Serviços Personalizados
Journal
artigo
Indicadores
Compartilhar
Revista Psicopedagogia
versão impressa ISSN 0103-8486
Rev. psicopedag. vol.26 no.80 São Paulo 2009
ARTIGO ORIGINAL
Desempenho de escolares com dificuldades de aprendizagem em um programa de intervenção com a consciência fonológica
Performance of students with learning difficulties in a phonological awareness intervention program
Ana Paula de Castro SilvaI; Simone Aparecida CapelliniII
IMestranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - FFC/UNESP-Marília-SP. Bolsista do CNPq
IIDocente do Departamento de Fonoaudiologia e Programa de Pós-Graduação em Educação da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista- FFC/UNESP-Marília-SP
RESUMO
O entendimento da estrutura da língua auxilia no desenvolvimento da alfabetização, e o ensino sistemático e explícito do funcionamento desta estrutura pode contribuir para que os escolares com dificuldades de aprendizagem as superem. Este estudo teve por objetivo verificar a eficácia de um programa de intervenção com a consciência fonológica. Participaram desta pesquisa 14 escolares de 30 ano do ensino básico de escola pública do interior de São Paulo, de ambos os gêneros, na faixa etária de 8 a 10 anos, sendo distribuídos em grupo experimental e controle. Em situação de pré e pós testagem, todos os escolares foram submetidos às provas do teste CONFIAS e realizaram a escrita espontânea de textos. Após a pré-testagem, somente o grupo experimental foi submetido ao programa de remediação fonológica. Os resultados apontaram que, após a intervenção, o grupo experimental apresentou diferença estatisticamente significante para as tarefas referentes à consciência de fonemas (segmentação e transposição) e que houve melhora na compreensão do código alfabético, evidenciada pelo aumento do número de palavras escritas. O programa de intervenção com a consciência fonológica favoreceu a percepção fonêmica e o entendimento do princípio alfabético de escrita do português.
Unitermos: Transtornos de aprendizagem. Aprendizagem. Transtornos da linguagem.
SUMMARY
The understanding of the language structure help to developing literacy and the explicit and systematic instruction about the functioning of this structure may help the students with learning disabilities to overcome their initial difficulties. This study aimed at verifying the effectiveness of a program of phonological awareness intervention. Fourteen students of both the genders, in the aged between 8 and 10 years old from 3rd grade of basic education in the city participated, distributed in experimental and control group. The tests of CONFIAS were applied in pre-test, and post-test situation in all children and the written expression was assessed asking the students to producing a written composition. After the pre-test only the experimental group was submitted to the program of phonological awareness intervention. The results pointed that after the intervention the experimental group presented significant statistical difference for tasks of phonemic awareness (sound blending and sound segmentation) and improvements in the understanding of alphabetic principle, demonstrated by the increase of the number of the writing words. The program of phonological awareness intervention favored phonemic perception and understanding of alphabetic basis of the Portuguese writing system.
Key Words: Learning disorders. Learning. Language disorders.
INTRODUÇÃO
Em nosso país, é crescente o número de crianças que apresentam dificuldade no aprendizado da leitura e escrita e que permanecem em sala de aula sem acompanhar essas atividades. Uma das possíveis causas desses problemas de aprendizagem é o fato de nosso sistema educacional não utilizar metodologias que enfatizem o ensino do princípio alfabético de nossa língua1.
A língua portuguesa apresenta escrita alfabética essencialmente fonêmica, baseada na relação entre grafemas e fonemas, e a descoberta desta relação só é alcançada mediante o acesso à consciência fonológica2. A literatura3-6 sugere um trabalho em sala de aula com atividades que aprimorem e desenvolvam as capacidades metafonológicas em crianças que estão em processo de aquisição da escrita, pois a leitura e a escrita iniciais estão baseadas na conversão fonema/grafema e na reflexão sobre os sons e sua representação na escrita2,3,8-10.
A aprendizagem do sistema alfabético da leitura e da escrita de nossa língua pressupõe a capacidade de reconhecer, decompor, compor e manipular os sons da fala, capacidades essas que correspondem à consciência fonológica3. A consciência fonológica é uma competência metalinguística que possibilita o acesso consciente ao nível fonológico da fala e a manipulação cognitiva das representações a este nível e é necessária tanto para a aprendizagem da leitura e escrita como sua consequência4. Portanto, o entendimento da estrutura da língua auxilia no desenvolvimento da alfabetização e o ensino sistemático e explícito do funcionamento desta estrutura pode contribuir para que crianças de risco para os transtornos de aprendizagem superem suas dificuldades iniciais11-17.
