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Revista Psicopedagogia

versión impresa ISSN 0103-8486

Rev. psicopedag. vol.41 no.125 São Paulo mayo/ago. 2024  Epub 13-Sep-2024

https://doi.org/10.51207/2179-4057.20240024 

ARTIGO ORIGINAL

Estudo neuropsicológico preliminar de crianças com câncer em atendimento pedagógico hospitalar

Preliminary neuropsychological study of children with cancer in hospital pedagogical care

Pablo Silva de Lima1 

Milene Bartolomei da Silva2 

Rochele Paz Fonseca3 

Nicolle Zimmermann4 

1. Pablo Silva de Lima – Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Campo Grande, MS, Brasil.

2. Milene Bartolomei da Silva – Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), Campo Grande, MS, Brasil.

3. Rochele Paz Fonseca – Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Belo Horizonte, MG, Brasil.

4. Nicolle Zimmermann – Conectare NeuroPsi, Porto Alegre, RS, Brasil.


Resumo

Crianças com câncer correm um alto risco de uma ampla gama de dificuldades cognitivas. Portanto, são necessárias intervenções direcionadas a essas dificuldades. O estudo teve por objetivo investigar o desempenho neuropsicológico em funções executivas, linguagem, memória episódica visual e verbal, velocidade de processamento, atenção concentrada e escrita de 8 crianças com câncer em tratamento quimioterápico e a relação do desempenho com a frequência na classe hospitalar. A amostra total final foi composta por oito crianças, com idades entre 8 e 12 anos (M=9,37; DP=1,40 anos), no Ensino Fundamental regular, entre o 3º e 7º ano de escolaridade (100% de escolas públicas), quatro meninos e quatro meninas, com diagnóstico de câncer em tratamento (87,5%). Como resultados preliminares foram encontrados déficits em maior frequência nos desempenhos em fluência verbal, processamento de inferências/interpretação oral e escrito, atenção concentrada e funções executivas, principalmente em memória de trabalho e flexibilidade cognitiva. No entanto, quando comparada a relação entre frequência na classe hospitalar e desempenho neuropsicológico, crianças que frequentaram a classe hospitalar de 3 a 5 vezes por semana, quando comparadas às crianças que frequentavam de 0 a 2 vezes, tiveram melhor desempenho em velocidade de processamento. As crianças que frequentaram a classe hospitalar por mais de 30 minutos apresentavam maior capacidade de aprendizagem, memória de curto prazo e linguagem pragmática, quando comparadas às que frequentavam por menos de 30 minutos.

Palavras-Chave: Câncer Infantil; Aprendizagem; Neurocognição; Classe Hospitalar

Summary

Children with cancer are at high risk of a wide range of cognitive difficulties. Therefore, targeted interventions addressing these difficulties are necessary. The study aimed to investigate the neuropsychological performance in executive functions, language, visual and verbal episodic memory, processing speed, focused attention, and writing of 8 children undergoing chemotherapy for cancer and their relationship with attendance frequency in the hospital classroom. The final total sample consisted of eight children, aged between 8 and 12 years (M=9.37; SD=1.40 years), attending regular elementary education, ranging from 3rd to 7th grade (100% from public schools), with four boys and four girls, diagnosed with cancer and undergoing treatment (87.5%). Preliminary results revealed more frequent deficits in verbal fluency, oral and written inference/interpretation processing, focused attention, and executive functions, especially in working memory and cognitive flexibility. However, when comparing the relationship between hospital classroom attendance frequency and neuropsychological performance, children who attended the hospital class 3 to 5 times a week showed better processing speed performance compared to those attending 0 to 2 times. Children who attended the hospital class for more than 30 minutes demonstrated higher learning capacity, short-term memory, and pragmatic language skills compared to those attending for less than 30 minutes.

Key words: Childhood Cancer; Learning; Neurocognition; Hospital Class

Introdução

Apesar dos déficits neurocognitivos bem documentados em sobreviventes de câncer pediátrico, há uma heterogeneidade substancial nos resultados neurocognitivos e psicológicos, sugerindo que o tipo de doença do câncer e os tratamentos associados podem não explicar completamente os resultados observados. Conforme Karlson et al. (2020), sobreviventes de câncer pediátrico experimentam desafios neurocognitivos e acadêmicos significativos após o tratamento, mas existe uma variabilidade individual considerável. Aproximadamente 35% de todos os sobreviventes de câncer infantil experimentam algum tipo de dificuldade de aprendizagem (por exemplo, no funcionamento executivo ou transtorno específico de aprendizagem) e aproximadamente 40% a 60% dos sobreviventes de Leucemia Linfoide Aguda (LLA) experimentam problemas de atenção na concentração e/ou memória, bem como um risco aumentado de dificuldades em várias áreas acadêmicas, incluindo matemática, vocabulário, leitura e ortografia (Kalson et al., 2020).

Também é importante notar que o nível socioeconômico (NSE) foi identificado como um moderador do resultado neurocognitivo em crianças com leucemia, e que os recursos e a estrutura da família podem exercer um papel importante tanto nas habilidades cognitivas básicas de uma criança quanto em sua capacidade de se beneficiar do desenvolvimento cognitivo saudável (Olson & Sands, 2016).

Representando menos de 1% de todas as malignidades diagnosticadas em todo o mundo, o câncer em crianças menores de 15 anos é raro, e o espectro de neoplasias que ocorrem tende a diferir em aspectos importantes daqueles observados em idades mais avançadas, não apenas em relação às suas características biológicas e comportamentais, mas também em relação aos seus perfis de sintomas, modos de apresentação, opções de tratamento e resultados (Spironello et al., 2020; Sung et al., 2021).

O câncer infantojuvenil acomete crianças e adolescentes de 0-19 anos, correspondendo de 1 a 4% de todos os tumores malignos na maioria das populações. Em países em desenvolvimento, onde a população infantil atinge cerca de 50%, essa proporção alcança entre 3 e 10% de todas as neoplasias. No entanto, em países desenvolvidos, essa proporção diminui, atingindo cerca de 1% (Cunha et al., 2019; Spironello et al., 2020).

Assim como nos países desenvolvidos, no Brasil, o câncer já representa a primeira causa de morte (8% do total) por doença entre crianças e adolescentes de 1 a 19 anos. O câncer infantojuvenil é considerado, como já mencionado, raro em incidência internacional, quando comparado ao câncer em adultos, correspondendo entre 2 e 3% de todos os tumores malignos registrados no Brasil (Spironello et al., 2020).

Os tumores mais frequentes na infância e na adolescência são as leucemias (que afetam os glóbulos brancos), os que atingem o sistema nervoso central e os linfomas (sistema linfático). Também acometem crianças e adolescentes o neuroblastoma (tumor de células do sistema nervoso periférico, frequentemente de localização abdominal), tumor de Wilms (tipo de tumor renal), retinoblastoma (afeta a retina, fundo do olho), tumor germinativo (das células que originam os ovários e os testículos), osteossarcoma (tumor ósseo) e sarcomas (tumores de partes moles) (Brasil, 2019).

Com ensaios clínicos visando à otimização do tratamento (especialmente a intensidade para reduzir a toxicidade) e pesquisas focadas na redução de efeitos somáticos e tardios, 70% das crianças acometidas são curadas a partir do diagnóstico e tratamento precoces. É inquestionável que o diagnóstico precoce possibilita uma maior chance de cura (Silva et al., 2020).

