Recentemente, publicado pela editora Cortina, foi lançado um belíssimo livro de Erik Kandel, Prêmio Nobel de Medicina em 2000, que liga o pensamento psicanalítico à neurociência e à arte da Viena do início do século 20. Tal livro, de notável qualidade, examina obras de Gustav Klimt, Oskar Kokoschka e Egon Schiele, desvendando seus “diálogos interiores” e revelando seus sentimentos mais profundos, como a sensorialidade, a angústia, o prazer e o desejo.
Desde os primeiros estudos de Freud, a psicanálise tem se interessado por suas relações com a arte e a literatura. A investigação psicanalítica das obras dos artistas e poetas sempre buscou compreender, através da alma, as leis do comportamento, especialmente aquelas determinadas pelo inconsciente.
O mérito do livro de Marisa Pelella Mélega, que vocês em breve terão a oportunidade de ler, está justamente nessa área árdua e complexa de investigação que o psicanalista busca compreender em sua formação e prática clínica. A autora examina o que atrai poetas e escritores e quais diretrizes orientam suas obras.
Nesse volume, a autora toma como objeto de análise a obra de Eugenio Montale, explorando as vicissitudes psicológicas que expressam as inquietações do escritor e poeta. No entanto, o mérito de Mélega não termina aqui. Com bravura, ela se dedica à análise de obras literárias em busca de criatividade, baseando-se no pensamento de psicanalistas como Wilfred R. Bion e Donald Meltzer.
A criatividade, nas palavras da autora, “foi admirada e simultaneamente temida, e foi referida à loucura, ao destino, à providência divina”. Por séculos se acreditou que o homem, sendo um animal racional, pensasse somente pelas leis da lógica. No entanto, para o psicanalista, a criatividade deve ser entendida como um modo de “acalmar” os sofrimentos humanos, buscando reconstruir ou mesmo construir novos objetos, símbolos e pensamentos, que são representados nas obras de arte.
Mas por que Montale? A autora responde a essa pergunta: porque Montale transmite em seus versos imagens oníricas intensas e profundas que tocam a alma. O volume desenvolve um continuum de análise da produção poética de Montale e suas possíveis teorizações, que enriquecem tanto o leitor de literatura quanto o estudioso de psicanálise, proporcionando uma linguagem e uma sintaxe de profundo conhecimento da alma humana.