As pressões do mundo do trabalho contemporâneo têm levado os trabalhadores a questionarem suas percepções sobre o que significa ser bem-sucedidos e como preservar o bem-estar diante das exigências diárias. À medida em que as formas de produção e as relações de trabalho passam por rápidas transformações, a noção de sucesso na carreira tem sido ressignificada (Soares et al., 2023). Muitas pessoas começaram a entender o sucesso não apenas por meio de conquistas profissionais, mas também em relação à qualidade de vida e ao bem-estar (Calvosa, 2020). Assim, buscam alinhar suas atividades profissionais com valores pessoais e aspirações mais profundas, buscando maior bem-estar e significado (DaSilva Junior et al., 2023). Esse movimento reflete a compreensão cada vez mais difundida de que o desempenho no trabalho não deve ser alcançado às custas da saúde mental, do bem-estar e do tempo dedicado às relações pessoais e atividades fora do ambiente de trabalho (Audibert et al., 2020). Dentre as estratégias de que muitos profissionais lançam mão para fazer frente às pressões experienciadas no cotidiano de trabalho, encontram-se as práticas de atenção plena, como o mindfulness.
Apesar do crescente interesse nos efeitos dessas práticas sobre o bem-estar, a literatura ainda carece de uma compreensão integrada sobre como a psicologia positiva e o mindfulness contribuem para o bem-estar dos trabalhadores. Em especial, há uma escassez de estudos que abordem de maneira sistemática a aplicação dessas abordagens no contexto organizacional. A presente revisão sistemática busca preencher essa lacuna ao examinar como a literatura tem descrito a relação entre psicologia positiva, mindfulness e bem-estar no ambiente laboral, utilizando bases de dados reconhecidas e descritores padronizados. Ao fornecer uma análise crítica das evidências disponíveis, este estudo contribuirá para uma melhor compreensão de como essas práticas podem ser aplicadas de maneira estratégica para promover o bem-estar emocional e fortalecer um ambiente de trabalho saudável e produtivo.
O ambiente de trabalho tem o potencial para contribuir para o bem-estar dos trabalhadores, na medida em que é capaz de promover ambientes físicos e psicossociais saudáveis, a busca por equilíbrio adequado entre a vida profissional e pessoal e o fornecimento de oportunidades para o desenvolvimento profissional, por exemplo (Santos & Ceballos, 2013). O bem-estar é compreendido como um conjunto de elementos que contribuem para o desenvolvimento saudável do ser humano, indo além da ausência de emoções negativas (Adler & Seligman, 2016). Seligman vê as emoções como centrais para a Psicologia Positiva (PP), não apenas como reações a eventos, mas como componentes-chave para o desenvolvimento de uma vida rica e significativa. Ele enfatiza que a promoção das emoções positivas e a gestão saudável das emoções negativas são essenciais para alcançar uma vida equilibrada e gratificante (Seligman, 2002). Para a PP, as emoções negativas são aquelas que geram desconforto e mal-estar, afetando de forma adversa o estado emocional e psicológico de uma pessoa. Elas incluem sentimentos como tristeza, raiva, medo, culpa e ansiedade. Essas emoções podem ter um impacto significativo na saúde mental e no comportamento e, eventualmente, contribuir para o desenvolvimento de transtornos psicológicos ou reduzir a capacidade de enfrentar desafios (Scorsolini-Comin, 2012).
A literatura indica que investir no bem-estar no trabalho não apenas impacta positivamente a vida dos indivíduos, mas também traz benefícios substanciais para as organizações. Assim, uma cultura organizacional positiva, baseada em valores como respeito e transparência contribui para um ambiente de trabalho comprometido com a saúde do colaborador. Mais especificamente, o reconhecimento do desempenho, a participação dos funcionários nas decisões, e o suporte à saúde mental, por exemplo, também contribuem para a construção de um ambiente laboral capaz de promover a realização dos trabalhadores (Santos & Ceballos, 2013).
Dando ênfase a esse esforço, a Psicologia Positiva propôs um novo enfoque, passando da atenção à doença mental para a promoção do bem-estar psicológico. Essa perspectiva direciona seus esforços para a construção sustentável da felicidade ao longo da vida, promovendo o cultivo de emoções positivas, que melhoram o estado emocional no momento presente, além de contribuir para o desenvolvimento de uma mentalidade mais otimista e resiliente. Incentivam, assim, maior engajamento nas experiências cotidianas e o emprego das habilidades individuais para conferir significado mais profundo à existência (Seligman, 2002; Seligman & Csikszenmihalyi, 2000).
