Services on Demand
article
Indicators
Share
Revista Psicopedagogia
Print version ISSN 0103-8486
Rev. psicopedag. vol.38 no.115 São Paulo Apr. 2021
https://doi.org/10.51207/2179-4057.20210008
ARTIGO DE REVISÃO
Revisão integrativa sobre métodos e estratégias para promoção de habilidades socioemocionais
Integrative review on methods and strategies to promote socio-emotional skills
Patricia Vieira de OliveiraI; Mauro MuszkatII
IDoutoranda em Educação e Saúde na Infância e Adolescência - Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil
IIDocente do Programa de Pós-Graduação em Educação e Saúde na Infância e Adolescência - Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil
RESUMO
Competências socioemocionais são um conjunto de habilidades fundamentais para o desenvolvimento integral dos indivíduos, bem como para seu sucesso nas interações sociais. Estudos longitudinais apontam o impacto dessas habilidades em relação à saúde mental e física, aprendizagem, relações afetivas e profissionais. Neste sentido, pesquisas recentes têm alertado para a importância de promover tais habilidades a partir da primeira infância. Sendo assim, o presente estudo teve como objetivo realizar uma revisão de literatura no recorte de 2008-2019, em busca de estudos que apresentem métodos e estratégias para a promoção de habilidades socioemocionais na infância e na adolescência. Foram utilizadas as bases de dados SciELO, LILACS e PePSIC. Após empregados os critérios de elegibilidade, oito estudos entraram para a revisão. Em todos os estudos, os resultados do pós-teste indicaram diminuição de comportamentos antissociais e aumento de comportamentos pró-sociais. Contudo, foi possível observar que ainda são poucas as pesquisas que visam a investigar a eficácia de programas e estratégias de intervenção e promoção de competências socioemocionais.
Unitermos: Socioemocional. Inteligência Emocional. Intervenção. Interação Social.
SUMMARY
Socio-emotional competencies are a set of skills fundamental to the integral development of individuals, as well as to their success in social interactions. Longitudinal studies point out the impact of these skills in relation to mental and physical health, learning, affective and professional relationships. In this sense, recent research has warned of the importance of promoting such skills from early childhood. Thus, the present study aimed to carry out a review of the literature in the 2008-2019 study, in search of studies that present methods and strategies to promote socioemotional skills in childhood and adolescence. The SciELO, LILACS, and PePSIC databases were used. After employing the eligibility criteria 8 studies entered for review. In all studies, post-test results indicated a decrease in antisocial behaviors and increased pro-social behaviors. However, it was possible to observe that there are still few researches that aim to investigate the effectiveness of intervention programs and strategies and the promotion of socio-emotional competences.
Keywords: Social Competence. Emotional Intelligence. Intervention. Social Interaction.
INTRODUÇÃO
É chamado de competências socioemocionais um conjunto de habilidades fundamentais para o desenvolvimento global dos indivíduos que envolve aspectos socioafetivos, emocionais, comportamentais e morais1. É por meio desse conjunto de competências que os indivíduos conseguem modular o seu comportamento, dando respostas mais adequadas durante as relações sociais comuns do cotidiano, sejam elas familiares, sejam escolares, ou em qualquer outro núcleo social que esteja inserido. Essas competências também auxiliam a formular objetivos de vida e traçar planos para alcançá-los.
Trata-se de um grupo de habilidades que pode, para fim de clareza, ser dividido em três categorias: a cognitiva, a emocional/afetiva e a comportamental. Na categoria cognitiva, é possível incluir a habilidade de resolução de problemas intra e interpessoais, metacognição, que é a capacidade de refletir sobre seus próprios pensamentos, como a flexibilidade cognitiva para administração de conflitos e gerenciamento de objetivos de vida; e, por fim, a cognição social, quando o indivíduo compreende a si mesmo como diferente do outro, ou seja, entende que as outras pessoas possuem seus próprios desejos, crenças e intenções e, a partir disso, torna-se capaz de constatar, compreender e interpretar emoções e situações sociais2,3 .
