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Temas em Psicologia
versão impressa ISSN 1413-389X
Temas psicol. vol.24 no.1 Ribeirão Preto mar. 2016
https://doi.org/10.9788/TP2016.1-23
ARTIGOS
Intervenções psicológicas diante do assédio moral no trabalho
Intervención psicológica ante el acoso moral en el trabajo
Vanessa RissiI; Janine Kieling MonteiroII; William Weber CecconelloIII; Eliz Graciela de MoraesIV
ICoordenação do Departamento de Pós-Graduação Lato Sensu da Escola de Psicologia da Faculdade Meridional - IMED, Passo Fundo, RS, Brasil Programa de Pós-Graduação em Psicologia Clínica da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, RS, Brasil
IIPrograma de Pós-Graduação em Psicologia Clínica da Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, RS, Brasil
IIIPrograma de Pós-Graduação em Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil
IVFaculdade Meridional - IMED, Passo Fundo, RS, Brasil
RESUMO
O assédio moral é um fenômeno mundial, complexo e multicausal. Refere-se a comportamentos violentos que visam humilhar, rechaçar e demolir psiquicamente o indivíduo ou grupo assediado, no contexto do trabalho. Devido ao seu potencial para causar sofrimento psíquico e adoecimento no trabalho, pode exigir intervenções psicológicas. Nesta perspectiva, o artigo objetiva identificar se os Psicólogos, quando inseridos nas organizações de trabalho, têm enfrentado o assédio moral, e como têm realizado as intervenções psicológicas. Para isto, também buscou-se compreender qual é o entendimento que estes profissionais possuem acerca do assédio moral nas relações de trabalho. Realizou-se um estudo de abordagem qualitativa e delineamento exploratório. Foram entrevistados sete Psicólogos, recrutados por conveniência. Os dados foram processados por análise de conteúdo. Os resultados apontaram que os Psicólogos utilizam intervenções psicológicas preventivas, mas pontuais e isoladas, bem como intervenções reativas, caracterizadas por demissão, manutenção de distanciamento físico entre os envolvidos no caso de assédio e acompanhamento do comportamento do agressor, após conversa inicial. Também se constatou que os Psicólogos compreendem adequadamente o assédio moral enquanto fenômeno que humilha e é perpetuado por gestores, caracterizando abuso de poder hierárquico.
Palavras-chave: Assédio moral, intervenções psicológicas, prevenção, trabalho.
RESUMEN
El acoso es un fenómeno global, compleja y multifactorial. Se refiere a un comportamiento violento destinado a humillar, rechazar y psíquicamente demoler el individuo o grupo acosado, en el contexto del trabajo. Debido a su potencial para causar trastornos psicológicos y enfermedades en el trabajo, puede requiere de intervenciones psicológicas. En esta perspectiva, el trabajo tiene como objetivo determinar si los psicólogos, cuando si inserem en las organizaciones de trabajo se han enfrentado el acoso moral y cómo se han realizado las intervenciones psicológicas. Por esto, también tratamos de entender lo que es el entendimiento de que estos profesionales poseen acerca de la intimidación en las relaciones laborales. Se realizó un estudio cualitativo y enfoque de diseño exploratorio. Fueron entrevistados siete psicólogos contratados por conveniencia. Los datos se procesaron por análisis de contenido. Los resultados mostraron que los psicólogos utilizan intervenciones preventivas, pero específicas y aisladas, así como las intervenciones reactivas, que se caracteriza por la demisión, el mantenimiento de la distancia física entre las personas involucradas en el caso del acoso y la vigilancia de la conducta del delincuente, después de la conversación inicial también mostró que: psicólogos entienden adecuadamente el acoso moral como un fenómeno que humilla y se perpetúa por los administradores, con el abuso de poder jerárquico.
Palabras clave: Acoso moral, las intervenciones psicológicas, prevención, trabajo.
O assédio moral é reconhecido como um problema sério e complexo, advindo de fatores sociais, econômicos, organizacionais e culturais. Pesquisas realizadas em quase todos os continentes dão conta de que este é um fenômeno mundial que tem preocupado estudiosos de diversas áreas e organismos multinacionais de proteção ao trabalhador, no âmbito dos direitos humanos (Heloani & Barreto, 2010). Contemplado na agenda de pesquisas internacionais, há mais de 25 anos, é objeto de estudos, no Brasil, a um tempo inferior (Soboll, 2008a), tendo sido publicado por Freitas, em 2001, o primeiro artigo sobre o tema. Essa forma de violência psicológica no trabalho, em grande parte, ainda é subestimada pelas organizações (Guimarães & Vasconcellos, 2012), embora os registros apontem para a presença desta prática no Brasil, desde o período da colonização (Teixeira, Munck, & Reis, 2011).
O assédio moral refere-se a um comportamento abusivo, intencional e frequente que ocorre no ambiente de trabalho e visa constranger, humilhar e desqualificar um indivíduo ou grupo, degradando as suas condições de trabalho e ameaçando a sua integridade pessoal e profissional (Freitas, Heloani, & Barreto, 2008; Leymann, 1996).
