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Junguiana

versão On-line ISSN 2595-1297

Junguiana vol.41 no.3 São Paulo  2023  Epub 02-Dez-2024

https://doi.org/10.70435/junguiana.v41i3.61 

Artigo

Da despedida para o viver na ausência: considerações sobre o luto e rituais de despedida a partir de vivências na pandemia

De la despedida para el vivir en la ausencia: consideraciones sobre el luto y rituales de despedida a partir de vivencias en la pandemia

Ludymilla Zacarias* 

Natália Dantas do Amaral** 

Rebecca Holanda Arrais*** 

*Doutora pelo Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Trabalha em clínica particular utilizando como eixo de atuação tanto a Psicologia Analítica quanto com as teorias de luto. Atende pacientes enlutados e público em diversos momentos do desenvolvimento. É coordenadora do Grupo de Apoio Lado a Lado dedicado a pessoas enlutadas por mortes e do Projeto JUNTAS NO CALORÃO dedicado ao trabalho em saúde integral de mulheres maduras. email: ludymillaz@yahoo.com.br)

**Mestre pelo Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Especialista em Saúde Mental pela Faculdade Estácio. É Psicóloga Clínica de orientação junguiana com foco no atendimento de adultos e idosos. email: natalianda@alumni.usp.br

***Mestre pelo Departamento de Psicologia Clínica e doutoranda pelo Departamento de Psicologia da Aprendizagem, do Desenvolvimento e da Personalidade do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Psicóloga da Saúde, trabalha em clínica particular, atendimento hospitalar e domiciliar a partir da Psicologia Analítica. Leciona em cursos de Especialização em Saúde Mental, Luto, Cuidados Paliativos e Psicologia Hospitalar. Coordenadora dos cursos de aperfeiçoamento em Intervenções no Luto, Psico-oncologia e Atendimento à Família no Contexto Hospitalar. email: rebecca.arrais@gmail.com)


Resumo

Este artigo consiste em um estudo de três casos de luto vivenciados na pandemia de covid-19. Os dois primeiros são provenientes de pesquisa de mestrado, já o terceiro é um caso clínico de uma viúva em seu primeiro ano de luto. Identificamos e discutimos, conforme as perspectivas de Jung e de autores junguianos, que o fenômeno da morte desorganiza e constela o Caos. Contudo, rituais de despedida disseminados pela cultura e pelas religiões, ou mesmo criados pelo enlutado, podem auxiliar no processo de luto, possibilitando a criação de novos sentidos para a perda vivenciada. Constatamos que, quando não é possível a vivência destes rituais, pode haver risco e impacto na saúde mental dos enlutados.

Palavras-chave psicologia analítica; psicologia junguiana; luto; covid-19; rituais de passagem

Resumen

Este artículo consiste en un estudio de tres casos de luto experimentado en la pandemia de covid-19. Los dos primeros provienen de la investigación de maestría, mientras que el tercero es un caso clínico de una viuda en su primer año de luto. Identificamos y discutimos, conforme las perspectivas de Jung y de autores junguianos, que el fenómeno de la muerte desorganiza y constela el Caos. Sin embargo, rituales de despedida diseminados por la cultura y las religiones, o incluso creados por el enlutado, pueden ayudar en el proceso de luto, posibilitando la creación de nuevos sentidos para la pérdida vivenciada. Constatamos que, cuando no es posible la vivencia de estos rituales, puede haber riesgo e impacto en la salud mental de los enlutados.

Palabras clave psicología analítica; psicología junguiana; luto; covid-19; rituales de pasaje

Abstract

This article consists of three case studys of grief experienced during the covid-19 pandemic. The first two cases originate from a master’s research, while the third is a clinical case of a widow in her first year of mourning. We identified and discussed, according to Jung’s perspectives and those of Jungian authors, that the phenomenon of death disorganizes and constellates Chaos. However, rites of passage disseminated by culture and religions, or even created by the bereaved, can assist in the mourning process, enabling the creation of new meanings for the experienced loss. We found that, when the experience of these rituals is not possible, there may be risks and impact on the mental health of the bereaved.

Keywords: analytical psychology; clinical psychology; grief; covid-19; rites of passage

Introdução

Jung (2001; 2003; 2006; 2013a; 2013b) tratou da relação do ser humano com a morte inúmeras vezes, construindo um arcabouço teórico que pudesse auxiliar profissionais e o público em geral na compreensão e vivência desse importante fenômeno. Para o autor, a morte é um fenômeno marcante e inigualável, que impacta de maneiras diversas. A morte tem o efeito de colocar o ser humano em contato com o real sentido da vida e, diante dela, ele se encontra com sentimentos díspares, que oscilam e são extremamente opostos.