Pesquisas atuais evidenciam que a consciência fonológica e a aquisição da escrita se influenciam de forma mútua, sendo que a estimulação da consciência fonológica facilita o processo de aquisição da linguagem escrita13-18. No entanto, a consciência fonológica não constitui um fator determinante na aquisição de regras ortográficas, que, em última análise, dependem da utilização de critérios gramaticais, mas está relacionada à aquisição de regras ortográficas de outra natureza, isto é, aquelas que dependem de uma análise mais minuciosa do contexto grafofônico da palavra, a fim de verificar qual a grafia que se aplica a uma determinada situação19.
No Brasil, ainda são restritas as iniciativas educacionais que valorizam o uso de estratégias fonológicas como meio de intervenção para minimizar o impacto das dificuldades de aprendizagem da leitura e da escrita. Porém, as iniciativas para detectar quais habilidades ou estratégias fonológicas encontram-se alteradas já são realidade no contexto educacional. Isso pode ser observado pela quantidade de procedimentos de avaliação disponíveis para a verificação do desempenho dos escolares em tais habilidades7,20-22.
Entre esses procedimentos, destaca-se o Teste Consciência Fonológica: instrumento de avaliação sequencial - CONFIAS7; que é amplamente utilizado no contexto clínico, porém sua utilização como um instrumento de intervenção conforme sugerido pelas autoras ainda é restrito.
Neste estudo será descrita a aplicação de um programa de intervenção baseado nas atividades de avaliação do instrumento CONFIAS em escolares com dificuldades de aprendizagem de uma escola pública do interior de São Paulo, tendo como objetivo verificar a eficácia de um programa de intervenção fonológica em escolares com dificuldades de aprendizagem.
MÉTODO
Participaram deste estudo, 14 escolares com idade entre oito e 10 anos, que frequentavam quatro salas do terceiro ano do ensino básico (segunda série do ensino fundamental) de uma escola pública situada na periferia da cidade de Orlândia-SP.
Os escolares foram divididos em dois grupos, a saber:
- Grupo Experimental (GE): composto por sete escolares, sendo cinco do gênero feminino e dois do gênero masculino, com dificuldades de aprendizagem, que foram submetidos ao programa de intervenção;
- Grupo Controle (GC): composto por sete escolares, sendo um do gênero feminino e seis do gênero masculino, sem dificuldade de aprendizagem, que não foram submetidos ao programa.
A indicação dos escolares com e sem dificuldade de aprendizagem foi realizada pelas professoras da escola em que o estudo foi realizado, a partir das informações contidas no prontuário escolar, no relatório de desempenho dos alunos nos dois primeiros bimestres do ano letivo e por meio da observação dos critérios de inclusão e exclusão. Foram utilizados como critérios de inclusão: assinatura pelos pais do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, ausência de histórico familiar de Dislexia do Desenvolvimento ou Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), ausência de diagnóstico de deficiência auditiva, visual, motora ou cognitiva descritas em prontuário escolar. Como critérios de exclusão, foram utilizados: ausência de assinatura pelos pais do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, histórico familiar de Dislexia do Desenvolvimento ou TDAH, diagnóstico de deficiência auditiva, visual, motora ou cognitiva descritas em prontuário escolar.
Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista - CEP/FFC/UNESP, sob o protocolo número 2576/2007.
Procedimento
Para a realização deste estudo, foram utilizados os seguintes procedimentos em situação de pré-testagem:
A) Termo de Consentimento Pós-Infor-mado: Conforme a Resolução do Conselho Nacional de Saúde CNS 196/96, anteriormente ao início das avaliações, os pais ou responsáveis dos escolares selecionados assinaram o termo de Consentimento Pós-informado para autorização da realização do estudo.