A psicologia positiva aborda o momento presente através da prática do mindfulness, que convida a focar deliberadamente no momento presente de maneira não julgadora para promover o bem-estar mental e emocional, incentivando a atenção plena e consciente às experiências do presente (Goyal et al., 2014). Essa abordagem busca cultivar uma consciência sem julgamento, permitindo que as pessoas enfrentem o estresse e a ansiedade de maneira mais eficaz. Além disso, destaca a importância de encontrar significado e satisfação no presente, encorajando a valorização das experiências positivas diárias, o cultivo da gratidão e o envolvimento em atividades que proporcionem propósito (Falcão & Souza, 2022).
Ao integrar mindfulness às suas práticas, a psicologia positiva busca promover o bem-estar emocional e construir uma base sólida para uma vida mais significativa. Essa abordagem não apenas oferece ferramentas para lidar com desafios diários, mas também incentiva uma mudança de perspectiva em relação à vida, direcionando a atenção para os aspectos positivos do presente, bem como a reflexão dos aspectos negativos e como encará-los. Ao desenvolver uma consciência plena, as pessoas podem experimentar uma melhoria na qualidade de vida e no equilíbrio emocional, contribuindo para o bem-estar duradouro (Cebolla, 2017).
Um estudo conduzido por Pereira (2022) sobre psicologia positiva e mindfulness indicou impactos positivos substanciais dessa prática no bem-estar emocional. A psicologia positiva, centrada no cultivo de forças e virtudes humanas, demonstrou eficácia em melhorar a qualidade de vida, reduzir sintomas de depressão e fortalecer a resiliência por meio de intervenções que promovem o desenvolvimento pessoal. A pesquisa revela ainda outros benefícios da prática, incluindo alterações neurobiológicas associadas à regulação emocional, eficácia na prevenção e tratamento de transtornos mentais (excetuando-se situações de crise) e aprimoramento da atenção. Práticas de mindfulness também estão vinculadas à redução do estresse percebido e ao aumento da consciência do momento presente, contribuindo para uma abordagem holística do bem-estar subjetivo.
Nos contextos de trabalho, a psicologia positiva foca nos pontos fortes de cada trabalhador, fortalecendo as relações interpessoais e a colaboração dentro da equipe. Ao cultivar um ambiente onde as pessoas se sintam valorizadas e capacitadas a utilizar seus talentos de forma significativa, contribui para a criação de culturas organizacionais mais saudáveis e produtivas. Ao incentivar a prática de gratidão, resiliência e otimismo no local de trabalho, a PP pode ajudar os colaboradores a lidarem de forma mais eficaz com desafios e adversidades, promovendo, assim, um clima de trabalho mais positivo e resiliente (Van Dam et al., 2018).
Em atenção ao exposto, o presente artigo apresentará uma revisão sistemática da literatura com o objetivo de mapear as principais contribuições teóricas e empíricas que abordam a relação entre psicologia positiva, mindfulness e bem-estar no trabalho. A pergunta norteadora da revisão é: “Como a literatura descreve a relação entre psicologia positiva, mindfulness e bem-estar no ambiente de trabalho?” Assim, a revisão buscará apresentar uma análise crítica das tendências contemporâneas e das lacunas existentes nos estudos sobre o tema.
Método
Este estudo adotou o Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analysis (PRISMA; Page et al., 2021) para organizar e descrever os achados desta revisão sistemática (Figura 1). A revisão sistemática de literatura conduzida utilizou as bases de dados PubMed (51), Web of Science (150), Embase (77) e Scopus (81), por serem reconhecidas como fontes de referências na área. De forma independente, buscou-se em cada base, sem definir faixa de tempo específica, os termos eleitos por meio de Descritores em Ciências da Saúde (DECS) e do Medical Subject Headings (MeSH Terms): (“Positive Psychology” OR “Psychology, Positive”) AND mindfulness AND (Workers OR Work OR Employees OR “Occupational Groups”). Também foram empregados os termos equivalentes em português e espanhol. Os materiais foram selecionados no mês de janeiro de 2024, sendo avaliados de forma independente por dois revisores que chegaram a um comum acordo.
