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Arquivos Brasileiros de Psicologia

versão On-line ISSN 1809-5267

Arq. bras. psicol. vol.74  Rio de Janeiro  2022  Epub 09-Set-2024

https://doi.org/10.36482/1809-5267.arbp-2022v74.19894 

Artigo original

POLÍTICA PRISIONAL E SOLUÇÕES APRESENTADAS POR EGRESSOS DO SISTEMA PRISIONAL

PRISON POLICY AND SOLUTIONS PRESENTED BY PRISON FORMER PRISONERS

POLÍTICA PENITENCIARIA Y SOLUCIONES PRESENTADAS POR EGRESOS DEL SISTEMA PENITENCIARIO

BRUNO GRAEBIN DE FARIASI 
http://orcid.org/0000-0002-7323-8621

SILVIA HELENA KOLLERII 
http://orcid.org/0000-0001-9109-6674

IUniversidade Federal do Rio Grande do Sul, Instituto de Psicologia, Psicologia do Desenvolvimento e da Personalidade. Porto Alegre, RS, Brasil.

IINorth West University South Africa, Faculty of Health Sciences, Optentia Research Unit, Vanderbijlpark, Gauteng, South Africa.


RESUMO

O objetivo deste estudo foi analisar concepções e reflexões de egressos do sistema prisional acerca da política prisional. Participaram do estudo sete homens e uma mulher egressos do sistema prisional do Rio Grande do Sul (Brasil). A partir da Entrevista Narrativa Autobiográfica, foi questionado a cada participante sobre como a política prisional poderia ser estruturada de modo a promover a reintegração social. Foram identificados quatro temas: 1) legitimidade da pena de prisão dentro de limites ideais; 2) crítica à arbitrariedade, injustiça e “burocracia” no sistema penal; 3) proposta de garantir trabalho digno e universal como estratégia de reintegração social; e 4) defesa da importância de assistência aos familiares de pessoas presas. Os achados revelam a reflexividade de egressos do sistema prisional e apontam para possibilidades de políticas públicas informadas pela experiência das pessoas mais afetadas, em especial em condições mais graves de exclusão social.

Palavras-Chave: Políticas públicas; Reabilitação penal; Criminologia; Trabalho; Psicologia da prisão

ABSTRACT

The aim of this study was to analyze the conceptions and reflections of former prisoners about prison policy. Seven former male prisoners and one female, from the prison system in Rio Grande do Sul (Brazil) participated in the study. From the Autobiographical Narrative Interview, each participant was asked how the prison policy could be structured to promote social reintegration. Four themes were identified: 1) legitimacy of the prison sentence within ideal limits; 2) criticism of arbitrariness, injustice, and “bureaucracy” in the penal system; 3) proposal to guarantee dignified and universal work as a strategy for social reintegration; and 4) defense of the importance of assisting family members of prisoners. The findings reveal the reflexivity of former prisoners and point to possibilities for public policies informed by the experience of the most affected people, especially in the most serious conditions of social exclusion.

Key words: Public policies; Penal rehabilitation; Criminology; Labor; Prison psychology

RESUMEN

El objetivo del estudio fue analizar concepciones y reflexiones de graduados del sistema penitenciário sobre la política penitenciaria. Siete hombres y una mujer graduados del sistema penitenciario de Rio Grande do Sul (Brasil) participaron en el estudio. En la Entrevista Narrativa Autobiográfica, se preguntó a cada participante cómo podría estructurarse la política penitenciaria para promover la reintegración social. Se identificaron cuatro temas: 1) legitimidad de la pena de prisión dentro de límites ideales; 2) críticas a arbitrariedad, injusticia y “burocracia” en el sistema; 3) propuesta para garantizar trabajo digno y universal como estrategia de reinserción social; y 4) defensa de la importancia de ayudar a familiares de los presos. Los hallazgos revelan la reflexividad de los graduados del sistema penitenciario y apuntan a posibilidades de políticas públicas informadas por la experiencia de las personas más afectadas, especialmente en condiciones más graves de exclusión social.

Palabras-clave: Políticas públicas; Rehabilitación penal; Criminologia; Trabajo; Psicología de la prisión

INTRODUÇÃO

Métodos qualitativos na pesquisa em ciências humanas têm como contribuição central o acesso às perspectivas dos interlocutores, de modo a promover insights teóricos e fundamentar práticas de atendimento e políticas públicas informadas pelos sujeitos (Denzin & Lincoln, 2005; Guba & Lincoln, 1989). O acesso às experiências e perspectivas em primeira pessoa (Leal & Serpa Júnior, 2013) tem sido buscado nas pesquisas avaliativas em saúde (Furtado, 2001; Guba & Lincoln, 1989; Onocko-Campos & Furtado, 2008; Patton, 1987) para investigar necessidades em saúde (Guedes, Fonseca, & Egry, 2013), adesão a tratamentos (Leite & Vasconcellos, 2003), qualidade da assistência (Bosi & Uchimura, 2007) e acesso aos serviços (Onocko-Campos, Ferrer, Gama, Campos, Trapé, & Dantas, 2014). Métodos que acessam as experiências e as perspectivas em primeira pessoa têm o potencial de orientar a organização de serviços, práticas e políticas públicas, como exemplos na saúde. No caso da política prisional, existe uma necessidade latente de construir ações informadas pelas perspectivas das pessoas mais diretamente afetadas pelo sistema prisional – as pessoas que cumprem ou cumpriram pena de prisão, a fim de promover ações efetivas de reintegração social (Porporino, 2010).

