Introdução
A escola organizada na perspectiva da Educação Especial tem como função complementar e suplementar o currículo de estudantes com deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação (AH/SD). Na Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva (Brasil, 2008), a educação especial é compreendida como modalidade transversal de ensino desde a Educação Infantil até a Educação Superior.
O Censo Escolar da Educação Básica do ano de 2021 (Brasil, 2022) mapeou 23.758 estudantes matriculados com AH/SD no segmento da Educação Especial em escolas brasileiras. Um número muito aquém do esperado, quando se estima que haja 2,3 milhões de estudantes com AH/SD no Brasil (Souza, 2021). Entende-se que o principal desafio hoje que reflete em um número tão baixo de alunos atendidos seja a dificuldade na identificação do público-alvo.
A identificação do estudante com AH/SD é fundamental para garantir o efetivo planejamento de intervenções educacionais que suplementem o currículo. Essa identificação envolve uma diversificação de instrumentos e deve ser utilizada para propor medidas que facilitem seu pleno desenvolvimento, prevenindo comportamentos desafiadores, desinteresse pela disciplina e/ou baixo rendimento devido à falta de motivação (Pasian, 2020; Pasian & Souza, 2022).
Destacam-se duas importantes teorias que devem ser consideradas para identificação e compreensão das altas habilidades/superdotação, a destacar: a) teoria das múltiplas inteligências de Gardner, que propõe que o ser humano é dotado de oito inteligências distintas, sendo elas linguística, musical, lógico-matemática, espacial, corporal cinestésica, interpessoal, intrapessoal e naturalista, que podem aparecer de forma conjunta ou não, b) teoria dos três anéis de Renzulli, considerada e utilizada em diversos países para a identificação da pessoa com AH/SD. Essa teoria mostra a interligação de três traços do comportamento, que são as habilidades gerais e/ou específicas acima da média, elevados níveis de comprometimento com a tarefa e elevados níveis de criatividade (Freitas & Perez, 2012; Pasian, 2020; Pasian & Souza, 2022; Renzulli, 2004). A teoria de Renzulli faz-se importante para o presente artigo, pois, dentre outras reconhecidas contribuições, enfatiza o comportamento de superdotação. Para o autor, mais importante do que “ser” superdotado, é possibilitar ao estudante com elevado potencial o desenvolvimento de comportamentos superdotados e criativos, por meio do comprometimento com a tarefa (Renzulli, 2004).
Estudantes com AH/SD, em geral, são percebidos quando apresentam comportamentos desafiadores. Outras vezes, esse aluno permanece invisível desde o ensino básico até o superior, sem apoio de qualquer natureza ou atendimento e suporte. Destaca-se que no Brasil há poucos programas direcionados para auxiliar nas necessidades e no desenvolvimento dos superdotados, que estão presentes em todas as camadas sociais (Pasian, 2020; Pasian & Souza, 2022).
O aluno com AH/SD pode apresentar, em diversos momentos, déficits socioemocionais e comportamentais, que afetam sua interação com os pares, sua relação com os professores e, com isso, problemas na sua socialização e relação com todos envolvidos no ambiente escolar (Freitas & Perez, 2012; Ourofino & Fleith, 2011; Pfeiffer, 2015; Rice et al., 2006).
Os comportamentos desafiadores podem derivar ou ser consequência da falta de interesse e alguns estudantes com AH/SD podem, inclusive, apresentar baixo rendimento escolar em uma ou várias disciplinas (Azevedo & Mettrau, 2010; Mendaglio, 2013). Isso ocorre porque os alunos com AH/SD podem estar acima da média em termos de rendimento pedagógico e, ao mesmo tempo, apresentarem sentimentos negativos. Com isso, podem ficar desmotivados, sem interesse ou atenção, dispersar em outros pensamentos ou atitudes, o que os leva à não aprendizagem e, por vezes, a comportamentos inadequados em sala de aula.
A falta de detecção e, consequentemente, a falta de acompanhamento do aluno com AH/SD pode favorecer a baixa autoestima, a identificação equivocada, a desmotivação, os comportamentos desafiadores e a baixa qualidade de relacionamentos no ambiente escolar, o baixo rendimento e a evasão. Espera-se que, ao propor intervenções fundamentadas em evidências científicas, seja possível encontrar alternativas para garantir a permanência estudantil, assim como o sucesso educacional e aproveitamento produtivo de suas habilidades.
Novos instrumentos têm sido utilizados na educação especial para identificação de comportamentos, assim como para auxiliar na análise de dados coletados por desempenho (e.g. acerto) e orientar o planejamento de intervenções mais personalizadas. Assim, o uso de medidas implícitas oriundas do processamento visual tem sido utilizado e documentado na literatura, como o uso em pessoas com autismo e deficiência intelectual (DI) (Cavalcante et al., 2020), bem como de respostas hemodinâmicas do córtex pré-frontal (Barreto et al., 2021).
A medida implícita de rastreio ocular tem contribuído na análise de controle de estímulos que, em geral, não pode ser realizada de forma observacional, como é o caso do número e tempo de fixações oculares, visando a análise de processamento visual. Ao considerar o olhar como um comportamento operante, controlado por condições ambientais e mantido por consequências, entende-se que a partir de sua avaliação é possível identificar aspectos relacionados ao controle atencional da estudante. O uso das medidas implícitas, principalmente em análises de sujeito único, tem sido importante para o fim de planejamento de tarefas personalizadas, com refinamento do controle de estímulos, a fim de garantir a aprendizagem e a manutenção do foco atencional de estudantes no procedimento de ensino.
