Introdução
O ingresso no Ensino Superior é caracterizado pela necessidade de adaptação acadêmica. Ao mesmo tempo em que o aluno é demandado a assumir uma maior carga de leitura e escrita científica, incluindo resumos, artigos e relatórios, ele precisa se adequar a um contexto caracterizado por exigir maiores níveis de autonomia, responsabilidade e autogerenciamento (Oliveira & Dias, 2014). Assim, a transição para o Ensino Superior requer atenção, haja vista que o uso de estratégias ineficientes e o baixo automonitoramento estão associados a prejuízos na aprendizagem acadêmica (Ahrens et al., 2019).
É possível encontrar na literatura evidências da contribuição das funções executivas (FE) nesse processo. Apontadas como preditoras de desempenho acadêmico (Ramos-Galarza et al., 2019), mesmo entre estudantes com dificuldades de aprendizagem (Knouse et al., 2014), as FE representam um conjunto de habilidades fundamentais para o gerenciamento e regulação de processos cognitivos e comportamentais. A partir do modelo teórico de Diamond (2013), controle inibitório, memória de trabalho e flexibilidade cognitiva são FE nucleares, cuja interação viabiliza a emergência de habilidades executivas mais complexas como raciocínio, resolução de problemas e planejamento.
No contexto educacional, o envolvimento dessas habilidades compreende todo o período de escolarização, inclusive o Ensino Superior (Pascual et al., 2019; Ramos-Galarza et al., 2019). Além disso, as FE estão relacionadas a processos importantes como a leitura e a escrita. Na leitura, por exemplo, as FE são demandadas para a manutenção da informação relevante à construção de uma representação global do texto e para a seleção das informações primárias em detrimento às secundárias (Butterfuss & Kendeou, 2018). No que diz respeito à escrita, além do planejamento da escrita, as FE estão envolvidas na regulação e no monitoramento da coerência entre os objetivos da produção do texto, a partir da consideração das características do gênero em questão e a adequação da linguagem ao público-alvo (Olive, 2021). Essas evidências são especialmente relevantes considerando as recorrentes dificuldades de compreensão de leitura e de produção escrita observadas entre universitários (Alcará & Santos, 2015; Mateos et al., 2020; Sala-Bubaré & Castelló, 2018; Wahleithner, 2020). Além disso, dificuldades de adequação a critérios de produção de trabalhos científicos, como resumos (Melo & Bezerra, 2021), e segmentos de texto confusos e incompletos são indicativos de falta de clareza, organização, planejamento e revisão (Alves, 2017) que destacam um papel fundamental que as FE podem ter para auxiliar na escolha de estratégias mais adequadas à produção e desempenho em contextos universitários (Hesse, 2019).
Diante do exposto, o Programa de Intervenção em Funções Executivas pró-aprendizagem acadêmica para Universitários (πFex-Academics, Dias et al., 2023) surge como uma proposta de intervenção promissora para a estimulação de FE entre esse público. Apesar do crescente avanço, em âmbito nacional, no desenvolvimento de programas de intervenção complementares ao currículo escolar e aplicados em contextos educacionais, os programas desenvolvidos até o momento destinavam-se a crianças em idade pré-escolar e escolar (e.g. Cardoso & Fonseca, 2016; Carvalho & Abreu, 2023; Dias & Seabra, 2013). O πFex-Academics, a depender do propósito e da demanda, pode ser aplicado de forma sequencial, com aplicação de todos os módulos que integram o programa, ou isolada, com módulos selecionados com base em demanda, e sua estrutura possibilita a integração em disciplinas de núcleo comum (“generalistas”) e em serviços institucionais de apoio estudantil, através de etapas de explicação, modelação, práticas guiada e autônoma, reflexão e discussão. No contexto de sala de aula com graduandos ingressantes, verificou-se a ocorrência de ganhos em compreensão leitora e a diminuição do autorrelato de indicadores de hiperatividade e impulsividade (Dias et al., 2022).
Inicialmente, o πFex-Academics não foi estruturado de modo a contemplar a habilidade de produção escrita, apenas de compreensão de leitura, organização de ideias e planejamento de projetos (Dias et al., 2022). Todavia, diante das dificuldades em dominar os processos de escrita (Alves, 2017; Melo & Bezerra, 2021) e da importância dessa competência na adaptação ao ambiente acadêmico (Wahleithner, 2020), um novo módulo, com foco específico no aperfeiçoamento da escrita, foi desenvolvido. Nele, por meio do estímulo indireto dos componentes executivos de inibição, memória de trabalho, flexibilidade cognitiva, planejamento e organização, quatro atividades apresentam estratégias para o reconhecimento de aspectos textuais de produções de boa qualidade, o planejamento de escrita, o exercício de contraposição de ideias para sustentação de argumentos e a preparação de resumos científicos.