Por exemplo, um dos maiores diagnósticos de câncer infantojuvenil é a leucemia linfoblástica aguda (LLA), que tem tido avanços no tratamento na infância, e as pesquisas têm mostrado que melhoraram as taxas de sobrevivência para quase 95% das crianças acometidas. Contudo, os sobreviventes de longo prazo de LLA infantil que foram tratados com protocolos de quimioterapia contemporâneos apresentam comprometimento neurocognitivo leve a moderado. Os sobreviventes também demonstram problemas comportamentais e psicológicos, além de déficits no desempenho acadêmico (Partanen et al., 2021; Peng et al., 2021; Ruble et al., 2019; van der Plas et al., 2018).

Além do diagnóstico, a associação de terapias direcionadas ao sistema nervoso central (SNC), como metotrexato (MTX) em altas doses e quimioterapia intratecal, estão relacionados a piores resultados neurocognitivos em sobreviventes de LLA infantil. Leucoencefalopatia, sepse e outras toxicidades agudas que ocorrem durante o tratamento ativo são preditivas de alterações estruturais no cérebro e déficits subsequentes nos resultados funcionais (Peng et al., 2021). No entanto, está bem estabelecido que esses sobreviventes estão em risco aumentado para sequelas neurocognitivas ou “efeitos tardios” e comportamentais que, provavelmente, podem afetar a qualidade de vida desses indivíduos (Olson & Sands, 2016; Siegwart et al., 2022).

As taxas de comprometimento cognitivo entre as crianças sobreviventes com tumores do SNC foram relatadas como variando de 40% a 100% e, embora a irradiação seja um fator de risco estabelecido, déficits foram relatados entre as crianças sobreviventes com tumores no SNC tratados apenas com cirurgia. Mesmo entre os sobreviventes de leucemia que não receberam irradiação craniana, as pontuações foram documentadas em declínio ao longo do tempo (Olson & Sands, 2016).

Em medidas de raciocínio perceptivo, atenção, memória e velocidade de processamento, os sobreviventes também tiveram um desempenho pior, se comparados ao desempenho da população com o um todo. É sabido que as funções executivas são preditoras de um bom desenvolvimento cognitivo. Nesse sentido, segundo Peng et al. (2021) observaram em sua pesquisa, os sobreviventes que desenvolveram condições crônicas de saúde tiveram mais disfunção executiva do que aqueles que não tiveram nenhuma condição crônica durante o tratamento de câncer infantojuvenil.

Um estudo avaliou o impacto do tratamento quimioterápico em sobreviventes LLA na infância e os sobreviventes demonstraram prejuízo em flexibilidade cognitiva, memória de trabalho, fluência verbal e atenção sustentada. Outro resultado importante desse estudo foi a correlação do desempenho cognitivo à medicação quimioterápica, foi identificado que a ativação aumentada e diminuída nas regiões envolvidas no alerta e na atenção sustentada, respectivamente, foram associadas à maior exposição ao MTX (Fellah et al., 2019).

Uma revisão sistemática recente identificou 13 estudos cognitivos em sobreviventes de câncer infantil em países asiáticos e descobriu que 10,0% a 42,8% dos sobreviventes demonstraram deficiências leves a moderadas na inteligência (ou seja, QI geral). Evidências obtidas em uma população ocidental não podem ser extrapoladas para sobreviventes asiáticos devido às diferenças genéticas nas respostas a terapias medicamentosas e suscetibilidades ao desenvolvimento de toxicidades crônicas relacionadas ao tratamento, pois sabemos que fatores étnicos e socioculturais podem levar a efeitos diferenciais dos tratamentos nos processos cognitivos em sobreviventes asiáticos e ocidentais (Peng et al., 2021).

Escolarização e reingresso escolar de crianças sobreviventes de câncer infantojuvenil

Segundo o estudo de Bryan et al. (2021), um diagnóstico de câncer pediátrico pode afetar a experiência escolar de uma criança ao longo de toda vida, conforme a trajetória de tratamento. No diagnóstico e durante o tratamento, o absenteísmo escolar devido aos regimes terapêuticos (quimioterapia e/ou radioterapia) e seus efeitos colaterais associados podem levar ao aumento das dificuldades sociais, inibindo a capacidade da criança de aprender e se envolver em sua educação, bem como, já bem documentado acima, déficits sensoriais e neurocognitivos permanentes podem afetar a capacidade da criança de se envolver nas disciplinas, interação com colegas, e outras atividades escolares dentro da instituição e, consequentemente, afetar suas realizações acadêmicas e o seu desenvolvimento biopsicossocial.

Até 30% dos sobreviventes de câncer infantil são forçados a repetir um ano de escolaridade devido às interrupções para os procedimentos hospitalares, principalmente a ausência escolar experimentada, um problema para crianças com câncer em todos os estágios de sua doença e, segundo pesquisas, professores relatam que as crianças com câncer frequentam a escola menos regularmente do que as crianças saudáveis. Embora o isolamento social possa continuar a ser um problema, apesar do envolvimento bem-sucedido com a escola, os efeitos colaterais relacionados ao tratamento, como déficits cognitivos e fadiga, podem dificultar a aquisição e retenção de informações para algumas crianças e adolescentes, levando-os a ter dificuldades de aprendizagem (Bonneau et al., 2011; Bryan et al., 2021; Vance & Eiser, 2002).

A preocupação dos pais com a educação de seus filhos após o diagnóstico também foi documentada, incluindo a observação de reduções no desempenho acadêmico, capacidade de participar da escola e atividades relacionadas, e a necessidade de profissionais da educação e colegas da escola receberem informações específicas para as necessidades de seus filhos (Bryan et al., 2021).

As variáveis sociodemográficas e ambientais também impactam no reingresso e sucesso acadêmicos das crianças sobreviventes de câncer infantojuvenil. Os fatores de risco foram: idade avançada ao diagnóstico, escolaridade secundária, baixa escolaridade dos pais, transplante de medula óssea, cirurgia cerebral e sequelas físicas. Na análise multivariada, o risco de repetência foi associado ao baixo nível educacional dos pais, frequentar o ensino médio no momento do diagnóstico e necessitar de apoio educacional organizado pela escola no retorno (Bonneau et al., 2011).

Atendimento Pedagógico em Ambiente Hospitalar

Diante do exposto acima, a criança com diagnóstico de câncer já vivencia diversas consequências devido à própria doença e ao tratamento, e precisa lidar com as demandas internas e externas. O Atendimento Pedagógico em Ambiente Hospitalar se direciona a crianças e adolescentes que se encontram impossibilitados de frequentar a escola. O objetivo é promover e garantir às crianças e adolescentes hospitalizados a continuidade dos estudos, abrangendo programas de educação, recreação e acompanhamento curricular durante a permanência no hospital. O Atendimento Pedagógico em Ambiente Hospitalar também pode ser definido como Atendimento Educacional Hospitalar (Saluana et al., 2019).

Esse atendimento hospitalar proporciona à criança um resgate de sua rotina escolar, pois, por mais que esteja em um hospital, permite a ela continuar o seu processo de alfabetização, a fim de poder resgatar a vivência do ambiente escolar da criança e do adolescente, que é bruscamente rompida pela doença e, assim, amenizar o sofrimento e proporcionar o seu desenvolvimento cognitivo (Santana et al., 2013).

A finalidade da classe hospitalar é proporcionar ao paciente as condições para que ele se sinta inserido no mundo dos não doentes, demonstrando que suas capacidades intelectuais não foram perdidas, por meio de atividades que estimulem suas habilidades. Isso pode assegurar uma valorização de seus conhecimentos prévios, ao mesmo tempo em que reduz a evasão escolar e a exclusão social. Essas atividades são realizadas em diversas áreas, abrangendo desde leitos e salas de espera até uma sala especialmente destinada aos atendimentos pedagógicos e educacionais (Costa & Rolim, 2020).