B) Teste de Consciência Fonológica: Instrumento de Avaliação Sequencial- CONFIAS7. Este teste foi aplicado em todos os escolares deste estudo de forma individual. O teste é formado por duas partes, sendo a primeira correspondente à consciência silábica, composta por nove itens: síntese, segmentação, identificação, produção, exclusão e transposição silábica. A segunda parte corresponde à consciência dos fonemas, composta por sete itens: produção de palavra que inicia com o som dado, identificação de fonema inicial, identificação de fonema final, exclusão, síntese, segmentação e transposição. A pontuação da prova foi realizada em protocolo específico. Cada resposta correta da criança equivale a um ponto e cada incorreta, zero, sendo setenta o número total de acertos possíveis (tarefas silábicas = 40 pontos e tarefas fonêmicas =30 pontos).
C) Avaliação de escrita: A escrita dos escolares foi avaliada por meio da elaboração de redação temática. As hipóteses de escrita foram classificadas de acordo com as hipóteses propostas por Ferreiro e Teberosky23.
Programa de Intervenção
Após a realização da pré-testagem, os escolares com dificuldades de aprendizagem foram submetidos ao programa de intervenção. A intervenção foi realizada na própria escola, durante o período de aula. Cada escolar, participava de duas sessões de intervenção por semana, com duração de 15 minutos cada. O instrumento CONFIAS foi adaptado para que tivesse 12 sessões cumulativas de intervenção que abrangessem todos os níveis de consciência fonológica. O programa foi dividido em duas etapas: na primeira, foram trabalhadas as habilidades referentes à consciência da sílaba (identificação de sílaba inicial, identificação de rima, produção de palavra com sílaba dada, identificação de sílaba medial, produção de rima, exclusão e transposição) e na segunda, foram trabalhadas habilidades referentes à consciência do fonema (produção de palavra que inicia com o som dado, identificação de fonema inicial, identificação de fonema final, exclusão, síntese, segmentação e transposição). Foi iniciado o programa trabalhando a atividade número um e a cada sessão foi acrescentada uma nova tarefa até que tivessem sido trabalhadas todas as habilidades referentes à consciência de sílabas e fonemas. As palavras de estímulos utilizadas no programa de intervenção foram extraídas de listas de palavras e pseudopalavras24. O programa de intervenção aplicado neste estudo encontra-se descrito a seguir:
a) Consciência de sílaba
1) Identificação de sílaba inicial: foi apresentado um desenho e solicitado aos escolares a nomeação deste. Em seguida, foram apresentadas quatro palavras auditivamente e solicitado que os escolares dissessem qual palavra iniciava com a mesma sílaba da palavra representada pelo desenho apresentado. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e quatro desenhos.
2) Identificação de rima: foi apresentado um desenho e solicitado aos escolares a nomeação deste. Em seguida, foram apresentadas quatro palavras auditivamente e solicitado que os escolares dissessem qual palavra terminava (ou rimava) com o mesmo som da palavra representada pelo desenho apresentado. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e quatro desenhos.
3) Produção de palavra com sílaba dada: foi apresentada auditivamente uma sílaba e solicitado aos escolares que dissessem uma palavra que iniciasse com esta mesma sílaba. Caso os escolares não conseguissem evocar a sílaba medial, eram fornecidos exemplos. Em cada sessão foram fornecidas três sílabas.
4) Identificação de sílaba medial: foi apresentado um desenho e solicitado aos escolares a nomeação deste. Em seguida, era solicitada a identificação da sílaba medial da palavra. Após a evocação da sílaba pelos escolares, eram apresentadas quatro palavras auditivamente e solicitado que os escolares dissessem qual delas apresentava a mesma sílaba medial da palavra representada pelo desenho apresentado. Caso os escolares não conse-guissem evocar a sílaba medial, eram fornecidos exemplos.
5) Produção de rima: foi apresentado um desenho e solicitado aos escolares a nomeação deste. Em seguida, foi solicitado que os escolares dissessem outra palavra que rimasse com a palavra representada pelo desenho. Após a produção da rima, eram apresentadas quatro palavras auditivamente, uma por vez, e solicitado aos escolares que dissessem uma palavra que rimasse com a palavra fornecida.
6) Exclusão: foi apresentada auditivamente uma palavra e fichas em papel cartão correspondentes ao número de sílabas desta palavra e solicitado aos escolares que dissessem qual palavra resultaria da retirada da sílaba inicial, medial ou final da palavra apresentada. Em cada sessão foram fornecidas quatro palavras.