O sistema prisional é marcado por violências e arbitrariedades que dificultam a efetiva reintegração social e aumentam o risco de reincidência (Chikadzi, 2017), reproduzindo processos criminogênicos de institucionalização, atribuição de estigma e vulnerabilização secundária – fazendo com que a passagem pelo sistema penal resulte em maior vigilância e criminalização e até novos episódios de encarceramento (Braga, 2008; Zaffaroni, 1991; Goffman, 1963). Diante deste quadro amplo de políticas e intervenções contraproducentes e motivadas por preconceitos e vieses ideológicos, alguns movimentos intelectuais têm buscado fundamentar as políticas direcionadas a pessoas cumprindo pena de prisão em conhecimento científico e nas perspectivas de apenados e egressos do sistema prisional, como os movimentos de Práticas Baseadas em Evidências (Dawes et al., 2005; Satterfield et al., 2009) e a criminologia-em-primeira-pessoa (Richards & Ross, 2001). A precursora dos movimentos de avaliação das intervenções no contexto prisional ou pós-prisional foi a abordagem pragmática sobre “o que funciona” na prevenção da reincidência criminal (Martinson, 1974), realizando estudos comparativos não experimentais ou quase experimentais para mensurar os efeitos de diferentes intervenções no contexto anglo-saxão. Tal abordagem, centrada na intervenção, encontrou dificuldades para identificar intervenções eficazes e replicá-las, em função da diversidade de variáveis em cada contexto institucional e da baixa adesão dos participantes (McMurran & McCulloch, 2007). Os resultados poucos satisfatórios das intervenções foram interpretados a partir da perspectiva de que “nada funciona” a não ser a pena de prisão na lógica da neutralização (Barton, 2005), negando a possibilidade de ações transformadoras e promotoras de reintegração social de egressos do sistema prisional (Martinson, 1974). Entretanto, a ideia de reintegração social foi recuperada na pesquisa em Criminologia a partir dos estudos exploratórios sobre remissão espontânea da reincidência e da centralidade da perspectiva das pessoas que cumpriram pena de prisão (Bottoms & McWilliams, 1979; McNeill, 2006. Porporino, 2010). Tais achados demonstraram que a abordagem centrada na intervenção sobre “o que funciona” retratava as pessoas cumprindo pena de prisão como “receptores” passivos da intervenção e não considerava seus próprios processos de agência e tomada de decisão (Maruna & LeBel, 2010; McMurran & McCulloch, 2007; Porporino, 2010). A investigação dos processos de mudança fundamentou uma reorientação das práticas de reintegração social e de assistência a apenados de modo geral, informando práticas menos “intervencionistas” e objetificadoras e mais voltadas para o empoderamento e para o desenvolvimento de forças pessoais (Maruna & LeBel, 2010; Porporino, 2010).

A abordagem das Práticas Baseadas em Evidências, que consiste na compreensão de uma hierarquia das evidências científicas na qual os ensaios clínicos randomizados e as revisões sistemáticas de literatura são consideradas o padrão-ouro para verificar a efetividade de práticas e programas, tem encontrado resultados relevantes sobre diversos programas de intervenção voltados para a reintegração social, contrariando a ideia de que “nada funciona” (Smith, Cullen, & Latessa 2009; Smith, Gendreau, & Swartz 2009). Entretanto, os programas para prevenção da reincidência investigados apresentavam taxas variáveis entre 6% e 15% de sucesso (McGuire, 2002). Tais resultados são similares aos de ausência de intervenção, mostrando que a remissão da reincidência ocorre mesmo sem intervenção, indicando o potencial dos processos de mudança pessoais (Toch, 2016).

Cabe destacar que a noção de Práticas Baseadas em Evidências não é um sinônimo de “utilização de evidências científicas orientando a prática”, mas uma abordagem epistemológica baseada no pressuposto da hierarquia de evidências e centrada na avaliação quantitativa da efetividade de intervenções, que não investiga mecanismos de causalidade e dinâmicas em ambiente natural (Maruna, 2015). Neste quadro, os achados da abordagem de Práticas Baseadas em Evidências têm apresentado contribuições limitadas para tomada de decisão considerando as particularidades de cada caso (Greenhalgh, 1999), sendo necessária a sua complementação com achados derivados de pesquisas qualitativas (Dixon-Woods et al., 2006, p. 26; Leal & Serpa Junior, 2013). A construção dessa complementaridade, que reconhece a relevância de estudos qualitativos para informar políticas públicas e alcançar justiça social (Denzin & Giardina, 2009), pode orientar políticas prisionais “baseadas em evidências” a partir de estudos qualitativos capazes de destacar perspectivas em primeira pessoa, como estudos narrativos, fenomenológicos e etnográficos com pessoas cumprindo ou que cumpriram pena de prisão (Maruna, 2015).

Tradicionalmente, o acesso a perspectivas em primeira pessoa sobre a experiência prisional consistia na análise sociológica de depoimentos autobiográficos (Maruna, 1997) ou depoimentos coletados por meio de etnografias prisionais – que passaram por um período de declínio com a expansão do encarceramento em massa e virada punitiva no hemisfério norte (Wacquant, 2002), sendo retomada nas décadas seguintes com inovações teóricas e metodológicas (Padovani, Hasselberg, & Boe, 2019) centradas na permeabilidade da prisão e relativização da dicotomia intramuros/extramuros (Cunha, 2014). Nestes casos, os relatos em primeira pessoa acessados nas pesquisas eram analisados em sua dimensão nomotética e generalizante, buscando identificar processos biográficos e desenvolvimentais – no caso das autobiografias – ou representações sociais e sociabilidades – no caso das etnografias. A dimensão idiográfica e singular da experiência individual dos relatos em primeira pessoa sobre a experiência prisional foi abordada pela investigação fenomenológica de Maruna (2001), que analisou as produções de significado sobre as experiências, sentido de vida e processos de agência narrados por egressos do sistema prisional. Entretanto, o acesso às perspectivas em primeira pessoa sobre a experiência prisional ainda se limitava à dinâmica da intersubjetividade produzida pelas entrevistas e não abordava a experiência corporificada do encarceramento, dependendo para isso da produção teórica elaborada por pessoas que vivenciaram diretamente o encarceramento. Esta produção teórica, inaugurada por Richards e Ross (2001) foi denominada convict criminology – aqui traduzida como criminologia em primeira pessoa.