A fase inicial da seleção de materiais consistiu na revisão dos resumos e na aplicação dos critérios de inclusão e exclusão. Foram considerados para inclusão os artigos disponíveis integralmente, redigidos em português, inglês ou espanhol, e publicados em periódicos revisados por pares (Akobeng, 2005). Os artigos incluídos na revisão tinham como objetivo investigar práticas de mindfulness e explorar a relação entre mindfulness e questões relacionadas a trabalho, como satisfação no trabalho, desempenho no trabalho e bem-estar. Ao término desse processo, 344 dos 359 artigos foram descartados pelas seguintes razões: não eram empíricos (66), estavam fora do escopo (167) ou eram duplicatas (111). O fluxograma que ilustra o procedimento de seleção dos materiais está representado na Figura 1.
A leitura integral de cada artigo foi realizada após a seleção. Durante esse processo, foi elaborada uma tabela que proporciona uma visão abrangente dos principais resultados obtidos aos leitores. Os achados de cada estudo incluído na revisão foram detalhadamente apresentados, considerando aspectos essenciais para a compreensão do contexto e da validade das intervenções. O tratamento dos dados incluiu a categorização das intervenções em função da sua duração, método (individual ou em grupo) e os efeitos observados sobre o bem-estar. Foi utilizado um modelo de síntese qualitativa para agrupar os resultados semelhantes e identificar padrões consistentes. As discussões também contemplaram as possíveis limitações inerentes aos estudos, como amostras pequenas, falta de controle adequado ou vieses na seleção dos participantes, que podem comprometer a generalização dos achados. As conclusões derivadas dessas evidências foram elaboradas com cautela, seguindo as recomendações da literatura sobre revisão sistemática, evitando extrapolações inadequadas que possam comprometer a aplicabilidade prática dos resultados (Galvão et al., 2015).
Resultados
A análise dos estudos selecionados foi conduzida de acordo com as diretrizes do PRISMA, a fim de organizar e sintetizar as evidências disponíveis sobre a relação entre psicologia positiva, mindfulness e bem-estar no ambiente de trabalho. Ao todo, foram incluídos oito estudos, sendo a maioria proveniente de países da Europa e América do Norte. A maioria das intervenções baseadas em mindfulness focou em práticas individuais no ambiente de trabalho, enquanto algumas implementaram intervenções em grupo. A seguir apresentaremos os dados de identificação e informações básicas sobre os artigos (Tabela 1), seguidos de uma breve descrição dos materiais analisados e, então, uma síntese qualitativa dos pontos principais compartilhados por eles.
Autores e Ano | País | População |
---|---|---|
Michel, Groß, Hoppe, González-Morales, Steidle, & O’Shea (2021) |
Alemanha | Os participantes, com diversas experiências profissionais, foram recrutados por meio de cartas de anúncio e folhetos. |
Jones & Drummond (2023) |
Austrália | A faixa etária foi de 18 a 80 anos e uma idade média de 44 anos, com 79% de mulheres e 21% de homens. |
Zheng, Gu, Jiang & Zeng (2022) |
China | No primeiro estudo participaram 342 pessoas com uma média de 30,67 anos de idade, sendo 50,3% do sexo feminino. |
Hafenbracka, Cameronb, Spreitzerc, Zhangd, Novale, & Shaffakatf (2020) |
Estados Unidos | 129 funcionários (22 homens, 107 mulheres), com 62 participantes permanecendo na condição de atenção plena e 67 na condição de controle. |
Tao, W. (2022) | China | 498 participantes adultos. Destes, 402 eram mulheres e 96 homens, idades não mencionadas no artigo. |
Calcagni, Salanova, Llorens, Bellosta-Batalla, Martínez-Rubio & Borrás (2021) |
África do Sul | 28 participantes completaram um dos diferentes programas, e seus resultados foram comparados entre os grupos e em relação a 27 participantes alocados aleatoriamente para um grupo de controle em lista de espera. Eles tinham uma média de 38,5 anos e 51% eram mulheres. |
Santos, Lacerda, Coelhoso, Barrichello, Tobo & Kozasa (2021) |
Suíça | O primeiro estudo foi composto por 30 participantes de ambos os sexos. No segundo estudo, participaram 99 mulheres. As idades das participantes variavam entre 25 e 60 anos, e seu nível de educação era pelo menos uma graduação universitária. |
Hepburn, Carrol & Holcroft (2021) |
Austrália | Participaram 17 pessoas. A idade média era de 36,2 anos e 76,6% eram mulheres. |
Em um estudo realizado por Michel et al., (2021), na Alemanha, os autores conduziram uma intervenção online baseada em mindfulness e atividades que eram consideradas positivas pelos participantes no trabalho, distribuída ao longo de três semanas consecutivas. Os participantes inicialmente preencheram um questionário sobre mindfulness e atividades positivas no trabalho ao ingressarem no estudo. Em seguida, foram distribuídos aleatoriamente entre o grupo experimental e o grupo de controle, sendo que este último recebeu a intervenção somente após a última medição, na semana 7. O grupo experimental teve acesso à plataforma de e-learning Moodle, sendo incentivado a se familiarizar com ela e a iniciar a intervenção na semana seguinte. Ambos os grupos completaram um questionário após o término da intervenção do grupo experimental, na semana 5 (pós), e um último questionário duas semanas depois, na semana 7 (acompanhamento). Os resultados indicaram que houve uma melhoria estatisticamente significativa na atenção plena relacionada ao trabalho, no envolvimento no trabalho, na qualidade do sono e uma redução da fadiga nos participantes do grupo intervenção quando comparados ao grupo controle.