As habilidades da categoria emocional/afetiva estão relacionadas à competência em trabalhar suas próprias emoções, isto é, reconhecer os seus estados emocionais, saber nomeá-los corretamente e defini-los de acordo com aquilo que está sentindo, autorregular suas emoções negativas e seus impulsos. A empatia é quando o indivíduo consegue, além de reconhecer e compreender o que o outro está sentindo, ser solidário ao seu sentimento e projetar em si mesmo um sentimento semelhante, colocando-se no lugar da outra pessoa e dando uma resposta emocional condizente com a situação4. Entra aqui também a autoestima, habilidade que está relacionada ao julgamento de si mesmo, à percepção e reconhecimento de suas principais características.
Já na categoria comportamental estão os comportamentos pró-sociais, que são aqueles voltados aos outros indivíduos, a agir de forma cooperativa, ajudar, confortar, compartilhar, entre outros5. Essas seriam respostas comportamentais das dimensões cognitivas e emocional/afetiva.
Vale mencionar que essas habilidades são algumas das citadas na literatura como pertencentes ao grupo das competências socioemocionais. No entanto, não há uma "lista" com todas essas habilidades, elas são descritas por organizações, instituições e pesquisadores do mundo todo com diversas terminologias diferentes. Para maior revisão sobre as habilidades que compõem as competências socioemocionais, ver: "Global Education Leaders' Program Brasil. Questões conceituais e práticas."6 e "Desenvolvimento socioemocional e aprendizado escolar: uma proposta de mensuração para apoiar políticas públicas"7.
De acordo com dados apresentados pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)1, oriundos de estudos longitudinais, boas competências socioemocionais podem influenciar e impactar de forma positiva várias esferas da vida do indivíduo. Dentre elas, melhor saúde mental e física, incluindo menores índices de depressão e obesidade, diminuição da prática de bullying, maior aproveitamento do Ensino Superior e, consequentemente, melhor colocação no mercado de trabalho, refletindo em salários mais altos. Além disso, o documento aponta que crianças de classes econômicas mais baixas são muito favorecidas com práticas de promoção dessas habilidades e apresentam resultados duradouros.
Neste sentido, nos últimos anos, é crescente o número de pesquisas que buscam investigar o desenvolvimento dessas habilidades, bem como formas para avaliá-las e promovê-las, especialmente na primeira infância, visto que se trata de um período crucial do desenvolvimento cognitivo, emocional, social, moral e afetivo de uma criança. Outra linha de pesquisa referente às competências socioemocionais é no contexto escolar, uma vez que impactam diretamente tanto no desempenho dos alunos quanto nas relações interpessoais dentro da escola7-12.
As investigações sobre a importância da promoção das competências socioemocionais na infância e no contexto escolar têm crescido muito nos últimos 20 anos. O Instituto Ayrton Senna (IAS)13, a UNESCO, a OCDE1, o Centro para Pesquisa e Inovação Educacional (CERI, sigla em inglês)5, entre outras entidades, vêm se debruçando sobre o tema com o intuito de avaliar os impactos que essas competências, quando bem estimuladas, promovem na vida das crianças, tanto em perspectiva transversal quanto longitudinal. Também visam à implementação de programas para promoção de competências socioemocionais em termos de políticas públicas no Brasil1,7,13.
É possível perceber que as competências socioemocionais influenciam questões referentes à saúde pública, à educação e ao desenvolvimento socioeconômico. Desta maneira, é aconselhável que elas sejam pesquisadas e abordadas por diferentes áreas do conhecimento.
Dentro da perspectiva educacional, essas competências são também conhecidas como competências para o século 217,11, no qual os esforços estão centrados em disseminar a importância da promoção dessas habilidades no contexto escolar, tanto para alunos quanto para os profissionais envolvidos neste processo. No documento "Competências socioemocionais: material de discussão", o Instituto Ayrton Senna defende que as escolas têm que ser capazes de trabalhar dentro do currículo competências como: responsabilidade; colaboração; comunicação; criatividade; autocontrole; pensamento crítico; resolução de problemas e abertura para novas experiências13.
Conforme relatório da OCDE1, pesquisas apontam que os pais e os professores sabem da importância das crianças desenvolverem outras habilidades para além das cognitivas, no entanto, ainda é pouco o movimento em prol desse desenvolvimento. Também levantam como hipótese explicativa para tal realidade que o conhecimento sobre as formas de promoção dessas competências seja limitado, prejudicando, assim, um trabalho efetivo nesse sentido.