Mediante a discussão sobre a identificação do comportamento talentoso, seja por meio de avaliações neuropsicológicas, de processamento visual e de resposta cerebral hemodinâmica, é fundamental sistematizar os procedimentos utilizados recentemente na área. Ao identificar a AH/SD, o próximo passo é propor o planejamento de serviços de permanência, por meio de intervenções baseadas em evidências.
O atendimento educacional especializado (AEE) enquanto serviço de apoio suplementar ao processo de escolarização pode ter como função possibilitar a oportunidade de aprimorar competências psicológicas. Esse atendimento pode ocorrer de diversas formas, sendo o mais comum os programas de suplementação (Brasil, 2008), por meio dos quais o estudante pode ter acesso a atividades extraclasse oferecidas ao aluno, em espaços fora da sala de aula da escola regular e os programas de enriquecimento curricular, que podem ocorrer dentro ou fora da sala de aula regular. Menos comuns, mas ainda possíveis, são os programas de aceleração curricular, que possibilitam ao aluno o término dos estudos em menor tempo do que o previsto (Brasil, 1996; Brasil, 1997; Brasil, 2001).
Mediante a discussão proposta para garantia de uma escola que deverá oferecer as mesmas oportunidades para todas as pessoas, por meio de serviços educacionais especializados de qualidade, aplicados e avaliados por profissionais formados em práticas baseadas em evidências na Educação Especial, são propostos os seguintes questionamentos: Como a literatura tem caracterizado e definido o comportamento talentoso? Quais são os procedimentos avaliativos que a literatura utiliza na identificação das AH/SD? Ao responder às questões, espera-se encontrar um conjunto de informações sistematizadas e instrumentos que possam orientar quanto à avaliação do comportamento talentoso. No presente trabalho, o estudo do comportamento talentoso foi fundamentado no modelo teórico de concepção dos três anéis de Renzulli (2004) e teve como ponto inicial para a intervenção a avaliação de comportamentos talentosos (que se referem aos comportamentos específicos das pessoas com AH/SD).
Além de caracterizar e identificar o comportamento talentoso, é fundamental pensar em ações de permanência baseadas em evidências que possam ser oferecidas como suplemento ao processo educacional, o que seria função do AEE segundo a Política Nacional de Educação Especial na perspectiva da educação Inclusiva (Brasil, 2008). Quais são as práticas e programas de intervenção que podem ser implementados no contexto da escola pública brasileira, marcada pelas desigualdades educacionais? Espera-se que ao responder tal questionamento seja possível traçar protocolos que orientem serviços educacionais suplementares de qualidade no contexto escolar.
Uma forma de validar as intervenções pode ser por meio do uso de medidas implícitas adicionais, que orientam quanto ao (re)planejamento educacional, garantindo, assim, a personalização do procedimento de avaliação e de ensino. Nesta área, a literatura tem documentado o uso do rastreamento ocular e espectrografia funcional de infravermelho próximo, conforme documentado anteriormente. Questiona-se então como tem sido utilizada a medida de oxigenação cerebral no córtex pré-frontal envolvendo pessoas com AH/SD. E, de maneira complementar, questiona-se sobre como a medida de rastreamento ocular tem sido utilizada na literatura prévia e, o que traz evidências sobre o processamento visual de pessoas com AH/SD? Espera-se que tais informações sejam úteis no planejamento de intervenções educacionais mais personalizadas.
Assim sendo, o estudo teve como objetivo geral analisar na literatura quais estratégias têm sido utilizadas para caracterização e sistematização da avaliação da AH/SD, incluindo instrumentos e recursos avaliativos. E como objetivo específico identificar e caracterizar intervenções baseadas em evidências com função suplementar ao processo de escolarização. Espera-se com este levantamento reunir um conjunto de informações que possam orientar as políticas públicas educacionais na perspectiva da Educação Especial.
Método
O presente método foi elaborado com base nas orientações de Ramos et al. (2014) e Souza et al. (2022) para identificar e caracterizar o processo de escolarização de estudantes com AH/SD na educação inclusiva brasileira. As buscas para esse levantamento foram realizadas no ano de 2021. Foram consultadas três bases de dados: Periódicos Eletrônicos de Psicologia (PePSIC), Scientific Electronic Library Online (SciELO) e o American Psychological Association PsycNet - Journals (PsycInfo). Em cada uma delas, usou-se o filtro de inclusão cruzado com um grupo de termos para designar pessoas com AH/SD, sendo “Altas habilidades”, “Superdotação”, “Talento”, “Comportamento talentoso”, “Dotação”, “Sobredotação”, “Sobredotado”, “highly gifted”, “Talent”, “talented”, “giftedness”, “high cognitive abilities”, “gift”, “High abilities” e “Altas habilidades/superdotación”.
Como critérios de seleção, usaram-se: a) não ter sido encontrado em string anterior; b) gratuidade e acesso ao documento; c) mencionar pessoas com altas habilidades ou superdotação ou comportamento talentoso. Para verificar os critérios, foram utilizados strings e selecionados todos os artigos disponíveis, que não eram redundantes e que mencionaram o público-alvo.
Após estes procedimentos, encontram-se 70 trabalhos atrelados à inclusão, dos quais foram selecionados para leitura integral 19. Na Tabela 1 estão disponíveis as strings encontradas e sua efetividade. Não foram inseridos os dados da plataforma PePSIC1, pois não houve resultados para nenhuma das strings utilizadas.
A Tabela 2 mostra o número de estudos considerados como resultados na proposta do estudo.