A Criminologia em Primeira Pessoa (Richards & Ross, 2001; Ross & Richards, 2003) emergiu a partir do delineamento de estudos prisionais por pessoas que cumpriram pena de prisão, utilizando suas próprias experiências de encarceramento como posicionalidade privilegiada para informar o delineamento e as análises nas pesquisas. A posicionalidade dos pesquisadores como egressos do sistema prisional, na criminologia em primeira pessoa, resulta na adoção de concepções baseadas na experiência pessoal, na capacidade de circular com facilidade pelos contextos êmicos das pessoas cumprindo pena de prisão, no acesso a redes de informação privilegiadas e no estabelecimento de relações horizontais e dialógicas com os interlocutores, implementando práticas que levam em consideração sofrimentos socialmente invisibilizados dos interlocutores (Richards & Ross, 2001; Ross & Richards, 2003). A Criminologia em Primeira Pessoa integra conhecimentos prévios advindos da experiência em primeira pessoa sobre a prisão com a utilização de etnografias e autoetnografias como estratégias metodológicas e a criminologia crítica como perspectiva de análise. A criminologia crítica consiste em uma abordagem teórica fundamentada no paradigma da reação social e no materialismo histórico que desnaturaliza o fenômeno do crime e analisa os processos de criminalização e organização do sistema penal a partir das relações de poder e conflitos de classe (Baratta, 2002). Deste modo, para a criminologia em primeira pessoa, o sistema penal pode ser analisado a partir de insights derivados da experiência no cárcere, informados pela reflexão da definição de crime, dos processos de criminalização e das dinâmicas do sistema penal como escolhas ideológicas orientadas por interesses políticos. Como perspectiva ética, a Criminologia em Primeira Pessoa busca destacar as perspectivas das pessoas classificadas como “objeto de intervenção” do sistema penal e informar práticas de reintegração social centradas no sujeito.

Richards et al. (2010) argumentaram que parte da literatura criminológica consiste em análises estritamente teoréticas ou conduzidas através de fontes secundárias, como relatórios e arquivos prisionais, dados estatísticos ou outros estudos acadêmicos anteriores, sendo as investigações detalhadas e descritivas do cotidiano prisional e das perspectivas de quem vive o cotidiano prisional consideradas “antiquadas” para os parâmetros acadêmicos. Este quadro implica na invisibilização das perspectivas de pessoas que cumpriram pena de prisão na estruturação de políticas prisionais, que pode acarretar a condução de tratamentos desumanizadores e sem compromisso com a plena reintegração social (Richards & Ross, 2001). A centralidade da perspectiva dos aplicadores do sistema penal, a opção metodológica por pesquisas que utilizam como material de análise apenas arquivos prisionais ou procedimentos oficiais do sistema penal e a opção discursiva por retratar as pessoas cumprindo pena de prisão de modo estigmatizante, por termos como “criminoso” ou “presidiário”, foram fatores identificados como características de pesquisas que levam à distorção dos resultados e interpretações (Richard & Ross, 2001). Para Irwin (1987), qualquer abordagem que não esteja solidamente fundamentada em uma compreensão fenomenológica consistiria em grave distorção do fenômeno – com destaque para a vivência no contexto prisional. Entretanto, Ross, Jones, Lenza e Richards (2016) também apontaram para a importância de compreender os efeitos da posicionalidade do pesquisador e o valor de autoetnografias e relatos de impressões sem reproduzir uma abordagem excessivamente subjetivista ou anedótica, evitando generalizações. Também foi destacada a necessidade de conhecer concretamente a realidade em diferentes unidades prisionais e formular políticas específicas para cada contexto prisional (Richards et al., 2010). Tal quadro sugere o potencial de pesquisas qualitativas, com entrevistas abertas, destacando as vozes e perspectivas de pessoas cumprindo ou que cumpriram pena de prisão, tanto na execução penal quanto na possibilidade de reestruturação do sistema com base em tais perspectivas (Richards et al., 2010).

O objetivo do presente estudo foi analisar concepções e reflexões de pessoas que cumpriram pena de prisão acerca da política prisional e possíveis estratégias de reorganização das políticas penais. Trata-se de um estudo exploratório de orientação êmica, situado no contexto de descoberta.

MÉTODO

PARTICIPANTES

Os participantes da pesquisa foram oito adultos egressos do sistema prisional do Rio Grande do Sul que já receberam sua liberdade condicional ou total. Os Quadros 1 e 2 descrevem as características sociodemográficas e histórico prisional dos participantes, respectivamente, identificados por nomes fictícios.

INSTRUMENTO

O roteiro de entrevista utilizado nesta pesquisa foi uma variante da Entrevista Narrativa Autobiográfica (Jovchelovitch & Bauer, 2002) focada nas experiências de encarceramento e reintegração social. Consiste em um convite amplo e não diretivo para que o participante conte sua história de vida de forma livre e sem interrupções, de modo sequencial e cronológico. Ao final do trabalho narrativo, declarado pelo participante, são realizadas perguntas para elucidar aspectos da narrativa, solicitar descrição de alguns episódios de vida de modo mais detalhado e buscar explicações para decisões tomadas em suas trajetórias biográficas. Na presente pesquisa, foram adicionadas questões relativas à avaliação do participante sobre o funcionamento do sistema prisional e as possíveis estratégias de promoção da reintegração social ou reestruturação da política prisional na perspectiva das pessoas entrevistadas.

PROCEDIMENTOS DE COLETA DE DADOS

Os participantes da pesquisa foram contatados por meio de uma organização não governamental que presta assistência para egressos do sistema prisional. A apresentação da pesquisa e o convite para participação foram feitos individualmente nas sessões de plantão assistencial. As entrevistas foram realizadas em uma sala na sede da instituição, disponibilizada exclusivamente para esse fim. Antes da realização das entrevistas, a pesquisa foi apresentada novamente, com mais detalhes dos aspectos éticos e metodológicos. Os participantes formalizaram sua participação assinando um termo de consentimento livre e esclarecido, no qual também registraram um nome fictício à escolha para uma publicação futura de seus depoimentos. Após o encerramento da Entrevista Narrativa Autobiográfica, os participantes respondiam a uma outra entrevista sociodemográfica para registro das informações apresentadas nas Quadros 1 e 2. As entrevistas foram registradas em áudio, transcritas e tratadas.

Quadro 1 Características sociodemográficas dos participantes 

Participante Sexo Idade Cor Com quem mora
1. Tony M 41 Pardo/Indígena Esposa, três filhos
2. Marco M 40 Negro Albergue/Rua
3. Clarice F 51 Branca Filha
4. Regis M 47 Negro Albergue/Rua
5. André M 35 Branco
6. Marcos M 49 Negro Filhos e netos
7. René M 54 Negro -
8. Santos M 50 Negro

Fonte: Elaborado pelos autores (2020).

