O período de adaptação e integração dos estudantes universitários nas instituições de ensino superior (IES) pode ser desafiador. Adaptar-se a este contexto demanda estratégias e recursos subjetivos mediante as mudanças nos âmbitos pessoais, interpessoais, financeiros, vocacionais e na rotina (Almeida & Soares, 2004; de Barros Torres & Almeida, 2021). Assim, o conceito de Adaptação Acadêmica é utilizado para abranger todos esses processos e corresponde à maneira pela qual os estudantes interpretam e respondem às novidades do contexto universitário (Oliveira & Levindo, 2020; Teixeira et al., 2008).
Quando a inserção e adaptação à vida acadêmica não ocorrem de forma satisfatória, são identificados resultados negativos no bem-estar e na saúde dos universitários (Fonte & Macedo, 2020; Sahão & Kienen, 2021; Souza et al., 2021). As expectativas reais e ajustadas em relação ao curso, habilidades sociais e a percepção de satisfação são variáveis que contribuem para a melhor adaptação dos estudantes, consecutivamente melhor estabelecimento de relações interpessoais e desempenho acadêmico (Soares et al., 2024). O amadurecimento também se configura como potencializador para que a adaptação à universidade seja facilitada e favoreça as condições necessárias para conclusão da graduação, engajamento ao longo do curso e a qualificação profissional (Peron, 2019; Sahão & Kienen, 2021; Soares et al., 2019).
Dentre as variáveis que afetam o processo de adaptação, encontra-se a autoeficácia. Especificamente, esta é entendida como crenças que determinam como o indivíduo avalia sua capacidade de realizar ou não determinadas ações (Bandura, 2001). Tal construto está positivamente correlacionado à adaptação acadêmica, sendo que as crenças nas capacidades ou habilidades influenciam não somente o desempenho acadêmico, mas a motivação, o estabelecimento de relações entre pares, a autorregulação, a qualidade de vida, a intenção de permanência no curso e a adaptação à universidade como um todo (Guerreiro-Casanova & Polydoro, 2011; Monteiro & Soares, 2023).
As crenças de autoeficácia são destacadas em pesquisas brasileiras como um importante fator a ser compreendido no período da adultez emergente, em especial quando correlacionada ao período da adaptação acadêmica (Vieira, 2019). As crenças podem ser preditoras para um adulto emergente ter sucesso em sua transição para a fase adulta, pois possuem um papel fundamental na escolha e desenvolvimento profissional destes indivíduos, ao passo que também atuam como fatores protetivos de saúde mental (Barrera Herrera & Vinet, 2017; Lima et al., 2019; Dutra-Thomé et al., 2017; Pereira et al., 2016; 2018). Quanto mais elevada a autoeficácia, maiores são as chances de ampliar suas possibilidades profissionais, pois sua motivação e mobilização para tal atividade será maior. De modo convergente, o empenho nos estudos é mais observado em adultos autoeficazes, aspecto que, por sua vez, impacta diretamente no processo de desenvolvimento de carreira (Ambiel et al., 2018; Leme et al., 2021; Santos et al., 2019; Monteiro & Soares, 2023)
O conceito Adultez Emergente foi cunhado para retratar o modo de vida do indivíduo adulto do século XXI na faixa etária entre 18 e 29 anos (Andrade, 2006; Arnett, 2000; 2001; Arnett, et al., 2014). Ateoria que retrata esta etapa do desenvolvimento humano foi desenvolvida a partir de modificações culturais em alguns marcadores da transição da adolescência para adultez que deixaram de representar este período. Por exemplo, há um aumento no tempo em que as pessoas permanecem estudando e maiores dificuldades em adentrar ao mundo do trabalho, em alguns casos por consequência do próprio investimento nos estudos. Além disso, sair da casa dos familiares se torna um processo cada vez mais tardio e, consecutivamente, as composições familiares se originam mais tarde (Dutra-Thomé et al., 2018).
Destaca-se que as características do período da adultez emergente irão variar conforme a cultura. Por exemplo, no contexto norte-americano, o período pode ser identificado por meio das seguintes características: a maior exploração de sua identidade, sentimentos relacionados à transição entre a adolescência e a adultez (sentimento intermediário), autofocalização, instabilidade e sentimentos relacionados às possibilidades de futuro (Arnett, 2000; Arnett & Tannel, 2006; Arnett et al., 2014).
