Certa lembrança de minha infância foi evocada por uma vivência em um Congresso de Bion, quando adentro uma sala escura abarrotada de pessoas, onde estava sendo projetado um filme. Eu buscava meu analista que imaginava estar ali, embora não o encontrasse. Transcorrido longo tempo, um vagalume levantou-se naquele breu direcionou-se até a porta de saída e passou por mim. Ao permanecer no escuro e aguardar o vagalume acender, vivo um estado expectante repleto de sentimentos como um berço em prontidão para aninhar a cria. Criada num laivo de luz para instantes depois apagar-se.
Dessa experiência emocional com meu analista brotou o modelo cunhado por ele como um “vagalumear”. O que me remeteu a Bion, em Transformações (1965/2004), ao mencionar que “O fato selecionado, precipita um modelo”. Tal qual a experiência emocional de revelar o fenômeno da Transitoriedade como um elemento presente na vida e na sessão analítica. Não capturamos a dinâmica dos nossos analisandos, quando muito um vagalume se acende na sessão, para tocarmos momentaneamente uma pequenina parte do seu inconsciente.
O sentimento, o tempo e o vagalumear…
Como o tempo atua sobre o sentimento
Sentimento no tempo presente
Sentimento no tempo passado/memória
O sentimento é volátil, uma metamorfose quando e
sempre amalgamado com o tempo.
É como um vagalume que acende e num instante se apaga.
Na minha infância me sentia fascinada pelos vagalumes.
Acho que o acender e apagar instantaneamente nos inquietava tanto
que brincávamos de capturá-los e colocá-los dentro de um
pequeno vidro transparente... Para ver? Entender?
Ou fazer o tempo parar e se apossar deste?
Se apossar daquilo que jamais poderemos nos apropriar,
a não ser que deixemos o tempo levar para daí guardar
no único lugar atemporal possível!
Havia uma curiosidade acerca daquele fenômeno:
Acender/apagar
Aparecer/desaparecer
Porque na caça aos vagalumes,
quando ia apanhar um e a luz se apagava,
o perdia momentaneamente no escuro.
Tinha que ficar esperando que se acendesse novamente…
Aquela espera repleta de expectativas…
Estará perto ou longe?
Às vezes quando acendia, já não estava mais ao meu alcance.
Era algo estimulante/excitante.
Corríamos pra lá e pra cá:
Onde foi esse bichinho ousado?
Neste piscar havia algo de liberdade...
E eu ansiando por capturá-los, observá-los…
E quando conseguia capturar, já no vidrinho, perdia o encanto.
O vagalumear já não era o mesmo, sua luz já não era tão verdinha.
Tornava-se fosca!
Lembro-me que preso entre meus dedos eles faziam uns estalinhos e
uns movimentos que eu pensava que o barulhinho deveria vir de suas asas.
Um ruído seco! Talvez bravo!
O encanto se foi...
Era voando em liberdade
Na noite escura que havia toda a magia:
A beleza de sua natureza vagalumeante!
O dentro e o fora da sala de análise
Capturar e tentar congelar o que não se congela.
O vagalume como o sentimento, não se captura,
só se vive no momento, no agora…
O que será que eu queria capturar naquele vidrinho?
Capturar o incapturável
Sentimentos são despertados naquele instante,
e no instante seguinte teremos que despertar novos sentimentos…
como os vagalumes, ou eles estão em liberdade
ou o vagalumear não acontece!!!