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Ide

Print version ISSN 0101-3106

Ide (São Paulo) vol.44 no.74 São Paulo July/Dec. 2022  Epub Aug 02, 2024

https://doi.org/10.5935/0101-3106.v44n74.21 

Ilustrações

ILUSTRAÇÕES

Vera Montagna1 

Membro efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). São Paulo

1Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo


Os elementos da natureza, antigas matas com a estrutura diversificada das árvores evocam múltiplos cenários criados pelas frondes de árvores centenárias e suas raízes entrelaçadas. São tramas fechadas, abrindo-se em clareiras, em múltiplas camadas e transparências nas quais a luz vibra e colore.

Isso tornou-se um lugar poético, de silêncios e movimentos. Lugar da lenta contemplação do mundo, da poeira vermelha das estradas, subindo, descendo vagarosamente, formando cortinas, transformando a paisagem ao redor. Tudo se convertia em imagens, desenhos e pinturas. Descobri muito cedo, pela observação demorada, o que denominamos perspectiva aérea, a paisagem mudando de cor a partir do ar, da neblina, da luz, os troncos das árvores não tinham o colorido do lápis de cor marrom, mas eram multicoloridos, as folhas eram azuis, amarelas, roxas, vermelhas; não apenas verde, a cor dependia da luz que incidia sobre elas. Tudo se mostra e se esconde, nesse misterioso tempo expandido. Imagens de mistério e surpresas que foram se enraizando, no acervo mais profundo dos anos da minha infância. Nelas estão amalgamadas a vida da cidade pequena, carroças, música dos pregões da rua e o zum-zum do cotidiano familiar, do jazz, do circo alegrando a criançada, do sol a pino, das noites estreladas sem fim. Aí a natureza penetrava e se misturava com os cantos dos pássaros, com as pequenas abelhas dançando em torno de jabuticabeiras em flor. São referências que contrastam com aquelas das árvores remanescentes à beira de estradas ou soltas no meio de extensas plantações. As raízes, o capim, as aves, pequenos declives lançam o olhar para o vasto da paisagem, testemunhando transformações provocadas pela mão humana, num diálogo contínuo entre o permanente e o transitório.

Minha bagagem se construiu aos poucos, lentamente, por isso uso o linho, o papel de arroz, o nanquim, a tinta, o cobre como suporte para a trama da pintura ou da gravura. Aí se processa um diálogo de linhas e manchas formando tramas, criando relações sutis de contrastes de luz e sombra que o olhar contempla e explora. Um lugar poético para evocar aquilo que não se apresenta de forma evidente e objetiva.

É a partir da vida, que constantemente nos escapa, da mobilidade de um armazenamento de experiências múltiplas, que uma rede de relações subjetivas é evocada, dinamizada. No fazer artístico o gesto é inacabado, nele a intuição, o sentimento, a memória se aliam, estabelecendo um trânsito amplo e profundo entre mundos. Envolve, assim, um diálogo constante do artista com a tradição da arte e seus múltiplos tempos.

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons Attribution, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que o trabalho original seja corretamente citado.