Quadro 2 Histórico prisional dos participantes 

Participante Tempo máximo de reclusão Tempo total de reclusão Quantidade de vezes na prisão Delito Tempo desde a saída da prisão
1. Tony 1 ano e seis meses ~5 anos ~10 Furto ~5 anos
2. Marco 10 anos e seis meses 10 anos e seis meses 1 Roubo/outros 10 anos
3. Clarice 6 anos 6 anos 1 Tráfico de entorpecentes 12 anos
4. Regis 14 anos 19 anos ~9 Homicídio/tráfico de entorpecentes/porte de arma/outros 7 anos
5. André 8 anos 15 anos 3 Furto/receptação/roubo/fuga 6 meses
6. Marcos 7 anos 18 anos 5 Latrocínio/roubo/fuga 7 meses
7. René 10 anos 12 anos 2 Porte de arma/tráfico de entorpecentes 20 anos
8. Santos 10 anos 15 anos 3 Homicídio/outros 15 anos

Fonte: Elaborado pelos autores (2020).

PROCEDIMENTOS DE ORGANIZAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

As narrativas foram transcritas integralmente e analisadas em suas dimensões de conteúdo, estrutura e função na interação comunicacional (Riessman, 2008). Foi realizada uma codificação aberta (Gibbs, 2007) buscando identificar categorias emergentes a serem organizadas em temas com relevância analítica (Braun & Clarke, 2006). Com a finalidade de aprofundamento teórico sobre os fenômenos analisados, os temas identificados foram separados em três distintos objetos de análise demarcados: impactos do encarceramento, trajetórias de reintegração social e perspectivas de egressos sobre a política prisional.

O presente estudo consiste em um recorte da pesquisa mais ampla e aborda o fenômeno das perspectivas de egressos sobre o sistema prisional. Para este fim, foram selecionados e analisados trechos com conteúdos avaliativos e explicativos nas narrativas autobiográficas, relacionados à temática da política prisional e das estratégias de reintegração social.

Durante o processo de análise, foram destacados trechos correspondentes ao fenômeno analisado, agrupados em seus temas correspondentes com o auxílio do software NVivo 11.

PROCEDIMENTOS ÉTICOS

A pesquisa foi formulada de acordo com a Resolução no 466/2012 e foi avaliada e autorizada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da unidade acadêmica dos pesquisadores (Protocolo CAAE nº 56316516.4.0000.5334).

RESULTADOS

O presente estudo buscou analisar as reflexões formuladas por egressos do sistema prisional sobre o funcionamento da política prisional e suas avaliações sobre como a política prisional poderia ser estruturada de modo a promover a efetiva reintegração social. O exercício imaginativo solicitado foi para os participantes da pesquisa se perceberem em uma condição com potencial para que suas experiências e reflexões sejam consideradas, validadas e abordadas como conhecimentos relevantes sobre a política prisional, acessados por meio das perspectivas em primeira pessoa. Nesta pesquisa, foram analisados os conteúdos avaliativos e reflexivos sobre a estrutura da política prisional, sem conferir destaque para as experiências e elaborações narrativas de tais experiências, focando nos processos avaliativos e nos raciocínios que fundamentam os discursos prescritivos sobre como a política prisional poderia ser estruturada.

Além da Entrevista Narrativa Autobiográfica, foi questionado a cada participante como a política prisional poderia ser estruturada de modo a promover a reintegração social de egressos do sistema prisional. Foram identificados quatro temas comuns: 1) legitimidade da pena de prisão dentro de limites ideais (sem promover sofrimentos e injustiças); 2) crítica à arbitrariedade, injustiça e “burocracia” no sistema penal; 3) proposta de garantir trabalho digno e universal como estratégia de reintegração social efetiva; e 4) defesa da importância de assistência aos familiares de pessoas presas.

Os convites realizados durante a pesquisa para o compartilhamento de reflexões sobre a política prisional de forma ampla mobilizaram estranhamentos e ressalvas entre participantes da pesquisa. Foi possível identificar que, ao solicitar a pessoas egressas do sistema prisional para compartilhar reflexões e críticas acerca da organização da política prisional, as primeiras observações apresentadas foram relacionadas a suas próprias perspectivas e posicionalidades, em especial questionando a legitimidade e a aplicabilidade de suas próprias considerações e reflexões.

Não vai ser porque um comentário ou uma opinião minha, uma reflexão minha, que vai mudar minha vida ou que vai mudar o meu dia a dia ou... né? Que vai mudar alguma coisa. Muito menos mudar a legislação brasileira só por causa de uma opinião (Tony).

As críticas encontradas sobre a validade de suas próprias reflexões e perspectivas indicam a preocupação dos interlocutores com o estigma atribuído a egressos do sistema prisional e a internalização das acusações associadas ao estigma. Foi declarado que “quem é ex-preso, ex-réu, às vezes tenta medir as palavras para não falar alguma coisa errada… por talvez achar que possa ter consequências...” (Tony). Mesmo em um contexto de pesquisa acadêmica com mecanismos de garantia de anonimato e com estratégias metodológicas de valorização das perspectivas dos interlocutores, foi externada tal dificuldade em considerar a própria compreensão sobre uma política que afeta diretamente a sua vida como uma compreensão legítima de ser enunciada.

Alternativas? Tipo um... Como eu acho que a sociedade… Olha, a sociedade eu não sei, né? Acho que todo mundo que comete erros... Antes de cometer o erro já tem que pensar que sempre vai ser apontado, né? Por alguém, né? Porque… É o mínimo, né? Que a gente pague pelo o que a gente fez, né? Independente de crime (Tony).

Nas declarações encontradas nesta pesquisa, os enunciados questionadores da legitimidade das vozes e perspectivas de egressos do sistema prisional foram acompanhados de enunciados que conferiam legitimidade à própria ideia da pena de prisão como mecanismo de justiça ideal. Considerando que suas narrativas autobiográficas foram majoritariamente centradas na descrição de violências e nos sofrimentos resultantes da experiência da pena de prisão, os enunciados de legitimação ética de mecanismos que proporcionaram violência, sofrimento e injustiça em suas próprias vidas desempenham uma função de ressalva às suas próprias falas. Tais enunciados ponderam que as experiências particularizadas das violências da pena de prisão não devem ser interpretadas como uma crítica universalizante à pena de prisão, que é justificada e legitimada pelos próprios egressos do sistema prisional.