Porém, ainda não há estudos realizados para investigar os desfechos neuropsicológicos das crianças em tratamento para o câncer e sua frequência no atendimento pedagógico hospitalar (classe hospitalar), não há referenciais brasileiros. Sendo assim, é de extrema importância este estudo preliminar para uma melhor compreensão dos possíveis benefícios e desafios que as crianças com câncer são acometidas durante o tratamento.

Portanto, no presente estudo, investigou-se o desempenho neuropsicológico em paradigmas como: funções executivas como o controle inibitório, flexibilidade cognitiva, memória de trabalho, linguagem pragmática, memória episódica visual e verbal, velocidade de processamento, atenção concentrada e a habilidade de escrita de 8 crianças com câncer em tratamento quimioterápico. Além disso, investigou-se a relação do desempenho neuropsicológico com a frequência na classe hospitalar sobre a aprendizagem durante o tratamento.

Método

Este é um estudo prospectivo e transversal, realizado em parceria com o Centro de Tratamento Onco Hematológico Infantil (CETHOI), que se situa no Hospital Regional de Mato Grosso do Sul (HRMS), onde é realizado o atendimento a crianças e adolescentes com suspeita de doença oncohematológicas malignas é o tratamento quimioterápico, cirúrgico e clínico desses pacientes. As coletas foram realizadas na Associação dos Amigos das Crianças com Câncer (AACC/MS).

Amostra

Participaram da presente pesquisa crianças (n=10) de ambos os sexos, com faixa etária entre 8 e 12 anos, contudo, dois foram excluídos, uma por não ter iniciado o processo de alfabetização formal em função do diagnóstico que a impediu de frequentar a escola, e o segundo por ter diagnóstico de Tumor no Sistema Nervoso Central. Constituído por cinco (55,6%) crianças sobreviventes da Leucemia Linfoide Aguda (LLA) que receberam apenas tratamento quimioterápico e três outros diagnósticos (37,5%), a saber: Leucemia Mieloide Aguda (n=1); Tumor de Wilms (foi submetido a cirurgia) (n=1) linfomas (n=1).

Os participantes elegíveis foram recrutados via amostragem de conveniência entre novembro de 2021 e junho 2022. A amostra total final foi, então, composta por oito crianças, com idades entre 8 e 12 anos (M=9,37; DP=1,40 anos), matriculadas no Ensino Fundamental regular, entre o 3º e 7º ano de escolaridade (100% de escolas públicas), quatro meninos e quatro meninas, todos com diagnóstico de câncer em tratamento (87,5%), apenas um já havia terminado o tratamento.

Foram considerados critérios de inclusão para este estudo: a) ter entre 8-12 anos; b) ter sido diagnosticado com câncer; c) não ter outras comorbidades neurológicas como transtorno do neurodesenvolvimento infantil (Transtorno de Déficit de Atenção e/ou Hiperatividade - TDAH, Transtorno do Espectro Autista - TEA, Deficiência Intelectual - DI, entre outros); d) não ter outro quadro neurológico ou psiquiátrico; e) ter ficado hospitalizado no mínimo um mês; f) ter passado pela classe hospitalar.

Instrumentos

Descrição das tarefas neuropsicológicas

  1. Discurso Narrativo Oral – DNO (Fonseca et al., 2016): a tarefa avalia memória verbal de curto prazo, memória de trabalho verbal e processamento de inferências. Divide-se em três etapas: 1) leitura e reconto parcial de cada parágrafo texto; 2) leitura integral do texto e com reconto do texto; 3) 11 perguntas de compreensão, atribuição de títulos para história, bem como avaliação do processamento de inferência. O DNO apresenta normas para crianças de 8 a 12 anos, de escola pública e privada.

  2. Discurso Narrativo Escrito – DNEI (Fonseca et al., 2016): A tarefa tem por objetivo avaliar, além do processamento discursivo e pragmático-inferencial por input visual, a habilidade de leitura das crianças, ou seja, habilidades de decodificação, de fluência (velocidade de leitura e precisão) e de compreensão leitora. Avalia também memória de trabalho e memória episódica verbal. Envolve o conhecimento prévio de linguagem oral (memória semântica), atenção executiva, velocidade de processamento. Divide-se em três etapas: 1) leitura e reconto parcial de cada parágrafo texto; 2) leitura integral do texto e com reconto do texto; 3) 11 perguntas de compreensão, atribuição de títulos para história, bem como avaliação do processamento de inferência.

  3. Teste Hayling Infantil (Fonseca et al., 2016): é um teste bipartite cujo estímulo consiste em frases nas quais falta a última palavra. Na parte A, pede-se à criança para evocar uma palavra que melhor complete a frase que será lida para ela. Já na parte B, a criança deve falar uma palavra que não tenha nenhuma relação com o contexto da frase. O instrumento avalia os componentes de inibição, iniciação e velocidade de processamento. A pontuação ocorre a partir dos acertos e tipos de erros na evocação das palavras complementares as frases, bem como tempo de resposta.

  4. Tarefas de fluência verbal (Fonseca et al., 2016): são utilizadas as tarefas de fluência verbal livre, fonêmico-ortográfica e fluência verbal semântica. Na modalidade livre, o participante deve evocar o máximo de palavras em dois minutos e meio. Na modalidade fonêmico-ortográfica, deve evocar palavras que começam com a letra “p”, em dois minutos; e, na semântica, palavras que sejam roupas/vestimentas, em dois minutos. A pontuação ocorre a partir do número de palavras evocadas no tempo estimado, bem como avaliação qualitativa-quantitativa a partir de clusters e switches realizados pelos avaliados. Essas tarefas têm como objetivo avaliar os componentes executivos, como inibição, monitoramento, flexibilidade, planejamento, iniciação e velocidade de processamento, além da memória léxico-semântica e as habilidades linguísticas.

  5. Teste de Aprendizagem Auditivo-verbal de Rey (RAVLT) (Malloy-Diniz et al., 2007): é um teste que avalia a memória episódica (imediata, recente e tardia), aprendizagem auditivo-verbal, interferência retro e proativa, velocidade de esquecimento e memória de reconhecimento. O RAVLT é constituído por uma lista A de 15 substantivos que é repetida 5 vezes, após isso, é realizada uma lista B de interferência, depois uma evocação recente e tardia referente a lista A. A lista B é lida apenas uma vez como interferência e evocação. A etapa de reconhecimento é constituída por 50 palavras, dentre elas, palavras da lista A, da lista B e 20 distratores semânticos e fonêmicos.

  6. Desenho da Figura Humana – IV (Wechsler, 2018): O desenho da figura humana, construído, validado e padronizado para crianças brasileiras na faixa dos 5 aos 12 anos. Tem por objetivo, segundo a literatura internacional, a avaliação do desenvolvimento cognitivo infantil.

  7. Teste D2-R (Brickenkamp et al., 2018) O teste d2-R é um teste de avaliação da Atenção Concentrada e pode ser aplicado individual e coletivamente. O processamento do teste em si tem a duração de quatro minutos e 40 segundos. As instruções, incluindo os exercícios para treino, requerem mais 5 minutos. A versão informatizada deve ser administrada individualmente e o tempo de aplicação é o mesmo da versão impressa.