De acordo com Zacarias (2021), Jung (2003; 2006, 2008; 2013a; 2013b; 2013c; 2013d) desenvolve o tema morte em duas vertentes emblemáticas: a morte como símbolo (individual e coletivo) e a morte como um aspecto da individuação, fazendo parte, portanto, do processo de desenvolvimento humano. A morte de uma pessoa com a qual se tem um vínculo afetivo importante, por sua vez, pode ser uma experiência avassaladora em vários sentidos. Esta travessia pode ser carregada de momentos de desorganização, raiva, dor psicológica intensa, medo, negação e ansiedade. Para Sá (2011, p. 38), “a vivência simbólica de morte significa o confronto com a sombra, bem como tudo que é desconhecido”, mas gera autoconhecimento. Nesse sentido, como bem apontado por Parisi (2009), a elaboração simbólica é um processo dinâmico entre consciente e Self, e rituais de passagem podem ser importantes para auxiliar nesta trabalhosa jornada de adaptação e construção de outra identidade.

Na perspectiva junguiana, Savage (1989) pontua que, quando o indivíduo está imerso em processos de luto, seria salutar que ele entrasse em contato com aspectos simbólicos acerca da morte em sonhos, mitos, folclores, material expressivo e outros. Essa recomendação se justifica porque esses elementos têm a capacidade de ajudar o enlutado a realizar associações subjetivas, organizar e ampliar sentidos que auxiliariam no manejo do luto, visto que a razão não tem a capacidade de trazer acolhimento e explicação ao contato avassalador com o fenômeno morte.

Von Franz (1984) afirma que, no confronto com situações que convocam o ser humano ao campo do visceralmente desconhecido, o inconsciente produz símbolos que, segundo a autora, são apreendidos pela consciência em seu sentido metafórico, não literal. Quando há essa apreensão, o indivíduo torna-se capaz de atribuir sentido às experiências que podem ser avassaladoras.

Ao estudar a história da humanidade, verifica-se que inúmeros ritos de passagem foram construídos coletivamente para auxiliar nos processos de transição. Zimmermann (2005) afirma que os rituais têm o objetivo de propiciar ao indivíduo a oportunidade de lidar com crises. Tais rituais têm em sua base temas mitológicos e arquetípicos. Ao vivenciá-los, há a oportunidade de integração de conteúdos inconscientes e, assim, há uma ampliação da consciência. Jung privilegiava o trabalho com imagens simbólicas (JUNG, 2013a; 2013e). Neste paradigma, os símbolos têm uma importância fundamental, por serem uma expressão originada do inconsciente.

A noção de que a ritualização é uma realidade viva é tratada por Mircea Eliade (1972; 1992). De acordo com o autor, o ritual possui cunho terapêutico ao conferir sentido às transições da existência. Eles evidenciam um eterno retorno à origem, entretanto, a renascença é de ordem espiritual e mística, sendo simbolizada para o grupo como o marco do início de uma nova existência.

Parkes (1998), estudioso das teorias de luto, pontua que os rituais oportunizam a oferta tanto de explicação para a morte, quanto o apoio social, contudo não basta recomendar que eles sejam feitos, é necessário acreditar neles para que esses efeitos tenham seu valor terapêutico. O autor pondera que as cerimônias têm valor psicológico, apresentando aos vivos que a morte física e a social não são simultâneas, “[...] sendo necessário o processo de aperceber-se, tornar real o fato da perda” (p. 198), sem submeter teste de realidade forçoso ainda no período inicial, o que poderia promover dificuldades no luto.

As cerimônias de despedida têm, então, importante papel na constatação da morte social, que faz parte de se aperceber da realidade da perda. Whitmont (1991), por sua vez, aponta sobre a necessidade de que o ritual seja descoberto, e não fabricado, incentivando a vivência de um ato significativo, o que por sua vez poderá promover o início da transformação.

Desta forma, a realização de cerimônias e rituais fúnebres, de acordo com Oliveira et al. (2015), é de fundamental importância para a elaboração do luto, pois possibilita a despedida do corpo conforme a crença de cada família, apoio e acolhimento da comunidade e do entorno afetivo. As cerimônias oportunizam a reconstituição da identidade, já que as mortes concreta e simbólica, como apontadas por Souza (2018), precisam ser integradas para promover o renascimento. Apoiada na perspectiva de Campbell, a autora afirma que: “A morte simbólica, com necessária ocorrência de ritual fúnebre e luto simbólico, representa a despedida do jeito velho de funcionar, a elaboração do antigo morrendo, para o renascimento da nova pessoa, com novos valores e comportamentos” (SOUZA, 2018, p. 143).