Aí assim, ó, eu sou mãe, né? Eu tenho que aguentar... os meus problemas e os que eu criei para ela. Eu sinto que o que ela tá vivenciando hoje foi por mim, entendeu? Foi porque eu fiz. Claro que não voluntariamente, né? Mas eu sabia que algum dia ia acontecer... mas eu não sabia que era tanto. Eu pensava que era assim, ó: tu fazia, tu pagava... e pronto. Já pagasse teu erro vai fazer tua vida… Mas não é. As pessoas ficam te cobrando até… Eu acho que talvez até o dia que eu morrer (Clarice).

Em função das narrativas indicando situações concretas de injustiça promovidas pelo sistema penal, a legitimação de pena de prisão consiste em uma legitimação normativa, abstrata, dentro de limites ideais – idealizando uma pena que não promoveria sofrimentos e injustiças. As críticas enunciadas à experiência real da pena de prisão consistem em críticas a situações específicas de arbitrariedade, injustiça e “burocracia” no sistema penal. Nas entrevistas, foi argumentado sobre a necessidade de implementação de uma pena “limitada” tanto no tempo quanto na intensidade da punição e que consistisse estritamente em uma reclusão humanizada, sem privação de direitos sociais e exposição à violência física e institucional.

No caso, primeiro eu puxei para depois ser absolvido… E, no caso, todo tempo que eu puxei não valeu de nada, porque eu ganhei a absolvição. Então… fiquei preso para o Estado, né? Muitas vezes por causa da burocracia judicial, porque… Às vezes, nesses tipos de crimes menores, poderia a sentença ser mais rápida. Poderia ser... (Tony).

Também foram sugeridos outros mecanismos de responsabilização distintos da pena de prisão, em especial à designação de trabalhos socialmente produtivos que funcionassem como medida reparatória à sociedade. Juntamente à restrição da extensão da pena de prisão dentro de “limites éticos ideais”, foi apresentada a proposta de garantia universal de trabalho digno como estratégia de reintegração social efetiva. As narrativas destacaram a exclusão sistemática do mundo do trabalho formal em função do estigma atribuído a egressos do sistema prisional: “O problema é que quando a gente cai lá a gente fica tachado: ex-cadeeiro hoje em dia o mercado de trabalho não está aceitando” (Marco). Para prevenir a exclusão social e a vulnerabilização secundária que gera risco de reincidência, os interlocutores da pesquisa indicaram a estratégia de trabalho digno pleno, em um sistema de emprego direto. “Tinha que sair já empregado. Tinha ter inserção direta, não tá batendo, ‘ó, não, tá, já tenho um canto aqui pra, ó’. Saiu de lá, vai trabalhar” (Marcos). Destacando a importância do trabalho digno e socialmente produtivo para a reintegração social, as narrativas indicaram a percepção de uma relação direta entre vulnerabilidade social e conflito com a lei, sendo a redução da vulnerabilidade social por meio da segurança financeira apresentada de forma categórica como mecanismo central para a prevenção da reincidência.

Tinham que dar mais serviço [...] para não voltar ao crime. O preso volta pro crime porque não tem curso, não tem nada…. O preso tem as filhas pra dar comida, tem a família pra sustentar, tem a mulher que leva fé nele… Tu vai dar o que pra tua família? Muitos do sistema carcerário voltam para o crime por ter que sustentar a família... (Regis).

Ainda, foram idealizadas algumas estratégias vinculando a necessidade de trabalho dos apenados, como forma de garantia de subsistência, com a possibilidade de realização de ações capazes de atender ao interesse público e suprir necessidades sociais. “O sistema não deveria ser um aglomerado de presos. Deveria pegar preso para limpar as ruas, para limpar as praças, né? Pra não ser tratado que nem bicho dentro do sistema” (Clarice). Deste modo, a pena idealmente assumiria um caráter reparatório e de promoção de cidadania em vez de retributivo e de promoção de vulnerabilidade social e exclusão.

O estudo de Costa e Bratkowski (2007), sobre significados do trabalho para pessoas cumprindo pena de prisão, identificou a valorização de modelos clássicos de administração para o trabalho prisional, em função de suas características disciplinares de estabilidade, rotina e controle externo, em detrimento de modelos de administração do capitalismo flexível. Tais características, esperadas no trabalho no contexto extramuros (Costa & Bratkowski, 2007), assemelham-se ao trabalho prisional convencional, baseado em princípios tayloristas e organizado em tarefas com baixa autonomia individual e sem outras possibilidades de arranjos estruturais e hierárquicos (Hassen, 1999).

A questão do trabalho é sistematicamente representada como central para o desenvolvimento de trajetórias pós-prisionais e manutenção de uma vida longe das grades (Madeira, 2008). O trabalho formal e assalariado é representado como uma esperança e uma garantia para egressos do sistema prisional – entretanto, tais expectativas tendem a não ser atendidas pelas experiências concretas de trabalho precarizado – atualizando experiências antigas de egressos do sistema prisional com o mundo do trabalho e reforçando vulnerabilidades (Madeira, 2008). Barbalho e Barros (2014) identificaram limites aos programas de inclusão pelo trabalho e promoção da cidadania em função da continuidade do estigma e de mecanismos punitivos no contexto extramuros, restringindo sua autonomia e acesso a direitos sociais – configurando uma disparidade entre o “prescrito” e o “real” na reintegração de egressos do sistema prisional (Schwartz & Durrive, 2007). Ainda, o trabalho prisional contemporâneo, atravessado pela lógica da mercantilização, gera a contradição de empregar pessoas em cumprimento de pena, por razões econômicas, mas não empregar as mesmas pessoas na condição de egressas do sistema prisional (Amaral, Barros, & Nogueira, 2016), ampliando vulnerabilidades e reforçando a exclusão sistemática do mundo do trabalho – com exceção do trabalho precário e explorado.

Nas entrevistas analisadas, o trabalho foi significado como fonte de sustento familiar, mecanismo de inclusão social, estratégia de reparação do dano e compromisso cidadão. Para as pessoas entrevistadas, o trabalho desempenha uma função generativa (Maruna, 2001; McAdams, Hart, & Maruna, 1998; McAdams & St. Aubin, 1992), de construção de um legado para a coletividade, sendo destacado como recurso ótimo para a construção da identidade positiva prossocial para egressos do sistema prisional. A função generativa, de engajamento em ações voltadas para a geração de benefícios para a coletividade, facilita a construção de uma identidade sem a internalização do estigma e a inserção em redes de solidariedade e trabalho:

Eu já estou com outro pensamento, não penso mais em roubar e… Estou há sete anos nesse projeto, 15 anos na luta, nesse jornalzinho – um jornalzinho de dentro da cidade vendido pelas pessoas que estão em situação de rua. É uma causa que me distraiu a mente e eu não penso mais em roubar. Estou na rua desde 2007 e não reincidi (Marco).