  8. Teste de Desempenho Escolar - TDE-II – Subteste Escrita (Stein et al., 2019): O TDE II pode contribuir com o mapeamento da aprendizagem da leitura, da escrita e da matemática, podendo ser utilizado como uma triagem universal do processo de aprendizagem desses três domínios do desempenho escolar ou como parte de uma bateria de instrumentos com fins diagnósticos e clínicos de planejamento de intervenções clínico-educacionais.

  9. Figuras Complexa de Taylor (Paula et al., 2016): O teste de Figura Complexa de Taylor original é composto por 18 elementos gráficos relacionados a componentes estruturais mais gerais e outros mais específicos e detalhados, visando a avaliar as habilidades visuoespaciais e da memória.

  10. Instrumento de Avaliação Neuropsicológica Breve - NEUPSILIN: Span auditivo de palavras em sentenças (Fonseca et al., 2009): O subteste Span auditivo de palavras avalia memória de trabalho do – NEUPSILIN que examina o desempenho nos seguintes processos neuropsicológicos: orientação temporoespacial, atenção concentrada, percepção visual, habilidades aritméticas, linguagem oral e escrita, memória verbal e visual, praxias e funções executivas. Nesse subteste são faladas ao examinando algumas frases. Após, ele deve repeti-la, memorizando, ao mesmo tempo, a última palavra de cada frase. Depois, deve dizer quais são as últimas palavras dessas frases em ordem.

Procedimento de coleta

No primeiro momento, a proposta de pesquisa foi submetida ao chefe de serviço de Oncologia Pediátrica pela Diretoria de Ensino, Pesquisa e Qualidade Institucional do HRMS, que autorizou a realização do estudo sob documento NR 05/2021. Em um segundo momento, a pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética da Universidade Federal do Mato Grasso do Sul, sob o parecer CAAE: 44511321.1.0000.0021, aprovado em junho de 2021, foi posteriormente estendida aos pacientes atendidos pela AACC, sendo autorizada em novembro de 2021.

As crianças foram avaliadas em uma sessão com duração de até 120 minutos com a criança, com um intervalo de 10 minutos para descanso, tomar água e ir ao banheiro. No início da avaliação, os responsáveis pela criança assinaram, em duas vias, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e Termo de Assentimento Livre e Esclarecido. Após a sua leitura e esclarecimentos de dúvidas, ambos termos foram assinados pelo paciente e pelo pesquisador e cada um ficou com uma cópia.

Logo após, foi preenchido o questionário de identificação do paciente, questionário sociodemográfico (preenchidos no momento da avaliação junto com o responsável), protocolo para o levantamento de informações do histórico médico (prontuário) e um questionário para investigar os efeitos da ‘desescolarização’, frequência na classe hospitalar, escolaridade dos pais e classe socioeconômica familiar.

Os horários das coletas foram adaptados ao melhor período conforme a rotina de cada criança na instituição, respeitando as condições clínicas, momento de recreação e alimentação na instituição, entre outros fatores que pudessem interferir na resposta das crianças às tarefas.

Procedimentos de análise de dados

Foi realizada uma análise dos questionários para levantamento das variáveis clínicas e sociodemográficas que foram coletadas mediante informações prestadas pelos responsáveis que acompanhavam a criança na instituição. Todas as medidas neuropsicológicas e comportamentais foram transformadas em percentis ajustados à idade usando referências fornecidas pelos manuais de teste ou a literatura.

Todos os percentis foram dimensionados de tal forma que uma pontuação mais alta indicava funcionamento cognitivo preservado ou uma pontuação baixa indicava déficits. Para estimar a prevalência de desempenhos inferiores na amostra do estudo, foi definido que abaixo do percentil 25, já indicava desempenho inferior.

As características da amostra e as medidas de resultados das frequências de déficit foram resumidas usando estatísticas descritivas. O teste Qui-quadrado foi usado para comparar diferenças nas características entre os grupos em variáveis categóricas com o objetivo de investigar em que medida o tempo de frequência na classe hospitalar se relacionava com o desempenho neuropsicológico das crianças. As análises estatísticas e inferenciais dos dados foram realizadas com auxílio do software estatístico StatisticalPackage for Social Sciences (SPSS)20 for windows. Adotou-se o valor p≤0,05 como nível de significância em todas as análises e calculados os devidos tamanhos de efeito.

Resultados

Caracterização da amostra

Participaram da presente pesquisa crianças (n=10) de ambos os sexos, com faixa etária entre 8 e 12 anos, contudo, dois foram excluídos, uma por não ter iniciado o processo de alfabetização formal em função do diagnóstico que a impediu de frequentar a escola e o segundo por ter diagnóstico de Tumor no Sistema Nervoso Central. Constituído por cinco (55,6%) crianças sobreviventes da Leucemia Linfoide Aguda (LLA) que receberam apenas tratamento quimioterápico e três outros diagnósticos (37,5%), a saber: Leucemia Mieloide Aguda (n=1); Tumor de Wilms (foi submetido a cirurgia) (n=1) linfomas (n=1) (Tabela 1).

Tabela 1 Características sociodemográficas 

Média DP Min-Max
Idade 9,37 1,40 8-12
Idade de início da escolaridade 5,87 0,64 5-7
Ano Escolar 3,50 1,19 1-5
Classe socioeconômica 15,33 5,22 7-24
FHLE Pais 22,20 13,31 4-43
FHLE Crianças 10,50 13,51 0-44
Idade do diagnóstico 7,25 3,37 1-12
Sexo n (%)
Feminino 4 (50,0%)
Masculino 4 (50,0%)
Tipo de escola n (%)
Pública 8 (100,0%)
Tipo de diagnóstico n (%)
Leucemia Linfoide Aguda 5 (62,5%)
Outros* 3 (37,5%)
Tratamento
Quimioterapia 8 (100,0%)
Cirurgia
Sim 1 (12,5%)
Não 7 (87,5 %)
Duração do Tratamento
2 anos 1 (12,5%)
Em andamento 7 (87,5%)

Fonte: Autoria própria

Os participantes elegíveis foram recrutados via amostragem de conveniência entre novembro de 2021 e junho 2022. A amostra total final foi, então, composta por oito crianças, com idades entre 8 e 12 anos (M=9,37; DP=1,40 anos), matriculadas no ensino fundamental regular, entre o 3º e 7º ano de escolaridade (100% de escolas públicas), quatro meninos e quatro meninas, todos com diagnóstico de câncer em tratamento (87,5%), apenas um já havia terminado o tratamento.

Caracterização sobre a escolarização, aprendizagem e classe hospitalar

Com o objetivo de compreender aspectos sobre a aprendizagem e escolaridade das crianças com câncer infantojuvenil, foi analisada a frequência dos participantes nas seguintes variáveis: interrupção, frequência escolar, tempo fora da escola decorrente do tratamento, se o distanciamento escolar prejudicou a aprendizagem, em que momento retornaram ao ambiente escolar, quedas nas notas, quando internado como foi feito o acompanhamento das atividades escolares, se o professor relatou dificuldades no ambiente escolar regular e a vivência na classe hospitalar. Os resultados sobre a escolaridade e aprendizagem das crianças estão descritos na Tabela 2.