Durante períodos críticos da pandemia de covid-19, a humanidade sofreu grande impacto em sua forma de velar seus mortos e vivenciar o processo de luto. De acordo com Amaral (2022), a condição imposta pela pandemia, com hospitais lotados, falta de leitos e carência de profissionais de saúde - com diversos profissionais tendo de se afastar em razão de adoecimentos e morte - situou muitos numa condição de desassistência que potencializou o risco de morte por covid-19. Além desse elevado risco, a humanidade se deparou com restrições para realização dos rituais de despedida - da pessoa em vida ou após sua morte - a fim de evitar o contágio pelo novo coronavírus. Naquele momento, a situação corrente na pandemia assemelhava-se às mortes repentinas provocadas por desastres, trazendo à tona também o temor por perdas múltiplas em uma mesma família.

Amaral (2022) complementa que, neste período, ocorre uma intensificação e institucionalização de elementos já característicos do período histórico de interdição da morte (ARIÈS, 1977), como o distanciamento familiar no acompanhamento de seu ente querido hospitalizado e no fim de sua vida, e rituais fúnebres mais discretos ou quase inexistentes. Contudo, Lisbôa e Crepaldi (2003) ponderam que “A oportunidade de se despedir do paciente com este ainda em vida parece fazer diferença na aceitação da morte, podendo-se cogitar que facilita também na elaboração do luto pós-óbito” (p. 107). As despedidas em vida possibilitam que os familiares conversem sobre questões que considerem importantes, pendências familiares, expressões de sentimentos de amor, carinho e de fé.

O colapso dos serviços funerários, a cremação compulsória, o enterro em valas coletivas, o impedimento de velórios e/ou a restrição ao número de pessoas permitidas para o velório são apenas alguns pontos que nos sensibilizaram acerca do que foi vivenciado. A condição imposta pelo desconhecido pode ter gerado grande impacto na saúde mental dos enlutados, sem dizer sobre a grande chance de desenvolvimento de lutos complicados, lacunas que ainda estão sendo avaliadas pela ciência.

O impacto gerado pela morte de um ente querido, por sua vez, leva alguns indivíduos a serem encaminhados ou a buscar autonomamente atendimento psicoterapêutico, objetivando ter, na relação com os/as psicólogos/psicólogas (e na técnica), espaço seguro e continente para lidar com este processo que, em muitos casos, é profundo, intenso e caótico. Assim, a produção de rituais pode trazer auxílio para a integração dos conteúdos difíceis de lidar, frente à dor psicológica originada de uma sensação de caos devastador.

O presente artigo tem como objetivo tratar os rituais de passagem relacionados à vivência da morte, tanto no que diz respeito à importância dos rituais de despedida, trazendo o impacto da pandemia nesta realidade, quanto na vivência de rituais no processo do primeiro ano de luto. Para isso contamos com três casos - utilizaremos nomes fictícios para preservar a identidade dos envolvidos. Os dois primeiros relativos ao contexto de despedidas na pandemia, tendo os colaboradores Claudio e Juliana concedido entrevista logo após a perda de seus pais, cerca de um mês depois. Já o terceiro caso, da Thaís, é relativo ao atendimento no decorrer do primeiro ano do processo de luto - também de uma morte na pandemia. Os dois primeiros compõem a pesquisa de mestrado de uma das autoras do artigo, já o terceiro caso clínico tem como origem o atendimento de uma viúva em clínica particular durante o ano de 2021 e 2022, recorte que compõe seu primeiro ano de luto.

Casos clínicos

Claudio é o enlutado do 1º caso a ser desenvolvido. Quando concedeu duas entrevistas para a pesquisa, em 2020, tinha 30 anos e era solteiro. Seu pai faleceu de covid-19 no início da pandemia. Claudio era o mais novo dentre três irmãos e o único que não possuía filhos, por isso era o mais requisitado para auxiliar os pais. No luto de Claudio, um sentimento bastante presente era a raiva. Raiva porque as pessoas não respeitavam o isolamento social imposto pelas medidas de biossegurança; raiva “contida” pelo pai ter sido um seguidor do então presidente do Brasil e por ter sido incentivado a não usar máscara; raiva pelo fato de ele ter sido vítima do vírus do qual ele mesmo duvidava da gravidade; raiva do Presidente da República que, por sua vez, encabeçava uma política negacionista.

Em alguns momentos da entrevista, Claudio parecia não se permitir mergulhar na introspecção e sentir a tristeza que o luto lhe trazia. Ele se questionava a respeito de que falar sobre seu pai não seria um sinônimo de fraqueza. O fato de Claudio ser psicólogo dá ensejo a uma cobrança adicional para suportar sozinho ou ocultar seu luto, tendo em vista a concepção coletiva de que pessoas que exercem esse trabalho possuem mais recursos psíquicos para enfrentar situações difíceis.

O funeral do pai de Claudio foi realizado apenas entre ele, sua mãe e seu irmão e, por isso, remeteu à sensação de ausência de pertencimento. Claudio se referiu à maneira como essas despedidas se sucederam quando da morte da avó, em 2017, comparando sua vivência atual com a passada. Ele declarou ter sentido falta do apoio de alguém um pouco mais distante da família nuclear, de forma que pudesse lhes oferecer acolhimento.