Tais características tornam o πFex-Academics original em sua proposta de promover FE em conjunto e no contexto de habilidades acadêmicas, no caso deste módulo, da produção escrita. Desenvolvido com base na neuropsicologia e psicologia cognitiva, se pauta, assim, em uma abordagem teórica diferente daquelas reportadas em outros estudos com foco na promoção de habilidades acadêmicas entre universitários (Salgado et al., 2018; Zoltowski & Teixeira, 2020). Estes estudos, de modo geral, mostraram que é possível promover autorregulação da aprendizagem em contexto universitário, porém não ofereceram medidas específicas em produção escrita, por exemplo.
Uma revisão relativamente recente na área (Sala-Bubaré & Castelló, 2018) identificou aumento no interesse de estudos sobre escrita, incluindo estudos sobre intervenções para promoção dessas habilidades, a partir de diferentes abordagens. A revisão não traz síntese dos efeitos das intervenções, pois seu objetivo era prover um mapeamento dos aspectos teóricos e metodológicos de estudos na área. Estudos identificados como conduzidos sob enfoque da psicologia cognitiva (mais próximos de nossa proposta) tenderam a ser quase-experimentais, conduzidos em contextos de laboratório e abordando os processos envolvidos na escrita. Foi, ainda, observada uma tendência a adotar métodos mais ecológicos. Os tipos de intervenções utilizadas incluíram instrução em estratégias metacognitivas de autorregulação e uso de suportes específicos para escrita. O mais recente dentre os estudos de intervenção cognitiva incluídos na revisão mostrou que a instrução de estratégias levou a aumento no uso de estratégias pelos estudantes durante produção escrita. No entanto, o estudo foi conduzido em um contexto muito específico de instrução de escrita em inglês, como uma segunda língua (Silva & Graham, 2015).
Frente à originalidade do programa de intervenção desenvolvido, este estudo teve como objetivo investigar os efeitos do módulo de produção escrita do Programa de Intervenção pró-aprendizagem acadêmica para Universitários - πFex-Academics.
Método
Participantes
A seleção da amostra ocorreu por conveniência, a partir de inscrição espontânea e voluntária via formulário on-line. Inicialmente, o estudo foi composto por 47 estudantes que atenderam aos critérios de estarem matriculados entre o primeiro e o quinto semestre da graduação de alguma instituição de Ensino Superior brasileira. Optou-se por incluir estudantes até o 5o semestre para reduzir a variabilidade da amostra e porque se entende que, no início da graduação, os alunos estão em um momento semelhante de adaptação ao ambiente acadêmico, que requer um ajuste significativo em relação à carga de estudos, níveis de autonomia e habilidades de autogerenciamento, sendo que tais habilidades são os alvos da intervenção. Além disso, entende-se que, uma vez evidenciada a efetividade, a intervenção pode fornecer uma base sólida para o restante de sua graduação.
Após aplicação de critério de exclusão de frequência de participação mínima em 75% das sessões de intervenção (n=12), a amostra final foi composta por 35 participantes. A maioria dos participantes era do sexo feminino (n=32; 91,4%), oriundos de universidades públicas (n=18; 51,4%), com idades entre 18 e 57 anos (M=25,17; DP=9,49). Eles estavam matriculados em cursos de Psicologia (n=29; 82,9%), Fisioterapia (n=2; 5,7%), Pedagogia (n=2; 5,7%), Ciências Biológicas (n=1; 2,9%) e Farmácia (n=1; 2,9%). A maioria morava nas regiões Sul (n=28; 80%) e Sudeste (n=2; 5,8%); e pouco mais da metade (n=22; 62,9%) possuía renda familiar mensal de até R$ 5.500,00.
Alguns estudantes (n=7; 20%) relataram possuir diagnóstico neuropsiquiátrico, dado por profissional, de depressão (n=2), ansiedade (n=2), depressão e ansiedade (n=1), Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) (n=1) e transtorno de personalidade borderline associado à depressão (n=1). Dentre estes, salvo um participante, os demais indicaram fazer uso de ansiolítico, antidepressivo ou anticonvulsivo. Além disso, parte da amostra relatou ter dificuldades educacionais atuais ou prévias em atenção (n=5), matemática/raciocínio lógico (n=3), escrita (n=2), memória (n=2) e organização (n=2). Apenas um deles relatou repetência no primeiro ano escolar.
A distribuição dos participantes entre os grupos experimental (GE=23) e controle (GC=12), se deu mediante sorteio. Os participantes do GE receberam a intervenção e os participantes do GC permaneceram em lista de espera. Observou-se equivalência entre os grupos em termos de idade (t=1,423; p=0,164), distribuição por sexo (χ2=1,712; p=0,536) e por presença de diagnóstico neuropsiquiátrico (χ2=1,553; p=0,380). A distribuição da presença de queixas educacionais atuais (χ2=0,005; p=1,00) ou prévias (χ2=0,048; p=1,00) também não foi diferente entre os grupos. Vale ressaltar que após a finalização da intervenção, os alunos que estavam no GC participaram do programa, seguindo os mesmos procedimentos adotados.
Instrumentos
Questionário de informações pessoais (Qip): utilizado para caracterizar a amostra a partir de questões referentes à saúde geral do participante e seu histórico escolar, como ocorrência de transtornos neuropsiquiátricos, uso de medicação, repetência e presença de dificuldades educacionais prévias ou atuais.