Ainda, a generatividade proporcionada pelo trabalho resultaria tanto em um trabalho útil para a sociedade como garantiria o sustento familiar, protegendo a pessoa egressa do sistema prisional de uma posição de dependência. O engajamento em trabalhos no contexto prisional que não forneciam retorno financeiro suficiente para sustentar as famílias no contexto extramuros foi criticado pelos entrevistados, indicando a busca de pessoas cumprindo pena de prisão para desempenhar o papel de provedoras, em vez de dependentes da família:

Aí eu vim em casa, tu não vê ninguém há um monte de tempo. Aí... aí tu vai voltar ali, “bah, preciso disso, preciso daquilo, preciso daquilo, preciso daquilo, preciso de uma roupa, preciso de um calçado”. Que onde vem um salário tu já vê futuro, né? Tu já vai ter um troquinho, ajudar em casa...Tu vai ajudar, já não vai tirar... Vai lá ‘ó, tenho quatrocentos, fica pra casa, tenho oitocentos, me contento também’... Deixa quinhentos em casa, tem o rancho pra ajudar. Nessa última vez agora que eu vi foi isso. Porque se não estaria a mesma coisa! Eu ia dizer ‘cheguei mas não tem nada pra fazer, que não tinha nada pra fazer... Aí chega no final do mês e não tem nada pra receber... Vai pra casa como? Apertar os outros ainda? Passou um monte de tempo preso e ainda vai tirar da família? Aí não deu, né? A gente tem que ajudar (Marcos).

O cuidado aos familiares foi a preocupação central expressa pelas pessoas egressas do sistema prisional entrevistadas, retratada tanto na importância da aquisição de trabalho para garantir o sustento aos familiares quanto na defesa de políticas de assistência aos familiares de pessoas presas, de modo a prevenir a extensão da pena aos familiares. A limitação da extensão da pena, de modo a incidir, idealmente, apenas sobre a pessoa cumprindo pena, sem se estender aos familiares, foi apresentada como uma preocupação prática pelas pessoas entrevistadas.

E aí o Sistema... Eu sei que eles tem que prender quem não tá certo. Mas eles poderiam oferecer pelo menos uma assistência pros filhos... que ficam... porque eles são crianças, eles não tem que pagar pelos erros dos pais... [...] Que pelo menos poderia ser assim, ó: ‘bom, tu vai presa, porque tu fez bobagem, mas a tua filha, nós vamos dar uma estrutura pra ela não seguir teu caminho’... Só que não...’A tua filha vai ficar atirada na rua, que é pra seguir teu caminho’... (Clarice).

Em diversos momentos das narrativas, as pessoas entrevistadas atribuíram à família os significados de rede de apoio e de fonte principal de motivação em suas decisões cotidianas.

Naquele tempo eu era sozinho... Hoje em dia tenho uma família: uma mulher, três filhos... Então, hoje em dia, eu penso muito antes de fazer uma coisa errada… Não talvez que um dia eu não possa acabar fazendo uma coisa errada, porque o dia de amanhã só Deus sabe, né? E quando a gente é pai de família tem os dois lados, né? De um lado, se fizer uma coisa errada tu vai preso e ao tentar melhorar a situação você só vai piorar em dobro ou o triplo, né? Vai tentar tampar o buraco com o dedo e não vai conseguir, né? Então… são situações muito complicadas para quem é um ex-detento (Tony).

Lago (2019), ao investigar experiências de mulheres que visitavam familiares homens presos, destaca o papel desempenhado pelas mulheres na assistência material tanto a seus familiares presos quanto a outros presos privados de redes afetivas de solidariedade. A visitação e a assistência a familiares presos oferecida pelas mulheres são atravessadas por normas e papéis de gênero vigentes na sociedade e operantes no contexto prisional, que atribuem às mulheres as tarefas de cuidado e fornecimento de atenção, compreensão e afeto (Lago, 2019). Por outro lado, mulheres presas são significativamente menos visitadas que homens presos – e ainda menos visitadas e acompanhadas por homens, em especial por seus próprios parceiros (Pereira, 2016). Ao investigar as práticas de homens que visitavam suas cônjuges na prisão, Lermen e Silva (2018) identificaram a expressão simultânea de masculinidades hegemônicas e não hegemônicas, centradas na identidade de provedor de cuidados e bens materiais e na condição de estabilidade financeira, indicando a centralidade da segurança material e econômica também na organização das relações familiares de pessoas cumprindo pena de prisão. Ainda, a inserção em redes de solidariedade e segurança material representa a facilitação de práticas de cuidado nas redes afetivas de egressos do sistema prisional, em diferentes configurações familiares:

O que eu tenho pra dizer é que eu não desejo aquilo lá pra ninguém. Estou desde 2007 na rua, trabalhando a ponto de dizer: me banco agora. Faço parte do movimento das pessoas em situação de rua, vendo meu jornal no sinal e venho aqui na casa só no caso quando eu preciso. Tenho filha, mora em outro bairro com a minha sogra. Estou na luta com a minha mulher, ex-mulher, que é dependente de droga, está ‘atirada’ dormindo ali na avenida. Eu estou tentando tirar ela de lá, mas ela não quer, e eu estou aí... na vida... (Marco).

Na presente pesquisa, as narrativas expressadas apontam que a questão central com familiares e visitas, para egressos do sistema prisional, é marcada pelo sentimento de preocupação. Tal preocupação com familiares e visitas é justificada por dois motivos: a apreensão quanto aos riscos de extensão da pena aos familiares e o sentimento de obrigação em relação ao sustento da família, sendo a posição de preso como dependente de auxílio da família percebida como motivo de vergonha. Deste modo, os auxílios e visitas oferecidos pelos familiares são percebidos, por quem passou pela experiência do encarceramento, como uma imposição indevida aos familiares – já afetados pela vergonha e pelo distanciamento –, que não deveriam estar experienciando mais desgastes, sofrimentos e privações. Como alternativa para esta dinâmica, os egressos do sistema prisional entrevistados indicaram a necessidade de políticas públicas de apoio material a familiares de pessoas presas, de modo a reduzir sofrimentos e vulnerabilidades. Tal linha de ação nas políticas públicas implicaria uma mudança radical na relação estabelecida entre o Estado e os familiares de pessoas presas, posicionando o Estado como provedor das famílias em vez do funcionamento atual no qual o sistema prisional é dependente dos sistemas de abastecimento organizados por familiares de pessoas presas (Godoi, 2015).