Para análise e tratamento dos dados, foi elaborada uma ficha contendo trechos e comentários acerca da leitura integral realizada em cada artigo, conforme recomendação dada por Severino (2007). Os dados encontrados foram usados para preencher uma tabela, cujas colunas representam as categorias de análise, sendo as seis questões anteriormente apontadas, além de: a) Autor(a)(es); b) Ano de Publicação; c) País dos autores; d) Tipo de documento; e) Palavras-chave; f) Objetivo(s); g) Participantes; h) Etapa escolar; i) Recomendação para estudos futuros; j) Conclusão; k) Resumo; l) Comentário (s);
De um total de 19 estudos recuperados pelos critérios de seleção e selecionados para leitura integral, nove foram excluídos, pois não tratavam explicitamente sobre o tema proposto, não envolvendo pessoas com comportamento talentoso na perspectiva da educação especial e inclusiva. Assim, especificamente, foram excluídos os textos de: a) Katz et al. (2008), Neves (2017), Vieira e Ramos (2018) e Wuo (2019) que apareceram na busca por mencionarem nosso público como parte da Educação Especial, contudo, seus enfoques eram outro grupo, como pessoas com DI, transtorno do espectro autista, etc., não contribuindo com o debate aqui proposto; b) Zhang et al. (2021) e Simonetti et al. (2021), não trabalham com nenhum público do público do atendimento especial especializado, debatendo, respectivamente, sobre nanofibras e o burnout de enfermeiros do Chile; c) Perez et al. (2020) e Vernon (1992), cujo documento principal e completo não estava disponível, apenas trechos; d) Comas-Díaz (2000) produziu uma nota de correção de uma citação de artigo anterior, sem fazer referência ao público-alvo delineado no presente trabalho.
Quanto à apresentação dos dados, verificou-se os objetivos em seis questões guias, a saber: 1) Como a literatura tem caracterizado e definido o comportamento talentoso e a pessoa com AH/SD? 2) Quais os serviços educacionais especializados identificados e documentados na busca, no contexto da inclusão escolar? 3) Quais são os procedimentos avaliativos que a literatura relata utilizar na identificação das AH/SD? 4) Há evidências sobre a sistematização e os programas de intervenção de ensino envolvendo a inclusão escolar de pessoas com AH/SD? 5) Como o processo cognitivo que envolve de maneira geral a inteligência e, de maneira mais específica, os correlatos neurais identificados no córtex pré-frontal têm sido documentados e avaliados, nos estudos identificados na busca sistematizada? 6) Como a medida de rastreamento ocular tem sido utilizada nos artigos recuperados e o que evidenciam sobre o processamento visual de pessoas com AH/SD?
Resultados e Discussão
Com base no método proposto, a amostra de resultado foi constituída por um total de 11 trabalhos científicos (Attoni et al., 2020; Barrera & Freitas, 2011; Cabellos & Lozano, 2016; Darub et al., 2020; Hidalgo, 2017; Jelinek & Bello, 2018; Mettrau & Reis, 2007; Oliveira et al., 2022; Pizarro, 2018; Rosin-Pinola et al., 2007; Streiechen et al., 2020). De maneira a contextualizar melhor os trabalhos, inicialmente descreveu-se sinteticamente o contexto da pesquisa, informando o ano, palavras-chave, o país de origem e as englobando em categorias temáticas. A Figura 1 mostra maior número de publicações no ano de 2020 (n=3), em relação aos demais anos. Já em relação às palavras-chave, a nomenclatura que retornou maior número de estudo, conforme objetivo estabelecido na proposta, foi altas habilidades (n=5), seguida de superdotação (n=3) e talento (n=2). E, em relação ao país de origem, os estudos foram desenvolvidos no Brasil (8), Chile (2) e Costa Rica (1).

Fonte: Elaboração própria.
Figura 1 Análise biométrica dos estudos distribuídos em ano de publicação, palavra-chave e país de origem de autores
O Quadro 1 evidencia os principais temas analisados no conjunto de estudos recuperados pela busca, a partir de conceitos delineados no contexto da Educação Especial, objetivos específicos dos estudos, assim como as conclusões.