Inventário de Dificuldades em Funções Executivas, Regulação e Aversão ao Adiamento para Adultos (IFERA-II; Trevisan et al., 2016): instrumento de autorrelato utilizado para mensuração do funcionamento executivo em tarefas do dia a dia. Composto por 28 itens respondidos em escala Likert. Subdivide-se nas dimensões de controle inibitório (CI), memória de trabalho (MT), flexibilidade cognitiva (FC), aversão ao adiamento (AA) e regulação do estado (REG). O desempenho parcial de cada dimensão é obtido pela média das pontuações dos seus respectivos itens. O escore total, por sua vez, é obtido pela média de todos os itens. Maior a pontuação, maior a dificuldade percebida em FE.
Escala Adult Self-Report Scale 1.1 (ASRS – 18): instrumento de domínio público, adaptado para o Brasil por Mattos et al. (2006), utilizado para mensurar indicadores de desatenção e hiperatividade/impulsividade em adultos. Possui 18 itens distribuídos em escala Likert. Como a pontuação de cada dimensão é obtida pela soma de seus respectivos itens, maior o escore, maiores os indicadores de sintomas de desatenção e hiperatividade.
Teste de Cloze: instrumento com características psicométricas para ampla faixa etária, incluindo universitários (Alcará & Santos, 2015; Lima & Muniz, 2021), utilizado para avaliação de compreensão de leitura (Santos & Monteiro, 2016; Santos et al., 2002; Suehiro, 2013). Utilizou-se como texto de referência a produção “Desentendimento” (Luís Fernando Veríssimo, 1995, 382, 382 palavras), proposto por Alcará e Santos (2015). Nele, 46 vocábulos são omitidos por traços proporcionais ao tamanho da palavra para serem preenchidos com o termo mais adequado ao contexto. Cada acerto (1 ponto) é conferido ao preenchimento da palavra, tal qual proposto no texto original. Com pontuação máxima de 46 pontos, classifica-se os níveis de compreensão de leitura em frustração (até 44% de acertos), instrucional (44,1% a 57% de acertos) e independente (acima de 57% de acertos) (conforme sumariado em Alcará & Santos, 2015). Há duas formas de correção do instrumento: a correção literal e a correção semântica. A correção literal considera como acerto o preenchimento correto da palavra exata que foi omitida, respeitando inclusive grafia e acentuação gráfica. No caso da correção semântica, considera-se como correto o preenchimento da lacuna não somente com a palavra exata que foi excluída, mas também com um sinônimo da palavra omitida. A correção literal tem sido mais utilizada, sobretudo em universitários (Suehiro, 2013) e foi também mencionada em estudo prévio como mais apropriada com amostra de universitários, por minimizar erro de medida (Alcará & Santos, 2015). Desta forma, neste estudo, também com base em evidência recente (Lima & Muniz, 2021), utilizou-se a correção literal.
Tarefa de Produção Escrita de Parágrafo: desenvolvida no contexto do presente estudo para avaliar a qualidade de escrita dissertativa. Os participantes foram solicitados a escrever à caneta, em uma folha A4, um parágrafo dissertativo sobre o tema “Exposição às redes sociais”. A pontuação foi atribuída por dois juízes, com análise de consenso em caso de desacordos, a partir de critérios de conteúdo (clareza, sequência lógica e coerência) e elementos básicos constitutivos de uma sequência dissertativa (ideia central, desenvolvimento e conclusão). O cálculo da pontuação total (máximo 6 pontos) foi obtido a partir da soma das pontuações das dimensões de cada critério (0 a 1 pontos, com possibilidade de frações de 0,5 pontos). Descontos de 0,5 pontos, já contabilizados no escore total, foram atribuídos nos casos de quebra de instrução da tarefa.
Tarefa de Produção Escrita de Resumo: desenvolvida no contexto do presente estudo para avaliar a qualidade de produção escrita de resumo. Os participantes foram solicitados a escrever um resumo científico a partir da leitura do artigo de Gonçalves et al. (2020). A pontuação foi atribuída por 2 juízes, com análise de consenso em caso de desacordos, considerando-se a presença de cinco elementos de contextualização (tema/problema, objetivo, método, resultado e conclusão) propostos pela norma brasileira NBR6028 da Associação Brasileira de Normas Técnicas. Para cada critério, há uma variação entre 0 e 1 pontos, com frações de 0,5 pontos permitidas. O cálculo da pontuação total (máximo de 5 pontos) foi obtido a partir da soma das pontuações de cada dimensão, considerando o desconto de 0,5 pontos, cumulativos, para o descumprimento de regras (e.g. formatação do resumo científico, como escrita em parágrafos e não em bloco único, falta de objetividade e falta de elementos da estrutura do resumo).
Entrevista: conduzida em formato de grupo focal, com 5 a 7 participantes, ela seguiu um roteiro semiestruturado de 7 perguntas. Teve-se como objetivo coletar informações sobre a percepção dos participantes quanto à relevância das estratégias aprendidas, o uso e impacto dos conteúdos abordados na vida acadêmica e sugestões e observações gerais para aprimoramento do módulo.
