Serviços Personalizados
Journal
artigo
Indicadores
Compartilhar
Avaliação Psicológica
versão impressa ISSN 1677-0471versão On-line ISSN 2175-3431
Aval. psicol. v.5 n.2 Porto Alegre dez. 2006
RESUMOS-XI SIMPÓSIO DA ANPEPP
Aspectos cognitivos em idosos
Irani I. de Lima Argimon
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
Nos últimos anos, os países em desenvolvimento se deparam com o envelhecimento da população. Em termos sócio-demográficos, isto pode ser explicado pela queda nas taxas de natalidade e pelo aumento da expectativa de vida principalmente em função das mudanças ocorridas nos setores econômico e científico. Segundo dados do IBGE, referidos por Argimon (2002), enquanto, em 1950, somente 4% da população tinham mais de 60 anos, em 1980, 6,4%, e que a projeção para o ano de 2025, especificamente no Rio Grande do Sul, é de 15%. Sendo assim, é possível afirmar que a sociedade está sendo colhida de surpresa frente ao envelhecimento populacional.
O envelhecimento populacional deve-se ao avanço da promoção de saúde nas últimas décadas, na qual se obtiveram o controle das doenças infecto-contagiosas e a diminuição da taxa de mortalidade infantil e da taxa de natalidade. Em decorrência disso, ocasionou-se uma mudança no perfil demográfico e epidemiológico da população.
Estes dados são muito importantes para profissionais de saúde mental. Se lembrarmos que a chamada terceira idade apresenta problemas peculiares, seu atendimento não irá representar um aumento de cuidados já previstos e dispensados a outros grupos etários (OMS, 1984) e sim cuidados próprios para esta faixa etária. A constatação de que a população idosa está em contínuo aumento induz a uma reconsideração nas áreas de competência dos profissionais de Saúde, que deverão, cada vez mais, se especializar em técnicas voltadas para esta faixa etária.
No que diz respeito à área cognitiva, o declínio cognitivo ocorre como um aspecto normal do envelhecimento. A natureza exata destas mudanças, no entanto, não é uma certeza, e problemas relacionados à linha que separa este declínio de possibilidades de uma possível demência são muito tênues, principalmente por não haver ainda uma referência consistente frente à demanda nesta faixa etária.
A implementação de estudos em idosos, que apresentem um perfil biopsicossocial considerado de boa qualidade, é crucial para tentar estabelecer um limite entre o patológico e o normal esperado na velhice. As pessoas idosas, fisicamente ativas, têm capacidade semelhante à das pessoas jovens ativas. Isso significa que alguns processos fisiológicos, que diminuem com a idade, podem ser modificados pelo exercício e pelo condicionamento físico (Argimon & Stein, 2005). O envelhecimento humano é um processo biológico natural, e não patológico caracterizado por uma série de alterações morfo-fisiológicas, bioquímicas e psicológicas que acontecem no organismo ao longo da vida.
Com relação às habilidades cognitivas, Bee (1997) salienta que dos 65 anos aos 75 anos algumas das mudanças cognitivas são sutis ou até inexistentes como é o caso do conhecimento de vocabulário, entretanto, ocorrem declínios importantes nas medidas que envolvem velocidade ou habilidades não exercitadas.
No que se refere à saúde mental, Papalia e Olds (2000) referem que, o declínio nesta área não é típico na terceira idade e que a doença mental é mais comum no adulto jovem do que no adulto mais velho. Na velhice, as pessoas podem e efetivamente continuam a adquirir novas informações e habilidades, bem como ainda são capazes de lembrar e usar bem aquelas habilidades que já conhecem. Os autores destacam ainda que o início da senescência varie bastante e justificam através da teoria biológica do envelhecimento e da teoria de programação genética. A justificativa é de que, por um plano normal de desenvolvimento embutido nos genes, os corpos envelhecem, salientando, portanto que, cada espécie tem sua própria expectativa de vida e padrão de envelhecimento. Esses processos, segundo essas autoras, podem ser influenciados tanto por fatores internos quanto externos. Resumindo e utilizando estas duas teorias, pode-se dizer que a programação genética pode limitar a duração máxima da vida, mas, fatores ambientais e de estilo de vida, podem afetar o quanto uma pessoa se aproxima do máximo, e em que condições. Cada fase da vida é influenciada pela que a antecedeu e irá afetar a que virá a ocorrer.
Em idosos saudáveis, as mudanças no cérebro geralmente são modestas e fazem pouca diferença no funcionamento (Papalia & Olds 2000). Quando existe um problema que esteja relacionado com o sistema nervoso central, este pode afetar a cognição, piorando o desempenho em testes cognitivos (principalmente nos testes com controle de tempo) e, pode interferir na capacidade de aprender e lembrar. O processamento mais lento de informações pode fazer com que pessoas com mais idade não entendam quando informações são apresentadas muito rapidamente ou sem muita clareza.