Na Europa, as características dos adultos emergentes podem variar conforme a região e as influências políticas locais, em relação ao tempo investido nos estudos, inserção no mercado de trabalho, políticas públicas e período de permanência nas residências familiares de origem. A exemplo, países nórdicos investem em direitos via apoio estatal aos indivíduos, beneficiando jovens de classe média a se engajarem no desenvolvimento de autonomia, autossuficiência e responsabilidade. Países de origem alemã ou francesa apoiam, além dos indivíduos, os núcleos familiares, fornecendo suporte educacional para a inserção no mercado de trabalho; os primeiros filhos viriam após um período de estabilidade laboral e as relações interpessoais variam até se consolidarem. No países anglo-saxões os jovens investiriam menos tempo nos estudos, saem da casa dos pais e tendem a formar relações afetivas de coabitação mais cedo, mesmo que também adiem a paternidade como nos outros países europeus (Douglass, 2007).
No contexto brasileiro, algumas características do período ainda não seriam identificadas em a toda população da faixa etária, à medida que a desigualdade nos contextos socioeconômicos, interpessoais e educacionais não proporcionam condições adequadas, especialmente para as pessoas em situações de vulnerabilidade. Dados semelhantes podem ser identificados no contexto Argentino e do Reino Unido, em que as condições socioeconômicas desfavorecidas impactam as perspectivas de futuro e características descritas aos adultos emergentes (Brandão et al., 2012; Dutra-Thomé & Koller, 2014; Douglass, 2007; Dutra-Thomé et al., 2018). O ingresso no ensino superior nem sempre ocorre imediatamente após a conclusão do ensino médio já que uma parcela desta população não possui condições financeiras suficientes no começo deste período desenvolvimental (18 a 24 anos). Ainda assim, mesmo quando ingressam na universidade, alguns estudantes podem não conseguir permanecer no curso, sendo que um dos principais motivos é a necessidade de complementar a renda familiar (Ambiel & Barros, 2018; Sahão & Kienen, 2021).
Apesar das especificidades, há evidências de que os brasileiros estariam apresentando algumas características típicas do que se compreende como adultez emergente, tais como a ambivalência, exploração de identidade, e os comportamentos de exploração das suas possibilidades (de Souza & Murgo, 2022; Faggiani, 2017). Assim como observa-se que a entrada no mercado de trabalho também ocorre tardiamente e que há dificuldades para a inserção destes adultos aos ambientes laborais. O trabalho pode se configurar como fonte de satisfação pessoal, principalmente nos grupos de adultos em situações econômicas mais favorecidas, ao investirem mais em sua formação profissional, com planejamentos de médio e longo prazo, para que, ao adentrar o mercado de trabalho, obtenham satisfação e condições melhores em suas funções. Além disso, observa-se uma grande rotatividade e o desejo pró estabilidade a partir dos 30 anos (Arnett et al., 2018; de Souza & Murgo, 2022; Dutra-Thomé & Amazarray, 2018).
Frente ao exposto, considera-se que a adaptação ao contexto universitário pode repercutir não somente em prejuízos à saúde mental (Fonte & Macedo, 2020), mas também no desempenho acadêmico, nas percepções de competências (Ambiel et al., 2018), nos processos de desenvolvimento pessoal e perspectivas de futuro, até mesmo, em última instância, na evasão escolar (Ambiel & Barros, 2018).
Considerando, ainda, as implicações do período da adultez emergente e suas especificidades na cultura brasileira (de Souza & Murgo, 2022), o objetivo geral desta pesquisa foi verificar as possíveis associações entre a Adaptação Acadêmica, período relevante para a permanência e engajamento de estudantes, as crenças de Autoeficácia, relacionas à avaliação destes estudantes quanto às suas potenciais competências para a formação profissional e as dimensões do período Adulto Emergente, compreendo suas características em estudantes universitários brasileiros. Dentre os objetivos específicos, analisar diferenças de médias entre as pontuações, considerando as variáveis faixa etária, regionalidade e cursos de graduação dos universitários.
Método
Participantes
A amostra contou com 186 participantes, com idade de 18 a 29 anos (M= 22,58; DP = 3,23), sendo que 67,7% (n = 126) eram do gênero feminino. Os participantes eram oriundos da região Sudeste (n = 104; 55,9%), Sul (n = 37; 19,98%), Nordeste (n = 28; 15,1%), Centro-Oeste (n = 12; 6,5%) e Norte (n = 5; 2,7%). As grandes áreas do conhecimento dos cursos de origem, organizados de acordo com a CAPES (Brasil, 2020) presentes no estudo foram: Ciências da Saúde (n = 52; 28%), Ciências Sociais Aplicadas (n = 31; 16,7%), Ciências Humanas (n = 29; 15,6%), Ciências Exatas e da Terra (n = 24; 12,9%), Linguística, Letras e Artes (n = 21; 11,3%), Ciências Agrárias (n = 13; 7%), Engenharias (n = 10; 5,4%), e Ciências Biológicas (n = 6; 3,2%).