Módulo 4 – Produção Escrita – Programa de Intervenção em Funções Executivas pró-aprendizagem acadêmica para Universitários (πFex-Academics; Dias et al., 2023): recentemente desenvolvido e com evidências de validade de conteúdo, este módulo tem o objetivo de estimular habilidades executivas (planejamento, organização, flexibilidade, memória de trabalho e monitoramento) no contexto da produção escrita, visa ao aprimoramento desta. Ele abrange 4 atividades: Identificando aspectos textuais e planejamento de escrita; Identificando textos de boa qualidade versus má qualidade; Mudando a perspectiva; e Aprendendo a resumir. Cada uma delas foi estruturada de modo a contemplar 6 etapas de implementação que conduzem o estudante na aprendizagem e aplicação das estratégias visando a generalização de seu uso para diversas disciplinas e atividades acadêmicas, a saber: explicação, modelação, prática guiada, prática autônoma, reflexão/metacognição, e aplicação/discussão. Enquanto na primeira ressalta-se a importância do uso e dos benefícios de cada estratégia, na segunda o aplicador atua como modelo de referência quanto ao modo de realização da atividade. Na sequência, as práticas servem como incentivo ao desenvolvimento autônomo dos estudantes, enquanto agentes dos seus próprios processos de aprendizagem. Essa etapa é potencializada pelos espaços para reflexão, avaliação e automonitoramento dos seus progressos. Por fim, a discussão é um momento significativo para a ponderação em relação à aplicação e uso das estratégias em outras atividades do cotidiano.
Procedimentos
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (CAAE No. 00545118.3.0000.0121). Os participantes foram esclarecidos do objetivo da pesquisa e consentiram em participar mediante assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Toda pesquisa foi conduzida atenta aos pressupostos éticos e pautada na resolução CNS nº 510/2016.
A coleta de dados ocorreu de forma on-line entre agosto de 2021 e janeiro de 2022, sendo iniciada somente após aprovação pelo Comitê de Ética, consentimento livre e esclarecido pelo participante e verificação dos critérios de inclusão. Inicialmente, cada participante preencheu um formulário on-line com um questionário de informações pessoais, o IFERA-II e o ASRS-18. Após, avaliações on-line e em grupos (com, no máximo, três pessoas) foram agendadas para a realização do teste de Cloze e das tarefas de produção escrita de parágrafo e resumo científico. Toda avaliação ocorreu em uma sessão única de aproximadamente 90 minutos. As produções foram fotografadas pelos participantes e enviadas aos pesquisadores ao término da sessão. A partir disso, parte da amostra foi submetida à intervenção, compondo o GE. Os demais (GC) permaneceram em lista de espera para participação posterior, seguindo os mesmos procedimentos adotados com o GE.
A implementação do πFex-Academics foi conduzida em grupos de 6 a 8 participantes, na modalidade on-line. Ela foi realizada ao longo de 8 sessões, com duração aproximada de 90 minutos, perfazendo um total de 12 horas. De forma geral, a cada dois encontros, concluiu-se uma atividade do módulo. Salvo pequenas alterações a depender da complexidade da tarefa ou dificuldades do grupo, para cada atividade, destinou-se o primeiro encontro para estabelecer um contato inicial e realizar as etapas de explicação, modelação e prática guiada; e o segundo para os processos de prática autônoma, reflexão/metacognição e aplicação/discussão.
Inicialmente, a intervenção foi oferecida com frequência semanal. No entanto, para minimizar desistências, optou-se pela disponibilização de uma nova turma em modalidade intensiva. Nela, a única diferença é que as 8 sessões foram distribuídas ao longo de 8 dias, ao invés de semanas. Todos os procedimentos de coleta permaneceram os mesmos. A avaliação pós-intervenção foi conduzida de modo semelhante à pré-intervenção, com adição de entrevistas conduzidas com os participantes, perfazendo cerca de 2 horas.
Análise de dados
As análises quantitativas foram feitas a partir da versão 25.0 do software Statistical Package for Social Science for Windows (SPSS). Inicialmente, devido a dados faltantes no banco de dados, procedeu-se à imputação por maximização esperada, considerando-se (a) diferença entre os escores pós e pré-intervenção (delta) do GE para as medidas de funcionamento executivo, desatenção e hiperatividade, compreensão de leitura e produção escrita (parágrafo e resumo); e (b) pontuação referente à classificação total no teste de Cloze (pós-teste). Com imputações de 4,3% dos casos, identificou-se a presença de dados faltantes completamente aleatórios, o que permite o uso do procedimento com segurança.
A comparação das características sociodemográficas entre o GE e GC foi feita a partir dos testes t Student e Qui-quadrado (χ2), com correção pelo teste de Fisher quando necessário. A distribuição de normalidade foi averiguada pelos testes Kolmogorov-Smirnov e Shapiro-Wilk, indicando inadequações para a maioria das medidas. Assim, utilizou-se o teste de U Mann Whitney para investigar equivalências entre os grupos no pré-teste e analisar possíveis ganhos em decorrência da intervenção por meio da diferença entre os desempenhos no pós- e pré-teste (delta). Nos testes não-paramétricos, considerou-se a classificação de Field (2009) de tamanho de efeito baixo (r<0,2), moderado (r≈0,5) e alto (r>0,8). Nas análises de Qui-quadrado, o V de Cramer foi utilizado como medida de tamanho de efeito.
