O metrô costuma ser um espaço de anestesia, espaço transitório pelo qual passamos torcendo para que o tempo passe rápido, para que possamos chegar no lugar de destino, geralmente o local de trabalho. As pessoas que ali circulam todos os dias estão profundamente inseridas na lógica de circulação de capital, que implica em uma determinada lógica de circulação pelo espaço. Também é um espaço que não costuma ser habitado por crianças e adolescentes negros, moradores de favela, de modo que sua presença muitas vezes suscita suspeita. Ao conduzirmos esses jovens vendados pelo metrô, esses elementos da configuração habitual da cidade pareciam estar em suspenso. Os vagões viraram um espaço de experimentação e pesquisa e, sobretudo, um espaço de brincadeira e diversão, em que cada solavanco era recebido com risos e frios na barriga. Seus corpos circulando pareciam despertar mais curiosidade do que suspeita, e geravam ao redor uma dança, uma reconfiguração do espaço - pessoas dando passagem, pessoas surpreendidas pelo inusitado da cena, pessoas procurando entender o que estava acontecendo. O uso não habitual do espaço parecia gerar a necessidade de criar sentidos e alguns corpos saíram do seu torpor de amortecimento. Principalmente os nossos, mais diretamente implicados no processo da pesquisa.

Quando chegamos à estação perto da universidade e, já fora do metrô, tiramos as vendas dos jovens, eles ficaram muito animados para explorar o novo território. Seguimos caminhando para o campus e eles reparavam em tudo, tirando inúmeras fotos do trajeto. Surpreenderam-se muito com o tamanho dos prédios, a limpeza, a marca das motos, comentaram que parecia que tudo ali era "coisa de rico". Mas também nos convidaram a exercitar um olhar lúdico para o espaço, para pequenas cenas poéticas do caminho. O olhar de estranhamento das crianças para lugares a nós tão cotidianos nos permitiu reconfigurar o nosso próprio olhar, tal como aponta o relato a seguir.

(...) seguimos desvendados pela Voluntários, o clima é de segurança, estamos juntos. Há fotos incríveis desse trajeto tanto da ida quanto da volta, olhares curiosos de quase tudo, perspectiva alucinada a 300 km por hora, no ritmo deles. Calisto segue flutuante, mas muito próximo a mim, puxamos papo sobre as motos, os carros, o viaduto, o que fazer se víssemos que o viaduto está desmoronando - 'tem que pular tio, lá embaixo - é, e torcer por um caminhão de colchão, é tio, tem que ver o caminhão vindo antes e pular antes dele aparecer aqui na frente -- tem que sentir né'. (...) Sou mais um observador passivo nesse momento em relação ao grupo, e como tal quem chega para junto de mim é Calisto, o flutuante, conversamos mais sobre as coisas que passam na rua e, no meio de uma frase sobre motos, Calisto para e chama todos para ver as plantas balançando por conta do ar da calefação do prédio comercial em seu jardim, uma cena tão pequena. Passando por uma horta de um instituto se anima, gosta das plantas, sabe seus nomes. Calisto está o percurso inteiro com uma venda transpassada entre seu ombro e sua bunda, como se a tivesse vestido, olho para ele e vejo Parangolés, estou lendo demais Hélio Oiticica. [Caderno de campo]. (Reis, 2017, p. 128)

 

Considerações Finais

Ao circular com crianças e adolescentes moradores de favela por diferentes espaços da cidade, deparamo-nos frequentemente com a rigidez nas configurações do espaço urbano, que constantemente diziam aos nossos corpos (favelados ou não) a quais espaços eles pertenciam e a quais espaços eram estrangeiros, com sua presença causando estranhamento ou denunciando, quiçá, algum (possível) risco eminente. Foi com o intuito de estranhar essas configurações urbanas, essa ficção consensual do real que designa espaços determinados para determinados corpos, que conduzimos nossa ação. Essa ação teve como fundamentos: a proposição artística concebida como potência geradora de experiências estéticas, a ética da alteridade como abertura à diferença do outro e a compreensão de que a política não prescinde do dissenso.

Para realizar este trabalho como invenção a partir de um diálogo de alteridades, nós, acadêmicos que habitam o território da universidade, nos munimos de articulações teóricas sobre arte, clínica e política - as quais compartilhamos aqui - e também da inspiração em artistas como Lygia Clark, Hélio Oiticica, Eleonora Fabião, Thiago Florêncio, Mauricio Dias e Walter Riedweg. As crianças e adolescentes que habitam o território da favela já vieram munidos de uma ferramenta fundamental de exercício da liberdade e de criação de novas formas de existência: o brincar. Em nosso encontro, na ação, o atravessamento da arte foi um elementochave para borrar as fronteiras entre nós e eles, e assim, ao longo do nosso processo de investigação, o esforço de pesquisar com eles e de criar uma linguagem comum acabou por nos levar à descoberta de uma forma lúdica de pesquisar e ocupar o espaço. Foi assim que criamos os dispositivos lúdicos de pesquisa e intervenção no espaço urbano. Descobrimos que "brincar pelas ruas é um pequeno exercício de presença/liberdade grandioso" (Reis, 2017, p. 112), como dito por uma das integrantes da nossa equipe.

Brincando como as crianças e com as crianças, nos colocamos em processo de diálogo como invenção comum de verdade e redescobrimos uma aderência do olhar às coisas do mundo, a possibilidade de nossas caminhadas urbanas serem habitadas por miradas poéticas, possibilidade de recriar pequenos mundos dentro do grande, borrando as fronteiras entremundos. Entre outros fatores, foram nossos esforços no sentido de uma investigação do caráter primordialmente intercorporal e sensível dos processos de subjetivação que nos conduziram à criação desses "pequenos exercícios experimentais da liberdade" (Reis, 2017, p. 20) - laboratórios de experimentação na cidade, em que buscávamos ativar nosso corpo sensível no espaço. O processo de descoberta de um corpo brincante e da experiência lúdica do espaço, assim como nossas reflexões sobre a segregação socioespacial, foram aspectos relevantes em nossa pesquisa e serão objeto de outros trabalhos. No presente artigo buscamos discutir a articulação teórica entre estética, clínica e política que fundamentou nossa ação e potencializou em nossos corpos de pesquisadores o que Suely Rolnik (1999) chama de "erotismo criador", gerador de "novas paisagens existenciais" (p. 3), ou seja, fundamentou um trabalho de ativação de um corpo sensível e vibrátil, poroso ao mundo, disponível à criação de novos sentidos do comum, na aposta de que este estudo possa potencializar também outros corpos e trazer contribuições para uma perspectiva ampliada da clínica.

 

Referências

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Endereço para correspondência:
Alice Vignoli Reis
E-mail: alice.v.reis@gmail.com

Mônica Botelho Alvim
E-mail: mbalvim@gmail.com

Recebido em: 15/05/2019
Revisado em: 27/12/2020
Aceito em: 16/01/2021
Publicado online: 19/06/2021

 

 

1 Todos os nomes dos participantes da pesquisa que aparecem nos cadernos de campo foram trocados, a fim de preservar suas identidades.

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