Instrumentos
Questionário sociodemográfico (desenvolvido especificamente para esta pesquisa): contendo questões relativas a gênero, faixa etária, estado civil, orientação sexual, religião, filhos, etnia, com deficiência, com quem residia, região e prática de atividades físicas. Além disso, buscou-se identificar o grau de escolaridade, curso, titulações e tipo de instituição.
Questionário de Vivências Acadêmicas - versão reduzida (QVA-r) (Granado et al., 2005): busca avaliar, sentimentos, pensamentos e estratégias de adaptação à vida acadêmica mediante cinco dimensões (Institucional, Pessoal, Interpessoal, de Carreira e Estudo). O instrumento é composto por 55 itens que são respondidos a partir de uma escala Likert, variando em 1 (nada a ver comigo) a 5 (tudo a ver comigo). Os índices de fidedignidade da versão brasileira são os seguintes para as dimensões: pessoal (α = 87), interpessoal (α = 86), carreira (α = 91), estudo (α = 82) e institucional (α = 71).
Inventário de Dimensões da Adultez Emergente (IDEA) (Reifman et al., 2007) versão brasileira Dutra-Thome & Koller, 2017): avalia características da etapa do desenvolvimento denominada Adultez Emergente (18 a 29 anos) e é composto por 29 itens dispostos nas subescalas de Exploração de Identidade, Experimentação/ Possibilidades, Negatividade/Instabilidade, Autofoco, “Sentindo-se entre” e Outro foco. O inventário é respondido com base em uma escala Likert de 1 (discordo totalmente) a 4 (concordo totalmente) Para o instrumento brasileiro, o α para todas as subescalas é de 0,80.
Escala de Autoeficácia na Formação Superior (AEFS) (Polydoro & Guerreiro-Casanova, 2010): avalia a percepção de estudantes de ensino superior em relação às crenças acerca de suas próprias capacidades para organizar e executar comportamentos envolvidos em seu processo acadêmico-formativo. A escala é composta por 34 itens respondidos em uma escala do tipo Likert de 10 pontos (variando entre 1= pouco capaz e 10= muito capaz), agrupados em 5 dimensões: 1. Autoeficácia Acadêmica (α = 0,88); 2. Autoeficácia na Regulação da Formação (α = 0,87); 3. Autoeficácia na Interação Social (α = 0,85); 4. Autoeficácia em Ações Proativas (α = 0,80) e 5. Autoeficácia na Gestão Acadêmica (α = 0,80). Houve um erro de coleta, e o item dois da dimensão de Autoeficácia na Gestão Acadêmica não foi respondido pela maior parte dos participantes. Assim, não foi somado ao escore desta; levados em consideração os demais itens do fator, foi realizado o alfa de Cronbach, com valor de 0,92, demonstrando uma consistência interna excelente e sem prejuízos ao fator.
Procedimentos
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Oeste Paulista (CAEE: 40591720.8.0000.5515). Para coletar os dados foi desenvolvido um formulário na plataforma do Google Forms que incluía o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, questionário demográfico, QVA-r, IDEA e a AEFS. A coleta dos dados ocorreu exclusivamente de forma online por meio de divulgação em snowball do link do formulário via utilização das redes sociais online, bem como, contato via correio eletrônico (e-mail) com as instituições de ensino superior brasileiras.
Análise de Dados
A análise de dados foi realizada no software IBM Statistical Package for Social Science (SPSS) versão 26. Foram geradas estatísticas descritivas e avaliada a distribuição normal dos escores pelo teste de Kolmorogov-Smirnov (KS). As correlações foram analisadas por meio de Correlação de Pearson com procedimento de Bootstrapping (BCa). A fim de avaliar como as dimensões de autoeficácia e a adultez emergente impactaram a adaptação acadêmica, foram realizadas regressões lineares múltiplas com método stepwise, tendo como variável dependente a adaptação acadêmica e independentes a adultez emergente e a autoeficácia para formação superior. Os resíduos foram analisados via Durbin-Watson e a colienearidade por meio do VIF (Field, 2018).