Tabela 2 Questões sobre a classe escolar, escolarização e aprendizagem 

Variáveis escolares e de aprendizagem n= % válida
A criança precisou interromper a frequência escolar, devido ao tratamento?
Sim 7 87,5
Não 1 12,5
Como você classifica o desempenho escolar geral (em média) do (a) a criança/adolescente?
Regular 1 12,5
Bom 5 62,5
Muito bom 1 12,5
Ótimo 1 12,5
Qual a maior dificuldade do (a) a criança/adolescente na escola?
Não soube observar 1 12,5
Leitura 2 25,0
Escrita 3 37,5
Matemática 2 25,0
Reprovações escolares
Sim 2 25,0
Não 6 75,0
Quanto tempo a criança/adolescente (a), ficou fora da escola decorrente do tratamento?
0 a 3 meses 1 12,5
3 a 6 meses 1 12,5
6 meses a 1 ano 3 37,5
mais de 1 ano 3 37,5
Se decorrente do tratamento, a criança/adolescente, necessitou ficar distante da escola, em que medida acredita que o distanciamento da escola prejudicou a criança/adolescente?
Sim 2 25,0
Não 6 75,0
A criança/adolescente voltou à escola durante o tratamento contra o câncer? Ou após o término do tratamento?
Não foi possível observar 1 12,5
durante o tratamento 5 62,5
após o término 1 12,5
não voltou para escola 1 12,5
Vocês observaram queda nas notas da criança/adolescente, após o retorno a escola?
Não foi possível observar 2 25,0
Sim 3 37,5
Não 3 37,5
Caso a criança necessitou de hospitalização. Durante o período de internação, como a criança/adolescente acompanhou as atividades escolares?
classe hospitalar 4 50,0
atividades programadas pela escola 3 37,5
Foram relatadas pelos professores dificuldades de aprendizagem da criança/adolescente, quando retornou à escola?
Variáveis escolares e de aprendizagem n= % válida
Sim 2 33,3
Não 4 66,7
A criança necessitou de atendimento educacional especializado (professora de apoio, sala de recursos, reforço particular, entre outros), quando retornou para escola?
Não 8 100,0
A criança/adolescente caso internado para tratamento, passou pela classe hospitalar?
Sim 8 100,0
Quantas vezes por semana ao longo do tempo de internação que a criança frequentou a classe hospitalar?
3 a 5 vezes por semana 5 62,5
1 ou 2 vezes por semana 3 37,5
Em média, quanto tempo a criança/adolescente ficava em atendimento pedagógico?
Menos de 30 minutos 5 62,7
Mais que 30 minutos 3 37,5
Em média, quanto tempo a criança/adolescente ficava em atendimento pedagógico?
3 a 6 meses 2 25,0
Mais de 1 ano 6 75,0
O professor responsável pelo atendimento a criança/adolescente da classe hospitalar matinha contato com a escola e/ou professor responsável pela classe regular?
Sim 5 71,4
Não 2 28,6
Você acredita que frequentar a classe hospitalar foi uma experiência boa?
Sim 8 100,0
Você acredita que o tempo que a criança/adolescente frequentou a classe hospitalar o ajudou a aprender melhor quando voltou para a escola?
Não 2 25,0
Sim 6 75,0
Você acredita que a criança se beneficiou da classe hospitalar para se sentir mais feliz e motivado durante a hospitalização?
Não 1 12,5
Sim 7 87,5

Fonte: Autoria própria

Desempenho neuropsicológico das crianças com câncer

Os dados foram comparados e analisados a partir do percentil, com as normas oficiais de cada instrumento, considerando-se duas categorias por meio de dois grupos: com déficits (percentil < 25) e sem déficits (percentil ≥ 26). A Tabela 3 demonstra os resultados encontrados.

Tabela 3 Desempenho neuropsicológico da amostra clínica de crianças com câncer infantojuvenil 

Tarefas Neuropsicológicas N % válida
Fluência Verbal Livre
Total
Com déficit 6 75,0
Sem déficit 2 25,0
Tamanho médio total de clusters
Com déficit 2 25,0
Sem déficit 6 75,0
Total Switches
Com déficit 2 25,0
Sem déficit 6 75,0
Returns
Sem déficit 8 100,0
Intersections
Sem déficit 8 100,0
Fluência Verbal Fonológica N % válida
Total
Com déficit 6 85,7
Sem déficit 1 14,3
Tamanho médio do total de clusters
Com déficit 5 71,4
Sem déficit 2 28,6
Switches
Com déficit 4 57,1
Sem déficit 3 42,9
Returns
Sem déficit 7 100,0
Intersections
Sem déficit 7 100,0
Fluência Verbal Semântica N % válida
Total
Com déficit 6 85,7
Sem déficit 1 14,3
Tamanho médio do total de Cluster
Com déficit 5 71,4
Sem déficit 2 28,6
Switches
Com déficit 6 85,7
Sem déficit 1 14,3
Returns
Sem déficit 7 100,0
Intersections
Sem déficit 7 100,0
RAVLT N % válida
A1
Com déficit 2 25,0
Sem déficit 6 75,0
A2
Com déficit 3 37,5
Sem déficit 5 62,3
A3
Com déficit 4 50,0
Sem déficit 5 50,0
A4
Com déficit 2 25,0
Sem déficit 6 75,0
A5
Com déficit 2 25,0
Sem déficit 6 75,0
B1
Com déficit 1 12,5
Sem déficit 7 87,5
A6
Com déficit 2 25,0
Sem déficit 6 75,0
A7
Com déficit 1 12,5
Sem déficit 7 87,5
Reconhecimento
Com déficit 4 50,0
Sem déficit 4 50,0
Total
Com déficit 3 37,5
Sem déficit 5 62,5
Aprendizagem ao longo das tentativas (ALT)
Com déficit 4 50,0
Sem déficit 4 50,0
Velocidade de esquecimento
Com déficit 1 12,5
Sem déficit 7 87,5
Interferência Proativa
Com déficit 2 25,0
Sem déficit 6 75,0
Interferência Retroativa
Com déficit 1 12,5
Sem déficit 7 87,5
Discurso Narrativo Oral n= % válida
Informações Presentes
Com déficit 3 37,5
Sem déficit 5 62,5
Informações Essenciais
Com déficit 3 37,5
Sem déficit 5 62,5
Presentes-Essenciais
Com déficit 3 37,5
Sem déficit 5 62,5
Reconto Integral
Com déficit 4 50,0
Sem déficit 4 50,0
Compreensão do Texto
Com déficit 3 37,5
Sem déficit 5 62,5
Processamento da Inferência
Com déficit 5 62,5
Sem déficit 3 37,5
Discurso Narrativo Escrito N % válida
Informações Presentes
Com déficit 2 28,6
Sem déficit 5 71,4
Informações Essenciais
Com déficit 2 28,6
Sem déficit 5 71,4
Presentes-Essenciais
Com déficit 3 42,9
Sem déficit 4 57,1
Reconto Integral
Com déficit 3 50,0
Sem déficit 3 50,0
Tempo de Leitura
Com déficit 4 57,1
Sem déficit 3 42,9
Compreensão do Texto
Com déficit 4 66,7
Sem déficit 2 33,3
Processamento da Inferência
Com déficit 5 83,3
Sem déficit 1 16,7
D2-R n= % válida
D2 - Total
Com déficit 8 100,0
Objetos Alvos Processados
Com déficit 7 87,5
Sem déficit 1 12,5
Precisão - E%
Com déficit 4 50,0
Sem déficit 4 50,0
Desenho da Figura Humana - IV N % válida
Com déficit 3 37,5
Sem déficit 5 62,5
Teste de Hayling N % válida
Hayling Parte A - Erros
Com déficit 4 57,1
Sem déficit 3 42,9
Hayling Parte A - Tempo
Com déficit 3 42,9
Sem déficit 4 57,1
Hayling Parte B - Erros
Sem déficit 7 100,0
Hayling Parte B - Tempo
Com déficit 1 14,3
Sem déficit 6 85,7
Categoria de Erros
Sem déficit 7 100,0
Tempo B - Tempo B
Com déficit 1 14,3
Sem déficit 6 85,7
Tempo B/Tempo A
Sem déficit 7 100,0
Desempenho Acadêmico - TDE-II N % válida
Escrita
Com déficit 3 42,9
Sem déficit 4 57,1
Eficiência
Com déficit 3 42,9
Sem déficit 4 57,1
Figuras Complexas de Taylor N % válida
Cópia
Com déficit 1 14,3
Sem déficit 6 85,7
Recordação
Com déficit 3 42,9
Sem déficit 4 57,1
NEUPSILIN N % válida
Span de palavras em sentenças
Com déficit 5 71,4
Sem déficit 2 28,6

Fonte: Autoria própria

Foram encontrados déficits em maior frequência nos desempenhos em fluência verbal, processamento de inferências oral e escrito, atenção concentrada e funções executivas, em memória de trabalho e flexibilidade cognitiva.