Estão implícitos na definição do assédio moral, quatro critérios específicos que devem ser levados em conta quando o objetivo é reconhecer determinada ocorrência. Freitas et al. (2008), Rezende (2008) e Soboll (2008b) mencionam tais critérios em suas publicações:
1. Habitualidade e repetitividade: as condutas hostis devem ocorrer repetidas vezes durante a jornada de trabalho, por um determinado período. Ações isoladas não se configuram como assédio moral. Não é consensual um período de tempo exato, sendo essencial, no entanto, identificar a prática continuada e insistente.
2. Pessoalidade: as ações hostis não são dirigidas a um grupo de pessoas, mas a uma pessoa em específico. É possível que mais de uma pessoa de um mesmo grupo possa ser alvo das agressões mutuamente, mas o processo é direcionado e pessoal.
3. Limite geográfico: deve ocorrer no lugar das práticas cotidianas, entre as pessoas que pertençam à mesma organização de trabalho e a ela se vinculem através de uma relação contratual ou que sejam dependentes, direta ou indiretamente da empresa (terceirizados).
4. Intencionalidade de prejudicar: o assédio visa prejudicar para diminuir os espaços de ação e forçar um desligamento da empresa ou de um projeto. O alvo é definido através de armadilhas sutis ou explícitas.
De acordo com a Organización Mundial de la Salud (OMS, 2004), o assédio moral tem potencial para causar ou contribuir para o aparecimento de muitos transtornos psicopatológicos, psicossomáticos e comportamentais. Nesta perspectiva, estudos internacionais têm indicado as consequências do assédio moral em nível individual, organizacional e social: prejuízos na qualidade de vida do sujeito assediado (Niedl, 1996); suicídio, desenvolvimento de Transtorno de Estresse Pós Traumático ou Depressivo (Hansen et al., 2006); problemas nas relações familiares (Duffy & Sperry, 2007); diminuição da satisfação do sujeito assediado com o trabalho (Hoel & Cooper, 2000); problemas de relacionamento interpessoal no trabalho (Vega & Comer, 2005); desempenho grupal prejudicado e aumento do comportamento agressivo nos trabalhadores (Ramsay, Troth, & Branch, 2010); problemas nas funções cognitivas, como atenção e concentração, até possibilidade de desenvolvimento de transtornos psicológicos como depressão (International Labor Organization [ILO], 2000; OMS, 2004) e aumento de custos médicos e tendência a aposentadoria precoce (Hoel, Sparks, & Cooper, 2001). Da mesma forma, no Brasil, Freitas (2007) relacionou incontáveis danos provocados pelo assédio moral, que vão desde processos psicopatológicos desencadeados nas vítimas, em nível individual, até problemáticas organizacionais e sociais como queda de produtividade e aumento de despesas com benefícios da previdência social, respectivamente. Não obstante, casos de suicídio podem estar entre as possíveis decorrências do assédio moral (Freitas, 2011).
Boa parte de pesquisadores concorda com a divisão do assédio em quatro tipos principais: descendente (ou vertical), horizontal, ascendente e mista. Seguindo as definições propostas por Hirigoyen (2005a) a ação descendente é o assédio vindo de um superior hierárquico, sendo, muito provavelmente, o tipo mais comum. Por horizontal o trabalhador se vê assediado por um colega com o mesmo nível hierárquico na organização. Esse tipo é muito comum quando dois funcionários disputam um mesmo cargo ou uma promoção. Menos habitual, o ascendente ocorre quando uma pessoa de nível hierárquico superior se vê agredida por um ou vários subordinados. Esta situação é desencadeada, geralmente, quando um novo funcionário, em nível superior, é admitido em uma organização. Possivelmente, o cargo era desejado pelos demais, que passam a não concordar com o modo de gestão do novo contratado. Será misto, quando a vítima for atingida a partir de assediadores diversos, como colegas e superior hierárquico. Qualquer que seja a direção do assédio (descendente, mista, horizontal ou ascendente), o processo é ardiloso e bloqueia psiquicamente a perda da capacidade de defesa da vítima, o que imprime consequências em sua autoestima. A perda do autoconceito e a predominância do sentimento de inutilidade minimizam sua dignidade e autorrespeito (Heloani & Barreto, 2010).
O assédio moral pode envolver duas grandes perspectivas: a do assédio pessoal, relacionado às questões de relações interpessoais; e a do assédio organizacional, associado a demandas do contexto, processo e da gestão do trabalho (Soboll, 2008b). Por isso, destaca-se a importância de se levantar informações de ambas as perspectivas (das relações de trabalho e da organização do trabalho à qual os trabalhadores estão submetidos).