A análise qualitativa dos dados foi feita através de uma análise de similitude conduzida no Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (Iramuteq). Considerando que, inicialmente, o gráfico desta análise gerou 80 termos, selecionou-se apenas aqueles mais significativos para o contexto e dentro de uma frequência de ocorrência entre 3 e 42, totalizando 25 palavras.
Resultados
Comparação entre os grupos na avaliação pré-intervenção (linha de base)
A comparação entre os grupos nas tarefas de pré-teste revelou equivalências na maioria das variáveis. Não foram identificadas diferenças entre os grupos nas medidas de funcionamento executivo, desatenção, hiperatividade e compreensão de leitura. Nas tarefas de produção escrita, no entanto, o GC apresentou desempenho superior tanto na produção de parágrafo quanto de resumo, conforme pode ser evidenciado na Tabela 1.
Tabela 1 : Resultados da comparação entre GE e GC na avaliação pré-intervenção
| Grupo | M | DP | Mdn | U | p | |
|---|---|---|---|---|---|---|
| IFERA – CI | GE | 2,74 | 0,80 | 2,50 | 135,50 | 0,930 |
| GC | 2,76 | 0,71 | 2,50 | |||
| IFERA – MT | GE | 2,97 | 0,77 | 2,83 | 134,50 | 0,903 |
| GC | 2,74 | 0,72 | 2,83 | |||
| IFERA – FC | GE | 2,99 | 0,74 | 3,00 | 101,50 | 0,201 |
| GC | 2,73 | 0,42 | 2,60 | |||
| IFERA – AA | GE | 3,03 | 0,79 | 2,80 | 136,50 | 0,958 |
| GC | 3,02 | 0,81 | 3,10 | |||
| IFERA – REG | GE | 3,33 | 0,66 | 3,50 | 126,00 | 0,675 |
| GC | 3,36 | 0,84 | 3,67 | |||
| IFERA – Total | GE | 3,01 | 0,62 | 3,07 | 123,00 | 0,602 |
| GC | 3,14 | 0,64 | 3,00 | |||
| ASRS Desatenção | GE | 27,91 | 5,49 | 27,00 | 88,00 | 0,082 |
| GC | 24,67 | 6,93 | 22,50 | |||
| ASRS Hiperatividade | GE | 23,74 | 7,32 | 23,00 | 108,50 | 0,304 |
| GC | 25,75 | 6,28 | 26,00 | |||
| Teste de Cloze | GE | 21,04 | 6,13 | 20,00 | 125,00 | 0,650 |
| GC | 19,92 | 5,25 | 18,50 | |||
| Produção escrita Parágrafo | GE | 2,78 | 2,35 | 3,50 | 59,50 | 0,005 |
| GC | 5,00 | 0,564 | 5,00 | |||
| Produção escrita Resumo | GE | 2,33 | 0,96 | 2,50 | 28,50 | < 0,001 |
| GC | 3,79 | 0,69 | 3,75 |
M: média; DP: desvio-padrão; Mdn: mediana; U: Mann-Whitney. IFERA: Inventário de Dificuldades em Funções Executivas, Regulação e Aversão ao Adiamento para Adultos (CI: controle inibitório; MT: memória de trabalho; FC: flexibilidade cognitiva; AA: aversão ao adiamento; REG: regulação do estado); ASRS: Escala Adult Self-Report Scale.
Análise de ganhos pós-intervenção
Após a intervenção, o GE obteve maiores ganhos que o GC nas tarefas de produção escrita de parágrafo e de resumo. Nesses casos, obteve-se, respectivamente, tamanhos de efeito alto e moderado. O detalhamento desses dados pode ser observado na Tabela 2. Não foram observados outros efeitos significativos. De modo complementar, análise comparando desempenhos/pontuações de GE e GC no pós-teste revelou efeitos significativos para produção escrita de parágrafo (U=27,00; p<0,001), com melhor desempenho final do GE.