Resultados e Discussão
Inicialmente, a fim de compreender as peculiaridades da amostra e revelar interferências das variáveis sociodemográficas nas variáveis que se configuraram como principal objeto de estudo desta pesquisa, a saber, adaptação acadêmica, adultez emergente e autoeficácia, serão apresentadas as estatísticas descritivas na Tabela 1. Além disso, analisou-se o pressuposto de normalidade dos dados, por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov.
Tabela 1 Estatística descritiva dos instrumentos e teste de normalidade
KS | Média | Desvio-Padrão | |
---|---|---|---|
1. Experimentação/Possibilidade (IDEA) | 0,157 | 9,75 | 2,02 |
2. Negatividade/Instabilidade (IDEA) | 0,101 | 21,60 | 4,28 |
3. Autofocada(IDEA) | 0,094 | 24,26 | 4,29 |
4. Exploração de Identidade (IDEA) | 0,135 | 15,90 | 3,41 |
5. Outro Foco (IDEA) | 0,129 | 5,69 | 1,62 |
6. Sentindo-se entre (IDEA) | 0,142 | 12,61 | 3,11 |
7. Dimensão Pessoal (QVA-r) | 0,071 | 43,65 | 11,42 |
8. Dimensão Interpessoal (QVA-r) | 0,087 | 39,84 | 7,80 |
9. Dimensão Careira (QVA-r) | 0,128 | 46,63 | 8,74 |
10. Dimensão Estudo (QVA-r) | 0,059 | 32,00 | 6,64 |
11. Dimensão Institucional (QVA-r) | 0,129 | 30,05 | 4,33 |
12. Autoeficácia acadêmica (AEFS) | 0,125 | 70,71 | 15,20 |
13. Autoeficácia na regulação da formação (AEFS) | 0,119 | 52,46 | 13,62 |
14. Autoeficácia em ações proativas (AEFS) | 0,092 | 49,19 | 14,72 |
15. Autoeficácia na interação social (AEFS) | 0,119 | 53,10 | 13,64 |
16. Autoeficácia na gestão acadêmica (AEFS) | 0,171 | 24,58 | 5,70 |
Nota. KS = Kolmorogov-Smirnov; IDEA = Inventário de Dimensões da Adultez Emergente; QVA-r = Questionário de vivências acadêmicas - versão reduzida; AEFS = Escala de Autoeficácia na formação superior
Observa-se que as distribuições das variáveis não atenderam o pressuposto de normalidade. Em relação às estatísticas descritivas, na Escala de Autoeficácia na Formação Superior (AEFS), as maiores médias foram as das dimensões Autoeficácia Acadêmica, que corresponde à crença de apreender e aplicar os conhecimentos, e de Autoeficácia na Interação Social, referente a crenças de bom estabelecimento de relações interpessoais com professores ou colegas (Polydoro & Guerreiro-Casanova, 2010). No Questionário de Vivências Acadêmicas - versão reduzida (QVA-r), as maiores médias foram nas dimensões Carreira, que envolve as perspectivas de futuro profissional, satisfação com o curso, reconhecimento de competências para o curso - e dimensão Pessoal, que aborda o bem-estar, físico e psicológico, o equilíbrio emocional e afetivo, otimismo e autoconfiança (Braga, 2017; de Souza & Franco, 2018; Sahão, 2019).
Por fim, no Inventário de Dimensões da Adultez Emergente (IDEA), as dimensões Autofoco e a Negatividade/Instabilidade foram as dimensões nas quais os participantes tiveram maiores médias, indicando o que a literatura descreve como característico desta etapa. Da mesma forma que estes adultos possuiriam maior autonomia de decisão, haveria mais vivências instáveis, em que experiências negativas ou malsucedidas seriam frequentes. (Arnett et al., 2014; Cavaleiro Ribeiro da Costa, 2022; Dutra-Thomé & Koller, 2017; Dutra-Thomé et al., 2018). Na sequência foi realizada uma correlação de Pearson com permutação aleatória de dados para avaliar as correlações entre os fatores de adultez emergente com os fatores de vivências acadêmicas, de autoeficácia e a variável idade. Os resultados estão apresentados na Tabela 2.