Tanto trabalhadores como empregadores reconhecem que as agressões psicológicas têm sido uma forma grave de violência vinculada às novas configurações de relações de trabalho que incidem tanto entre colegas quanto naqueles que ocupam posições hierarquicamente superiores no contexto organizacional. Relações essas que dominam o trabalhador em nome da competitividade e do individualismo crescentes na organização, a qual muitas vezes não incentiva laços de cooperação entre os trabalhadores, impossibilitando que haja, nas relações de trabalho, a valorização ou o reconhecimento do trabalho realizado pelo outro. Com frequência, as situações de violência se naturalizam e são banalizadas no cotidiano organizacional, pois são reflexos de uma lógica que não acredita em injustiças, mas sim em fenômenos causados por questões econômicas, sistêmicas e até pela causalidade do destino (Dejours, 2001), mas que, de certo modo, são "bem" utilizadas pelas organizações no intuito de se eximirem de responsabilidade (Monteiro & Machado, 2010). Isto explica a posição de grande parte das organizações nesse processo no que tange às situações de violência, visto que muitos locais de trabalho não possuem ainda alguma forma de registro para denunciar a violência psicológica ou o assédio moral no contexto laboral.
O sofrimento e o adoecimento psíquicos relacionados ao trabalho representam, atualmente, um enorme desafio com o qual se defrontam os profissionais dedicados à saúde mental dos trabalhadores (Glina & Rocha, 2010). Dentre estes profissionais, destacam-se os Psicólogos. As intervenções psicológicas podem estar relacionadas à prevenção, promoção e tratamento, (Capitão, Scortegagna, & Baptista, 2005) em diversos contextos e, podem dirigir-se ao assédio moral, já que o fenômeno tem potencial para causar doença e sofrimento psíquico.
Intervenções têm sido realizadas no contexto do trabalho e divulgadas em publicações, a fim de prevenir, promover, e/ou combater o assédio moral. Por outro lado, têm se mostrado escassos os estudos que avaliam a eficácia destes modelos interventivos (Glina & Soboll, 2012). Segundo a European Agency for Safety and Health at Work (2009a) o assédio moral pode ser considerado um risco psicossocial, e, como tal, deve ter a intervenção alinhada aos princípios de avaliação e gerenciamento de riscos no contexto de trabalho.
Intervenções que buscam a melhoria do clima psicológico no trabalho são recomendadas e necessárias (Einarsen, Hoel, Zapf, & Cooper, 2003). Podem ser classificadas em três níveis: para indivíduos envolvidos diretamente (assediados e assediadores), para grupo, equipe e colegas de trabalho, o chamado nível de interface indivíduo x organização e para a organização.
A prevenção do assédio moral pode-se dar de diversas formas. Educar os trabalhadores e líderes, incutindo normas de adequado comportamento social na organização e buscar estabelecer limites, pode ser um caminho. O modelo de prevenção de assédio moral deve englobar questões relacionadas à informação do fenômeno para os trabalhadores, criação de grupos de discussão, capacitação dos profissionais dos setores de recursos humanos, entre outros (Hirigoyen, 2005b).
A European Agency for Safety and Health at Work (2009b) recomenda algumas práticas que podem auxiliar na prevenção do assédio moral:(a) dar liberdade, por parte dos trabalhadores, para escolher o modo de realizar o seu trabalho; (b) difundir amplamente os objetivos organizacionais; (c) o desenvolvimento de lideranças; (d) clareza na descrição de funções e tarefas; (e) o desenvolvimento de políticas organizacionais que favoreçam relações sócio profissionais positivas; (f) o desenvolvimento de programas e políticas que esclareçam e combatam esse tipo de problema dentro da organização.
Para as vítimas do assédio moral no trabalho pode-se intervir, por exemplo, por meio de aconselhamento, grupo de apoio, estratégias de reabilitação e acompanhamento no retorno ao trabalho e através de ouvidoria (Glina & Soboll, 2012). Tehrani (2003) sugere utilizar conselheiros profissionalmente treinados. Dentre as técnicas citadas pelo autor, destacam-se: a inquirição (debriefing), a terapia narrativa, a terapia cognitivo-comportamental, outros tipos de psicoterapia e os grupos de autoajuda.
Para esta pesquisa, partiu-se da certeza de que o Psicólogo é um profissional que, dentre várias atribuições, tem o compromisso de enfrentar o assédio moral, quando inserido profissionalmente em organizações de trabalho. Esta constatação encontra subsídios no Código de Ética Profissional do Psicólogo (Conselho Federal de Psicologia [CFP], 2005), quando refere, em seus princípios fundamentais I e II que, o psicólogo baseará o seu trabalho no respeito e na promoção da liberdade, da dignidade, da igualdade e da integridade do ser humano, apoiado nos valores que embasam a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e que trabalhará visando promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e das coletividades e contribuirá para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. No mesmo sentido, ainda leva-se em conta o Manual de Atribuições do Psicólogo no Brasil (CFP, 1992), ao mencionar que o profissional da psicologia deverá pautar seu trabalho no respeito à dignidade e integridade do ser humano.