Outro estudo, realizado por Jones e Drummond (2023), na Austrália, teve como objetivo testar a eficácia do Programa de Qualidade de Vida e Bem-Estar (MQW) fundamentado em mindfulness. Devido à complexidade do autorrelato de felicidade, foi concebido um programa de aprimoramento centrado no desenvolvimento do estilo mental (processos subjetivos), abrangendo os domínios objetivos da vida, como relacionamentos, trabalho, dinheiro, saúde e lazer. Em resposta a essa necessidade, foi desenvolvido e avaliado o Programa de Qualidade de Vida e Bem-Estar (MQW) baseado em mindfulness, que utilizou diversas medidas, incluindo a Escala de Consciência de Atenção Mindfulness, Índice de Qualidade de Vida, Índice de Bem-Estar Pessoal - Adulto, Escala de Afetos Positivos e Negativos, Satisfação com a Escala de Vida e a recém-criada Escala Clínica de Qualidade de Vida (CLINQOL). O MQW foi composto por psicoeducação e exercícios interativos, incentivando os participantes a aplicarem o programa às suas circunstâncias de vida para consolidar os ganhos do tratamento.
Dividido em três seções, o programa começou com uma introdução aos resultados gerais da pesquisa sobre qualidade de vida e bem-estar subjetivo. Na segunda seção, os participantes foram treinados para aplicar os princípios e métodos da atenção plena às cinco principais áreas da vida: relacionamentos, trabalho, dinheiro, saúde e lazer. Por exemplo, por meio de educação e exercícios, eles exploraram como aplicar os atributos da atenção plena, como consciência sem julgamento, equanimidade interpessoal ou abertura emocional para conflitos de relacionamento. Na terceira seção, os participantes foram treinados em como aplicar a atenção plena para cultivar um estado mental robusto de bem-estar. O MQW baseado em mindfulness compreendeu psicoeducação e exercícios interativos, incentivando os 342 participantes a aplicarem o programa em suas vidas para consolidar os ganhos do tratamento. Durante as seis semanas, os participantes foram treinados nas áreas fundamentais da vida, como relacionamentos, trabalho, dinheiro, saúde e lazer, utilizando princípios de atenção plena. O segundo estudo, conduzido online, contou com 127 participantes. Os resultados indicaram aumentos significativos na atenção plena, qualidade de vida e bem-estar subjetivo nos participantes tratados.
Antes de explorar em detalhes como as Intervenções baseadas em mindfulness (MBIs) podem mitigar o esgotamento através da autorregulação, Zheng et. al (2022) afirmaram ser essencial compreender a interação entre autorregulação e esgotamento. A pesquisa abrangeu dois pontos distintos: o primeiro visava compreender o impacto da psicologia positiva baseada em atenção plena (MBPP) no burnout, enquanto o segundo analisa o papel mediador dos três componentes da autorregulação nesse contexto.