Quadro 1 Categorias temáticas dos resultados analisados no presente estudo
Categoria | Descrição com base nos objetivos e conclusões dos estudos |
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Práticas escolares | AH/SD e ensino de matemática com uso de jogo (Jelinek & Bello, 2018). Análise das particularidades cognitivas envolvidas no processo de aprendizagem (Streiechen, et al., 2020). |
Trajetória de vida e escolar | Etnografia de um filho com AH/SD com uma mãe surda em contexto familiar multilinguístico (Streiechen, et al., 2020). |
Políticas públicas | Os dados orientam a urgência de políticas públicas para proposição de sequências didáticas e estratégias escolares para AH/SD (Streiechen, et al., 2020). Analisar aspectos das políticas públicas voltadas para o atendimento dos indivíduos com AH/SD no país, no contexto da educação especial/inclusiva (Mettrau & Reis, 2007). |
Formação docente e ampliação curricular | Urgência de componentes curriculares na área da educação especial e inclusiva (Streiechen, et al., 2020). Inclusão de um módulo de AH/SD nos cursos de formação para o atendimento educacional especializado (Barrera & Freitas, 2011). A falta de orientações específicas, a formação permanente e acompanhamento dos docentes regulares são imprescindíveis para oferecer uma estratégia educacional viável para potencializar habilidades psicomotoras (Cabellos & Lozano, 2016). Aponta para a necessidade de mudanças na estrutura curricular, de forma que todos os grupos da educação especial sejam atendidos no processo de formação dos futuros professores (Darub et al., 2020). |
Serviço educacional especializado | A inclusão educativa é um processo que deve iniciar desde os primeiros anos de vida, vê-se a necessidade de reorganização do currículo do curso de Pedagogia com vistas a ampliar a reflexão teórico-prática acerca do atendimento educacional do estudante com deficiência nos diferentes níveis da educação básica (Darub et al., 2020). |
Comportamento verbal | Aspectos específicos na linguagem de crianças identificadas com AH/SD (Attoni et al., 2020). |
Desenvolvimento socioemocional | Investimento em procedimentos que permitam aos alunos, com deficiência ou não, adquirir repertórios sociais e acadêmicos para o desenvolvimento interpessoal e socioemocional (Rosin-Pinola et al., 2007). Indica poucas pesquisas na área de AH/SD com crianças, principalmente nos aspectos emocionais e sociais. Em geral, é avaliado apenas a frequência das habilidades sociais (Oliveira et al., 2022). |
Avaliação do comportamento talentoso | A base cognitiva não é o único fator determinante para a manifestação e desenvolvimento de potencialidades, aspectos externos e ambientais impactam na potencialização das capacidades (Pizarro, 2018). |
Em relação à formação de profissionais, sobretudo docentes, por um lado a revisão identificou como ponto nevrálgico a urgência de políticas públicas que garantam a formação docente inicial e continuada em Educação Especial (Barreira & Freitas, 2011; Cabellos & Lozano, 2016; Darub et al., 2020; Streiechen et al., 2020) e, por outro lado, a carência de estudos que operacionalizam a variável formação do ponto de vista pedagógico e atitudinal, como foi o caso do estudo de Benitez et al. (2021) que mostra a proposta de formação em Análise do Comportamento (AC) a docentes atuantes na área do autismo, evidenciando que ao entrar em contato teórico e prático com tais componentes curriculares, as professoras participantes da formação desenvolveram atitudes sociais mais favoráveis à inclusão, dado o potencial empírico da AC.
Sugere-se que estudos futuros possam desenvolver propostas pedagógicas formativas operacionalizadas com base na literatura, de modo a avaliar as atitudes sociais de docentes, no contexto da sala de aula envolvendo a interação com estudantes com comportamento talentoso.
1) Como a literatura tem caracterizado e definido o comportamento talentoso e a pessoa com AH/SD?
A revisão sistemática mostrou que a literatura tem analisado o comportamento talentoso sobre perspectivas distintas, que ao compreendê-las conjuntamente são passíveis de complementação. Assim, o Quadro 2 mostra como as AH/SD estão sendo definidas.
Quadro 2 Definições de AH/SD conforme documentos normativos
Documentos | Definições |
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LDB 5692/71 (Brasil, 1971, art. 9º) | Altas habilidades/superdotação, talento e genialidade em crianças e jovens, muitas vezes, mesmo considerando a precocidade, não manifestam toda a sua capacidade. Portanto, para as evidências das altas habilidades/superdotação é necessário constância de elevada potencialidade de aptidões, talentos e habilidades ao longo do tempo, além de expressivo nível de desempenho. |
Política Nacional de Educação Especial (Brasil, 1995) | Capacidade intelectual geral; aptidão acadêmica específica, pensamento criativo ou produtivo; capacidade de liderança; talento especial para as artes e capacidade psicomotora com os seguintes tipos: Tipo Intelectual, Tipo Acadêmico, Tipo Criativo, Tipo Social, Tipo Talento Especial e Tipo Psicomotor. |
Resolução nº 2/2001, Art. 5º (Brasil, 2001) | Caracteriza alunos com AH/SD aqueles que possuem “grande facilidade de aprendizagem que os levem a dominar rapidamente conceitos, procedimentos e atitudes”. |
Brasil (2008, p. 15) | Alunos com AH/SD são aqueles que demonstram potencial elevado em qualquer uma das seguintes áreas, isoladas ou combinadas: intelectual, acadêmica, liderança, psicomotricidade e artes. Também apresentam elevada criatividade, grande envolvimento na aprendizagem e realização de tarefas em áreas de seu interesse. |
Resolução nº 4/2009 (Brasil, 2009, p. 1) | Apresentam um potencial elevado e grande envolvimento com as áreas do conhecimento humano, isoladas ou combinadas: intelectual, liderança, psicomotora, artes e criatividade. |
Conselho Superior de Peritos em Altas Capacidades, (2008 apud Pizarro, 2018) | São definidas como um conjunto de fenômenos cognitivos, emocionais e motivacionais que requerem alto potencial intelectual, multidimensionalmente configuradas em diferentes aptidões que se desenvolvem ao longo da vida e se manifestam na idade adulta. Estão relacionadas ao bom desenvolvimento cognitivo, alto nível de desempenho em habilidades acadêmicas, pensamento criativo, imaginação, habilidades espaciais, etc., características com as quais, como um todo, souberam se referir aos termos precoce, brilhante, dotado, excepcional. |
Jelinek e Bello (2018) | Pessoas habilidosas em leitura e escrita e que podem, ao mesmo tempo ficarem aborrecidas, desatentas e frustradas. Também podem apresentar um pensamento crítico e abstrato e, ao mesmo tempo, demonstrar desconforto com a repetição e memorização; às vezes são excessivamente ativos, e tal comportamento pode ser confundido com hiperatividade. AH/SD é definida como conjunto de padrões linguísticos, epistemológicos e históricos que moldam as ações e condutas produzindo subjetividades, identidades e modos de ser e agir. |
Quintero e Morón (2011 apud Pizarro, 2018) | Talento refere-se a uma alta capacidade em um campo específico, que pode ser artístico, acadêmico, matemático, verbal, motor ou criativo. |
Attoni et al. (2020) | Apresentam grande facilidade de aprendizagem, com domínio e rápida clareza sobre conceitos, procedimentos e atitudes. |
Fonte: Elaboração própria.