Sklad et al.14 realizaram uma meta-análise com o objetivo de investigar a eficácia de programas que visam a promover habilidades socioemocionais no âmbito escolar. Foram avaliados 75 estudos. De modo geral, os resultados indicaram que houve aumento nas habilidades sociais e diminuição de comportamentos antissociais na grande maioria dos estudos revisados.
No estudo de Gomes15, com o intuito de investigar a eficácia de um programa para desenvolvimento de habilidades socioemocionais no contexto escolar, participaram 40 indivíduos, sendo 17 crianças com seus respectivos pais (n=17) e 6 professoras. Os resultados indicaram que, na visão dos pais, não houve diferença significativa entre o pré-teste e o pós-teste. Já na perspectiva das professoras, as crianças melhoraram significativamente nos sintomas de ansiedade, problemas emocionais e comportamentais após a intervenção.
Apesar do grande enfoque em promover competências socioemocionais no âmbito escolar, é importante mencionar que elas podem ser trabalhadas em outros ambientes, como o familiar. É possível, por meio de formação psicoeducacional, ensinar os pais, com informações baseadas em evidências científicas, para que eles se tornem aptos a desenvolver e/ou aprimorar as habilidades socioemocionais de seus filhos durante o convívio familiar16,17.
De acordo com Bolsoni-Silva & Marturano16, a forma com que os pais educam os filhos é fundamental para que as crianças tenham sucesso, ou não, durante suas relações interpessoais dentro e fora do contexto familiar, assim como para o seu desenvolvimento emocional. No estudo de Coelho & Murta18, foi realizado um treinamento de práticas parentais positivas com sete pais, no qual os resultados do pós-teste indicaram aumento nas práticas educativas positivas, melhor desenvolvimento de habilidades sociais e estratégias mais eficazes para lidar com estressores externos por parte das crianças.
Com base nas informações até aqui apresentadas, é possível afirmar que as competências socioemocionais podem e devem ser ensinadas e estimuladas nas crianças a partir da primeira infância, tanto no contexto familiar como no contexto escolar. Como é mencionado no documento do Porvir & IAS11: "As competências socioemocionais são habilidades que você pode aprender; são habilidades que você pode praticar; e são habilidades que você pode ensinar".
Nesse sentido, o presente estudo tem como objetivo realizar um levantamento na literatura de pesquisas que apresentem métodos e/ou estratégias de intervenção e promoção de habilidades socioemocionais na infância e na adolescência. Para tanto, será conduzida uma revisão integrativa de literatura.
PROCEDIMENTOS BÁSICOS
Para realizar o levantamento dos estudos, foram consultadas as bases de dados da Scientific Eletronic Library Online (SciELO), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) e Periódicos Eletrônicos em Psicologia (PePSIC), por se tratar de bases relevantes para a área de saúde e educação. Foram utilizadas como descritores para a busca dos artigos as seguintes palavras-chave: "habilidades socioemocionais"; "competências socioemocionais"; "comportamento pró-social"; "cognição social"; e "inteligência emocional". A busca ocorreu no mês de setembro de 2019.
A primeira etapa foi a busca por cada um dos descritores nas três bases escolhidas a priori, o que resultou em um montante de 828 artigos científicos, dos quais 583 foram encontrados na SciELO, 205 na LILACS e 40 na PePSIC. Em seguida, foi realizada a primeira seleção dos artigos de acordo com o critério de inclusão referente ao período que, por conveniência, ficou estabelecido como recorte de 11 anos (2008-2019).
No momento seguinte, todos os artigos restantes passaram por uma análise preliminar de seus títulos e resumos a fim de verificar os demais critérios de elegibilidade, a saber: estudos publicados em português; estudos na íntegra; estudos empíricos que apresentem estratégias/métodos de intervenção e promoção de habilidades socioemocionais para crianças e adolescentes. Os critérios de exclusão foram artigos fora do recorte temporal; artigos de revisão de literatura; artigos que não tratassem de estratégias de intervenção e promoção de habilidades socioemocionais; artigos em outras línguas que não o português; e artigos que não fossem sobre crianças e adolescentes.