7) Transposição: foi solicitado aos escolares que repetissem cada palavra em ordem inversa à forma apresentada pela pesquisadora. Para auxiliar na compreensão da tarefa, foram fornecidas fichas correspondentes ao número de sílabas de cada palavra. Em cada sessão foram fornecidas quatro palavras.
b) Consciência de Fonemas
1) Produção de palavra que inicia com som dado: foi apresentado auditivamente um fonema e solicitado que os escolares mencionassem uma palavra que começasse com este som. Caso os escolares não conseguissem evocar uma palavra que iniciasse com o fonema solicitado, eram fornecidos exemplos. Em cada sessão foram fornecidos três fonemas.
2) Identificação de fonema inicial: foi apresentado um desenho e solicitado aos escolares a nomeação deste. Em seguida, foram apresentadas oralmente três palavras e questionado qual delas começava com o mesmo som da palavra representada no desenho. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e quatro desenhos.
3) Identificação de fonema final: foi apresentado um desenho e solicitado aos escolares a nomeação deste. Em seguida, foram apresentadas oralmente três palavras e questionado qual delas terminava com o mesmo som da palavra representada no desenho. Em cada sessão foram fornecidas 12 palavras e quatro desenhos.
4) Exclusão: foi solicitado aos escolares que dissessem qual palavra resultaria da retirada do fonema inicial, medial ou final da palavra apresentada. Em cada sessão foram fornecidas três palavras.
5) Síntese: foi apresentada uma palavra auditivamente separada por sons e os escolares deveriam reconhecê-la. Em cada sessão foram fornecidas quatro palavras.
6) Segmentação: foi apresentada aos escolares uma palavra oralmente e solicitado que dissessem todos os fonemas desta. Nesta fase do programa, foram utilizadas fichas coloridas para auxiliar os escolares a segmentar os sons das palavras auditi-va-mente apresentadas. Em cada sessão foram fornecidas quatro palavras.
7) Transposição: foi apresentada aos escolares uma palavra oralmente com os fonemas na ordem inversa e solicitado aos escolares que invertessem (com a ajuda das fichas) os fonemas e dissessem a palavra-alvo. Em cada sessão foram fornecidas quatro palavras.
Após a aplicação do programa de intervenção, todos os escolares do GE e GC foram submetidos à reaplicação do Teste de Consciência Fonológica: Instrumento de Avaliação Sequencial- CONFIAS7 e elaboração de escrita espontânea.
Análise Estatística
O nível de significância de 5% (0,050) foi adotado para a aplicação do teste estatístico de Mann-Whitney, a fim de verificar possíveis diferenças entre os dois grupos estudados nas habilidades silábicas, fonêmicas e de escrita do CONFIAS, nos dois momentos da observação, e dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, com o objetivo de verificar possíveis diferenças entre ambos os momentos de observação para cada grupo estudado. O programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences) foi utilizado em sua versão 13.0 para a análise dos resultados.
RESULTADOS
Na Tabela 1, encontram-se a descrição da média, desvio padrão e valor de p da comparação do desempenho em habilidade silábica entre o GE e o GC em situação de pré e pós-testagem.
Com a aplicação do Teste de Mann-Whitney, foi observado que a média de acertos dos dois grupos tanto na pré quanto na pós-testagem das habilidades silábicas de síntese e segmentação (S1 e S2), identificação (S3, S4), produção (S5) e transposição (S9) foi próxima, sendo a diferença considerada estatisticamente não significante (Tabela 1). Houve diferença estatisticamente significante entre os dois grupos para S6 (identificação) na pós-testagem, tendo o GC obtido maior média de acertos para S7 (produção), houve diferença estatisticamente significante tanto na pré quanto na pós-testagem, tendo o GC obtido maior média de acertos, para S8 (exclusão), houve diferença estatisticamente significante apenas na pré-testagem, tendo o GC obtido maior média de acertos nos dois momentos da observação.
Na Tabela 2, encontram-se a descrição da média, desvio padrão e valor de p da comparação do desempenho em habilidade fonêmica entre o GE e o GC em situação de pré e pós-testagem.
Foi observada, com a aplicação do Teste de Mann-Whitney, diferença estatisticamente significante entre o desempenho de GE e GC na pós-testagem para F2 (identificação de fonema inicial), na pré-testagem para F4 (exclusão), F6 (segmentação) e F7 (transposição), tendo o GC obtido maior média de acertos. Nas demais provas, o desempenho dos grupos foi próximo, sendo a diferença considerada estatisticamente não significante.