Tabela 2 Correlação de Pearson entre adultez emergente, vivências acadêmicas, autoeficácia e idade
Variáveis | 1 | 2 | 3 | 4 | 5 | 6 |
---|---|---|---|---|---|---|
1. Experimentação/Possibilidade (IDEA) | - | |||||
2. Negatividade/Instabilidade (IDEA) | 0,07 | - | ||||
3.Autofocada(IDEA) | 0,46*** | -0,05 | - | |||
4. Exploração (IDEA) | 0,35*** | 0,28*** | 0,41*** | - | ||
5. Outro foco (IDEA) | 0,08 | 0,22** | 0,12 | 0,12 | - | |
6. Sentindo-se entre (IDEA) | 0,32*** | 0,24*** | 0,15* | 0,51*** | 0,02 | - |
7. Adaptação Pessoal (QVA-r) | -0,09 | 0,43*** | -0,18* | 0,15* | 0,06** | 0,21*** |
8. Adaptação Interpessoal (QVA-r) | 0,06 | -0,01 | 0,08 | 0,03 | 0,22** | -0,05 |
9. Adaptação Carreira (QVA-r) | 0,22** | -0,01 | 0,12 | 0,07 | 0,20 | -0,04 |
10. Adaptação Estudo (QVA-r) | 0,21** | -0,15* | 0,20*** | 0,10 | 0,12 | -0,07 |
11. Adaptação Institucional (QVA-r) | 0,15* | 0,153* | 0,10 | 0,14* | 0,15* | 0,00 |
12. A.E. Acadêmica | 0,06 | -0,09 | 0,10 | 0,01 | 0,10 | -0,15* |
13. A. E. Regulação da Formação | 0,05 | -0,15* | 0,12 | -0,01 | 0,14* | -0,17* |
14. A.E Ações Proativas | 0,06 | -0,10 | 0,13 | 0,05 | 0,03 | -0,14* |
15. A.E Interação Social | 0,05 | -0,06 | 0,07 | -0,04 | 0,16* | -0,13 |
16. A. E. Gestão Acadêmica | 0,09 | -0,04 | 0,14 | 0,06 | 0,07 | -0,00 |
17. Idade | -0,08 | 0,03 | 0,03 | -0,03 | 0,08 | -0,15* |
Nota. * p < .05, ** p < .01, *** p < .001; IDEA= Inventário de Dimensões da Adultez Emergente; QVA-r = Questionário de vivências acadêmicas -versão reduzida; A. E. = autoeficácia
Dentre as dimensões da Adultez Emergente, as correlações foram, em grande parte, estatisticamente significativas. A faixa etária apresentou uma correlação estatisticamente significativa com a dimensão “Sentido-se entre”, indicando que quanto maior a idade, menores são os níveis de percepção subjetiva de estar vivenciando a transição entre as fases da adolescência e vida adulta, característica principal da dimensão do IDEA relacionada ao sentimento de experienciar ambas as etapas, principalmente nos primeiros anos da faixa etária correspondente (18 a 24 anos). Algumas pesquisas no contexto brasileiro reforçam os dados apresentados, de que quanto mais se avança na etapa adulta, maior a percepção deste indivíduo sobre sentir-se adulto de fato. Indivíduos com mais de 25 anos tendem a possuir maior percepçção de vivenciar a etapa adulta efetivamente e a buscar maior estabilidade em todas as áreas de sua vida (Arnett et al., 2014; Arnett et al., 2018; Dutra-Thomé & Amazarray, 2018; Núñez; 2018; Ponciano, 2018).
As dimensões da Adaptação Acadêmica e Autoeficácia também apresentaram correlações estatisticamente significativas em relação às dimensões do IDEA. Para a dimensão Experimentação/Possibilidade, as dimensões Estudo e Institucional apresentaram correlações significativas. A dimensão Estudo também se correlacionou com a dimensão Autofocada do IDEA, e a dimensão Institucional com Instabilidade/Negatividade, Exploração e Outro foco.
Os estudantes, independente da faixa etária, que estariam engajados em estabelecer hábitos e rotinas de estudo, bem como a preparação para avaliações, tenderiam a experienciar este momento do curso de forma mais assertiva, aproveitando as oportunidades e recursos disponíveis da instituição para apresentar melhor desempenho. A maneira como o estudante se organiza para os estudos, desde o primeiro ano, poderia impactar não somente o desempenho acadêmico, mas a sua integração ao curso de ensino superior, participação em atividades, motivação, autoeficácia e evasão. Tais apontamentos são essenciais para adaptação dos universitários, assim como o estabelecimento de redes de apoio e a percepção de satisfação com o curso e com a IES frequentada. (Casanova et al., 2021; Cavaleiro Ribeiro da Costa, 2022; Costa et al., 2018; Farias et al., 2022; Fior et al., 2022; Fonte & Macedo, 2020; Martins & Santos, 2019).