Nesta perspectiva, o artigo objetiva, em linhas gerais, identificar se os Psicólogos, quando inseridos nas organizações, têm enfrentado o assédio moral, e como têm realizado as intervenções psicológicas. Para isto, também buscou-se compreender qual é o entendimento que estes profissionais possuem acerca do assédio moral nas relações de trabalho.
Método
Participantes
Os participantes foram recrutados por conveniência e teve como critério de inclusão: Psicólogos que trabalham há pelo menos um ano em empresas. Fizeram parte do estudo sete Psicólogos do sexo feminino, com idade média de 31 anos; com graduação em Psicologia concluída há sete anos, em média, e trabalhando na empresa atual há seis anos, em média, sendo que 66,66% possuíam curso de pós-graduação em nível de especialização na área de Psicologia Organizacional e/ou Gestão de Pessoas. A Tabela 1 apresenta a caracterização dos participantes da pesquisa.
Procedimentos de Coleta de Dados
A coleta de dados ocorreu através de entrevista semi-estruturada, a partir de roteiro orientador. A entrevista foi dividida em três principais seções: entendimento dos Psicólogos sobre o que é assédio moral no trabalho; percepção da ocorrência do assédio moral no trabalho e intervenções utilizadas pelos Psicólogos frente ao assédio moral no trabalho. Os profissionais foram entrevistados no seu local de trabalho, após prévio agendamento. O período de coleta deu-se entre setembro e novembro de 2013. As entrevistas duraram, em média, 60 minutos, foram gravadas e transcritas na íntegra.
Procedimentos de Análise dos Dados
Os dados obtidos nas entrevistas foram processados por análise de conteúdo, seguindo os critérios propostos por Bardin (1979): préanálise dos documentos por meio de leitura flutuante; exploração do material através de classificação ou categorização; interpretação dos dados obtidos.
Considerações Éticas
A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de ética em Pesquisa da instituição de ensino de origem, sob número 11424812.8.0000.5319 e os participantes assinaram o TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, a fim de cumprir com os preceitos éticos necessários a estudos científicos envolvendo seres humanos.
Resultados e Discussão
Chegou-se, a partir da análise dos dados, a três categorias temáticas, que respondem aos objetivos da pesquisa: (a) assédio moral: humilhação e abuso de hierarquia; (b) percepção de ocorrência do assédio moral no trabalho e (c) intervenções psicológicas preventivas e reativas.
Assédio Moral: Humilhação e Abuso de Hierarquia
O assédio moral foi compreendido pelos Psicólogos, em acordo com o que preconiza a literatura nacional e internacional sobre o tema, correspondendo a um padrão de relacionamento inadequado, marcado por humilhações, agressões e ofensas. Conforme relato do Sujeito A: ''É uma situação em que um sujeito está sendo fragilizado, sentindo-se humilhado, sentindo-se exposto, sendo que isso pode trazer prejuízos psíquicos para ele em virtude de exposições a situações constrangedoras''. Mais do que isso, os participantes da pesquisa associaram o assédio à um comportamento nocivo de líderes, sobressaindo-se, logo, o assédio do tipo vertical, em detrimentos de outras direções possíveis.
Glina e Soboll (2012) conferem ao assédio moral o status de um comportamento negativo e, ao mesmo tempo, tipificado como violência psicológica extrema que gera constrangimento ao vitimado (Soboll, 2010). Hirigoyen (2005b), pesquisadora responsável pela publicidade do fenômeno assédio moral em nível mundial, o denomina como toda e qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o ambiente de trabalho.
Ao relatar sobre a compreensão da definição do assédio moral, os profissionais da Psicologia evidenciaram-no como um fenômeno que ocorre, mais frequentemente, por parte dos superiores hierárquicos em relação a trabalhadores subordinados a eles, configurando-se como abuso de poder diretivo; conforme referem o Sujeito G ''É uma situação provocada pelos gestores em seus subordinados'' e Sujeito C ''Assédio moral é tudo aquilo que ultrapassa o respeito pelos funcionários, tudo o que as pessoas acabam usando, por exemplo, o próprio cargo de chefia para conseguir coisas''.
De fato, o assédio moral no trabalho encontra-se fortemente relacionado com elementos do ambiente e da organização do trabalho (OT), como o estilo de liderança, por exemplo (Einarsen, 2000). A competitividade que permeia o ambiente organizacional é capaz de intensificar o assédio. Esta condição favorece o tratamento nocivo dos superiores hierárquicos em relação aos seus subordinados, pois eles usufruem o poder que detêm para rechaçar ou humilhar. Não raramente, esses agressores são vistos como gestores eficientes pelos seus superiores, pelo perfil agressivo e assertivo que possuem (Heloani, 2003).