Os resultados trazidos por Zheng et. al (2022), indicaram que a autocompaixão apresentou uma maior correlação com o autocontrole. Além disso, os autores observaram que a ação consciente, juntamente com a autocompaixão e o autocontrole, desempenhou papéis cruciais na autorregulação e no centro do burnout, distúrbio emocional com sintomas de exaustão extrema, estresse e esgotamento físico resultante de situações de trabalho desgastante, que demandam muita competitividade ou responsabilidade (Codo & Vasques-Menezes, 1999). Em suma, a aplicação do MBPP (Mindfulness-Based Positive Psychology) proporcionou melhorias significativas na atenção plena, autocontrole e autocompaixão, ao mesmo tempo que ofereceu proteção contra o esgotamento. Adicionalmente, identificou-se que a ação consciente mediou o efeito do autocontrole inibitório na despersonalização. Essas descobertas ressaltam a importância de diferentes aspectos da autorregulação e apontam os benefícios potenciais do MBPP na promoção do bem-estar e na prevenção do burnout.
Hafenbracka et. al, (2020), considerando o contexto atual de ambientes de trabalho altamente desafiadores e imprevisíveis, afirmaram que tanto as práticas centradas na respiração quanto as práticas de amor e bondade têm se mostrado capazes de fomentar comportamentos pró-sociais, utilizando mecanismos que ampliam a empatia e a capacidade de adotar diferentes perspectivas. O Estudo 1a consistiu em um experimento de campo longitudinal realizado em uma empresa de seguros nos Estados Unidos. Comparando os funcionários designados para um treinamento diário de atenção plena com aqueles em uma lista de espera de controle, constatou-se que os primeiros relataram maior incidência de comportamentos de ajuda ao longo de um período de cinco dias, tanto em pesquisas quantitativas quanto em diários qualitativos.
O Estudo 1b, realizado em uma grande empresa de consultoria na Índia, ampliou essas descobertas através de um experimento de campo, onde os colegas avaliaram o comportamento pró-social dos membros da equipe em um design de rodízio. Nos Estudos 2a e 2b, que alteraram o foco da prática da atenção plena de dedicar tempo para dedicar dinheiro, descobriu-se que os indivíduos designados aleatoriamente para praticar uma meditação de respiração focada foram mais generosos financeiramente. No intuito de compreender os mecanismos por trás dos efeitos da atenção plena no comportamento pró-social, o Estudo 3 encontrou suporte para a empatia e um apoio moderado para a tomada de perspectiva como mediadores desses efeitos. Mais especificamente, os autores observaram que os efeitos pró sociais resultantes da atenção plena não apenas têm o potencial de aprimorar a vida profissional daqueles que a incorporam, mas também de impactar positivamente a vida de muitas outras pessoas com as quais colaboram e interagem diariamente. O estudo permite concluir que a atenção plena não é apenas uma prática individual, mas também uma ferramenta valiosa para promover uma cultura de trabalho mais colaborativa e compassiva (Hafenbracka et. al, 2020).
Os estudos obtidos na pesquisa de Tao (2022) investigaram as relações entre a atenção plena do professor e suas emoções no contexto chinês. Foi administrado um questionário online aos participantes, contendo itens para coletar dados sobre demografia, atenção plena do professor, engajamento no trabalho e emoções em sala de aula. As informações demográficas solicitadas incluíram gênero, anos de experiência no ensino, nível da escola, localização da instituição e autoavaliação da competência de ensino. Os resultados revelaram que a atenção plena, o engajamento no trabalho e as emoções vivenciadas em sala de aula possuem correlações significativas entre si. Foi possível observar ainda que o engajamento no trabalho atuou como um mediador parcial, atenuando os efeitos da atenção plena do professor nas emoções positivas e negativas. Em uma relação recíproca, as emoções positivas exercem uma mediação total no impacto da atenção plena do professor no engajamento no trabalho, enquanto as emoções negativas desempenham um papel de mediação parcial.
Calgani et al., (2021) conduziram um estudo na África do Sul, com o objetivo explorar os efeitos diferenciais de duas intervenções baseadas em mindfulness, incluindo bem-estar psicológico, engajamento no trabalho, desempenho e estresse, em uma amostra de trabalhadores. Foram implementadas duas intervenções baseadas em mindfulness em uma amostra de trabalhadores administrativos para explorar os efeitos diferenciais em diferentes facetas de mindfulness, dimensões de bem-estar psicológico, engajamento no trabalho, desempenho e estresse dos participantes. O programa Mindfulness and Positive Stress Management (MPSM) foi desenvolvido como intervenção personalizada, integrando elementos dos ensinamentos tradicionais de mindfulness com ferramentas específicas da psicologia positiva, como as forças de caráter. Os resultados indicaram que ambos os programas foram bem-sucedidos em aumentar o bem-estar psicológico, o engajamento no trabalho e o desempenho dos participantes, ao mesmo tempo que reduziram os níveis de estresse. Os resultados sugeriram que intervenções breves e personalizadas de mindfulness no ambiente de trabalho podem ser tão eficazes quanto programas mais extensos. Os autores concluem que é importante adaptar as intervenções de mindfulness ao contexto específico dos participantes, apoiando, assim, o uso de MindfulnessBased Interventions (MBIs) personalizados no ambiente de trabalho.