Frequência na classe hospitalar e desempenho neuropsicológico

Foi realizado um teste de Qui-Quadrado de independência (2x2) com o objetivo de investigar se havia relação entre frequência na classe hospitalar e desempenho neuropsicológico. Os resultados seguem na Tabela 4.

Tabela 4 Frequência na classe hospitalar por semana e desempenho neuropsicológico da amostra clínica de crianças com câncer 

Variáveis Frequência na classe hospitalar Cramer’s V
3 a 5 vezes p/ semana 0 a 2 vezes p/ semana χ2 (gl) ou Fischer Exact Test
Fluência Verbal Livre
Total
Com déficit 5 2 0,32(1)
Sem déficit 1 1
Tamanho médio total de clusters
Com déficit 2 1 0,00 (1)
Sem déficit 4 2
Total Switches
Com déficit 2 1 0,00 (1)
Sem déficit 4 1
Cluster taxonômico
Com déficit 4 1 0,90(1)
Sem déficit 2 2
Cluster temático
Com déficit 1 0 0,56(1)
Sem déficit 5 3
Fluência Verbal Fonológica
Total
Com déficit 5 2 0,37
Sem déficit 0 1
Tamanho médio total de clusters
Com déficit 4 2 0,17(1)
Sem déficit 1 1
Total Switches
Com déficit 3 2 0,03(1)
Sem déficit 2 1
Cluster fonêmico-ortográfico
Com déficit 2 2 0,53(1)
Sem déficit 3 1
Fluência Verbal Semântica
Total
Com déficit 4 3 1,00
Sem déficit 1 0
Tamanho médio total de clusters
Com déficit 4 2 0,17(1)
Sem déficit 1 1
Total Switches
Com déficit 4 3 1,00
Sem déficit 1 0
Cluster taxonômico
Com déficit 3 2 0,03(1)
Sem déficit 2 1
Cluster fonêmico-ortográfico
Com déficit 1 1 0,17(1)
Sem déficit 4 2
Teste de Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey - RAVLT
A1
Com déficit 0 2 0,83
Sem déficit 6 1
A2
Com déficit 3 1 0,22(1)
Sem déficit 3 2
A3
Com déficit 3 1 0,22(1)
Sem déficit 3 2
A4
Com déficit 2 1 0,00(1)
Sem déficit 4 2
A5
Com déficit 2 1 0,00(1)
Sem déficit 4 2
B1
Com déficit 1 1 0,32(1)
Sem déficit 5 2
A6
Com déficit 1 1 0,32(1)
Sem déficit 5 2
A7
Com déficit 1 1 0,32(1)
Sem déficit 5 2
Reconhecimento
Com déficit 3 2 0,22(1)
Sem déficit 3 1
Total
Com déficit 3 1 0,22(1)
Sem déficit 3 2
ALT
Com déficit 2 2 0,90(1)
Sem déficit 4 1
Velocidade de esquecimento
Com déficit 2 0 0,50
Sem déficit 4 3
interferência Proativa
Com déficit 2 1 0,00(1)
Sem déficit 4 2
Interferência Retroativa
Com déficit 1 0 1,00
Sem déficit 5 3
Discurso Narrativo Oral
Informações Presentes
Com déficit 2 2 0,90(1)
Sem déficit 4 1
Informações Essenciais
Com déficit 2 2 0,90(1)
Sem déficit 4 1
Presentes-Essenciais
Com déficit 2 2 0,90(1)
Sem déficit 4 1
Reconto Integral
Com déficit 3 2 0,22(1)
Sem déficit 3 1
Compreensão do Texto
Com déficit 2 2 0,90(1)
Sem déficit 4 1
Processamento da Inferência
Com déficit 4 2 0,00(1)
Sem déficit 2 1
Discurso Narrativo Escrito
Informações Presentes
Com déficit 2 1 0,03(1)
Sem déficit 3 2
Informações Essenciais
Com déficit 2 1 0,03(1)
Sem déficit 3 2
Presentes-Essenciais
Com déficit 2 2 0,53(1)
Sem déficit 3 1
Reconto Integral
Com déficit 2 2 0,19(1)
Sem déficit 2 1
Tempo de Leitura
Com déficit 4 1 1,74(1)
Sem déficit 1 2
Compreensão do Texto
Com déficit 2 3 0,14
Sem déficit 2 0
Processamento da Inferência
Com déficit 3 3 0,42
Sem déficit 1 0
D2-R
Objetos Alvos Processados
Com déficit 5 3 1,00
Sem déficit 1 0
E%
Com déficit 3 2 0,22(1)
Sem déficit 3 1
Desenho da Figura Humana - IV
Com déficit 1 2 2,25(1)
Sem déficit 5 1
Teste de Hayling
Hayling Parte A - Erros
Com déficit 2 2 0,19(1)
Sem déficit 2 1
Hayling Parte A - Tempo
Com déficit 0 3 0,029 0,94
Sem déficit 4 0
Hayling Parte B - Tempo
Com déficit 0 1 0,42
Sem déficit 4 2
Tempo B - Tempo B
Com déficit 1 0 1,00
Sem déficit 3 3
Desempenho Acadêmico - TDE-II
Escrita
Com déficit 2 2 0,53(1)
Sem déficit 3 1
Eficiência
Com déficit 1 0 1,00
Sem déficit 4 3
Figuras Complexas de Taylor
Cópia
Com déficit 1 0 1,00
Sem déficit 3 3
Recordação
Com déficit 2 1 0,19(1)
Sem déficit 2 2
NEUPSILIN
Span de palavras em sentenças
Com déficit 3 2 0,05(1)
Sem déficit 1 1

Nota: χ2 = qui-quadrado; gl = graus de liberdade; *p<0,05

Frequência na classe hospitalar em horas e desempenho neuropsicológico

Foi realizado um teste de Qui-Quadrado de independência (2x2) com o objetivo de investigar se havia relação entre frequência na classe hospitalar em horas e desempenho neuropsicológico. Os resultados seguem na Tabela 5.