Competitividade exacerbada, bem como estilos de liderança nocivos e enaltecidos, e que, foram citados como parte das relações de trabalho, pelos Psicólogos, na pesquisa, são considerados traços característicos de um tipo de organização do trabalho que favorece a ocorrência de episódios violentos no trabalho, tais como o assédio moral. Neste aspecto, cabe destacar que a variável organização do trabalho é fator imprescindível para que possa compreender o percurso de ações de cunho violento que geram sofrimento nas pessoas. Conceitualmente, a organização do trabalho, (Dejours, 1988; Mendes, 2007) envolve características biopsicossociais do trabalho, como a divisão do trabalho, relações afetivas e sócio profissionais, condições de trabalho, possibilidade de iniciativa e autonomia, grau de ambiguidade sobre os resultados da tarefa, bem como nível de cooperação e comunicação. Conforme estiver caracterizada, a própria OT pode, inclusive, influenciar no estabelecimento de relações de trabalho marcadas por competição e individualismo em detrimento de relações sócio profissionais positivas e, consequentemente, nestes meandros, favorecer o assédio moral. Ilustram esta compreensão, Martiningo e Siqueira (2008), ao demonstrarem que a OT, em determinadas circunstâncias, é causa de insegurança por parte dos chefes e subordinados que, mais pressionados pelo cumprimento de metas e sem o devido suporte organizacional, podem iniciar um processo de assédio moral.
Os Psicólogos participantes do estudo, em suas falas sobre a compreensão do assédio moral, não demonstram, contudo, estabelecer uma relação entre o comportamento violento e desrespeitoso dos líderes assediadores e a própria organização do trabalho, que, conforme posto anteriormente, pode incentivar ou facilitar a ocorrência do assédio. Nessa situação, o mesmo é caracterizado como assédio organizacional (Soboll, 2008a).
Ainda que tenhamos identificado que os Psicólogos possuem noção sobre o significado do conceito de assédio moral, nenhum deles fez referência a critérios identificadores, como a frequência e a duração dos eventos assediadores. Muito embora, saiba-se que não há consenso quanto a qual frequência e permanência considerar (Glina & Soboll, 2012), reconhece-se a importância destes dois fatores, a fim de que se possa identificar o assédio moral e diferenciá-lo de outras formas de violência ocupacional (Einarsen & Skogstad, 1996).
Percepção da Ocorrência do Assédio Moral no Trabalho
Diante do questionamento em relação à ocorrência de assédio moral na empresa em que atuam, os profissionais negaram, em sua maioria, a existência de eventos que pudessem vir a caracterizar o fenômeno; conforme relatos do Sujeito D: ''Gostaria de dizer que não e acredito que não ocorre, nós nunca tivemos nenhum problema em relação ao assédio moral". Ainda, o Sujeito F ''Olha, eu acredito que não, embora eu fale de um lado, do lado da Psicologia, do lado da gestão, mas me parece que não''. Neste sentido, pode-se perceber que é possível sim, que muitas empresas consigam manter relações de trabalho saudáveis, através de uma OT que contribua para isso e, evidentemente, para a não ocorrência de assédio e outras formas de violência. Muitas organizações têm decidido enfrentar a problemática do assédio moral através de diversas intervenções, tais como o estabelecimento de políticas de tolerância zero ao assédio (Salin, 2008), criação de códigos de ética e mecanismos de denúncia de casos ao setor de recursos humanos (Heloani, 2005).
Contudo, muitas falas do grupo de profissionais entrevistados, seguiram-se de justificativas que relevaram um mecanismo de negação, a fim de defenderem a imagem da empresa e, muito provavelmente, a própria atuação enquanto Psicólogos, como referido nos depoimentos do Sujeito F: ''Pode ocorrer de algum gestor exagerar com algum funcionário, mas em contrapartida o que a gente percebe também que tem o outro lado, tem alguns funcionários que procuram isso, eles provocam para que ocorra alguma situação assim'' e Sujeito D:
O assédio moral não ocorre aqui. Tudo depende da pessoa. Esses dias eu ouvi uma pessoa relatando que a sua gestora a mandou entrar para o programa Medida Certa para emagrecer, que emagrecendo produziria mais. Então, tudo depende da estrutura psíquica da pessoa para receber isso. Não que seja assédio moral.
Nos casos citados, o trabalhador foi colocado enquanto responsável pela situação vexatória a que foi submetido. Infelizmente, na prática, não são menos frequentes as situações em que a vítima de assédio moral é responsabilizada (Hirigoyen, 2005b), muitas vezes, sob a alegação de problemas relacionados à sua personalidade e fragilidade emocional, como também é citado em estudos como o de Vartia (1996). Entretanto, já é sabido que a personalidade do assediado pode ser considerada menos relevante frente ao assédio moral (Leymann, 1992), estando os fatores organizacionais e psicossociais à frente das discussões sobre as causas do fenômeno, como já discutido neste artigo.