Assim, considera-se necessário seguir investigando essa etapa da vida com o objetivo de melhor compreender como se processa o desenvolvimento cognitivo na terceira idade e para isto será utilizado o Wisconsin Card Sorting Test (WCST) ou Teste Wisconsin que é um teste, criado em 1948, ampliado e revisado posteriormente, que avalia o raciocínio abstrato e a capacidade do sujeito para gerar estratégias de solução de problemas, em resposta a condições de estimulação mutáveis. Desta forma, também pode ser considerada uma medida da flexibilidade do pensamento. Criado para a população geral passou a ser empregado, cada vez mais, como um instrumento clínico na avaliação neuropsicológica de funções executivas que envolvem os lobos frontais (Huber, Bornstein, Rammohan et al., 1992).
Entre as pesquisas realizadas com o Teste Wisconsin, a maioria utilizou como sujeitos, crianças e adolescentes (Harris, Schuerholtz, Singer e colaboradores, 1995) teste este adaptado e padronizado para o Brasil por Cunha, Trentini, Argimon, Oliveira, Werlang e Prieb em 2005. Trata-se de uma técnica sensível a transtornos de déficit de atenção/hiperatividade, aprendizagem de leitura, transtornos convulsivos e outros. Entretanto, é expressivo o número de investigações de problemas envolvendo funções executivas em adultos que relacionam o declínio cognitivo associado ao envelhecimento (DCAE), seja em transtornos como demência, esclerose múltipla, Parkinson, Alzheimer, etc.
Estudar o envelhecimento cognitivo torna-se cada vez mais importante, considerando que o avanço da idade já caracteriza os paises desenvolvidos e, aos poucos, naturalmente desperta o interesse nos países em desenvolvimento, uma vez que consiste em uma demanda crescente em saúde pública. Os pesquisadores passaram a se preocupar com a possibilidade de dificuldades em outras funções cognitivas além da memória. Tendo em vista as controvérsias na literatura relacionadas na hipótese frontal do envelhecimento, há questionamento sobre as funções executivas constituírem as primeiras a sofrer a ação do passar dos anos.
Fuster (1997) refere que as características clássicas da síndrome disexecutiva (dificuldades atencionais e de planejamento) podem estar presentes, sendo que são comuns em pacientes com lesão frontal dificuldades de abstração, raciocínio e de flexibilidade do pensamento.
O Teste de Wisconsin é um instrumento com extensiva aplicação clínica e, embora venha sendo bastante utilizado no Brasil, só estão disponíveis normas americanas para adultos e idosos. Por outro lado, uma vez que o Teste Wisconsin não oferece maiores problemas para o uso transcultural, por se tratar de cartas com cor e figuras comuns, não se faz necessário a validação do instrumento, mas sim o desenvolvimento de normas brasileiras, aspecto que pode ter uma variação importante de cultura para cultura.
Justifica-se, assim o estudo para o desenvolvimento de normas para a população brasileira de 60 anos, ou mais do referido instrumento.
Referências
Argimon, I. L. (2002). Desenvolvimento Cognitivo na Terceira Idade. Tese de Doutorado não publicada. Faculdade de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Porto Alegre.
Argimon, I..L.; & Stein, L. M. (2005). Habilidades Cognitivas em Indivíduos muito Idosos: Um Estudo Longitudinal. Cadernos de Saúde Pública, 1, p. 64-72.
Bee, H. (1997). O Ciclo Vital. Porto Alegre: Artes Médicas.
Cunha, J. A.; Trentini, C. M.; Argimon, I. L.; Oliveira, M. S.; Werlang, B. G.; & Prieb, R. G. (2005). Teste Wisconsin de Classificação de Cartas - Adaptação e Padronização Brasileira. São Paulo: Casa do Psicólogo.
Fuster, J. M. (1997). The prefrontal córtex. Anathomy, physiology and neuropsychology of the frontal lobe. III ed. Philadelphia: Lippincott-Raven.
Harris, E. L.; Schuerholtz, L. J.; Singer, H. S.; Reader, M. J. & colaboradores (1995). Executive function in children with Tourette Syndrome and/or attention deficit hyperactivity disorder. Journal of the International Neuropsychological Society, 1(6), 511-516.
Huber, S. J.; Bornstein, R. A.; Rammohan, K. W.; Christy, J. A.; & colaboradores. (1992). Magnetic resonance imaging correlates of executive functions impairment in multiple sclerosis. Neuropsychiatry, Neuropsychology and Behavioral Neurology, 5 (1), 33-36.
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). (1994). Projeção preliminar da população do Brasil para o período 1980-2020. Texto para discussão nº 73. Rio de Janeiro: Diretoria de Pesquisa.
Papalia, D. E. & Olds, S. W. (2000). Desenvolvimento Humano. Porto Alegre: Artes Médicas.
OMS-Organización Mundial de la Salud (1984). Aplicaciones de la epidemiologia al estúdio de los ancianos: informe de um grupo científico de la OMS sobre a epidemiologia Del envejecimento. Ginebra: OMS, Série de informes técnicos. 706.