Tabela 5 Frequência na classe hospitalar por hora e desempenho neuropsicológico da amostra clínica de crianças com câncer 

Variáveis Frequência na classe hospitalar
Menos de 30 minutos Mais de 30 minutos χ2 (gl) ou Fischer Exact Test
Fluência Verbal Livre
Total
Com déficit 4 3 0,85(1)
Sem déficit 1 1
Fluência Verbal Fonológica
Total
Com déficit 3 4 1,00
Sem déficit 1 0
Fluência Verbal Semântica
Total
Com déficit 4 3 1,00
Sem déficit 0 1
Teste de Aprendizagem Auditivo-Verbal de Rey - RAVLT
A1
Com déficit 2 0 0,44
Sem déficit 3 4
A2
Com déficit 2 2 0,76(1)
Sem déficit 3 2
A3
Com déficit 3 1 0,29(1)
Sem déficit 2 3
A4
Com déficit 2 1 0,63(1)
Sem déficit 3 3
A5
Com déficit 2 1 0,63(1)
Sem déficit 3 3
B1
Com déficit 1 1 0,85(1)
Sem déficit 4 3
A6
Com déficit 2 0 0,44
Sem déficit 3 4
A7
Com déficit 1 1 0,85(1)
Sem déficit 4 3
Reconhecimento
Com déficit 3 2 0,76
Sem déficit 2 2
Total
Com déficit 3 1 0,29(1)
Sem déficit 2 3
ALT*
Com déficit 4 0 0,04
Sem déficit 1 4
Velocidade de esquecimento
Com déficit 1 1 0,85(1)
Sem déficit 4 3
Interferência Proativa
Com déficit 2 1 0,63(1)
Sem déficit 3 3
Interferência Retroativa
Com déficit 0 1 0,44
Sem déficit 5 3
Discurso Narrativo Oral
Informações Presentes
Com déficit 3 1 0,29(1)
Sem déficit 2 3
Informações Essenciais
Com déficit 3 1 0,29(1)
Sem déficit 2 3
Reconto Integral
Com déficit 3 2 0,76(1)
Sem déficit 2 2
Compreensão do Texto
Com déficit 3 1 0,29(1)
Sem déficit 2 3
Processamento da Inferência
Com déficit 4 2 0,34(1)
Sem déficit 1 2
Discurso Narrativo Escrito
Informações Presentes
Com déficit 2 1 0,46(1)
Sem déficit 2 3
Informações Essenciais
Com déficit 2 1 0,46(1)
Sem déficit 2 3
Reconto Integral
Com déficit 3 1 0,27(1)
Sem déficit 1 2
Tempo de Leitura
Com déficit 2 3 0,46(1)
Sem déficit 2 1
Compreensão do Texto
Com déficit 4 1 0,14
Sem déficit 0 2
Processamento da Inferência
Com déficit 4 2 0,42
Sem déficit 0 1
D2-R
Objetos Alvos Processados
Com déficit 4 4 1,00
Sem déficit 1 0
E%
Com déficit 3 2 0,76(1)
Sem déficit 2 2
Desenho da Figura Humana – IV
Com déficit 3 0 0,16
Sem déficit 2 2
Teste de Hayling
Hayling Parte A - Erros
Com déficit 2 2 0,65(1)
Sem déficit 2 1
Hayling Parte A - Tempo
Com déficit 3 0 0,14
Sem déficit 1 3
Hayling Parte B - Tempo
Com déficit 1 0 1,00
Sem déficit 3 3
Tempo B - Tempo B
Com déficit 0 1 0,42
Sem déficit 4 2
Desempenho Acadêmico - TDE-II
Escrita
Com déficit 3 1 0,15(1)
Sem déficit 1 3
Eficiência
Com déficit 3 1 0,15(1)
Sem déficit 1 3
Figuras Complexas de Taylor
Cópia
Com déficit 1 0 1,00
Sem déficit 3 3
Recordação
Com déficit 2 1 0,65(1)
Sem déficit 2 4
NEUPSILIN - Span de palavras em sentenças
Com déficit 3 2 0,80(1)
Sem déficit 1 1

Nota: c2 = qui-quadrado; gl = graus de liberdade; *p<0,05

Diante das análises, foi encontrada uma diferença significativa em aprendizagem ao longo das tentativas – ALT. As crianças que frequentaram a classe hospitalar por mais de 30 minutos, comparadas às que frequentavam por menos de 30 minutos, apresentavam a capacidade aprender ao longo de várias exposições do mesmo conteúdo por mais tempo.

Discussão

Foram encontrados como resultados preliminares déficits em maior frequência nos desempenhos em fluência verbal, processamento de inferências oral e escrito, atenção concentrada, funções executivas, em memória de trabalho e flexibilidade cognitiva. Os déficits encontrados estão em consonância com a literatura até então pesquisada (Chiou et al., 2019; Peng et al., 2021; Pierson et al., 2016; Richard et al., 2018; Siegwart et al., 2022).

A grande maioria das crianças interrompeu a frequência escolar devido ao diagnóstico, e a maioria dos pais afirmou que o distanciamento escolar não prejudicou a aprendizagem. Metade das crianças retornaram ao ambiente escolar regular durante o tratamento e não foi observado pelo professor dificuldades de aprendizagem, contudo, os pais observaram quedas nas notas. Tais achados devem ser observados com cautela, pois por mais que os pais relatassem que o distanciamento não prejudicou sua aprendizagem e os professores não tenham observado dificuldades, o desempenho acadêmico das crianças, em suas notas, foi rebaixado, o que pode ser observado com um dos possíveis impactos da interrupção da frequência escolar para o desempenho acadêmico da própria criança.

Todas as crianças passaram pela classe hospitalar enquanto estavam internadas, a maioria frequentava de três a cinco vezes por semana, por menos de 30 minutos. A maioria dos pais relatou que a classe hospitalar foi uma boa experiência para a criança, que elas se sentiam mais felizes e motivadas e ajudou na aprendizagem quando retornou para o ensino regular.

Outro achado preliminar foi que as crianças que frequentaram a classe hospitalar de 3 a 5 vezes por semana, quando comparadas com as que frequentavam 0 a 2 vezes por semana, tiveram melhor desempenho em velocidade de processamento entre as variáveis. Elas tinham entre 8 e 12 anos e, quando analisado o tempo que ficaram em atendimento, não apresentaram diferenças significativas, a maioria frequentou por mais de um ano (75%).

Houve diferença das crianças que passaram mais de 30 minutos em atendimento pedagógico hospitalar diários, daquelas que ficaram por menos de 30 minutos. Apresentaram melhores escores em memória de curto prazo, melhores índices de consolidações de informações recorrendo à linguagem pragmática. Já quando era necessário fazer o uso de funções executivas, demonstraram necessitar de mais tempo, foram lentificadas.

Dados esses que corroboram a hipótese preliminar inicial de que a classe hospitalar pode funcionar como preditor do desempenho cognitivo das crianças com câncer infantil. Em um estudo conduzido por Irwin et al. (2015), foi identificado que os pacientes com diagnóstico de leucemia ou linfoma requerem um pouco mais de suporte educacional, em média 8:00 horas, do que pacientes com outros diagnósticos.

Mediante as análises dos efeitos da ‘desescolarização’, a grande maioria das crianças interrompeu a frequência escolar devido ao diagnóstico n=7 (87,5), e a maioria dos pais afirmou que o distanciamento escolar não prejudicou a aprendizagem n=6 (75,0%). Metade das crianças retornaram ao ambiente escolar regular durante o tratamento n=5 (62,5%) e não foram observadas pelo professor dificuldades de aprendizagem n=4 (66,7%).

Todas as crianças passaram pela classe hospitalar enquanto estavam em tratamento n=8 (100%), a maioria frequentava de três a cinco vezes por semana n=5 (62,5%), por menos de 30 minutos n=5 (62,5%). Todos os pais relataram que a classe hospitalar foi uma boa experiência para as crianças n=8 (100%), que se sentiam mais felizes e motivadas n=7 (87,5%) e ajudou na aprendizagem quando retornaram para o ensino regular n=6 (75,0%). Nossos dados estão atrelados conforme dados da literatura (Ellis et al., 2013; Lee, 2020; Thabrew et al., 2022; Tsimicalis et al., 2018). Portanto, pode-se observar que a interrupção da frequência escolar nessa população clínica é quase inerente ao tratamento, como se pode observar nos resultados preliminares obtidos, em que mais de 85,5% interromperam sua frequência regular.