Quanto a questão da culpabilização e responsabilização do trabalhador por eventuais dificuldades oriundas nas relações de trabalho, deve-se ressaltar que ainda se trata de prática frequente por gestores e Psicólogos atuantes na área do trabalho. A Psicodinâmica do Trabalho possibilita algumas reflexões na tentativa de compreender as razões pelas quais, tão facilmente, culpabiliza-se o trabalhador, quando, por vezes, ele é uma vítima de situações tais quais o assédio moral. Ao não considerar o trabalho real, e as exigências que esse trabalho demanda ao trabalhador (valorizando essencialmente o trabalho prescrito), Barros (2010) alerta que cai-se na armadilha de dizer que o trabalhador é que não tem o saber fazer, que não foi preparado, que não teve uma boa formação, que não se preparou adequadamente para lidar com as diversificadas demandas, etc. As análises têm sido, portanto, centralizadas no indivíduo, desprezando a riqueza presente naquilo que o ser humano faz e nas situações que enfrenta cotidianamente na teia da cultura de uma organização. Muitas vezes, o poder de agir do trabalhador é que tem sido amputado pela organização do trabalho, estando sua atividade impedida e, sem prestarmos atenção ao trabalho real, nossa tendência é novamente culpabilizar o trabalhador (Barros, 2010).
Isoladamente, o assédio moral foi considerado realidade numa das empresas, conforme referido pelo sujeito B:
Teve uma situação em que um diretor anti-go estava chamando a telefonista de bruxa, disse que iria comprar uma vassoura para presenteá-la. Então, ela estava sentindo-se humilhada e eu tive que intervir. Ele tinha trinta anos de empresa e ela um ano. Ela estava com dificuldade ainda de entrar no ritmo dele, acelerado.
No caso ilustrado, tem-se a impressão de que o assédio teve o propósito, por meio do xingamento, de gerenciar a produtividade do trabalhador, que não se enquadrou no ritmo de trabalho imposto pela empresa (Andrade & Tito, 2012). Neste contexto, tem-se a ocorrência do subtipo de assédio moral organizacional, que já foi demonstrado por pesquisadores brasileiros (Araújo, 2006; Soboll, 2006, 2008b) e corresponde às práticas abusivas utilizadas como instrumentos de gestão, controle e disciplina e não exclusivamente para prejudicar o trabalhador, como é o caso do assédio moral típico.
Intervenções Psicológicas Preventivas e Reativas
As intervenções, quando preventivas, em relação a situações de assédio moral e violência nas organizações, podem ser primárias, secundárias ou terciárias. Primariamente, significa estabelecer políticas de avaliação e redução de riscos ou políticas antiassédio. Num segundo nível, envolveria programas de capacitação, inquérito dos trabalhadores e resolução de situação de conflitos. A prevenção terciária, por sua vez, objetiva a redução de danos e tratamento dos envolvidos no caso, quando o problema já está instalado (Leka & Cox, 2008).
As intervenções citadas pelos Psicólogos entrevistados envolveram ações preventivas e reativas, conforme sintetizam as Tabelas 2 e 3. Por reativas, entendemos, nesta pesquisa, àquelas iniciativas empreitadas pelos profissionais depois da ocorrência do assédio moral ou diante da hipótese de ocorrência.
Os Psicólogos revelaram que existem ações preventivas, porém, não são focadas exclusivamente na questão do assédio moral, conforme apontado pelo Sujeito D: ''Temos capacitação, desenvolvimento, mas nada focado especificamente em assédio moral".
Entretanto, evidenciou-se que existe preocupação no sentido de capacitar os líderes para que estabeleçam relações de respeito com seus subordinados, através de comunicação assertiva e práticas de feedback, conforme apontado pelo sujeito A: ''O que a gente faz são ações de desenvolvimento dos gestores, e aí, a gente aborda várias coisas, do que falar com os subordinados, como falar, de como se deve demitir''.
Este tipo de ação encontra respaldo em Terrin (2007), ao afirmar que o trabalho a ser feito nas organizações, diante do assédio, deve ser através de reeducação de valores, implicando em uma mudança cultural e incentivando à prática do diálogo constante e permanente entre as pessoas. As políticas relacionadas ao bem-estar do pessoal, à mediação de conflitos, ao desenvolvimento, ao zelo pelo clima organizacional, podem não apenas reparar erros atuais, mas também auxiliar na construção de um ambiente mais saudável, de forma que se possa falar em trabalho decente sem nenhuma ambiguidade ou dubiedade (Heloani & Barreto, 2010).
O código de ética foi mencionado como uma ferramenta a fim de que se possa prevenir a ocorrência, conforme indicado por Sujeito B ''Temos o código de ética, que fala de respeito, de igualdade social, da forma como é cobrado o resultado dos nossos colaboradores, de práticas que não são permitidas''.
Entretanto, em nenhum dos casos é feita referência clara ao assédio moral nos artigos que compõem o referido código. Esta é uma recomendação importante em se tratando de código de ética, na medida em que as normas e orientações de comportamento devem ser definidas explicitamente, a fim de que fiquem claras as situações que não serão toleradas pela organização (Martiningo & Siqueira, 2008). Ainda assim, é cabível de reflexão o fato de que se a empresa possui código de ética, isto não deve servir como justificativa que ela exime-se de responsabilidade se as condutas ocorrerem.