No estudo de Santos et. al, (2021), os autores destacaram a relevância e eficácia de uma intervenção baseada em meditação e psicologia positiva no manejo do estresse, especialmente entre profissionais de saúde e mulheres gestoras. A análise abrangeu dois experimentos distintos, os quais envolveram um total de 86 participantes. No primeiro experimento, composto por 29 profissionais de saúde, a intervenção demonstrou impacto positivo, resultando na redução significativa dos níveis de estresse e sintomas de ansiedade. No segundo experimento, que envolveu 57 mulheres gestoras, a intervenção não apenas contribuiu para a diminuição do estresse, mas também apresentou efeitos benéficos em relação aos sintomas psiquiátricos e à qualidade do sono, em comparação com o grupo controle. A eficácia da intervenção foi consolidada pela avaliação dos participantes por meio da Escala de Estresse Percebido, revelando que ambos os grupos de trabalhadores experimentaram uma redução significativa nos problemas relacionados ao estresse.
Por fim, o estudo conduzido por Hepburn et al., (2021), na Austrália, visou contribuir para a pesquisa sobre intervenções complementares (IC) destinadas a educadores, para incluir estratégias que atuavam por meio de mecanismos cognitivos e fisiológicos, regulando a resposta ao estresse e aumentando a conscientização sobre comportamentos, emoções e reatividade. As medidas de autorrelato incluíram estresse percebido, atenção plena, bem-estar subjetivo, burnout e bem-estar afetivo relacionado ao trabalho. Utilizou diversas escalas, como a Escala de Atenção Plena (MAAS), o Índice de Bem-Estar Pessoal (PWI), a Escala de Estresse Percebido (PSS), o Inventário de Burnout para Educadores (MBI-ES) e a Escala de Bem-Estar Afetivo Relacionado ao Trabalho (JAWS), os resultados destacaram aspectos cruciais do impacto das intervenções cognitivas e multimodais. Com a participação de 17 professores, em sua maioria mulheres, o estudo revelou uma diminuição estatisticamente significativa no estresse percebido, acompanhada de aumentos na consciência atencional e bem-estar subjetivo. Além disso, a análise dos níveis de cortisol salivar indicou uma redução progressiva ao longo do tempo, sugerindo benefícios fisiológicos das intervenções (Hepburn et. al, 2021).
Em síntese, as evidências apresentadas pelos estudos indicaram que as intervenções de mindfulness, quando aplicadas no contexto de trabalho, apresentaram resultados consistentes na promoção do bem-estar emocional e na redução do estresse. No entanto, os estudos apresentaram variação em termos de amostras, duração das intervenções e métodos de avaliação, o que pode influenciar a generalização dos achados. De maneira geral, destacaram que a prática regular de mindfulness no trabalho está associada a melhorias na resiliência, na satisfação profissional e na redução do burnout. Pode-se ainda observar alguns padrões entre os estudos.
Embora a maioria dos estudos tenha sido realizada em países ocidentais, alguns estudos indicaram variações culturais no impacto das intervenções. Jones e Drummond (2023), na Austrália, e Tao (2022), na China, observaram que as intervenções de mindfulness apresentaram diferentes resultados dependendo da cultura e do ambiente organizacional. Ainda, os estudos variaram entre intervenções em grupo e individuais. Intervenções em grupo, como o Programa de Qualidade de Vida e Bem-Estar (Jones & Drummond, 2023), mostraram-se eficazes para aumentar a colaboração e o engajamento no trabalho. No entanto, intervenções individuais também tiveram impacto positivo, conforme relatado por Calgani et al. (2021). Por fim, os materiais analisados demonstraram uma relação positiva entre o mindfulness e o aumento do bem-estar no trabalho. Em estudos como Michel et al. (2021), os participantes relataram melhorias na atenção plena, na qualidade do sono e na satisfação profissional após a intervenção.