Tabela 2 : Dados descritivos e inferenciais da comparação de ganhos do GE e GC em medidas cognitivas e acadêmicas
| Grupo | M | DP | Mdn | U | p | r | |
|---|---|---|---|---|---|---|---|
| IFERA – CI | GE | -0,19 | 0,71 | 0,00 | 132,50 | 0,848 | 0,03 |
| GC | -0,12 | 1,15 | -0,08 | ||||
| IFERA – MT | GE | -0,65 | 0,52 | 0,00 | 137,50 | 0,986 | 0,00 |
| GC | 0,03 | 0,83 | -0,17 | ||||
| IFERA – FC | GE | -0,14 | 0,58 | 0,00 | 109,50 | 0,318 | 0,17 |
| GC | 0,18 | 0,67 | 0,30 | ||||
| IFERA – AA | GE | -0,12 | 0,84 | 0,00 | 120,00 | 0,530 | 0,10 |
| GC | -0,13 | 1,35 | -0,60 | ||||
| IFERA – REG | GE | -0,04 | 0,62 | -0,00 | 120,00 | 0,531 | 0,10 |
| GC | -0,18 | 0,82 | -0,17 | ||||
| IFERA – Total | GE | -0,13 | 0,50 | 0,00 | 124,00 | 0,627 | 0,08 |
| GC | -0,26 | 0,81 | -0,19 | ||||
| ASRS Desatenção | GE | -1,66 | 5,60 | -1,00 | 85,00 | 0,065 | 0,31 |
| GC | 2,67 | 7,69 | 4,50 | ||||
| ASRS Hiperatividade | GE | 9,33 | 8,97 | 8,00 | 107,50 | 0,289 | 0,18 |
| GC | 11,67 | 8,66 | 11,50 | ||||
| Teste de Cloze | GE | 1,69 | 2,90 | 1,00 | 125,00 | 0,644 | 0,08 |
| GC | 1,25 | 3,41 | 1,00 | ||||
| Produção escrita Parágrafo | GE | 2,25 | 2,18 | 1,76 | 3,00 | <0,0001 | 0,80 |
| GC | -1,50 | 0,52 | -1,50 | ||||
| Produção escrita Resumo | GE | 1,57 | 1,09 | 1,50 | 54,00 | 0,003 | 0,50 |
| GC | 0,25 | 0,99 | 0,50 |
IFERA: Inventário de Dificuldades em Funções Executivas, Regulação e Aversão ao Adiamento para Adultos (CI: controle inibitório; MT: memória de trabalho; FC: flexibilidade cognitiva; AA: aversão ao adiamento; REG: regulação do estado); ASRS: Escala Adult Self-Report Scale.
Com relação às classificações em termos de níveis de leitura, conforme pode ser observado na Tabela 3, diferenças estatisticamente significativas entre os grupos foram identificadas no Teste de Cloze após a intervenção (χ2=6,56; p=0,042). Inicialmente com perfis equivalentes (χ2=0,521; p=0,893) o GE aumentou o número de participantes na classificação independente, com capacidade de compreensão leitora autônoma, com um tamanho de efeito moderado (v=0,427).
Avaliação qualitativa de ganhos e pertinência das estratégias aprendidas
A representação gráfica das percepções dos participantes sobre o módulo de produção escrita pode ser observada na Figura 1. Nela, os vértices maiores indicam as palavras com maior número de frequência e as arestas, linhas de diferentes espessuras, representam as ligações e co-ocorrências entre as palavras evocadas. Assim, pode-se observar que os termos “intervenção”, “estratégia” e “escrever” ocuparam uma posição central e interrelacionada nos discursos dos sujeitos, indicando como, ao longo da intervenção, eles se remeteram às estratégias de escrita aprendidas.

Figura 1 : Análise de similitude sobre a participação na intervenção e a pertinência das estratégias aprendidas
No contexto de análise, é possível verificar a forte relação do núcleo “intervenção” com os termos “ajudar”, “aprender”, “aplicar” e “saber”. Tais conexões indicam maneiras pelas quais os participantes foram beneficiados na aprendizagem de seus processos de escrita, conforme pode ser observado no relato:
Essa parte de produção escrita (...) foi algo bem novo pra mim. No começo, até tive um pouco de dificuldade, mas começou a ficar fácil no decorrer da intervenção. (...) estes conteúdos ajudaram bastante na realização dos trabalhos de final de semestre. (Participante 1)
O núcleo “estratégia” apresentou conexões com palavras que qualificaram as técnicas utilizadas ao longo da intervenção e os processos cognitivos associados ao seu uso, através de termos como “útil”, “importante”, “pensar” e “organizar”. Essa inferência é reforçada por colocações como:
Antes de eu participar dessa intervenção, eu não sabia nem por onde começar a fazer um relatório. Eu simplesmente começava e via como é que ia ficar. Agora, pelo menos, eu já tenho uma noção de qual estrutura de texto eu posso ter pra fazer esse relatório. Fica mais simples. (Participante 7)
O núcleo “escrever” contemplou elementos associados ao processo de escrita, representados nos termos “ler”, “planejamento” e “texto”. Ao relatar uma atividade avaliativa de construção de sínteses ao longo do semestre, uma das participantes descreveu a trajetória do seu desenvolvimento ao longo do programa, através da elaboração:
Para mim, [escrever sínteses] era muito desorganizado. Eu ainda tenho muita dificuldade, porque (...) eu tenho que ler página por página (...). Eu não consigo gravar totalmente o texto, mas eu consigo planejar melhor. Às vezes, faço um esqueleto antes, com os planejamentos do que quero escrever nas páginas para depois montar [um esboço]. Então, esse planejamento de estruturar o texto foi bem melhor para mim. (Participante 15)
Outro ponto de destaque são as conexões encontradas entre a palavras “estratégia”, “trabalho” e “faculdade”, pois elas remetem à percepção dos participantes quanto à aplicabilidade das estratégias aprendidas na intervenção. Tal relação pode ser observada pelo relato: “Usei as estratégias nos fóruns da faculdade e me pareceu mais fácil a construção após as aulas (...)” (Participante 3) e “Pra mim, a intervenção ajudou bastante na questão de relatórios e trabalhos da faculdade.” (Participante 18)
Discussão
Este estudo teve como objetivo investigar a efetividade do novo módulo de produção escrita do πFex-Academics. De forma geral, após a intervenção, o GE apresentou maiores ganhos que o GC em produção escrita. Também houve algum ganho em compreensão de leitura, que levou à mudança de níveis de classificação de compreensão entre os estudantes do GE.