Dentre as dimensões da Adaptação Acadêmica, a dimensão Pessoal apresentou correlações significativas com Negatividade/instabilidade, Sentindo-se entre, Outro foco e Exploração do IDEA. O bem-estar, a saúde física e mental, a autoconfiança, e um equilibro emocional seriam pontos de destaque e imprescindíveis aos universitários durante todo o período de adaptação ao curso e para a etapa do desenvolvimento que estariam vivenciando. Sentir-se satisfeito com a escolha do curso e com a IES são elementos fundamentais para o bem-estar dos estudantes durante este período de desenvolvimento em que situações de instabilidade, mudanças subjetivas, e exploração de identidade estão ocorrendo paralelamente à inserção e formação profissional (Cavaleiro Ribeiro da Costa, 2022; Fonte & Macedo, 2020; Froeseler, 2019).
Em relação às dimensões correspondentes às crenças de Autoeficácia da presente amostra, correlações foram estatisticamente significativas e negativas para a dimensão “Sentindo-se entre” e as dimensões de Autoeficácia Acadêmica, na Regulação da Formação e Ações Proativas. Quanto mais o estudante possui a percepção de estar vivendo um período de transição (adolescência -vida adulta), a sua avaliação em relação à capacidade de autorregular-se, aplicar seus conhecimentos, oportunizar situações ou inserir-se em contextos que maximizem sua formação sofreria impacto direto do quão habilidoso ou capaz este indivíduo se percebe.
A dimensão de Autoeficácia para a Formação também se correlacionou negativamente com a dimensão Negatividade/instabilidade, demonstrando que quanto mais instável o período, menos possibilidade de avaliar adequadamente a capacidade em relação a autorregularse durante o período de formação profissional. Crenças ajustadas de Autoeficácia contribuem para aumentar engajamento, motivação, participação efetiva em atividades, autorregulação e a adaptação deste estudante ao curso e contexto universitário (Casanova et al., 2021; Fior et al., 2022; 2022; Lima & Moraes, 2023; Martins & Santos, 2019; Monteiro & Soares, 2023; Santos et al., 2019).
Possuir Outro foco, ou seja, se engajar em experiências ou atividades em que o foco em si próprio não seja o principal, apresentou correlações positivas na presente amostra com as dimensões Autoeficácia na Regulação da Formação e Autoeficácia para Interação Social, e com a dimensão Interpessoal da Adaptação Acadêmica. Quando o estudante não tem foco apenas em si e em seu desenvolvimento pessoal, ele pode se expor a situações de convívio social e estabelecer relações interpessoais que forneçam suporte frente a situações difíceis e demandas acadêmicas, bem como avaliar melhor suas capacidades de relacionamento e de autorregulação para atividades.
Na sequência, para descrever o potencial preditivo dos fatores do IDEA e da AEFS em relação aos fatores de vivências acadêmicas, foi realizada uma análise de regressão. Os coeficientes identificados por meio das dimensões do QVA-r em relação às dimensões da AEFS e do IDEA são apresentados na Tabela 3.
Tabela 3 Regressão múltipla tendo a adaptação acadêmica como variável dependente e a autoeficácia para formação superior e a adultez emergente como independentes
B | Erro Padrão | B Padronizado | t | r2 Ajustado | Δr2 | |
---|---|---|---|---|---|---|
Adaptação Pessoal | ||||||
(Intercept) | 34,911 | 6,479 | 5,38** | |||
Negatividade/Instabilidade (IDEA) | 1,010 | 0,176 | 0,379 | 5,73** | 0,182 | 0,186 |
A. E. Gestão Acadêmica | -0,387 | 0,129 | -0,193 | -3,005* | 0,232 | 0,046 |
Autofocada (IDEA) | -0,416 | 0,174 | -0,156 | -2,389** | 0,249 | 0,017 |
Sentindo-se entre (IDEA) | 0,518 | 0,245 | 0,141 | 2,115* | 0,267 | 0,018 |
Adaptação Interpessoal | ||||||