No velório da avó, havia muitos parentes buscando confortar e lembrar de coisas boas, o que remeteu à sensação da ocasião do velório como um ponto de encontro de pessoas queridas, de familiares que há tempos não se viam. Por mais que fosse um funeral, havia um sentimento de pessoas se encontrando, de pessoas se reunindo para homenagear a avó. No velório do pai, o que o marcou foi o sentimento de solidão e isolamento: eram só ele, a mãe e o irmão, “os três em frangalhos, tentando se abraçar” (sic) (AMARAL, 2022).

O segundo caso é o de Juliana, outra colaboradora da pesquisa supracitada, que vivenciou o ritual do velório por videoconferência. À época da pesquisa, ela tinha 50 anos, era casada e sem filhos. Seus pais estavam divorciados desde os seus 17 anos. Após a separação, seu pai foi morar em Maceió, enquanto ela e o restante da família continuaram residindo em Santos. Eles se viam pouco, porém o relacionamento a distância se manteve, principalmente, por iniciativa dela, que ligava todos os dias.

Estar longe do pai foi um fator dificultador para seu acompanhamento, pois ela necessitava de contato com terceiros - que, muitas vezes, não cuidavam do pai conforme ela gostaria - para assegurar que ele estava sendo bem cuidado. O medo do contágio pelo coronavírus durante a viagem, por sua vez, impediu que Juliana se deslocasse para acompanhá-lo em Maceió. Juliana destacou que cuidou do pai a distância, servindo-se da tecnologia e do auxílio das pessoas que tinham laços com ele em Maceió; contudo, lamenta não ter sido como gostaria, porque muitas questões fugiam ao seu controle. Por fim, ela contratou uma cuidadora para acompanhar seu pai no hospital, que, por sua vez, lhe enviava vídeos dele.

Com a piora de seu quadro, ele foi para a unidade de terapia intensiva (UTI), e a profissional foi dispensada. Dessa maneira, Juliana novamente não tomou conhecimento dos detalhes da evolução do pai e só soube que ele havia sido entubado dois dias depois. O desconhecimento acerca dos detalhes que ocorreram no período de internação contribuiu para fomentar dúvidas e angústias no luto pós-óbito: não saber se ele foi cuidado com dignidade e se estava sendo feito o possível para sua melhoria no hospital.

Com a morte repentina de seu pai, Juliana e seu irmão, ambos em Santos, não sabiam o que fazer. A ex-esposa dele, que se aproximou no seu adoecimento, providenciou o velório e a cremação. Filmou o caixão fechado com as flores, e Juliana escolheu a música que foi tocada nesse momento: “Ave Maria”, pois seu pai era muito devoto.

A escolha pela cremação foi realizada para que, com as cinzas, organizassem uma cerimônia posteriormente. Juliana considerava, talvez, levar um pouco delas para a Igreja de Fátima, em Portugal, pela devoção do pai. Ela expressou a importância que essa ritualização teve para ela, e salientou que foram realizadas missas de 7° dia e de um mês, pois precisavam dessas vivências para ter mais proximidade com a realidade da perda.

Thais, 42 anos, é a paciente do terceiro caso a ser desenvolvido. Ela foi atendida por uma das autoras, e chegou ao consultório após perder o esposo, por complicações da covid-19, com quem foi casada por 10 anos, sem filhos. Assim que perdeu o marido, cercou-se de profissionais para o autocuidado: psiquiatra, duas psicólogas (uma delas especialista em luto), aromaterapeuta, aula de pilates, massagem terapêutica, leituras sobre luto, espiritualidade (frequentando o centro espírita e a igreja católica) dentre outros.

O primeiro ano do processo de luto foi descrito por Thais como um “luto devotado” (sic), no qual ela vivenciou muitas integrações e o encontro consigo mesma. Aqui não cabe a análise aprofundada de seu amplo processo de luto, mas a apresentação de como ela atravessou instintivamente este momento de sua vida por meio da criação de vários rituais.

Segundo a paciente, a frase “meu marido morreu” (sic) ecoava reiteradamente em seus pensamentos. Em busca de atualização e de respostas para esta nova realidade visceralmente dolorosa, Thaís enfrentava as datas comemorativas criando pequenos rituais de passagem. Apresentaremos dois deles, um relacionado ao primeiro aniversário de casamento em 2021 e o segundo ao aniversário do esposo em 2022.