Especificamente em relação ao desempenho em produção de escrita, foco principal dessa intervenção, o fato de maiores ganhos terem sido observados pelo GE é coerente com a própria proposta da intervenção, que teve a produção escrita como contexto das atividades de estimulação, mas também com a tendência de as diferenças entre grupos em programas de promoção de FE serem percebidas nas tarefas que mobilizam componentes executivos mais complexos (Diamond & Ling, 2016). Do ponto de vista cognitivo, escrever envolve processos cognitivos que variam desde memória de trabalho e controle inibitório, até regulação, monitoramento, planejamento e revisão (Olive, 2021). Desta forma, esse achado sugere que uma intervenção que contemple esses processos executivos, por meio de práticas deliberadas que favoreçam a construção de um repertório de estratégias de escrita, pode colaborar para o aprimoramento dessa habilidade entre universitários. Esses resultados são ainda mais relevantes frente ao fato de que dificuldades em composições textuais são continuamente relatadas em universitários (Mateos et al., 2020; Melo & Bezerra, 2021; Sala-Bubaré & Castelló, 2018; Wahleithner, 2020).
É importante destacar que o GC obteve, no pré-teste, maiores desempenhos nas tarefas de produção escrita em comparação ao GE. De fato, isso torna a comparação dos ganhos mais complexa. Assim, apesar de maior ganho do GE, poder-se-ia argumentar que o GC não teve ganhos por já ter bom desempenho. No entanto, apesar de melhor desempenho, as pontuações do GC não atingiram, ao pré-teste, o teto dos instrumentos. Outro ponto, de maior relevância é que, no pós-teste, não apenas o GE teve maiores ganhos, mas estes elevaram seu desempenho de modo a superar desempenho do GC, com efeito significativo na produção escrita de parágrafo no pós-teste.
Os dados da análise qualitativa também reforçaram achados da concretização dos objetivos da intervenção. Ao longo do módulo, ensinou-se estratégias de planejamento e automonitoramento para que os estudantes pudessem aperfeiçoar suas habilidades através da prática orientada e independente de planejamentos antecipados, com delimitação de estrutura microestrutural de parágrafos para se ter um texto bem articulado, coeso e coerente. Desse modo, em complementariedade aos dados quantitativos, pode-se inferir que os participantes compreenderam que o engajamento de habilidades executivas (por meio de estratégias de organização/estruturação, reflexão e planejamento) pode contribuir para a qualificação de suas produções textuais.
Uma das premissas do πFexAcademics envolve o uso de estratégias metacognitivas explícitas pelo aplicador para guiar a efetivação de cada atividade e favorecer a reflexão do aluno sobre seu próprio processo de aprendizagem. Sabe-se que, além de contribuir para um melhor desempenho, o uso de estratégias eficientes direcionadas à produção escrita pode evitar uma sobrecarga cognitiva, principalmente no que tange à memória de trabalho, liberando recursos para processos mais demandantes como planejamento e revisão (Olive, 2021). Evidências como essa ressaltam a necessidade de se instrumentalizar universitários no uso de estratégias, sobretudo quando considerada a produção escrita (Hesse, 2019). De fato, no âmbito da psicologia cognitiva, a instrução de estratégias e estímulo à metacognição são, em geral, utilizadas nas intervenções no campo da escrita (Sala-Bubaré & Castelló, 2018), com algumas evidências de que, de fato, os estudantes passam a adotar essas estratégias em suas produções (Silva & Graham, 2015).
Comparativamente ao GC, o GE também obteve maiores ganhos em compreensão de leitura. Embora isso não tenha sido demonstrado no delta (ganho médio, a partir da diferença entre desempenhos no pós- e pré-teste), verificou-se que houve, exclusivamente no GE, uma melhora na classificação de desempenho dos participantes entre os níveis de compreensão de leitura. Mesmo diante de inconsistências em relação à contribuição específica das FE na compreensão de leitura, estudos apontam o envolvimento dessas habilidades através de processos como planejamento, pela ponderação prévia da estratégia de leitura mais adequada ao objetivo da tarefa (Georgiou & Das, 2016), da flexibilidade cognitiva, pela alternância entre essas estratégias, conforme a demanda, e a integração da informação lida aos conhecimentos prévios (Georgiou & Das, 2018). Da mesma forma, evidências sugerem contribuição relevante da memória de trabalho, pois permite a seleção e manutenção da informação relevante em um espaço de trabalho mental, colaborando para uma representação mental mais apropriada do conteúdo de um texto (Butterfuss & Kendeou, 2018). Nesse sentido, a participação na intervenção e aprendizado de estratégias parece ter contribuído para ganhos na compreensão leitora.