Discussão
A análise dos materiais permitiu observar que a integração entre psicologia positiva, mindfulness e o ambiente de trabalho apresenta um potencial significativo para a promoção do bem-estar dos trabalhadores, além de seu avanço profissional. A partir do foco em emoções como gratidão, otimismo e resiliência, a PP oferece um caminho transformador para o ambiente de trabalho ao priorizar o florescimento humano (Vazquez & Hutz, 2021). Essa abordagem se alinha ao movimento contemporâneo dos trabalhadores, que buscam equilibrar atividades profissionais com seus valores pessoais, a fim de alcançar maior bem-estar e significado na carreira (Calvosa, 2020). Esse realinhamento do sucesso profissional é especialmente relevante em um cenário de mudanças rápidas nas formas de produção e nas relações de trabalho (Da Silva Junior et al., 2023).
Nesse cenário, o mindfulness surge como uma ferramenta poderosa para a redução do estresse e o aumento da resiliência no trabalho (Goyal et al., 2014). Em consonância com o que foi observado nos estudos analisados, a literatura vem demonstrando que, a partir da aplicação do Mindfulness-Based Stress Reduction (MBSR), a prática da atenção plena contribui para o bem-estar físico e emocional, tornando-se essencial no contexto organizacional, onde o burnout e o estresse são comuns (Kabat-Zinn, 2003). Esses resultados somam-se às evidências de que a prática regular de mindfulness melhora a concentração, permitindo que os trabalhadores lidem de forma mais eficiente com as pressões diárias, o que contribui para a redução dos níveis de esgotamento (Cebolla, 2017). Além disso, como aponta Fredrickson (2001), emoções positivas ampliam o repertório cognitivo e comportamental, fortalecendo a capacidade dos indivíduos de desenvolver novas habilidades e de se adaptar melhor aos desafios do ambiente de trabalho.
Os resultados desta revisão sistemática encontram apoio também na literatura que indica que, no contexto organizacional, intervenções que integram mindfulness e psicologia positiva têm o potencial de transformar a cultura do trabalho. Ao promover um ambiente em que o bem-estar é valorizado, essas práticas não apenas beneficiam os indivíduos, mas também melhoram a eficiência e a produtividade das organizações (Santos & Ceballos, 2013). Como sugere Lyubomirsky et al. (2005), práticas como a gratidão podem contribuir para a construção de ambientes de trabalho mais saudáveis, nos quais os colaboradores se sentem mais satisfeitos e engajados, resultando em maior retenção de talentos e um clima organizacional positivo. Em outras palavras, além dos efeitos individuais, o mindfulness também promove relações interpessoais mais saudáveis e colaborativas no ambiente de trabalho (Falcão & Souza, 2022). A empatia, fomentada pela atenção plena, é um fator central para a construção de uma cultura organizacional mais inclusiva e colaborativa, como aponta Fredrickson (2001) em sua teoria “Broaden-and-Build”. Ao praticar a atenção plena e desenvolver emoções positivas, os indivíduos se tornam mais propensos a colaborar e apoiar seus colegas, criando uma rede de suporte mútuo no ambiente de trabalho.
Ainda, no que tange ao desenvolvimento de carreira, práticas de psicologia positiva e mindfulness fornecem ferramentas para a construção de trajetórias profissionais mais sustentáveis e alinhadas com os valores pessoais dos indivíduos. Como propõe Savickas (2013), o crescimento profissional está diretamente relacionado à capacidade de resiliência e adaptação, e o mindfulness auxilia na tomada de decisões mais conscientes, que contribuem para a construção de uma carreira mais equilibrada. Nesse sentido, intervenções baseadas em mindfulness e psicologia positiva não apenas promovem o bem-estar no ambiente de trabalho, mas também reforçam o desenvolvimento profissional e a realização pessoal.
Por fim, nossa revisão sistemática indica que a integração de práticas de psicologia positiva e mindfulness no ambiente organizacional desempenha um papel crucial na promoção do bem-estar emocional, de ambientes de trabalho saudáveis e produtivos, e no desenvolvimento sustentável das carreiras. As intervenções baseadas nessas abordagens reduzem o estresse e o burnout, ao mesmo tempo que promovem maior engajamento, satisfação e colaboração no trabalho. O impacto dessas práticas, quando aplicadas ao contexto organizacional, se traduz em benefícios tangíveis tanto para os indivíduos quanto para as organizações, criando um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo.