Cumpre destacar também que é importante compreender o comportamento talentoso na ótica do comportamento verbal (Attoni et al., 2020), do desenvolvimento socioemocional (Oliveira et al., 2022; Rosin-Pinola et al., 2007), variáveis cognitivas e ambientais (Pizarro, 2018). .
Assim, os conceitos atribuídos ao comportamento talentoso historicamente passaram por mudanças de visões, abordagens e estudos. Em termos normativos, entende-se que nos documentos brasileiros iniciais (Brasil, 1995), os componentes biológicos e sociais atuavam na definição de comportamento talentoso ao considerar as aptidões e talentos em relação a sua durabilidade ao longo do tempo, conforme a história de aprendizagem da pessoa. Na sequência, nota-se um direcionamento para o componente cognitivo na definição de comportamento talentoso, assim como um olhar mais amplo para as tipologias, segundo documentos normativos (Brasil, 2009), bem como o compromisso com o desempenho nas atividades específicas que envolvem o talento da pessoa (Renzulli, 2004).
É interessante relacionar as definições e avanços na compreensão dos processos, que identificam os diferentes públicos-alvo da educação especial, como uma forma de compreender a Educação Especial, em sua amplitude. Exemplo disto refere-se ao autismo, que inicialmente tinha uma série de definições previstas em tipologias (APA, 2014) e, atualmente, sua definição está centrada no termo espectro, que engloba as diferentes especificidades em uma visão de apoio/suporte do ambiente.
Enquanto isso, no comportamento talentoso, verifica-se um movimento diferenciado, no sentido de partir inicialmente de definições mais generalistas (como, documentada na LDB) (Brasil, 1971) para tipologias mais específicas de comportamentos talentosos (como, na Política de 1995) (Brasil, 1995). Contudo, identifica-se que o hiperfoco no autismo leve (ou seja, sem DI), conforme definição atual (APA, 2014), pode estar relacionado a certas tipologias previstas no comportamento talentoso, do tipo acadêmico, intelectual e talento especial, gerando, muitas vezes, desafios relacionados ao diagnóstico diferencial ou ainda, a dupla excepcionalidade no caso do autismo com comportamento talentoso (Alves & Nakano, 2015).
Fato análogo foi replicado com a história da DI (APA, 2014; Brasil, 2001; 2016), que envolve comprometimentos nas habilidades adaptativas e processos cognitivos, segundo o DSM- 5 (APA, 2014). Se por um lado a DI apresenta lentidão nos processos de aprendizagem quando o estudante está exposto ao ensino convencional, por outro lado, o comportamento talentoso requer velocidade na aquisição da aprendizagem, conforme a Resolução nº 2/2001, em seu Art. 5º (Brasil, 2001). Assim, com base neste diálogo, espera-se que a formação em Educação Especial abarque os diferentes conhecimentos produzidos nas definições, em momentos históricos distintos.
2) Quais são os serviços educacionais especializados identificados na busca, no contexto da inclusão escolar?
As abordagens e os serviços educacionais especializados identificados na busca sistemática no contexto da inclusão escolar, foram elencados abaixo:
a) Classes de Integração e Recursos/Altas Habilidades, SIR/AH, em algumas escolas da cidade de Porto Alegre, RS (Jelinek & Bello, 2018).
b) Intervenção multilíngue (Libras, Língua Portuguesa) (Streiechen et al., 2020).
c)Cabellos e Lozano (2016) indicam em seu trabalho uma dificuldade em encontrar direcionamentos ou serviços ao público em questão, apenas trazendo a característica de desenvolver as habilidades de maneira singular e centrada no indivíduo.
d) Integração Educacional (meados de 1990), Unidades do Serviço de Apoio à Educação Regular (USAER) e Ministério da Educação Pública (SEP) (Pizarro, 2018).
e) Abordagem criativa-produtiva (encorajar a habilidade de abordar problemas e áreas de estudo, que tenham relevância pessoal para o estudante, que possam ser dimensionados em diferentes níveis de desafio da atividade investigativa) e abordagem escolar (enfatizar a aprendizagem dedutiva, o treino estruturado no desenvolvimento de processos de pensamento) para intervenção educacional (Mettrau & Reis, 2007).
f) Programas de enriquecimento em três níveis voltados para o desenvolvimento de potencialidades dos estudantes da rede de ensino, desenvolvidos a partir de pesquisas realizadas por Renzulli (1977; 1978; 1988 apud Mettrau & Reis, 2007) nos Estados Unidos.
O enriquecimento do Tipo I envolve variedade de disciplinas, tópicos, ocupações, hobbies, pessoas, lugares e eventos, por meio de uma equipe constituída por famílias, docentes e estudantes, organiza e planeja experiências do Tipo I, tais como palestras, minicursos, demonstrações, apresentações artísticas, filmes, slides e outros recursos.
O enriquecimento do Tipo II consiste no uso de materiais e métodos elaborados para promover o desenvolvimento de processos cognitivos e afetivos. Parte do treino é geral e inclui o desenvolvimento de pensamento e resolução criativa de problemas, pensamento crítico e processos afetivos; uma ampla variedade de habilidades específicas de aprendizagem do tipo “como fazer”; habilidades envolvendo o uso apropriado de materiais de nível avançado; e habilidades de comunicação visual, oral e escrita.