A participação de pessoas cumprindo pena na gestão e na aplicação das penas já é uma realidade em diversas modalidades prisionais contemporâneas – tanto pela administração e disciplina praticadas pelos apenados organizados na “dupla governança” das prisões (Marcis, 2016) quanto pelo envolvimento ativo de apenados em programas de penas “terapêuticas” e reeducacionais (Godoi, 2015). Entretanto, a participação de presos e egressos na construção de políticas de reintegração social ou na própria segurança pública ainda é escassa, implicando limitações no acesso à cidadania, tanto pela constante criminalização quanto pela dificuldade de construção de protagonismo social e político (Barbalho & Barros, 2014). Melicio (2018) destaca os problemas, em termos de acirramento dos conflitos e escalada de violência, de modelos de segurança pública construídos de forma vertical e sem participação popular. A ausência de escuta das perspectivas das pessoas diretamente abordadas pelo funcionamento do sistema de segurança pública – seja pelo policiamento ou pela penalização – pelo poder público reflete uma negação da cidadania e do reconhecimento do outro como sujeito, reforçando processos de objetificação e aumento do conflito (Melicio, 2018). Como alternativa, podem ser construídas práticas de segurança pública que facilitem com que o encontro com “o outro” seja vivenciado a partir da lógica da alteridade e da transformação mútua, em vez de rígidas separações e processos hierarquizantes que separam os sujeitos entre “superiores” e “inferiores”, buscando “porosidade cultural” (Melicio, 2018). Ainda, Lima e Alvarenga Filho (2018) destacam o potencial de intervenções sobre o sistema prisional a partir do encontro com a alteridade e do testemunho da dor, como “experiências-faísca” capazes de mobilizar afetos e produzir efeitos disruptivos na naturalização das violências do sistema prisional, incentivando práticas de cuidado.

O ideal da prisão como “ressocializadora” e modificadora de comportamentos ou personalidade pouco especifica a qualidade da experiência prisional esperada – podendo configurar-se como uma transformação por meio da reflexão, do sofrimento, da intimidação, da disciplina ou da tortura (Reishoffer & Bicalho, 2017). Assim, o sistema prisional “devolve à sociedade” corpos marcados pelo estigma e pela violência – dos ferimentos, da tortura ou da morte –, produzindo uma forma de “ressocialização” pela subjugação e anulação da vida (Lima & Alvarenga Filho, 2018). Os testemunhos de violência no sistema prisional encontrados nas pesquisas em prisões, em especial no contexto brasileiro, destacam a violência – das agressões, das violações de direitos e da exclusão social – como o problema central no sistema prisional: “‘ Ah, eles roubam e fazem tudo, depois vão pra lá comer, beber e dormir de graça’. Mentiu. Porque não é de graça. Tu paga muito mais do que se fosse com dinheiro... porque tu paga com a tua honra e com a tua dignidade” (Clarice).

Como resposta aos mecanismos de institucionalização, prisionização e violação sistemática de direitos humanos presentes no sistema prisional, Nascimento e Bandeira (2018) argumentaram pela necessidade de orientar o trabalho da Psicologia para a defesa e promoção de direitos humanos e redução de danos do encarceramento, com foco nas ações de saúde prisional. A partir desta perspectiva ética de atuações mais inventivas de trabalho da Psicologia no contexto prisional (Nascimento & Bandeira, 2018), em contraste com práticas profissionais reforçadoras de processos de criminalização e privação de liberdade, as estratégias de promoção do acesso ao trabalho digno e socialmente produtivo poderiam também se configurar como práticas de redução dos danos do encarceramento – em contraste com a submissão a trabalhos precarizados e atravessados por processos de exploração e violência institucional.

Segundo a Lei de Execução Penal (Presidência da República, 1984), a execução penal deve proporcionar a “harmônica integração social do condenado” (art. 1º), posicionando a garantia de condições efetivas a integração social como função precípua da própria execução penal. Ainda, marcos regulatórios internacionais, que fundamentam a legislação brasileira – com destaque para a Constituição Federal de 1988 -, estabelecem condições mínimas para o tratamento de pessoas presas, a proibição incondicional de qualquer forma de tortura e outros tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes. O Projeto “Saúde nas Prisões”, da Organização Mundial de Saúde (World Health Organization [WHO], 2007), estabelece o princípio de que o sistema prisional deve se organizar de modo a atender as necessidades de saúde das pessoas presas e prevenir danos, garantindo com que as pessoas não fiquem em situação de saúde pior do que quando foram presas (Constantino, Assis, & Pinto, 2016). Tais normas e princípios determinam que o sistema prisional não deve provocar danos à saúde e ao desenvolvimento de pessoas que foram presas e deve promover mecanismos que facilitem a “integração social do condenado”.

Complementando a obrigatoriedade de prevenir danos e violência e garantir direitos, os marcos regulatórios da saúde prisional no Brasil – o Plano Nacional de Saúde no Sistema Penitenciário (Ministério da Saúde, 2003) e a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Pessoas Privadas de Liberdade no Sistema Prisional (Ministério da Saúde, 2014) – determinam a aplicação dos princípios do Sistema Único de Saúde (Presidência da República, 1990) – universalidade, integralidade e equidade – na orientação da saúde prisional. Ainda, a extinção da prática do exame criminológico como condição para a progressão de regime – conforme a Lei Federal nº 10.792 (Presidência da República, 2003), que altera o artigo 112 da Lei de Execução Penal (Presidência da República, 1984) – contribuiu com os fundamentos de uma reorientação ética e normativa da execução penal, deslocando do paradigma baseado na neutralização e no controle de riscos para um paradigma baseado na garantia de direitos e na promoção da saúde. Entretanto, tais princípios e normativas são sistematicamente descumpridos, conforme é possível observar tanto na literatura quanto nos testemunhos encontrados. Assim, configura-se uma contradição no sistema penal de punir aqueles que violaram a lei por meio da violação sistemática das leis penais e de garantia de direitos humanos (Rangel & Bicalho, 2017).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo pode ser situado na tradição de pesquisas do sistema prisional a partir “do lado de fora” das prisões (Gaborit, 2019), fundamentadas na teorização das etnografias prisionais contemporâneas sobre a permeabilidade e continuidade da prisão no contexto extramuros (Cunha, 2014) e na restrição do acesso a informações no contexto intramuros (Gaborit, 2019). Nesta linha, o fenômeno estudado não é a prisão em si, mas as experiências de encarceramento (Gaborit, 2019).