Para evitar que algum artigo não fosse resgatado corretamente, optou-se por não procurar especificamente as palavras-chave junto com o descritor "intervenção", que é o foco do presente estudo. A seleção dos artigos que abordavam o tema de intervenção e promoção foi feita manualmente após leitura do título, resumo e palavras-chave.
Posterior à análise dos títulos e resumos, dez estudos se encaixaram no perfil; desses, dois estavam duplicados, ou seja, apareceram em duas bases, e após a exclusão desses dois, ficaram oito artigos para a revisão.
O resultado da busca encontra-se sumariado na Tabela 1.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Com o intuito de facilitar a análise e a compreensão dos resultados, inicialmente será apresentada uma tabela descritiva com informações técnicas dos artigos sumariados na Tabela 1 e, em seguida, informações referentes à metodologia dos estudos, especificamente sobre quem foi o profissional responsável por aplicar as intervenções (Tabela 2).
Todos os artigos revisados tratam de estudos empíricos que, em sua maioria (87,5%), foram realizados em contexto escolar. Apenas o estudo D foi conduzido em contexto clínico, como pode ser observado na Tabela 2. Esse achado vai ao encontro da literatura na área, na qual a maioria dos esforços em promover habilidades socioemocionais está centrado no âmbito escolar1,7,13,14, visto que esse é um ambiente altamente favorável para o desenvolvimento dessas habilidades por se tratar, na maioria das vezes, do primeiro ambiente social das crianças fora da família.
Na análise da metodologia, foi possível observar que em alguns estudos (A e G) os procedimentos de intervenção foram realizados pelos próprios professores da escola após treinamento ministrado pelo pesquisador. Já nos estudos B e E, quem aplicou a intervenção foram os pesquisadores, assim como o estudo C, no qual a pesquisadora era também professora da turma. No estudo F, a intervenção foi conduzida pela professora, porém com orientação semanal da pesquisadora e observação de duas bolsistas.
O estudo H contou com dois momentos distintos de aplicadores da intervenção, sendo que, em um primeiro momento, a pesquisadora é quem aplicava uma etapa da intervenção/orientação com os alunos. Em paralelo, era realizado um trabalho de treinamento com os professores e coordenadores que, por fim, realizavam a intervenção com os alunos. No estudo D, o procedimento de intervenção foi realizado por um profissional da psicologia em contexto clínico.
As informações supracitadas sobre quem aplicou a intervenção são importantes indicadores dos processos que estão sendo utilizados para promover essas habilidades, especificamente os agentes promotores. Em geral, é possível observar que, com exceção dos estudos B e D, todos os demais contaram com o apoio dos professores. Isso indica que, dentro do contexto escolar, a escolha principal é a formação e capacitação dos professores para que eles possam lidar com os conflitos e estimular comportamentos mais adequados e pró-sociais nos alunos, assim como neles próprios.
Desse modo, é possível inferir que estejam sendo usados os modelos propostos pelas organizações IAS & UNESCO13, OCDE1 e Santos & Primi7, que visam justamente a promoção das habilidades socioemocionais dentro das escolas, contando com o suporte de toda a equipe escolar.
A formação continuada dos professores - especialmente sobre temas relacionados às competências socioemocionais - tem se mostrado muito importante, visto que, uma vez que essas competências são bem trabalhadas, reduzem o número de conflitos em sala de aula, tanto entre os alunos como entre alunos e professores, e também é observada uma redução no índice de práticas de bullying1. Outro fator significativo que dá suporte para o incentivo dessas formações são as mudanças no comportamento dos próprios professores, como citado nos estudos de Bolsoni-Silva et al.19 e Rocha & Carrara23.
A seguir, na Tabela 3, serão apresentadas as principais características dos estudos em função da descrição dos participantes, tipo de intervenção realizada e os principais achados.