Na Tabela 3, encontram-se os resultados da aplicação do Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, tendo o objetivo de verificar possíveis diferenças entre ambos os momentos de observação para cada grupo estudado.
Em relação ao GE, observou-se diferença estatisticamente significante apenas para as tarefas referentes à consciência de fonemas: segmentação F6 e transposição F7. Já para o GC, não houve diferença estatisticamente significante entre a pré e a pós-testagem para nenhuma tarefa tanto silábica quanto fonêmica.
Nas Tabelas 4 e 5, encontram-se a descrição da média, desvio padrão e valor de p da comparação do número de erros na escrita do GE e GC em situação de pré e pós-testagem.
Observa-se, na Tabela 5, diferença estatisticamente significante entre os dois grupos tanto na pré quanto na pós-testagem, tendo o GE apresentado maior média de erros.
Com o teste de Mann-Whitney, verificou-se, na Tabela 4, que ocorreu diferença estatisticamente significante entre os dois grupos, tanto na pré quanto na pós-testagem, tendo o GE apresentado maior média de erros. Na Tabela 5, com a aplicação do Teste dos Postos Sinalizados de Wilcoxon, verificou-se que, em relação ao GE, houve aumento do número de erros na escrita, mas a diferença entre a pré e a pós-testagem não foi estatisticamente significante. Para o GC, houve diminuição da média de erros na escrita entre a pré e a pós-testagem, porém esta diferença não foi estatisticamente significante.
Quanto à avaliação da escrita, todos os escolares apresentaram nível alfabético tanto em situação de pré como pós-testagem, não evidenciando diferença estatisticamente significante. Apesar de não ter ocorrido diferença estatisticamente significante, ressalta-se que a análise qualitativa da produção de escrita dos escolares com dificuldades de aprendizagem deste estudo revelou que ocorreu aumento significativo no número de palavras escritas e melhora na estrutura textual em 100% dos escolares, como pode ser observado na Figura 1.
DISCUSSÃO
Em relação à consciência da sílaba, os resultados deste estudo foram semelhantes aos encontrados em um estudo25 com crianças brasileiras que frequentavam a 1ª série, que, apesar de expostas ao ensino formal da leitura e escrita durante um semestre, não foram bem sucedidas na alfabetização. Estas crianças foram submetidas a um programa de terapia em Consciência Fonológica associada ao ensino explícito da relação letra-som, não havendo diferença estatisticamente significante entre o grupo experimental e o controle (crianças da 1ª série alfabetizadas) entre a pré e a pós-testagem para síntese, segmentação e identificação de rima. Porém, no estudo de Paula et al.25; houve diferença estatisticamente significante entre o grupo experimental e o de crianças alfabetizadas entre a pré e a pós-testagem quanto à identificação de sílaba inicial, o que não ocorreu em nossos resultados.
Os resultados deste estudo em relação à comparação dos resultados do GE e GC para consciência de fonemas diferem dos encontrados por Paula et al.25; que observaram que o grupo de crianças alfabetizadas demonstrou vantagem altamente significante em relação ao GE, tanto na pré quanto na pós-testagem, em relação à síntese fonêmica. Em relação à transposição, não houve diferença entre os dois grupos apenas na pós-testagem. Neste estudo houve diferença estatisticamente significante entre a pré e a pós- testagem para identificação, exclusão, segmentação e transposição, tendo o GC obtido maior média de acertos.
A comparação do desempenho do GE nos dois momentos da observação revelou resultados que diferem de um estudo26 que analisou a evolução da consciência fonológica em alunos da 1ª e 2ª série após a aplicação de um programa de estimulação fonológica, pois foi observada uma diferença proporcional entre a avaliação inicial e final das tarefas de rima, aliteração, segmentação fonêmica, deleção e identificação, o que não ocorreu em nossos resultados.
Quanto ao número de erros da escrita, os resultados deste estudo corroboram uma pesquisa27 que comparou o aspecto ortográfico da escrita de crianças com desempenho inferior em escrita e crianças com desempenho satisfatório que cursavam a 2ª série de uma escola pública no interior de São Paulo. Nesta pesquisa, as crianças com desempenho inferior em escrita cometeram significativamente mais erros ortográficos que o grupo com desempenho satisfatório, o que também foi observado neste estudo. Estes resultados corroboram a literatura8; que aponta forte correlação entre consciência fonológica e conhecimento da relação letra-som durante os estágios iniciais do aprendizado da leitura e escrita.