Os achados deste estudo expressam exercícios de reflexividade e criticidade de egressos do sistema prisional sobre o funcionamento corrente da política prisional e indicam os principais pontos a serem modificados de acordo com egressos do sistema prisional. Estes achados também reforçam a relevância para as políticas públicas de pesquisas de orientação êmica centradas na experiência das pessoas mais afetadas, em especial em condições mais graves de exclusão social.

A partir destas entrevistas, foi possível identificar três propostas de reestruturação da política prisional de modo a promover efetivamente a reintegração social, na perspectiva de egressos do sistema prisional. As soluções enunciadas foram: 1) limitar a extensão da pena de modo a não resultar em prejuízos no longo prazo ou a terceiros; 2) oferecer garantia universal de trabalho digno e socialmente relevante; e 3) garantir políticas de assistência plena a familiares de pessoas presas de modo a prevenir a ampliação das vulnerabilidades e a extensão da pena. As soluções enunciadas indicam a compreensão, na perspectiva de egressos do sistema prisional, de uma relação direta entre vulnerabilidade social e conflito com a lei, sendo a redução da vulnerabilidade social apresentada como mecanismo central para a prevenção do risco de reincidência.

O acesso a reflexões de pessoas cumprindo pena ou egressas do sistema prisional sobre a política prisional pode informar estratégias de reintegração social eficientes e centradas nas necessidades humanas. O acesso a perspectivas em primeira pessoa resulta em contribuições fundamentais para as práticas em saúde e a formulação de políticas públicas, revelando processos psicológicos e questões éticas e culturais específicas que merecem atenção e possibilitam engajamento e resultado. Enquanto práticas de reintegração social informadas de modo tradicional por teorias criminológicas e atuariais privilegiam processos de modificação comportamental ou a neutralização de fatores de risco, as perspectivas de egressos do sistema prisional revelam outras preocupações e concepções dos mecanismos da reincidência. Nas entrevistas analisadas, a falta de acesso ao trabalho digno e à segurança material foi representada como o fator mais significativo para o risco de reincidência, em vez de fenômenos psicossociais como a internalização da sociabilidade carcerária e a prática de comportamentos de risco, considerados prioridade tanto na literatura criminológica baseada no interacionismo simbólico quanto na pesquisa etiológica de matriz positivista. Deste modo, o acesso a perspectivas de egressos do sistema prisional possibilita a compreensão de concepções psicológicas em primeira pessoa sobre os processos de conflito com a lei, punição, encarceramento e reintegração social. Tais compreensões êmicas apresentam diferenças em relação a teorias criminológicas formuladas a partir de outros critérios e fontes de informação e indicam um campo de investigação a ser explorado, destacando as reflexões produzidas por pessoas que experienciaram diretamente o conflito com a lei, o encarceramento e o processo de reintegração social.

As estratégias de reintegração social e reestruturação da política prisional identificadas nas reflexões de egressos do sistema prisional indicam o potencial de perspectivas em primeira pessoa para informar práticas de reintegração social, que podem ainda ser estudadas em maior profundidade e verificadas empiricamente. Para Porporino (2010), pessoas que experienciaram a pena de prisão devem ser abordadas como “guias” ou “experts” no enfrentamento dos desafios cotidianos na busca pela reintegração social, informando necessidades, prioridades e boas práticas.

Para realizar uma apreciação crítica e parcimoniosa dos achados de perspectivas em primeira pessoa, é necessário também destacar algumas limitações deste estudo que são comuns em abordagens êmicas. Primeiramente, existe a possibilidade de os discursos enunciados pelas pessoas entrevistadas terem sido influenciados por processos de desejabilidade social, correspondendo às expectativas sociais ou reproduzindo discursos sociais mais amplos – embora tais processos de desejabilidade social sejam limitados por estratégias metodológicas de narrativa livre. Também deve ser considerada a diversidade de pontos de vista das pessoas identificadas como egressos do sistema prisional e os riscos da generalização. Ainda, os objetivos, os valores e as prioridades das pessoas entrevistadas para pensar a política prisional podem não ser congruentes com os de pessoas ocupando outras posições ou papéis na política penal. A própria literatura de Criminologia em Primeira Pessoa apresenta considerações sobre os problemas da validação automática de pontos de vista em função da experiência do encarceramento (Newbold & Ross, 2013). Entretanto, tais limitações não reduzem as contribuições e o potencial teórico e de aplicação das reflexões de egressos do sistema prisional sobre a política prisional.

Estudos futuros podem verificar a aplicação, em termos de processo e resultado, de propostas de ações de reintegração social derivadas das reflexões de egressos do sistema prisional. Os achados deste estudo sugerem o potencial da garantia de trabalho digno e socialmente produtivo e de medidas de redução da vulnerabilidade social por meio da segurança material como estratégias relevantes para a prevenção da reincidência, a serem verificadas empiricamente em estudos posteriores. O presente estudo contribui para a inserção das perspectivas de egressos do sistema prisional, sistematicamente silenciados e marginalizados em função do estigma, no debate público e para o seu reconhecimento como perspectivas válidas e capazes de informar práticas de reintegração social empiricamente fundamentadas e centradas no sujeito. Ainda, outros grupos sociais em situação de vulnerabilidade e exclusão também podem se beneficiar de estratégias metodológicas que promovam acolhimento, validação e empoderamento, como a articulação de Entrevista Narrativa Autobiográfica com questionamentos específicos sobre a reformulação de políticas públicas e práticas de assistência.

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Recebido: 26 de Fevereiro de 2020; Revisado: 30 de Março de 2020; Aceito: 22 de Abril de 2020

Correspondência: Bruno Graebin de Farias. bfarias.contato@gmail.com

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