O esposo de Thaís faleceu em março de 2021 e, no dia em que comemorariam 10 anos de casados (15 dias depois de sua morte), ela organizou uma viagem sozinha e um ritual que considerou necessário. Dilacerada com a morte trágica e repentina do marido, ela estava lidando, além da perda em si, com as violências relacionadas ao manejo das medidas de biossegurança. A paciente questionava: “por que o colocaram em um saco mortuário preto? Não fazia sentido, seria mais humanizado para nós enlutados se este fosse transparente foi muito violento” (sic). Além disso, Thais sentia que lhe foi subtraída a possibilidade de tocar no corpo do marido - mesmo ela também tendo sido infectada na mesma ocasião, assim como a oportunidade de escolher uma roupa para o sepultamento.

Outro ponto que merece destaque foi a inexistência de um velório adequado para que ela pudesse iniciar a ritualização da perda: “Sabe aquele momento em que a viúva fica sentada horas, velando o caixão e recebendo os amigos com afeto e solidariedade? Pois é, eu não tive isso. E o fato de não termos tido filhos tornou mais absurdo o meu sofrimento, não tive apoio e reconhecimento social neste momento do novo status de viúva. Foi tudo muito violento” (sic). A paciente entorpecida por toda a circunstância foi acolhida na casa de seus pais, mas sua rotina sem contorno, o sentimento de falta de um lugar só seu e a proximidade do aniversário de casamento impulsionaram-na instintivamente para o primeiro ritual criado por ela.

Thaís deslocou-se para a cidade onde moraram enquanto casal por um certo período. No primeiro dia, ela realizou um longo passeio por locais significativos. O lockdown ainda estava bem representativo, oque trouxe uma experiência ainda mais peculiar. No momento seguinte, dia em que comemorariam 10 anos de casamento, ela, com horário agendado, se dirigiu a um tatuador, amigo do casal, e fez no braço um desenho idêntico ao que ele tinha tatuado.

Um ano depois, sentiu a necessidade de realizar outro ritual no dia em que seria comemorado o aniversário do esposo (2022), e dessa vez o ponto seria a troca da aliança que até então era mantida na mão esquerda. Alguns meses antes desse passo, Thais havia comprado uma joia, um anel duplo, com duas argolas acopladas, mas ainda não conseguia usar. No dia do aniversário, ela preparou em casa um jantar para os dois, montou a mesa, colocou a foto dele, com flores, e serviu o prato predileto de ambos. Ela comeu toda a refeição servida para os dois e, ao final, realizou a troca das alianças, em conversa íntima e emocionada com o marido.

Alguns meses depois, sentiu esvaziar a necessidade da nova aliança, guardou-a junto às outras e comprou uma série de anéis, tipo bijuteria, atravessando simbolicamente do estado civil de casada para seguir escrevendo sua história, ainda que estivesse profundamente vinculada ao esposo. A partir deste momento, sentiu que o “luto devotado” transformou-se em um luto mesclado com a busca de uma nova Thaís.

Discussão

O anúncio ou o prenuncio da morte de um ente querido marca o início de um processo de luto. Assim como um rizoma, as muitas dimensões do luto se alastram na vida do enlutado, percorrendo vários aspectos da vida individual, familiar e comunitária. Neste contexto, os indivíduos entram em contato com a própria finitude, com muitas outras perdas como, por exemplo, podemos citar: perda da parceria nas decisões e vivências cotidianas, perda de um futuro planejado juntos, do status quo, perda da vida sexual como era conhecida, mudanças no lazer, na vida econômica e na dinâmica do sistema familiar.

De acordo com Zacarias (2021), temos que, a partir de Jung (2006; 2013a), o processo de luto é uma dinâmica de adaptação, uma travessia não patológica, e é vivenciado na saúde de modo oscilatório entre o ponto de vista do ego e do ponto de vista do Self. Do ponto de vista do ego estão relacionadas as inúmeras ambivalências, desorganizações (emocional, econômica, cognitiva etc.), desorientação (no tempo e no espaço), dor psicológica, insegurança etc. A partir do ponto de vista do Self, Jung pontua que o enlutado vivencia uma experiência diferente relacionada à compreensão profunda da totalidade, gerando sentimentos de confiança, paz, alegria etc.

A sensação de estar vivendo um momento de caos e a árdua tarefa em reencontrar a ordem são constantes na clínica dos enlutados. A noção do tempo ganha formatos relativos e polarizados, e frases como as seguintes são frequentemente ouvidas, inclusive simultaneamente: “já passou um ano” versus “ainda não completou um ano”, “já faz tempo que ele se foi” versus “parece que foi ontem”, “quanta coisa aconteceu nestes meses”, “parece que sou outra pessoa depois destes meses sem ele”, dentre outras manifestações.

Nesse sentido nos aproximamos simbolicamente de dois seres divinos da Mitologia Grega: Caos e Crono. E para lidar com tudo que eles evocam muitos rituais podem ser vivenciados durante este processo, a fim de reorganizar a vida psíquica. Caos antecede Crono tendo características diferentes e trazendo sentidos díspares, mas que compõem muitas vezes o contexto do luto.