O enriquecimento do Tipo III envolve estudantes, que estão interessados em estudar um tema, dispostos a empregar o tempo necessário na aquisição de conteúdo avançado e no treino do processo de pesquisa, assumindo, assim, o papel de investigadores.
Os objetivos são: promoção de oportunidades para relacionar interesses, conhecimentos, ideias criativas e envolvimento com a tarefa com questões relativas às áreas de estudos selecionadas pelo estudante; desenvolvimento de habilidades de aprendizagem autodirigidas nas áreas de planejamento, organização, utilização de recursos, gestão do tempo, tomada de decisão e autoavaliação; autoconfiança e sentimentos de realização criativa.
g) Aceleração/avanço, regulamentada pelos sistemas de ensino, permite, inclusive, a conclusão da Educação Básica em menor tempo, desde que haja registro do procedimento adotado em ata da escola e no dossiê do aluno; inclusão das especificações cabíveis no histórico escolar; e especificação, nos projetos pedagógicos e regimentos escolares, do atendimento educacional oferecido, inclusive por meio de convênios com instituições de ensino superior e outros segmentos da comunidade. Recomendável que a diferença máxima de idade entre o aluno superdotado a ser acelerado e seus colegas seja de dois anos (Mettrau & Reis, 2007).
h) Estudos avançados: Pequenos grupos de alunos interessados em temas ou conteúdos específicos atendidos em horário contrário desenvolvem situações de aprendizagem não seriada mediante técnicas e metodologias diferenciadas das classes comuns (Mettrau & Reis, 2007).
i) Entrada precoce: Acesso antecipado, anterior à idade prevista, após comprovada a superdotação, respeitando as normas dos sistemas educacionais (Mettrau & Reis, 2007).
j) Classes Universitárias: Estudantes superdotados do ensino médio habilitados a participar de cursos superiores, se beneficiam dos créditos escolares obtidos nas classes universitárias incorporando-os aos seus currículos, devidamente autorizados pelos conselhos de Educação, quando puderem ter acesso legal ao ensino superior (Brasil, 1999, v. 2, p. 64 apud Mettrau & Reis, 2007).
Dentre os serviços especializados e as estratégias utilizadas nos estudos, identifica-se carência de evidências científicas que apoiem e sustentem as estratégias delineadas. Por exemplo, no caso dos programas de enriquecimento do tipo I, II e III, qual a evidência que sustenta tal linearidade no programa? Será que um delineamento experimental para mostrar a função de cada programa pode auxiliar no efeito de sequência estabelecido pelo programa?
Neste caso, a programação de ensino delineada por Matos (1991) dialoga com tal provocação, no sentido de estabelecer uma avaliação de repertório de entrada, identificação de comportamento-alvo a ser ensinado, planejamento de contingências de ensino, como o uso de dicas, consequências diferenciais para respostas de acerto e erro na tarefa, critérios de aprendizagem, dentre outros. O planejamento cuidadoso do serviço a ser oferecido, por exemplo, nos estudos com estudantes com TEA e/ou DI mostram que o arranjo de contingências de ensino se torna fundamental para identificar a eficácia e eficiência do procedimento de ensino (intervenção educacional).
Na perspectiva da Análise do Comportamento Aplicada (Applied Behavior Analysis - ABA), Baer et al. (1968) apresentaram sete dimensões que são os fundamentos da ABA em evidências científicas a saber: 1. Comportamental: ressalta-se o foco na observação e na mensuração dos comportamentos; 2. Aplicada: tem como foco principal a importância do social; 3. Analítico: é a demonstração das relações funcionais entre o comportamento e o ambiente; 4. Tecnológica: nesta dimensão os procedimentos são descritos de maneira clara e precisa a fim de possibilitar a réplica; 5. Conceitual: os procedimentos utilizados na mudança comportamental são derivados dos princípios básicos do comportamento; 6. Eficaz: os procedimentos comportamentais resultam em uma mudança socialmente significativa e 7. Generalizável: a mudança comportamental deverá ser de longa duração e deverá ocorrer em outras situações além daquela que a intervenção aconteceu.
A ABA busca identificar e estudar relações funcionais entre o comportamento do indivíduo e seu contexto ambiental; essas informações são importantes para planejar, avaliar e explicar intervenções baseadas nos princípios do condicionamento operante introduzidos por Skinner.
Sugere-se, portanto, que estudos futuros programem o ensino de componentes cognitivos que possam favorecer a autonomia e independência de estudantes com comportamentos talentosos, dada a sua variabilidade comportamental, replicando assim achados com outras populações, como é o caso da DI e do autismo.
3) Quais são os procedimentos avaliativos que a literatura utiliza na identificação da AH/SD?
São poucos os parâmetros para a determinação de uma pessoa com AH/SD, em geral é em torno da indicação e observação externa da comunidade. Autores como Mettrau e Reis (2007) comentam sobre encaminhamento para avaliações por profissionais, mas não as descrevem, visto que eles também tiveram dificuldades para encontrar um parâmetro. Em Jelinek e Bello (2018), por exemplo, são citados três instrumentos para a identificação, com uso de entrevista aplicada aos profissionais da educação.
Tais dados mostram a carência de instrumentalização para a identificação de pessoas com AH/SD, fato também apontado em Martins et al. (2016). De forma que apenas no trabalho de Oliveira et al. (2022) foi indicado um instrumento, no caso o de Mendonça e Silva (2015), que estabelece como parâmetro apresentar: a) resultados acima do percentil 90 no teste Matrizes Progressivas de Raven; b) dois resultados superiores nos subtestes ou no total do Teste de Desempenho Escolar (TDE); 3) uma indicação do professor; 4) pelo menos um QI (Verbal, Execução ou Total) acima de 130 no WISC-III.