No que tange às limitações desta revisão sistemática, é importante pontuar que foram incluídos artigos que adotaram diferentes estratégias metodológicas. Esta variabilidade impede uma comparação direta dos resultados obtidos pelos estudos. Ainda, tendo em vista que as amostras eram diversas em termos de cultura e contextos de trabalho, é difícil generalizar os resultados obtidos, por exemplo, para a realidade brasileira. Assim, considerando as limitações desta revisão, bem como os resultados dos estudos analisados, as recomendações para estudos futuros são as seguintes: 1. que explorem como os benefícios do mindfulness variam entre diferentes culturas organizacionais e setores a fim de identificar fatores contextuais que influenciem os resultados; e 2. que contemplem investigações longitudinais para avaliar os efeitos sustentáveis de mindfulness e PP ao longo do tempo.
Considerações Finais
Os estudos sobre bem-estar e psicologia positiva se apresentam como uma abordagem atraente para os adeptos da valorização das emoções positivas, além de abrir as portas para uma nova linha de investigação que busca compreender o ser humano a partir de suas capacidades intrínsecas, em contraponto ao tradicional foco nas fraquezas individuais. Este enfoque emergente sugere uma mudança de paradigma na pesquisa psicológica, incentivando uma exploração mais abrangente das experiências humanas e das fontes de bem-estar.
A síntese realizada destaca a importância crescente atribuída ao cultivo de uma mentalidade positiva e à prática de mindfulness como estratégias promotoras de bem-estar emocional e desenvolvimento profissional. A compreensão desses conceitos e sua implementação nas políticas organizacionais podem não apenas fortalecer a resiliência individual diante das demandas laborais, mas também fomentar um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo. Portanto, promover a integração dessas abordagens na gestão de recursos humanos e nas práticas organizacionais pode representar um passo significativo na construção de culturas corporativas mais voltadas para o bem-estar e o sucesso sustentável dos colaboradores.
Além disso, pode trazer contribuições relevantes para a construção de trajetórias de carreira mais significativas. Mais especificamente, a partir dos resultados desta revisão, é possível depreender que: ao cultivar a atenção plena, os profissionais se tornam mais capazes de refletir sobre suas escolhas de carreira de maneira mais consciente e estratégica, alinhando suas decisões ao que lhes traz maior propósito e satisfação; ao incentivar o cultivo de competências como resiliência e otimismo, a PP prepara os profissionais para enfrentar os desafios e incertezas que surgem ao longo de suas carreiras, promovendo uma trajetória mais estável e satisfatória; intervenções que integram mindfulness e psicologia positiva podem ser eficazes na promoção do bem-estar imediato dos trabalhadores, e oferecer uma base sólida para o desenvolvimento de carreira significativo e satisfatório; e o mindfulness pode ajudar os profissionais a navegarem por transições de carreira, como as mudanças de trabalho ou a assunção de novos papéis com maior clareza e confiança facilitando uma construção de carreira mais fluida.
Até o momento, considerando os estudos fornecidos pelas bases de dados exploradas, observa-se uma notável escassez de estudos conduzidos no Brasil sobre o tema em questão. Esta lacuna na literatura sugere que a atenção dos pesquisadores brasileiros tem sido direcionada primordialmente para outras áreas, deixando um espaço substancial para investigações adicionais e o avanço do conhecimento nesse domínio específico. Evidencia-se, assim, a necessidade de explorar mais profundamente a relação entre psicologia positiva, mindfulness e suas implicações na esfera profissional a fim de promover avanços significativos no entendimento dessas interações no contexto brasileiro.
Por fim, espera-se que a apresentação desta revisão sistemática sirva como estímulo para a realização de novos estudos que explorem a relação entre psicologia positiva, mindfulness e o ambiente de trabalho. Estes poderão ampliar a compreensão sobre como essas práticas influenciam a experiência profissional, além de estabelecer fundamentos para o desenvolvimento de estratégias mais eficazes para a promoção do bem-estar no contexto laboral, considerando a complexidade do trabalho contemporâneo. A investigação detalhada dessas interações pode fornecer insights valiosos sobre como cultivar um ambiente de trabalho que favoreça a saúde mental e o crescimento pessoal. Portanto, é premente a realização de estudos aprofundados que identifiquem práticas e intervenções que possam melhorar o equilíbrio entre a saúde mental e o desempenho profissional, promovendo um ambiente mais positivo e produtivo.