Neste estudo, os escolares de ambos os grupos frequentavam a 2ª série, momento em que o ensino da ortografia ainda não é enfatizado, com nível alfabético de escrita e, portanto, já haviam sido alfabetizados. Após a intervenção, somente o GE apresentou diferença estatisticamente significante para segmentação e transposição de fonemas, não havendo diferença para as habilidades de consciência silábica. Houve aumento do número de palavras escritas, embora com erros ortográficos, de-monstrando que os escolares do GE apresentavam falhas no mecanismo de conversão letra-som e a intervenção em consciência fonológica contribuiu para a aquisição de regras ortográficas que envolviam apenas uma análise do contexto grafofônico das palavras. Esses resultados corroboram a teoria de que os erros ortográficos fazem parte do processo de aquisição e desenvolvimento da escrita27 e a consciência fonológica capacita as crianças em fase de aquisição da escrita a fazer melhor utilização das pistas grafêmicas, compreendendo, graças à metafonologia, a relação grafema-fonema2,28,29 e o entendimento desta relação juntamente com o desenvolvimento da consciência fonológica é que propicia a aquisição do princípio alfabético e, poste-riormente, das regras ortográficas29,30.
CONCLUSÃO
O programa de intervenção em consciência fonológica foi eficaz para melhora da consciência fonêmica e compreensão do código alfabético. Portanto, conclui-se que o programa de intervenção fonológica baseado no CONFIAS pode ser utilizado em crianças que, embora alfabetizadas, ainda apresentam elevada quantidade de erros na escrita devido à não-aquisição de regras ortográficas que envolvem a análise do contexto grafofônico das palavras.
REFERÊNCIAS
1. Capellini SA. Distúrbios de aprendizagem versus dislexia. In: Ferreira LP, Befi-Lopes D, Limongi SCO, eds. Tratado de fonoaudiologia. São Paulo:Roca;2004. p.862-76. [ Links ]
2. Freitas GCM. Sobre a consciência fonológica. In: Lamprecht RR, eds. Aquisição fonológica do português: perfil de desenvolvimento e subsídios para terapia. Porto Alegre:Artmed;2004. p.179-92. [ Links ]
3. Berninger VW, Nielsen KH, Abbott RD, Wijsman E, Raskind W. Writing problems in developmental dyslexia: Under-recognized and under-treated. J Sch Psychol. 2008;46:1-21. [ Links ]
4. Pestun MSV. Consciência fonológica no início da escolarização e o desempenho ulterior em leitura e escrita: estudo correlacional. Est Psicol. 2005;10(3):407-12. [ Links ]
5. Bernardino Júnior JA, Freitas FR, Souza DG, Maranhe EA, Bandini HHM. Aquisição de leitura e escrita como resultado do ensino de habilidades de consciência fonológica. Rev Bras Educ Espec. 2006;12(3):423-50. [ Links ]
6. Musti-Rao S, Cartledge G. Effects of a supplemental early reading intervention with at-risk urban learners. Top Early Child Spec Educ. 2007;27(2):70-85. [ Links ]
7. Moojen S, Lamprecht R, Santos RM, Freitas GM, Brodacz R, Siqueira M, et al. Consciência fonológica: instrumento de avaliação sequencial. São Paulo:Casa do Psicólogo;2003. [ Links ]
8. Castles A, Coltheart M, Wilson K, Valpied J, Wedgwood J. The genesis of reading ability: what helps children learn letter-sound correspondences? J Exp Child Psychol. 2009;104(1):68-88. [ Links ]
9. Leppanen U, Kaisa A, Pekka N, Jari-Erik N. Letter knowledge predicts grade 4 reading fluency and reading comprehension. Learn Instr. 2008;18:548-64. [ Links ]
10. Roman AA, Kirby JR, Parrila RK, Wade-Woolley L, Deacon SH. Toward a comprehensive view of the skills involved in word reading in grades 4, 6, and 8. J Exp Child Psychol. 2009;102:96-113. [ Links ]
11. Santos MTM, Navas ALGP. Linguagem escrita: aquisição e desenvolvimento. In: Ferreira LP, Befi-Lopes D, Limongi SCO, eds. Tratado de fonoaudiologia. São Paulo:Roca;2004. p.825-45. [ Links ]