(Intercept) | 23,905 | 2,606 | 9,173** | |||
A. E. Interação Social | 0,406 | 0,046 | 0,71 | 8,848** | 0,312 | 0,316 |
A.E. Acadêmica | -0,13 | 0,041 | -0,253 | -3,179** | 0,344 | 0,035 |
Outro foco (IDEA) | 0,626 | 0,287 | 0,131 | 2,182* | 0,357 | 0,017 |
Adaptação de Carreira | ||||||
(Intercept) | 18,855 | 4,039 | 4,668** | |||
A. E. Acadêmica | 0,22 | 0,038 | 0,382 | 5,815** | 0,164 | 0,168 |
Experimentação/Possibilidade (IDEA) | 0,808 | 0,284 | 0,187 | 2,849** | 0,198 | 0,039 |
Outro foco (IDEA) | 0,766 | 0,354 | 0,142 | 2,164* | 0,214 | 0,02 |
Adaptação ao Estudo | ||||||
(Intercept) | 14,381 | 3,367 | 4,27** | |||
A. E. Gestão Acadêmica | 0,408 | 0,105 | 0,351 | 3,882** | 0,272 | 0,276 |
Experimentação/Possibilidade (IDEA) | 0,575 | 0,2 | 0,175 | 2,880** | 0,295 | 0,027 |
A. E. Acadêmica | 0,09 | 0,04 | 0,206 | 2,275* | 0,314 | 0,023 |
Negatividade/Instabilidade (IDEA) | -0,203 | 0,094 | -0,131 | -2,151* | 0,328 | 0,017 |
Adaptação Institucional | ||||||
(Intercept) | 19,955 | 2,199 | 9,07** | |||
A. E. Acadêmica | 0,086 | 0,02 | 0,303 | 4,330** | 0,076 | 0,081 |
Negatividade/Instabilidade (IDEA) | 0,185 | 0,071 | 0,183 | 2,619** | 0,105 | 0,033 |
Nota: * p < 0,05; ** p < 0,01; A. E. = autoeficácia; IDEA = Inventário de Dimensões da Adultez Emergente
No modelo de predição, a dimensão Pessoal que compõe a Adaptação Acadêmica [F(4, 181) = 16,465, p < 0,001;] e a dimensão Negatividade/instabilidade do período adulto emergente apresentaram as maiores variâncias [R2changed = 18,6%], assim como o maior impacto [B = 1,01; beta = 0,175]. Por sua vez, as variáveis Autoeficácia na Gestão Acadêmica e a dimensão Autofoco da adultez emergente apresentaram um coeficiente negativo, o que indica que ambas impactam em sentido inversamente proporcional a dimensão Pessoal. Tais resultados dão indicativos de potenciais impactos expressivos e negativos na experiência acadêmica. A vivência sistemática de momentos de instabilidade ou de negatividade pode impactar diretamente a saúde mental, o otimismo, a autoconfiança e a tomada de decisão, gerando planejamentos ineficazes ou desordenados das atividades acadêmicas (Dutra-Thomé & Koller, 2017; Granado et al., 2005).
Já em relação à dimensão Interpessoal da Adaptação Acadêmica [F(3, 182) = 35,291, p < 0,001;] a Autoeficácia, sozinha, conseguiu explicar 31,6% da variância. Comparada às outras variáveis independentes, a dimensão Interpessoal é a que possui maior tamanho de efeito (r2). A Autoeficácia Acadêmica é a única que impacta negativamente a dimensão Interpessoal [B = -0,13; beta = 0,253]. Essa dimensão diz respeito à capacidade de estabelecimento de relações interpessoais no contexto acadêmico, bem como a manutenção e capacidade de pedir ajuda a terceiros, caso haja necessidade (Granado et al., 2005).
Autoeficácia na Interação Pessoal se relaciona positivamente com a dimensão Interpessoal, indicando que quanto maiores os níveis de crença nas interações sociais, mais o indivíduo vai conseguir administrar as situações sociais, formar novos laços, e relacionar-se bem, seja com colegas ou corpo docente (Monteiro & Soares, 2023). Na presente amostra, a Autoeficácia Acadêmica é a única dimensão que impactou negativamente a dimensão Interpessoal, ou seja, quanto maior o foco nas atividades acadêmicas e maior tempo investido para os estudos, menos eficiente o estabelecimento de relações sociais. De tal maneira, é necessário pensar estratégias para equilibrar os estudos com a socialização, já que o suporte social pode ser um fator protetivo, ao passo que também auxilia no desenvolvimento de habilidades sociais, melhores crenças de autoeficácia, qualidade de vida e saúde (Pereira et al., 2016; 2018).