Alguns pesquisadores já vão além, e contribuem para as discussões quanto à eficácia destas ações preventivas. Eles afirmam que, em qualquer delas, alguns elementos devem estar presentes, como a garantia de clima social positivo que favoreça a diversidade e a administração das frustações e conflitos, estilos de liderança e práticas de gestão igualitários e construção de uma organização do trabalho pautada por metas, regras e responsabilidades claras e nítidas (Freitas et al., 2008).
Nas empresas, não se mostraram habituais, as atividades, políticas ou procedimentos com ênfase na prevenção do assédio moral, realizadas pelos Psicólogos. Porém, do ponto de vista jurídico, e, geralmente realizadas por advogados, algumas ações específicas ocorrem como relatam os sujeitos D ''Em qualquer ação trabalhista a empresa está sendo exposta. É importante mostrar as questões legais e de impacto para a empresa via orientação e conversa com os advogados'' e G:
A palestra dada pelo nosso advogado envolve estas questões de leis, como o Ministério Público do Trabalho encara esta questão. A gente visa muito mais na questão da orientação para que futuramente a gente não vá parar na justiça. Esta é uma ferramenta de prevenção que temos.
O assédio moral, certamente, pode envolver ações trabalhistas, na medida em que é passível de dano moral. Se ocorrer no contexto de uma organização, independente do nível hierárquico do agressor, a empresa, enquanto pessoa jurídica deverá ser responsabilizada. Esclarece-se que o dano moral, no ordenamento jurídico, é a consequência do assédio moral e significa, mais precisamente, os prejuízos que alguém vem a sofrer diante dos fatos. Por sua vez, o dano moral pode exigir reparação por meio de indenizações pagas, mediante provas. (Carvalho & Tonial, 2012). Ficam evidentes nas falas dos Psicólogos, a preocupação com esta questão em detrimento dos prováveis prejuízos psíquicos e emocionais dos sujeitos vitimados, conforme apontado pelo sujeito G:
Teve um supervisor que falava demais na hora da cobrança das metas. Teve, inclusive, uma reclamação da equipe. Não era nada gravíssimo, assim, mas a gente ficou preocupada, a gente não pode estar disseminando esta prática. Porque daqui a pouco a gente vai ter problemas lá na frente com a justiça.
Tais achados vão de encontro a Argimon, Boaz, Da Rosa, Daldon e Wendt (2007) ao referirem que percebe-se, com frequência cada vez maior, Psicólogos abdicando de um olhar humanizado, vindo a se submeter às exigências da empresa em que atuam e à sua gestão; e estes, mesmo conscientes de que sua atuação não condiz com os objetivos de sua profissão, acabam por aderir à visão da organização.
Neste sentido, pesam ainda os preceitos do Código de Ética Profissional do Psicólogo, do CFP (2005), segundo o qual, cabe ao psicólogo, fundamentalmente, promover a saúde e a qualidade de vida das pessoas e da coletividade, contribuindo para a eliminação de quaisquer formas de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Assim, entende-se que um dos compromissos profissionais dessa categoria é não abster-se na busca de respostas e renunciar ao silêncio cúmplice e ao conformismo conveniente que permite o sofrimento das pessoas nas organizações de trabalho (Caniato & Lima, 2008).
A demissão do assediador foi citada como opção diante de uma possível ocorrência de assédio moral nas empresas, ilustrado no relato do Sujeito B: ''Se ocorresse iríamos optar, com certeza, pela demissão. A empresa, por ser uma empresa familiar, que tem uma conduta de bastante respeito e ética, não teria outra opção que não fosse o desligamento''.
Na mesma lógica, figura como possibilidade de intervenção, diante da ocorrência do fenômeno, o afastamento do agressor e da vítima, referido pelo Sujeito E: ''Solicitamos para que o gestor evite o relacionamento direto com a vítima e que ela também evite este contato próximo''.
Em ambos os casos, a conduta é paliativa, apenas. O conflito se mantém latente e poderá vir à tona novamente, a qualquer momento. Nesta perspectiva de distanciamento entre os envolvidos, cabe a reflexão de Brodsky (1976) que alerta para o fato de que o assédio se mantém presente naquelas organizações cuja autorização implícita existe para assediar. Esta informação advém da ausência de sanções em relação àqueles que não cumprem normas ou violam políticas de combate ao assédio moral. Entrevistas realizadas com vítimas revelaram que o fenômeno parece prevalecer em empresas nas quais a cultura organizacional permite ou até valoriza esse tipo de comportamento (Einarsen, Skogstad, Raknes, & Matthieses, 1994).
Outra forma de intervenção citada nas entrevistas foi, diante da eminência do assédio moral, conversar com o agressor e solicitar mudança de comportamento, ilustrado no relato do Sujeito F:
Chamamos para uma conversa no setor de RH. É o momento em que se pode abrir espaço para a conversa sobre o que está acontecendo e orientar este trabalhador. É explicado que não podemos tolerar aquele comportamento e combinamos um prazo para a mudança daquelas atitudes aconteça.