Com base nas informações sumariadas na Tabela 3, no que tange ao delineamento das pesquisas, é possível constatar que apenas os estudos B, C e G tiveram Grupo Experimental (GE) e Grupo Controle (GC). Esse tipo de desenho de estudo é muito utilizado e indicado para pesquisas que têm como objetivo mostrar o efeito de uma intervenção, pois nesses casos todos os indivíduos são avaliados igualmente. Porém, no momento da intervenção, apenas o GE é submetido a ela. Depois, no período de pós-teste, todos são avaliados novamente, então é possível comparar os efeitos de quem passou pela intervenção com quem não passou.
Quanto às habilidades socioemocionais que foram trabalhadas, é possível elencar algumas categorias em comum nos estudos, sendo elas: resolução de conflitos interpessoais; autocontrole emocional; reconhecimento de comportamentos pró-sociais e antissociais; expressão de sentimentos; comunicação eficaz; e empatia. Essas categorias confirmam as definições de habilidades socioemocionais descritas na literatura5,7,11,13. Como citado na introdução deste trabalho, essas habilidades podem ser divididas em três categorias para facilitar o entendimento, porém todas fazem parte das competências socioemocionais.
Em seguida, investigou-se o tipo de recurso utilizado para o desenvolvimento das intervenções e constatou-se que há em comum nos estudos, exceto no B e D, a formação e/ou treinamento de professores. Além da formação inicial dos professores, alguns estudos fizeram uso de livros de histórias infantis para o momento de intervenção, que é o caso dos estudos B, C, D, F e G, no entanto, no estudo B, as histórias eram apresentadas via tablet e não livro físico.
Os estudos E e H apostaram em formações teóricas e dialogadas com os professores. No estudo A, além da formação teórica e dialogada, foram utilizadas também filmagens de situações de conflitos em sala de aula para exemplificar os cenários existentes e buscar junto aos professores mediações possíveis para resolver o conflito. Essas filmagens foram feitas antes da formação, na própria sala de aula em que os professores lecionavam.
Recursos desse tipo são apontados como favoráveis pela literatura, como é o caso do uso de histórias e narrativas. De acordo com o documento do Porvir & IAS11, durante a leitura de um livro é possível identificar e questionar os comportamento e sentimentos dos personagens e, a partir disso, pensar em estratégias para resolução de conflitos. Também se pode tomar os conflitos dos livros como exemplo para a resolução dos conflitos reais vividos em sala de aula, assim como ampliar o repertório sobre emoções, pois, de acordo com informações já citadas no presente estudo, saber reconhecer as próprias emoções e as das outras pessoas é fundamental para os relacionamentos interpessoais.
No que diz respeito aos principais achados das pesquisas apresentadas, é possível perceber que, de modo geral, em todos os estudos foram relatados sinais de diminuição de comportamentos antissociais e aumento de comportamentos pró-sociais. Isso ocorre até no estudo B, em que a pesquisa ainda está em andamento e só foram apresentados resultados parciais de uma avaliação qualitativa com os pais das crianças que estão no processo de intervenção. No estudo F, também foi relatado aumento nos índices de atribuição de estados mentais.
Esses resultados estão em consonância com o estudo de Sklad et al.14, no qual foi observado, na maioria dos estudos revisados, diminuição de comportamentos antissociais após intervenção em habilidades socioemocionais. Resultados semelhantes são observados também nos estudos apresentados pela OCDE1. Ainda corroboram parcialmente o estudo de Gomes15, pois nas pesquisas aqui revisadas os pais também relataram melhoras no comportamento dos filhos; já no estudo de Gomes, apenas os professores conseguiram observar mudanças.
É importante salientar que, mesmo diante dos dados positivos sobre os impactos do desenvolvimento e promoção das competências socioemocionais, apresentados na seção de introdução e, perante o resultado da revisão aqui feita, é possível observar que ainda são poucos os estudos que buscam investigar a eficácia de programas e estratégias de intervenção.