12. Reschly DJ. Learning disabilities identification: primary intervention, secundary intervention and then what? J Learn Disabilit. 2005;38(6):510-5. [ Links ]
13. O'Connor RE, Harty KR, Fulmer D. Tiers of intervention in kindergarten through third grade. J Learn Disabilit. 2005;38(6): 532-8. [ Links ]
14. Elbro C, Petersen DK. Long-term effects of phoneme awareness and letter sound training: an intervention study with children at risk for dyslexia. J Educ Psychol. 2004;96(4):660-70. [ Links ]
15. Blachman BA, Fletcher JM, Clonan SM, Shatschneider C, Francis DJ, Shaywits BA, et al. E. Effects of intensive reading remediation for second and third graders and a 1-year follow-up. J Educ Psychol. 2004;96(3):444-61. [ Links ]
16. Wanzek J, Vaughn S. Response to varying amounts of time in reading intervention for students with low response to intervention. J Learn Disabilit. 2008;41(2):126-42. [ Links ]
17. Savage RS, Frederickson N. Beyond phonology: what else is needed to describe the problems of below-average readers and spellers? J Learn Disabilit. 2006;39(5):399-413. [ Links ]
18. Hay I, Elias G, Fielding-Barnsley R, Homel R, Freiberg K. Language delays, reading delays and learning difficulties: interactive elements requiring multidimensional programming. J Learn Disabilit. 2007;40(5):400-9. [ Links ]
19. Hayard D, Das JP, Janzen T. Innovative programs for improvement in reading through cognitive enhancement: a remediation study of Canadian first nations children. J Learn Disabilit. 2007;40(5):443-57. [ Links ]
20. Justice L. Evidence-based practice, response to intervention, and the prevention of reading difficulties. Lang Speech Hear Serv Sch. 2006;37:284-97. [ Links ]
21. Cunha VLO, Capellini SA. Desempenho de escolares de 1ª a 4ª série do ensino fundamental nas provas de habilidades metafonológicas e de leitura - PROHMELE. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2009;14(1):56-68. [ Links ]
22. Carvalho IA, Alvarez Amma, Caetano AL. Perfil de habilidades fonológicas. 1ª ed. São Paulo:Via Lettera;1998. [ Links ]
23. Ferreiro E, Teberosky A. A psicogênese da língua escrita. Porto Alegre:Artes Médicas;1986. [ Links ]
24. Pinheiro AMV. Leitura e escrita: uma abordagem cognitiva. Campinas:Editorial Psy;1994. [ Links ]
25. Paula GR, Mota HB, Keske-Soares M. A terapia em consciência fonológica no processo de alfabetização. Pro-Fono Rev Atual Cient. 2005;17(2):175-84. [ Links ]
26. Cárnio MS, Santos D. Evolução da consciência fonológica em alunos de ensino fundamental. Pro-Fono Rev Atual Cient. 2005;17(2):195-200. [ Links ]
27. Zuanetti PA, Corrêa-Schnek AP, Manfredi AKS. Comparação dos erros ortográficos de alunos com desempenho inferior em escrita e alunos com desempenho médio nesta habilidade. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2008;13(3):240-5. [ Links ]
28. Salles JF, Parente MAMP. Funções neuropsicológicas em crianças com dificuldades de leitura e escrita. Psic Teor Pesq. 2006;22(2):153-62. [ Links ]
29. Devonshire V, Fluck M. Spelling development: fine-tuning strategy-use and capitalising on the connections between words. Learn Instr. 2009 (no prelo). [ Links ]
30. Kandel S, Hérault L, Grosjacques G, Lambert E, Fayol M. Orthographic vs. phonologic syllables in handwriting production. Cognition. 2009;110:440-4. [ Links ]
Correspondência:
Ana Paula de Castro Silva
Rua São Luiz, 519 - apto 42 - Centro - Marília
CEP 17500-005- SP
E-mail: anacas31@yahoo.com.br
Artigo recebido: 18/1/2009
Aprovado: 11/5/2009
Trabalho realizada na Faculdade de Filosofia e Ciências da Universidade Estadual Paulista, Marília, SP.