O Círculo Psicanalítico de Minas Gerais tornou-se um sexagenário em abril de 2023. Foi com muito prazer que comemoramos, ao longo do ano, sua fundação, suas marcas particulares, seus rearranjos e seus destinos que fazem de nossos laços a nossa história, sempre em aberto.
Usufruir do tempo, seja por efeito de seu destino, seja pela riqueza de sua origem, traz um campo inesgotável de possibilidades. Tanto quanto as ampulhetas, minimizadas em seu tamanho e rearranjadas em sua forma, constituindo a capa desta nova edição (gentilmente criada por Paulo Sérgio Miranda), encontramo-nos diante dessa bricolagem temporal.
Passado, presente, atemporalidade do inconsciente, temporalidade histórica, descontinuidades temporais, sintomas em tempos atuais, ideais culturais cravados na temporalidade, entre outras articulações instigantes, se fazem aqui representadas a um só tempo - o número 86 de nossa Reverso.
Ednei Soares, nosso convidado e professor da Universidade Radboud, na Holanda, discorre de forma fluida e criativa sobre a importância do conceito de angústia no século XX, como um dos elementos axiais na obra freudiana, e paralelamente essencial, em sua vertente clínica.
Podemos usufruir, nesta edição, a história da psicanálise e sua implicação na fundação do CPMG. Arlindo Pimenta cuidadosamente apresenta essa instigante trilha a ser percorrida pelos leitores.
Ainda na perspectiva temporal, Scheherazade Paes de Abreu trata da “descontinuidade” apontada pelo funcionamento psíquico a partir da perspectiva de Freud em diferentes e importantes artigos de sua obra.
Em articulações da psicanálise com a literatura, encontramos dois autores. Edson Santos de Oliveira apresenta limites da sublimação, articulada ao conceito de objeto transicional, trazendo, assim, a dimensão de “resto”, do que “sai de cena” no ato da escrita. Pedro Henrique Estevão Ferreira nos apresenta o “desencontro amoroso” e sua reinvenção pela literatura, numa interseção com o olhar psicanalítico.
Caminhando na direção de um encontro da cultura com a psicanálise, Bernardo Maranhão, de forma particular, tece a partir de Lacan uma delicada articulação entre o afeto da tristeza e uma “gaia ciência brasileira”, nas palavras de José Miguel Wisnik. Temos aí um diálogo produtivo entre música popular brasileira e psicanálise.
Ainda na interseção entre psicanálise e cultura, Eliana Rodrigues Pereira Mendes aborda a metapsicologia através do conceito de “ideal do eu”. Ao confrontá-lo com o “eu ideal”, vemo-nos, frente à cultura contemporânea, naquilo que ela apresenta em seus excessos, entre eles, o consumo, a intolerância, os racismos, as tecnologias. Frente a essa hiperbolização, a autora propõe o pensamento crítico como ponte entre a herança clássica e a contemporaneidade.
Marcos de Moura Oliveira apresenta uma intervenção relevante, ainda na interface psicanálise e cultura. Através de ícones sintomáticos advindos do encontro entre excesso de tecnologia e o sujeito contemporâneo, o autor nos interroga sobre os efeitos dessa alienação.
Nesta edição, encontramos artigos em que os autores dialogam com a Clínica. Michelle Mello e Paulo Roberto Ceccarelli ressaltam a relevância da transferência para a escuta psicanalítica e seu papel como força motriz para retificação subjetiva e ressignificação, tão essenciais ao trabalho clínico.
Contemplando também a práxis psicanalítica, Paulo Victor Madureira Costa e Paula Sobral, tratam da especificidade do obsessivo e sua sustentação pelo narcisismo e pela agressividade. A imaginarização excessiva do obsessivo o torna refém do outro. Faz-se necessária a abertura de uma falta, possibilitando, assim, o campo do desejo.
Vanessa Campos Santoro propõe de maneira clara a desmontagem dos excessos, especialmente no que tangencia ideais, sejam presentes no campo da singularidade como no caso clínico apresentado, seja no campo das instituições, em que a abertura para a falta e a desconstrução de “rigor excessivo” serão bons aliados nessa travessia.
A abertura, segundo a autora, se dá pela abdicação dos excessos idealizantes.
Por último, mas não menos importante, nossos agradecimentos à comissão editorial da Reverso - aos queridos colegas, Carlos Mello, Eliana Mendes, Marília Brandão, Paulo Roberto Cecarelli e, em especial, à incansável Mazzarello Cotta Ribeiro, sempre atenta e dedicada. Nossos agradecimentos também, à equipe técnica que nos apoia “no pingo e na letra” - Dila Bragança de Mendonça, com a revisão, Valdinei do Carmo, nosso diagramador, além das secretárias do CPMG Adriana e Esmeralda, e a bibliotecária Marta Almeida, sempre solícitas.
Aos nossos leitores, desejamos uma ótima experiência por aqui!
Comissão Editorial