Fortalecendo a evidência da transferência de efeitos, os dados qualitativos sinalizam uma tentativa de uso das estratégias aprendidas na intervenção em outros contextos, principalmente no âmbito acadêmico e laboral. Diamond e Ling (2016) mencionam que uma grande dúvida acerca das intervenções em FE recai sobre quais são os efeitos de transferência, visto que alguns estudos acabam por não os evidenciarem. Todavia, as mesmas autoras pontuam que fatores como o tempo dedicado à prática, as características pessoais do aplicador, a percepção da relevância da atividade para o estudante, bem como a sua motivação influem sobre essa dimensão. O fato de o πFex-Academics ser uma intervenção ecológica pode ser fator que favoreça a apropriação e utilização das estratégias. Cabe destacar que o emprego de procedimentos ecológicos foi indicado como uma tendência observada nas intervenções cognitivas em revisão recente na área dos estudos sobre escrita (Sala-Bubaré & Castelló, 2018).
Não foram observados outros efeitos significativos da intervenção, incluindo nos próprios índices de dificuldades de FE mensurados pelo IFERA-II. É possível que os participantes não tenham conseguido reconhecer ganhos nas dimensões avaliadas ou que esses tenham sido tão pequenos a ponto de não serem detectados pelo instrumento. Não se pode desconsiderar, também, a possibilidade de os ganhos em FE serem observados após o período avaliado (Diamond & Ling, 2016), conforme já verificado por outros autores na investigação dos efeitos de intervenções de promoção de FE (Hermida et al., 2015).
Vale ressaltar que já existem na literatura programas e estratégias para alunos universitários voltados para uma melhor adaptação acadêmica, melhor redação, melhor desempenho acadêmico e promoção de processos de aprendizagem autorregulatórios (e.g. Amicucci, 2011; Rosário et al., 2012; Salgado et al., 2018; Zoltowski & Teixeira, 2020). Porém, o diferencial do πFex-Academics é o objetivo de promover conjuntamente produção escrita e FE, compreendendo essas habilidades como processos cognitivos fundamentais. Desse modo, este estudo disponibiliza de forma inovadora, evidências acerca dos efeitos do πFex-Academics na estimulação da produção textual, suprindo uma lacuna destacada em estudos prévios (Knouse et al., 2014; Ramos-Galarza et al., 2019) e fortalecendo evidências anteriores de seus efeitos sobre a compreensão de leitura em aplicação em formato presencial (Dias et al., 2022). Esse estudo também ilustra a possibilidade desse tipo de intervenção em formato remoto e on-line.
Considerações
Em síntese, após a intervenção, o GE apresentou maiores ganhos em produção escrita de parágrafos e resumos. O estudo também sugere algum ganho em compreensão leitora, dada a mudança de classificação quanto ao nível de leitura que ocorreu em participantes do GE. Os dados qualitativos corroboram essas primeiras evidências, apontando para a utilidade da participação no programa de intervenção e a aplicabilidade das estratégias para uma abordagem à produção escrita mais planejada e organizada. Em conjunto, esses dados indicam a potencialidade do módulo 4 de produção de escrita do πFex-Academics no aprimoramento dessa habilidade por meio da estimulação indireta de FE. Sua replicabilidade, no entanto, merece ser investigada em razão de algumas especificidades do contexto e limitações deste estudo, como o tamanho da amostra e o uso de apenas uma medida de autorrelato para avaliação de FE.
Outro aspecto que deve ser mencionado foi a diferença de periodicidade pela qual a intervenção ocorreu ao longo do semestre, uma em modalidade semanal e outra intensiva. Essa configuração foi necessária devido à grande perda amostral no grupo que recebeu a intervenção ao longo do semestre, de modo que decidiu-se propor um outro grupo no período das férias acadêmicas. Por fim, outra limitação refere-se à falta de controle da variável curso. As características do currículo de cada curso podem interagir com a intervenção e/ou contribuir para melhorias nas habilidades alvo da intervenção, potencializado essas habilidades, independentemente do efeito do programa em si. Essa ausência de controle da variável curso é uma limitação que deve ser considerada ao interpretar os resultados do estudo.
Apesar de tais limitações, os resultados quanti-qualitativos indicam a utilidade do πFex-Academics e fortalecem a Neuropsicologia Escolar brasileira. Destaca-se que o programa pode ser útil para prevenir o avanço das dificuldades de produção escrita, melhorando as FE e contribuindo para uma melhor aprendizagem de estudantes do Ensino Superior. Para estudos futuros, indica-se a ampliação da amostra para realização de análises mais robustas, a inclusão de outras medidas de desfechos e a realização da intervenção em diferentes formatos (semanal x intensiva) para investigar se este inflige algum impacto nos desfechos observados. Ainda, recomenda-se estudo de follow-up para verificar se os resultados se alteram com o passar do tempo. Apesar de ainda se fazer necessário avançar estudos na área e, em particular com o programa aqui utilizado, as evidências atuais são promissoras quanto à sua aplicabilidade e utilidade.