Crawshaw (2008) afirma que existem métodos de coaching específicos para reabilitação de líderes assediadores que envolvem o uso da empatia. Nestes casos, compreende-se que o assédio é uma resposta mal adaptativa do líder frente à percepção de alguma ameaça. Contudo, tem-se dado menos atenção a este tipo de intervenção, mostram as pesquisas.
No que diz respeito às intervenções para as vítimas de assédio moral, os resultados da pesquisa são incipientes, na medida em que foram negadas ocorrências de assédio moral. A literatura internacional e nacional (Glina & Soboll, 2012; Sheehan, 1999), entretanto, demonstram que os casos de assédio moral vêm crescendo de forma significativa na lógica das mudanças e pressões correntes do mundo do trabalho. Neste sentido, não pode-se deixar de relacionar as possíveis formas de acolhimento às vítimas de assédio.
Segundo a European Agency for Safety and Health at Work (2002), as intervenções que focam vítimas de assédio moral no trabalho, são denominadas de nível individual e visam melhorar as possibilidades do indivíduo para lidar com o estresse. Neste patamar, pode-se trazer como exemplos de intervenções para as vítimas do assédio moral no trabalho: aconselhamento, grupo de apoio, estratégias de reabilitação e retorno ao trabalho, ouvidoria (Glina & Soboll, 2012). Existem ainda, outras formas de atuação, como demonstrado por Tehrani (2003), que sugere utilizar conselheiros profissionalmente treinados. Dentre as técnicas citadas pelo pesquisador, destacam-se: a inquirição (debriefing), a terapia narrativa, a terapia cognitivo-comportamental, a psicoterapia e os grupos de autoajuda.
Mais importante do que agir depois da ocorrência dos casos violentos, porém, é agir preventivamente, como aponta Heloani (2011), baseando-se no argumento de que as empresas nunca estão isentas de responsabilidade. A prevenção e combate evitaria, inclusive, que tais práticas tornem-se institucionalizadas e, assim, aceitas e naturalizadas.
Considerações Finais
As intervenções frente ao assédio moral são realizadas pelos Psicólogos, pontualmente, e não como um processo planejado que objetive enfrentá-lo enfaticamente. Em se tratando de prevenção, especificamente, não ocorrem ações voltadas para o assédio. Porém, os profissionais estudados entendem que realizam ações voltadas à prevenção, quando, por exemplo, capacitam gestores em cargos de liderança para a prática de feedback.
Diante da possibilidade ou ocorrência do assédio, também são apresentadas alternativas de intervenção: demissão, distanciamento dos envolvidos e orientação ao agressor. De qualquer modo, já se sabe, conforme apontam Glina e Soboll (2012) que intervenções isoladas e esporádicas não se mostram efetivas, visto que a abordagem deve levar em consideração as variáveis psicossociais, de clima e cultura da organização.
Os Psicólogos compreendem o assédio moral enquanto ato violento caracterizado por humilhações e constrangimentos causados à vítima. Reconhecem, também, que, na maioria das vezes, parte da direção vertical, ou seja, daqueles que se encontram em posição hierárquica superior às vítimas.
Cabem questionamentos acerca do papel do psicólogo diante do assédio moral. Uma vez que qualquer situação de violência, discriminação ou negligência devem ser veementemente combatidos por este profissional, segundo consta do Código de Ética Profissional dos Psicólogos (CFP, 2005). Diante da eminência do fenômeno, não se pode, sob qualquer justificativa, deixar de agir claramente e objetivamente, através de ações que vão desde a prevenção, até medidas de ordem secundária e terciária. Estariam os Psicólogos, no contexto das organizações, sucumbindo ao seu papel, em favor das estratégias de gestão? Esse é o questionamento que resulta deste trabalho.
A partir disto, sugere-se a realização de estudos futuros que se proponham a refletir criticamente sobre o papel do Psicólogo nas organizações de trabalho. Dadas as limitações deste estudo, sobretudo que os dados aqui apresentados não são representativos da categoria, a pesquisa aponta, também, para a necessidade de ampliação da discussão no que tange a efetividade de intervenções psicológicas em relação ao assédio moral, em populações brasileiras. Da mesma forma, o pequeno número de Psicólogos entrevistados pode ter enviesado os resultados do estudo no que diz respeito ao fato de que, em praticamente todas as empresas, foi dito que o assédio moral não ocorre.
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Endereço para correspondência:
Vanessa Rissi
Faculdade Meridional - IMED, Departamento de Pós-Graduação Lato Sensu em Psicologia
Rua Senador Pinheiro, 304, Cruzeiro
Passo Fundo, RS, Brasil 99070-220
Fone/Fax: (54) 3045-6100
E-mail: vanessa.rissi@imed.edu.br, janinekm@unisinos.br, willcecconello@yahoo.com.br e moraeseliz@yahoo.com.br
Recebido: 07/10/2014
1ª revisão: 04/03/2015
Aceite final: 31/03/2015