O diagnóstico de câncer na infância é um grande evento de mudança de vida para crianças e suas famílias, e um dos custos de produtividade é o impacto do diagnóstico de câncer na educação das crianças. Elas faltam à escola para se submeterem ao tratamento e lidar com a multiplicidade de efeitos colaterais (enjoo, vômitos e indisposição física).

Portanto, as crianças estarem em contato com um ambiente de aprendizagem (classe hospitalar) em conjunto com outras crianças é um fator que pode melhorar a qualidade de vida e a motivação delas. Estudos nacionais ainda não foram conduzidos de modo quantitativo sobre classe hospitalar e fator de motivação das crianças. Um estudo internacional mais próximo dos nossos achados foi uma revisão que indica que o uso de tecnologias com crianças e jovens em hospitais geralmente aumenta seu potencial de aprendizagem e melhora a conectividade com a escola. Tais descobertas revelaram que a implementação de pedagogias digitais e a criação de comunidades online foram recursos úteis para as crianças hospitalizadas (Maor & Mitchem, 2015).

Outro fator importante a ser considerado é que esse estudo foi conduzido durante o momento de pandemia da COVID-19. As crianças com câncer infantil já vivenciam um isolamento escolar, e devido às medidas de segurança implementados pelos órgãos de saúde, elas também vivenciaram o isolamento social em domicílio. Os estudos internacionais encorajam que as crianças com câncer devam retornar à escola quanto antes (Thompson et al., 2015). Contudo, com as escolas fechadas durante a pandemia o retorno não foi viável.

Um estudo conduzido por meio de entrevistas em centros de oncologia pediátrica pertencentes à Sociedade Alemã de Oncologia e Hematologia Pediátrica recomendou participação social regular/frequência escolar após o término da terapia intensiva, 81% afirmaram que as restrições persistentes resultam em graves consequências psicossociais negativas para os pacientes e suas famílias. A educação escolar intra-hospitalar, a educação em casa e a frequência da escola e do jardim de infância entre pacientes com câncer pediátrico sofreram um grave revés durante a pandemia de COVID-19 (Simon et al., 2021).

Além disso, não se pode deixar de considerar o contexto pandêmico, pois a ‘desescolarização’ devido ao tratamento e ao isolamento imposto como medida de segurança, podem também ter efeito no funcionamento neuropsicológico das crianças. Uma série de estratégias de saúde pública baseadas em intervenções não farmacêuticas foi aplicada em todo o mundo para controlar a disseminação da COVID-19, incluindo isolamento de casos confirmados, rastreamento de contatos, quarentena de pessoas expostas, restrições de viagem, fechamento de escolas e locais de trabalho, entre outros. Essas estratégias podem estar associadas a pior saúde mental e desenvolvimento de crianças e adolescentes em idade escolar (Huang et al., 2021).

Considerações

Esse estudo buscou contribuir com o conhecimento da realidade brasileira e internacional – demonstrando ainda a carência nos relatos dos desfechos neuropsicológicos de crianças com câncer infantil em tratamento que recebem assistência da classe hospitalar pela rede pública de ensino e saúde – , a fim de elucidar a importância nacional de que esse mapeamento do exame neuropsicológico, com o objetivo de trazer possíveis déficits e potencialidades, para se pensar e estruturar planos de intervenção, a fim de que seu neurodesenvolvimento possa ocorrer com maior qualidade de vida possível em conjunto com a classe hospitalar que se mostrou uma grande aliada para manter a criança em contato com os pares e promover maior qualidade de vida.

O presente estudo apresentou algumas limitações que devem ser mencionadas, devido às condições clínicas das crianças em tratamento, o número da amostra foi baixo, e os resultados encontrados devem ser analisados com cautela, mas são importantes para uma discussão preliminar, a fim de continuar o mapeamento dos déficits, pois ainda se carece de informações acerca de como a neuropsicologia pode contribuir com a pedagogia hospitalar e com essa população clínica, dado que o número de pais que aderiam à proposta foi baixo.

A compreensão dos desfechos neuropsicológicos associados aos quadros de câncer infantil podem auxiliar no manejo clínico de tratamentos e orientações para pacientes e familiares. A variabilidade de diagnóstico e tratamento são uma limitação para conseguir amostras suficientes que permitam comparações. Apesar da necessidade de estudos que reflitam a prática da Pedagogia Hospitalar, é recomendado que pesquisas futuras fortaleçam suas bases ao invocar recursos adicionais que justifiquem a frequência à sala de Atendimento Pedagógico Escolar (APE), identificando fatores mais conclusivos por meio de grupos-controle.

Recomenda-se que próximos estudos haja um acompanhamento longitudinal das crianças com diagnóstico de câncer, levantamento de sintomas pródomos, funcionamento cognitivo pregresso dos alunos e o contexto em que estão inseridos: família, equipe de saúde, processo de escolarização entre outros. A fim de acompanhar os possíveis déficits neuropsicológicos e possíveis comorbidades com transtornos do neurodesenvolvimento e seu impacto no desenvolvimento e consequências para a vida adulta dos sobreviventes, bem como as dosagens de quimioterapia, sintomatologia inicial, saúde mental das crianças e dos pais.

O estudo atual não aprofundou nas características pedagógicas da classe hospitalar, sugere-se que estudos futuros elaborarem pesquisas que possam compreender a relação da classe hospitalar (metodologias pedagógicas, vivências dos professores e quais consequências na reinserção escolar) e desempenho cognitivo, avaliando as estratégias usadas pelos professores com as crianças hospitalizadas para a promoção e prevenção do neurodesenvolvimento infantil.

Portanto, diversos elementos, como a adaptação à hospitalização, as estratégias de enfrentamento familiares, os fatores de risco e de promoção ao desenvolvimento, a consideração dos tipos de cânceres infantojuvenis e as condutas invasivas de investigação diagnóstica, têm um impacto direto no desempenho geral de cada aluno. Todos esses aspectos devem ser considerados ao responder aos instrumentos de avaliação.

Transformar este artigo em uma contribuição para a área da Pedagogia Hospitalar requer estabelecer um diálogo profícuo entre a Neuropsicologia e a Psicopedagogia. Embora ambas as disciplinas partam de premissas e campos de aplicação específicos, o intercâmbio de conhecimentos certamente enriquece e proporciona uma análise sólida do aluno hospitalizado.

Consequentemente, ao considerarmos as características individuais de cada aluno participante deste ou de qualquer outro estudo, devemos levar em conta parâmetros e referências anteriores para identificar possíveis obstáculos no desenvolvimento e mudanças significativas em suas emoções, comportamento e desempenho cognitivo. Essa abordagem holística garantirá uma compreensão mais completa e aprimorada dos desafios enfrentados por esses alunos em contexto hospitalar.

Referências

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Trabalho realizado no Centro de Tratamento Onco Hematológico Infantil do Hospital Regional de Mato Grosso do Sul, Campo Grande, MS, Brasil.

Recebido: 24 de Julho de 2023; Aceito: 5 de Novembro de 2023

Correspondência: Pablo Silva de Lima Universidade Federal do Mato Grosso do Sul Av. Costa e Silva s/no – Campo Grande, MS, Brasil, – CEP 79070-900 E-mail: psipablo.lima@gmail.com

Conflito de interesses: Os autores declaram não haver.

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