De acordo com Brandão (2016), o Caos traz a noção de “abismo insondável”, e de confu - são e estado disforme da massa, o que se assemelha ao estado de confusão relacionado ao que o Parkes (1998), importante teórico para os estudos do luto, denominou de perda do mundo presumido que foi impactado pela morte de uma pessoa afetivamente vinculada. Segundo o autor: “Caos - No princípio era o Caos. [...] Estar desorientado é entrar no Caos, de onde não se pode sair, a não ser pela intervenção de um pensamento ativo, que atua energeticamente no elemento primordial” (BRANDÃO, 2016, p.194).

Do Caos grego nasceu Geia, Tártaro e Eros. Geia1 é a Terra, uma deusa cósmica, concebida como elemento primordial cuja característica é dar suporte e gestar os seres, as fontes, os minerais e os vegetais. O Titã Crono é filho de Urano e Geia (BRANDÃO, 2016). Identificado muitas vezes como o Tempo personificado, tempo que devora, mutila, estanca a fonte da vida e, ao mesmo tempo, gera e fecunda. Crono castra o rei (Urano) e separa dele a rainha (Geia), mas, ao se apossar do governo do mundo, tornou-se pior déspota que o próprio pai. No processo de luto o tempo simbólico é atravessado por estes sentidos: tempo que devora, mutila, mas também o tempo de abertura para o novo.

De acordo com Byington (2005), os mitos são, de modo geral, compreendidos pela psicologia analítica como caminhos que simbolicamente constituem a formação da consciência coletiva. Os mitos além de “gerarem padrões de comportamento humano, para vivermos criativamente, permanecem através da história como marcos referenciais através dos quais a Consciência pode voltar às suas raízes para se revigorar” (BYINGTON, 2005, p. 9). Nesse sentido, cabe sua utilização na clínica como possíveis guias, principalmente em situações de crise como o processo de luto.

De acordo com Jung (2006), temas mitológicos e a vivência de rituais atuam como guias para lidarmos com a morte, no sentido de que oferecem recursos para a vivência da dinâmica psíquica de ressignificação e de reconstrução de uma identidade pós-perda, conforme pode ser percebido nos casos relatados. Os ritos são, assim, recursos para lidar com a ansiedade gerada pelo contato com grandes forças do inconsciente e, frente à ameaça de desordem psíquica, auxiliam o processo de renovação e transmutação.

Os rituais para os seres humanos são essenciais, pois concatenam aspectos conscientes e inconscientes, o que auxilia no desenvolvimento do indivíduo e na lida com situações de crise. De modo geral, tem-se que no transcorrer da vida humana, existem muitas fases e passar de uma para outra demanda modificações e possíveis crises. De acordo com Zimmermann (2005), são bem conhecidos alguns rituais que celebram e marcam a transição de uma fase para outra.

Consideremos, então, de maneira geral os ritos de velório. Este é um dos primeiros rituais de passagem vivenciados após a perda, caracterizado como um ritual presente em diferentes tradições e compreendido como necessário. Durante ele, pode-se dividir a perda com a comunidade a qual pertence e se inicia a atualização interna do rompimento do vínculo com a pessoa que morreu (ZACARIAS, 2021). Falamos aqui de um ritual inserido no momento inicial de Caos e que propicia contexto de expressão e validação dos afetos despertados, bem como pode favorecer o início do processo de integração da nova realidade de vida dos enlutados.

Contudo, no desastre biológico da pandemia, o impedimento ou a restrição da realização dos rituais fúnebres provocou a sensação de negligência para os enlutados. A percepção de que o ente querido não recebeu as homenagens que merecia desencadeou, pois, uma conjunção adicional de problemas à saúde mental dos enlutados (TAYLOR, 2019).

O impacto não ocorreu apenas no cenário do momento da morte e da experiência com a nova forma de velar os mortos, mas também no decorrer do processo de luto. Os enlutados também sofreram com o imperativo do isolamento social, já que o apoio do entorno afetivo do enlutado foi restrito e muitas vezes feito de modo digital via redes sociais, por aparelho telefônico etc. Nos casos de Claudio e Juliana podemos observar tanto a importância destes ritos iniciais como impactos das restrições a eles impostas.

Para Claudio, o isolamento vivido no velório do pai foi contrastante com a experiência anterior no velório da avó. Destacamos neste ponto, além da falta de suporte social, a falta de um espaço/momento de validação social para que as emoções despertadas pela morte possam ser sentidas e expressas. No velório do pai, ele refere a falta do suporte e acolhimento de familiares e amigos fora do núcleo imediato, o que possibilitaria uma maior entrega à vivência emocional do momento - Caos. No lugar disso, o rito restrito levou os irmãos e a mãe a tentarem exercer uma função de suporte uns para os outros.