Por fim, faz-se importante expor que a investigação realizada neste estudo teve limitações, dentre elas, a busca por trabalhos escritos apenas em português, assim como o resgate somente de artigos, não abrindo a busca para dissertações e teses. Desse modo, sugere-se que pesquisas futuras busquem estudos em outros idiomas, especialmente o inglês, que corresponde à maior quantidade de trabalhos publicados. Recomenda-se também a busca por dissertações de mestrado e teses de doutorado que, porventura, ainda não tenham sido publicadas em formato de artigo, pois, por se tratar de um tema relativamente recente, novos estudos podem ter sido recém-finalizados.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto, é possível concluir que a promoção de habilidades socioemocionais na infância e na adolescência apresenta resultados favoráveis para a diminuição de comportamentos mal adaptativos, como agressão física, verbal e conflitos em sala de aula, bem como para o aumento de comportamento pró-social, autoconhecimento, atribuição de termos mentais e abertura para novas experiências. Também foram observadas melhoras nos índices de saúde mental, como diminuição de ansiedade.
Além das alterações observadas no comportamento das crianças e dos adolescentes, também se notaram modificações positivas no comportamento dos professores que participaram das intervenções, como diminuição de ameaças e punições e aumento de comportamentos positivos e reforçadores, sugerindo que a promoção de habilidades socioemocionais, quando trabalhadas no contexto escolar, pode beneficiar não só os alunos, como todos que estão inseridos nele.
No entanto, é importante apontar que, mesmo quando os métodos foram aplicados no ambiente escolar, foi fundamental uma formação prévia, assim como um acompanhamento para mensurar os resultados, dar suporte na aplicação e pensar em novas estratégias de manejo quando for o caso. Para isso, é indicado um profissional com conhecimentos aprofundados em promoção de habilidades socioemocionais, podendo ser do campo da psicologia, da Psicopedagogia ou áreas afins.
Sendo assim, o presente estudo apresentou algumas evidências científicas da eficácia da promoção de habilidades socioemocionais em crianças e adolescentes, reforçando a importância de investimentos e pesquisas nessa área, visto que tais achados certamente propiciam um ambiente mais favorável ao processo de ensino e aprendizagem.
REFERÊNCIAS
1. Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Estudos da OCDE sobre competências: Competências para o progresso social: O poder das competências socioemocionais. São Paulo: Fundação Santillana; 2015. 136 p. [ Links ]
2. Pavarini G, Loureiro P, Hollanda DH. Compreensão de emoções, aceitação social e avaliação de atributos comportamentais em crianças escolares. Psicol Reflex Crit. 2011; 24(1):35-143. [ Links ]
3. Pinkham AE, Penn DI, Green MF, Buck B, Healey K, Harvey PD. The social cognition psychometric evaluation study: results of the expert survey and RAND panel. Schizophr Bull. 2014;40(4):813-23. [ Links ]
4. Grove R, Baillie A, Baron-Cohen S, Hoekstra R. The latent structure of cognitive and emotional empathy in individuals with autism, first-degree relatives and typical individuals. Mol Autism. 2014;5:42. [ Links ]
5. Centre of Excellence for Early Childhood Development/Strategic Knowledge Cluster on Early Childhood Development (CEECD/SKC-ECD). Eyes on. Prosocial behaviour. Helping your child to give back. Montreal: CEECD/SKC-ECD; 2016. [ Links ]
6. Fundação Telefônica. Innovation Unit. Laboratório de Inovação Educacional Labi. Global Education Leaders' Program Brasil. Questões conceituais e práticas. São Paulo: Fundação Telefônica; 2015. [ Links ]
7. Santos D, Primi R. Desenvolvimento socioemocional e aprendizado escolar: uma proposta de mensuração para apoiar políticas públicas. São Paulo: OCDE, SEEDUC, Instituto Ayrton Senna; 2014. 93 p. [ Links ]