Quanto aos valores encontrados na dimensão Carreira doQVA-r[F(3,182)= 17,814, p<0,001;], observou-se que a Autoeficácia Acadêmica, Experimentação/Possibilidade e Outro foco impactaram positivamente nessa variável, sendo a primeira com maior impacto e poder explicativo [B = -0,220; beta = 0,038;]. Para a dimensão Carreira (QVA-r), a Autoeficácia Acadêmica, a Experimentação/ Possibilidades e Outros Focos são preditores para que o desenvolvimento de carreira e a percepção do futuro profissional sejam facilitados. Esta dimensão corresponde aos sentimentos relacionados ao curso de graduação que o aluno frequenta, as perspectivas de futuro profissional, percepção de competência para com o curso e a satisfação do indivíduo em relação aeste (Granado et al., 2005). Portanto, quando o aluno acredita ser capaz de aprender e aplicar conteúdos acadêmicos, tendo uma perspectiva otimista através das experiências e possibilidades que a universidade pode oferecer ao passo em que também não tem nenhuma responsabilidade para com terceiros que interfiram em seu engajamento, melhor será sua avaliação e sua satisfação relacionada aos estudos, universidade e a posse das competências para tal, bem como a visão de um futuro profissional.
Cabe elucidar que as dimensões Autoeficácia na Gestão Acadêmica, Experimentação/Possibilidade (IDEA) e Autoeficácia Acadêmica foram preditores positivos da dimensão de Adaptação ao Estudo, que compreende gerenciamento do tempo, rotinas de estudo, utilização de estratégias ou recursos facilitadores da aprendizagem e a preparação para os períodos de avaliações (Granado et al., 2005), Em contrapartida, a dimensão Negatividade/ Instabilidade (IDEA) se relacionou negativamente com a dimensão de Adaptação ao Estudo [F(4, 181) = 23,563, p < 0,001]. Assim, conforme o aluno gerencia as atividades de forma autorregulada, possuindo crenças positivas de suas capacidades, e tem oportunidade de explorar estas atividades de estudo com otimismo, visando a resultados positivos, seu desempenho nos estudos se torna mais satisfatório. A correlação da dimensão dos estudos com a de Negatividade/Instabilidade indica que o aluno tenderá a obter resultados menos exitosos, uma vez que estabelece um planejamento em que os resultados não serão satisfatórios para o que se comprometeu realizar.
O modelo que prediz a dimensão de Adaptação Institucional foi impactado apenas pela Autoeficácia Acadêmica [F(1, 184) = 16,224, p < 0,001], com baixa variância explicada. A dimensão de Adaptação Institucional, que engloba os sentimentos relacionados à instituição de ensino, a percepção e desejo de permanência, bem como o conhecimento e estima da infraestrutura que a instituição de ensino proporciona ao aluno (Granado et al., 2005), relacionou-se positivamente com Autoeficácia Acadêmica, ou seja, quanto maiores as crenças da capacidade de apreender e aplicar os conhecimentos adquiridos, melhor é a relação do aluno com a instituição. As relações interpessoais e a relação do aluno para com a instituição de ensino se estabelecem como fatores protetivos para adultos emergentes, propiciando a formação de crenças de Autoeficácia e o estabelecimento de papéis de adulto. (Dutra-Thomé et al., 2017; 2019; Leme et al., 2021).
Considerações finais
O presente estudo teve como objetivo avaliar as possíveis associações entre a Adaptação Acadêmica e Autoeficácia no período da adultez emergente. Os resultados identificaram características desta etapa do desenvolvimento humano na população investigada. As principais contribuições que esta pesquisa proporciona são os apontamentos no que diz respeito à relevância das relações sociais para as atividades de estudo, para a saúde mental e para a estabilidade afetiva e emocional de adultos emergentes brasileiros. De modo direto, os dados apontam que a criação de hábitos de estudos e organização de rotina são aspectos que contribuem para melhor desempenho acadêmico. Além disso, vivências mais positivas na universidade, englobando a satisfação com a escolha e a crença na capacidade de explorar e aproveitar oportunidades, podem ser fatores que potencializam a adaptação acadêmica.
Apesar de promissores, os resultados do estudo devem ser ponderados em virtude da ausência de dados suficientes para verificar possíveis especificidades em função de região geográfica ou áreas de conhecimento. De tal maneira, o tamanho amostrai da presente pesquisa permite explorar o fenômeno sem pretensão de generalização dos dados. São necessários novos estudos para ampliar o conhecimento desta etapa em adultos brasileiros, bem como investigações que associem a Adaptação Acadêmica e a Autoeficácia em adultos emergentes. Outro ponto a ser considerado como limitação do presente estudo trata-se da seleção de adultos emergentes apenas dentro do contexto universitário; a ampliação do conhecimento desta população deve ser cada vez mais investigada em todos os contextos que está inserida esta população, abrangendo não somente as áreas relacionadas ao trabalho e futuro profissional, mas oportunizando compreender mais cara-terísticas desta população no cenário nacional.