Claudio - profissional de saúde, psicólogo - manifestou dificuldade de entrar em contato com os sentimentos relativos à perda, pois temia que essa expressão fosse interpretada como fraqueza. Compreendemos que não entrar em contato com tais sentimentos não é sinônimo de que não sinta a dor. É possível que ele esteja identificado com a persona do profissional de saúde associada ao arquétipo do herói - não demonstram sofrimento e escondem sua fragilidade sob a égide do herói combativo, que foi ainda mais ressaltada na pandemia.

A persona representa um aspecto da psique coletiva, correspondendo ao que o indivíduo mostra externamente e está relacionada a papéis e status social, representando um compromisso entre ele e a sociedade. Tem a função adaptativa àquilo que é coletivo. Para Jung (2014, par. 245), “[...] ela é a máscara que aparenta uma individualidade, procurando convencer os outros e a si mesma quando, na realidade, não passa de um papel no qual fala a psique coletiva”.

O par arquetípico da persona é a sombra, arquétipo que representa aspectos da personalidade que não são bem aceitos pelo indivíduo, são considerados ruins, imorais ou fora dos padrões da sociedade e que, por conseguinte, permanecem como conteúdos inconscientes que exercem influências sobre a consciência. Uma perspectiva dialética, que inclua a possibilidade de integração dos conteúdos sombrios, auxilia numa dinâmica de melhor equilíbrio com a persona. No caso de Claudio, reconhecer sua humanidade com suas “fragilidades”, sofrimentos, desalento e desamparo, evidenciados na vivência da sua orfandade, possibilitaria um afastamento dessa atitude heroica, costumeiramente atribuída ao seu status profissional.

Neste processo de integração, um dos elementos que poderia, então, ser trabalhado seria a raiva sentida por ele. Kübler-Ross (1981), Bowlby (1990), Kast (1993) e Parkes (1998) observaram a reação de raiva em diversos pacientes, dirigida a terceiros - médicos ou familiares, que não cuidaram o suficiente do paciente - a Deus, ao falecido ou raiva autodirigida. Kast (1993) reitera que a raiva e a culpa devem ser validadas, e não confrontadas, e que, ao extenso do processo de luto, um novo relacionamento com o falecido se estabelece. Claudio manifestou sua raiva dirigida ao macrossistema político no Brasil, que levou a consequências desastrosas para uma crise sanitária. Ele compreende que o fato de seu pai não ter seguido as normas de biossegurança e por ter duvidado delas - ao justificar que ele era um seguidor do então Presidente - está relacionado à raiva que ele sentia em seu processo de luto.

Em estudo sobre o luto na meia-idade, Pope (2005) ressalta que a literatura sobre a perda dos pais na vida adulta é ofuscada pela quantidade de estudos sobre luto parental, viuvez ou perda dos pais na infância. Essa constatação leva a pensar sobre as nuanças do não reconhecimento da orfandade adulta pela sociedade - que tem, consequentemente, reflexos no meio acadêmico - dado que é considerada uma transição natural da vida os pais morrerem antes dos filhos. Nesse sentido, a sociedade e o enlutado tendem a não olhar para a profundidade dessa experiência e para riqueza de significados que ela está habilitada a trazer.

Ademais, a pandemia da covid-19 provocou a morte de muitos genitores mais jovens do que seria previsto, retirando a possibilidade de envelhecerem. Nesse contexto, os filhos lamentam não poderem acompanhar e cuidar dos pais em seu envelhecimento. A sociedade enfatiza que o adulto deve concentrar suas energias para as conquistas da vida: concluir estudos, conseguir um bom trabalho e constituir sua família, permanecendo escondidas as perdas que ocorrem nessa jornada. Falta espaço na sociedade para a expressão e validação desses lutos.

As pesquisas de Rando (1993), Pope (2005) e Scoz (2012) apresentam as nuances da transição do papel de filho(a) sem atribuições de cuidado com os pais, para o de adulto cuidador, com difíceis tarefas e escolhas a serem tomadas. Juliana lamentou não ter tido a oportunidade de cuidar do pai presencialmente em seus últimos dias de vida. Por outro lado, teve de tomar a frente dos afazeres burocráticos pós-morte: viajar para Maceió para resolver questões relativas ao apartamento do pai, organizar seus objetos pessoais, dentre outros aspectos que evidenciavam a morte e estabeleciam conexão com os sentimentos relativos à perda. Embora não tivesse sido possível sua presença no velório do pai, ela se sentiu ativa nesse processo ao escolher a música a ser tocada. A chegada das cinzas a Santos possibilitaria também que ela ritualizasse à sua maneira: planejava jogá-las na Igreja de Fátima em Portugal, santa da qual seu pai era devoto.