8. Carvalho RS, Silva RD. Currículos socioemocionais, habilidades do século XXI e o investimento econômico na educação: as novas políticas curriculares em exame. Educ Rev. 2017;63:173-90. [ Links ]
9. Damásio BF; Grupo Semente Educação. Mensurando habilidades socioemocionais de crianças e adolescentes: desenvolvimento e validação de uma bateria. Temas Psicol. 2017; 25(4):2043-50. [ Links ]
10. Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal. Aposte na primeira infância: Qual o papel das empresas no desenvolvimento das crianças brasileiras? São Paulo: Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal; 2018. 15 p. [ Links ]
11. Porvir, Instituto Ayrton Senna (IAS). Especial Socioemocionais Encontro da Série Diálogos: O Futuro se Aprende. São Paulo: Porvir/IAS; 2014 [acesso 2019 Set 27]. Disponível em: http://porvir.org/especiais/socioemocionais/ [ Links ]
12. Rodrigues CESL. Habilidades Socioemocionais: a OCDE e seu projeto de governança educacional global. Florianópolis: Reunião Nacional da ANPEd; 2015. [ Links ]
13. Instituto Ayrton Senna, Unesco. Competências socioemocionais: Material de discussão. Rio de Janeiro: Instituto Ayrton Senna; 2014. 28 p. [ Links ]
14. Sklad M, Diekstra R, Ritter M, Bem J, Gravesteijn C. Effectiveness of school-based universal social, emotional, and behavioral programs: do they enhance students' development in the area of skill, behavior, and adjustment? Psychol Sch. 2012;49(9):892-909. [ Links ]
15. Gomes TCC. Efeito de um programa voltado para o desenvolvimento de habilidades socioemocionais em crianças pré-escolares: Intervenção na comunidade [dissertação]. São Paulo: Universidade Presbiteriana Mackenzie; 2018. [ Links ]
16. Bolsoni-Silva AT, Marturano EM. Práticas educativas e problemas de comportamento: uma análise à luz das habilidades sociais. Estud Psicol (Natal). 2002;7(2):227-35. [ Links ]
17. Pinheiro MIS, Haase VG, Del Prette A, Amarante CID, Del Prette ZAP. Treinamento de Habilidades Sociais Educativas para Pais de Crianças com Problemas de Comportamento. Psicol Reflex Crít. 2006;19(3): 407-14. [ Links ]
18. Coelho MV, Murta SG. Treinamento de pais em grupo: um relato de experiência. Estud Psicol. 2007;24(3):333-41. [ Links ]
19. Bolsoni-Silva AT, Verdu ACMA, Carrara K, Melchiori LE, Leite LP, Calais SL. Ampliando comportamentos pró-éticos dos alunos: relato de pesquisa e intervenção com educadores do ensino fundamental. Temas Psicol. 2013; 21(2):348-59. [ Links ]
20. Varanda CA, Mendes ECCS, Campina NM, Aulicino MGGC, Nascimento RCGvO, Marczak CMF, et al. Aplicativos para tablets sensíveis ao toque para melhorar vocabulário, processamento auditivo e habilidades de interação social em pré-escolares. Rev Psicopedag. 2015;32(98):136-49. [ Links ]
21. Borges DSC, Marturano EM. Aprendendo a gerenciar conflitos: um programa de intervenção para a 1a série do ensino fundamental. Paidéia. 2009;19(42):17-26. [ Links ]
22. Gonçalves ES, Murta SG. Avaliação dos efeitos de uma modalidade de treinamento de habilidades sociais para crianças. Psicol Reflex Crít. 2008;21(3):430-6. [ Links ]
23. Rocha JF, Carrara K. Formação ética para a cidadania: reorganizando contingências na interação professor-aluno. Psicol Esc Educ. 2011;15(2):221-30. [ Links ]
24. Rodrigues MC, Ribeiro NN, Cunha PC. Leitura Mediada com Enfoque Sociocognitivo: Avaliação de Pesquisa-Intervenção. Paidéia. 2012;22(53):393-402. [ Links ]
25. Borges DSC, Marturano EM. Melhorando a convivência em sala de aula: responsabilidades compartilhadas. Temas Psicol. 2010; 18(1):123-36. [ Links ]
26. Fernandes EC, Santos ACG. Programação de contingências reforçadoras no fortalecimento de repertórios pró-sociais no contexto escolar. Rev Bras Ter Comport Cogn. 2009; 11(2):285-304. [ Links ]
Endereço para correspondência:
Patricia Vieira de Oliveira
Rua Paulo Lício Rizzo, 16/101 - Centro
Osasco, SP, Brasil - CEP 06018-010
E-mail: patricia@prvo.com.br
Artigo recebido: 9/7/2020
Aprovado: 23/1/2021
Trabalho realizado na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), São Paulo, SP, Brasil.
Conflito de interesses: Os autores declaram não haver.