4) Há evidências sobre a sistematização e os programas de intervenção de ensino envolvendo a inclusão educacional de pessoas com AH/SD?
Com base na revisão realizada, identificou-se ausência na descrição dos procedimentos utilizados durante as intervenções didáticas das pessoas com AH/SD, não apresentando recursos, materiais, etapas ou frequência das atividades. Apenas Mettrau e Reis (2007) descreveram um atendimento de duas vezes por semana, com oito estudantes durante as sessões, sendo sempre realizada no contraturno escolar. As atividades se direcionam para desafiar e motivar os estudantes, utilizando recursos diferentes dos usados em sala de aula (as autoras não os descrevem).
Cumpre salientar que também há enfoque tanto na área intelectual quanto nas habilidades sociais e psicomotoras, ficando a critério dos indivíduos envolvidos na intervenção. Como avaliação, após dois meses de intervenção a responsável pela sala de recursos avalia se o estudante está correspondendo ao esperado por este grupo (embora não se menciona o que é esperado). As autoras também apontam como um dos principais desafios a assiduidade dos estudantes, seja por dificuldades de acesso, ou falta de um suporte familiar (Mettrau & Reis, 2007).
5) Como o processo cognitivo que envolve de maneira geral, a inteligência e, de maneira mais específica, os correlatos neurais identificados no córtex pré-frontal têm sido documentados e avaliados, nos estudos identificados na busca sistematizada?
Para esta questão, apenas Aretxaga (2013 apud Pizarro, 2018) denotou contribuições das neurociências nesse aspecto biológico de pessoas com AH/SD, contudo, ainda aparece em forma de comentário, não apresentando informações de como andam essas pesquisas.
6) Como a medida de rastreamento ocular tem sido utilizada nos artigos recuperados e o que trazem evidências sobre o processamento visual de pessoas com AH/SD?
A análise dos resultados identificou ausência de discussão acerca de estudos que utilizaram medidas de rastreio ocular com a área da AH/SD. O uso do rastreio em literatura prévia (Jung-Ho et al., 2017) identificou diferenças nos padrões de olhares em slides que deveriam ser categorizados por estudantes do Ensino Médio, de acordo com características das imagens apresentadas. A amostra envolveu estudantes talentosos na área de ciências. Como conclusão, estudantes sem AH/SD apresentaram maior fixação ocular no canto superior esquerdo, o que pode ser explicado por ser o mesmo padrão que se utiliza para a leitura de textos escritos. Sobre a atividade de categorização em si, observou-se que os estudantes usaram diferentes estratégias cognitivas para a realização da tarefa. Os estudantes com AH/SD utilizaram estratégias indutivas, essenciais para a atividade em questão, enquanto os estudantes sem AH/SD utilizaram em grande parte, estratégias dedutivas.
Outro estudo importante para discussão dos dados (Škrabánková et al., 2018) buscou identificar padrões oculares em estudantes com AH/SD na resolução de problemas da disciplina de ciências naturais. O estudo concluiu que os estudantes com AH/SD exibiam um padrão ocular similar entre si, diferente dos demais estudantes da pesquisa, sugerindo inclusive o uso de tais instrumentos como auxiliares na identificação de estudantes com AH/SD. Tem-se aumentado o interesse pelos estudos que se utilizam do eye-tracking para fins relacionados à educação. Cita-se, como exemplo, o seu uso no estudo de áreas específicas do conhecimento, como a matemática (Strohmaier et al., 2020) e, também para com o indivíduo com TEA (Kollias et al., 2021), estudos que têm auxiliado na identificação de atividades que mais mobilizam os estudantes e evidenciam seus interesses e dificuldades. Observa-se o potencial do instrumento para futuras pesquisas também com a população com AH/SD, principalmente como instrumento que pode auxiliar na avaliação de identificação da AH/SD, como também orientar intervenções mais personalizadas.
Recomendações da revisão sistemática para estudos futuros
Dentre as recomendações dadas pelos estudos para futuras investigações, foram sumarizadas e descritas as seguintes propostas:
Criação e registro de estratégias didáticas e políticas, com o fim de oferecer a eles uma educação de qualidade (Rosin-Pinola et al., 2007; Streiechen et al., 2020).
Novas propostas pedagógicas para cursos de formação de professores/as com disciplinas direcionadas à educação especial e inclusiva, procedimentos para identificar, encaminhar e desenvolver estratégias que estimulem as habilidades dos discentes (Streiechen et al., 2020).
Construção de normativas e avaliações que apresentem fundamentação especializada na área de comportamento talentoso, sobretudo, em relação aos processos cognitivos envolvidos em altas capacidades ou ainda, na mesma classificação de talento, enriquecendo meios de validar intervenções e o próprio progresso do estudante (Vernon, 1992).
Investigar o comportamento social e o impacto da comunidade escolar e família no processo de formação do indivíduo com AH/SD (Oliveira et al., 2022).
Expansão das investigações, trabalhando com corpus mais expressivos e também com grupos controle, para poder comparar a efetividade das intervenções, a partir de uma perspectiva de delineamento de grupo (Oliveira et al., 2022).