O planejamento de uma continuidade dos ritos funerários com uma viagem futura em memória do pai, bem como o destaque dado por

Juliana à missa de sétimo dia e à de um mês como necessárias para a integração da perda, aponta, desta forma, que a função dos ritos se estende para além do momento inicial do luto. Aqui aparece a conexão com a dimensão Cronos do luto, enquanto processo que passa a acompanhar o enlutado na sequência de sua vida e articula em diferentes momentos separação, dor, criação e desenvolvimento.

A travessia do primeiro ano de luto costuma ser bastante dolorosa, contudo, é caracterizada como um período de transição, não sendo considerada patológica nem medida a partir do tempo cronológico. De acordo com a literatura, é um período carregado de dificuldades, no qual o enlutado passará por inúmeras situações sem o ente que partiu (FRANCO, 2021; AMARAL, 2022). A nova rotina, bem como a vivência das datas comemorativas - rituais familiares e sociais, como aniversários, natal, dia dos namorados, dia dos pais, dentre outros - são atravessadas pela primeira vez com a nova configuração, marcando a ausência de quem partiu.

Thaís, 15 dias após a perda do marido, deparou-se com a travessia do primeiro aniversário de casamento sem o esposo. Tomada pela esperada desorganização pós-perda e sentindo o atravessamento da violenta despedida, a paciente encontrava-se devastada. Em um contexto comparado simbolicamente ao estado de caos, buscou, a partir de recursos internos, trazer certo contorno e controle ao que estava vivenciando. De acordo com o que foi pontuado, é possível sair do “abismo insondável” - gerado pela desorganização do caos - por meio da intervenção ou mobilização de um pensamento ativo, que fizesse uma movimentação da energia psíquica sobre o elemento desorganizador. Isto é, em geral, um movimento profundamente difícil para uma pessoa enlutada recentemente. É importante pontuar que o processo de luto é individual e subjetivo, dessa forma, não existe receita e nem forma adequada de ser vivenciado. Percorrer o território da cidade, visitar a história do casal e realizar as homenagens desejadas foram atitudes que auxiliaram positivamente seu processo de luto. Além disso, a escolha simbólica do desenho que foi tatuado representa uma forma de homenagem e de imortalizar o marido, integrando-o ao próprio corpo.

No segundo exemplo, no dia em que o esposo faria aniversário, Thais seguiu produzindo seu próprio ritual, agora sentindo a necessidade de ressignificar a aliança. O ritual criado por ela pôde oferecer recursos para a reconstrução da identidade, possibilitando a renovação e marcando a transmutação da ligação simbólica com a aliança. Entretanto, o que mais chamou a atenção foi a liberdade de vivenciar o impulso criativo e a possibilidade de seguir o próprio ritmo na construção de seus rituais. O preparo da mesa, das flores, do retrato do marido, o pedido das refeições prediletas de ambos e o movimento de comê-los trouxe uma série de símbolos e atos simbólicos. De maneira geral, Thais pôde, dessa forma, integrar aspectos importantes, descobrindo-se e tendo autonomia para se recriar.

Considerações finais

A psicoterapia junguiana está voltada ao autoconhecimento e ao processo de individuação, tendo um amplo alcance de atuação, podendo ser utilizada para auxiliar pacientes que estejam em momento diversos, inclusive em situações de crise como a vivência de um luto. A interação acolhedora e continente, bem como a compreensão profunda e simbólica dos processos psíquicos, pode auxiliar na reconstrução de uma nova identidade após a perda por morte.

O atendimento clínico com pessoas enlutadas é permeado por estas questões, que, em muitos momentos, são relacionadas ao tempo (simbólico e literal) e aos marcos importantes como certas datas comemorativas. Neste contexto, os rituais desempenham um enorme papel, propiciando vivências simbólicas que auxiliam na integração da realidade da perda. Estes podem tanto ser rituais da tradição à qual pertencem os sujeitos, como novos ritos desenvolvidos pelo próprio enlutado. Em ambos os casos é fundamental que sejam vividos de forma integral, e não apenas como tarefa social ou como racionalização.

Nesse sentido, o luto é um tema com grande relevância para o cuidado em saúde mental, porém segue ainda com lacunas importantes. Faz-se necessária, assim, a ampliação de pesquisas e estudos, tanto para a compreensão do fenômeno em si quanto para a construção de manejos cada vez mais adequados.

1 Brandão (2016) pontua que como Geia é considerada a guardiã das sementes e da matriz da vida, “em todas as culturas sempre houve ‘enterros’ simbólicos, análogos às imersões batismais, seja com a finalidade de fortalecer as energias ou curar, seja como rito de iniciação. De toda forma, esse regressus ad uterum, essa descida ao útero da terra, tem sempre o mesmo significado religioso: a regeneração pelo contato com as energias telúricas; morrer para uma forma de vida, a fim de renascer para uma vida nova e fecunda” (p. 195).

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Recebido: 05 de Agosto de 2023; Aceito: 11 de Novembro de 2023

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