Avaliar respostas hemodinâmicas do córtex pré-frontal em tarefas pedagógicas que estudantes já realizam com autonomia e independência, em comparação àquelas que ainda necessitam de apoio para realização. Tais medidas neurofisiológicas podem atuar na predição e monitoramento do desempenho pedagógico e auxiliar docentes nas tomadas de decisões mais personalizadas, em relação aos objetivos de ensino. Uma das formas de fazer esse registro é com a utilização da Espectroscopia Funcional de Infravermelho Próximo (Functional Near-Infrared Spectroscopy - fNIRS). Trata-se de uma técnica para avaliar, de forma indireta e não invasiva, a atividade neural que pode ser inferida por meio das alterações dos níveis de concentração de oxigenação do sangue (acoplamento hemodinâmico). O método é seguro e portátil, o que permite sua aplicação em experimentos naturalísticos (Balardin et al., 2017), incluindo o contexto educacional (Barreto et al., 2021).
Considerações
A proposta teve como objetivo geral analisar na literatura quais estratégias têm sido utilizadas para caracterização e sistematização da avaliação da AH/SD, incluindo instrumentos e recursos avaliativos. Dessa forma, verificou-se na literatura que: a) caracterização e sistematização da avaliação da AH/SD, incluindo instrumentos utilizados e recursos avaliativos; b) intervenções baseadas em evidências com suplementar ao processo de escolarização; c) medidas implícitas que podem orientar o planejamento de intervenções. Como resultado, os procedimentos avaliativos da AH/SD estão fundamentados em instrumentos psicométricos, em pressupostos cognitivos, assim como em protocolos que buscam informações de relato e de observação comportamental, sobretudo por meio do rastreio docente e da família. Inicialmente, utilizava-se como instrumento no campo da Psicologia Educacional uma prática centrada e reduzida apenas à aplicação e análise de dados oriundos de testes psicológicos. E, mais recentemente, foi inserida a medida de relato e observação por profissionais da educação que interagem no cotidiano escolar com as pessoas com comportamentos talentosos. Questiona-se aqui sobre o papel da equipe interdisciplinar para desenvolver o trabalho multiprofissional com este público-alvo, desenvolvendo, assim, uma avaliação ampla que envolve aspectos sociais, culturais, psicológicos, pedagógicos, a despeito de práticas excludentes do contexto social.
Sugere-se ampliar o número de instrumentos avaliativos por meio de avaliações de processamento visual, com uso de rastreio ocular, bem como, de respostas hemodinâmicas. Além de tais medidas apoiarem a avaliação, podem apresentar potencial para o planejamento das intervenções educacionais mais personalizadas.
Em relação às estratégias educacionais utilizadas no contexto das escolas inclusivas, identifica-se desafios relacionados à formação de profissionais interdisciplinares, assim como propostas concretas, que operacionalizam como tal formação pode ser implementada e avaliada. Um aspecto crucial se refere à formação docente na identificação precoce do comportamento talentoso para encaminhamento dos apoios necessários para autonomia e independência. A precocidade tem sido uma variável crítica com outros públicos, no contexto da Educação Especial.
Em relação à permanência estudantil, questiona-se sobre a programação de ensino e os passos necessários para ensinar e avaliar os comportamentos específicos, assim como aspectos relacionados à aceleração pedagógica e os efeitos da transição entre educação básica e universidade, em especial, sobre as questões de antecipação da conclusão de estudos e inserção no contexto universitário e no mercado de trabalho. No caso de estudantes com deficiência tem-se documentado sobre a questão da distorção idade-série (Mendes & Silva, 2019) e, no caso das pessoas com AH/SD? A transição da educação básica tem sido efetiva do ponto de vista sócio emocional, autonomia e inclusão na sociedade?
Assim sendo, espera-se que o compilado de dados possa orientar futuras políticas públicas educacionais relacionadas ao campo da inclusão da pessoa com AH/SD, por meio de formação docente qualificada, oferta de serviços educacionais especializados e instrumentos neurocientíficos no processo de identificação e orientação do planejamento educacional.
Tabela 1 Strings utilizadas e número de estudos identificados
String usada no APA - Journals | R | S | String usada no SciELO | R | S |
---|---|---|---|---|---|
Altas Habilidades and inclusão | 0 | 0 | (Altas habilidades) and (inclusão) | 6 | 6 |
Superdotação and inclusão | 0 | 0 | (Superdotação) and (inclusão) | 7 | 2 |
Talento and inclusão | 0 | 0 | (Talento) and (inclusão) | 3 | 0 |
Comportamento talentoso and inclusão | 0 | 0 | (Comportamento talentoso) and (inclusão) | 0 | 0 |
Dotação and inclusão | 0 | 0 | (Dotação) and (inclusão) | 1 | 1 |
Sobredotação and inclusão | 0 | 0 | (Sobredotação) and (inclusão) | 0 | 0 |
Sobredotado and inclusão | 0 | 0 | (Sobredotado) and (inclusão) | 0 | 0 |
highly gifted and inclusion | 1 | 1 | (highly gifted) and (Inclusion) | 0 | 0 |
Talent and inclusion | 3 | 0 | (Talent) and (inclusion) | 11 | 4 |
talented and inclusion | 4 | 1 | (talented) and (inclusion) | 0 | 0 |
giftedness and inclusion | 1 | 0 | (giftedness) and (inclusion) | 2 | 1 |
high cognitive abilities and inclusion | 2 | 0 | (high cognitive abilities) and (inclusion) | 2 | 0 |
gift and inclusion | 0 | 0 | (gift) and (inclusion) | 8 | 0 |
High abilities and inclusion | 6 | 1 | (High abilities) and (inclusion) | 13 | 2 |
Altas habilidades/superdotación and inclusão | 0 | 0 | Altas habilidades/superdotación and inclusion | 0 | 0 |
Total | 17 | 3 | 53 | 16 |
Fonte: Elaborado pelos autores.
R: Resultados disponíveis; S: Selecionados pelos critérios de inclusão e exclusão.