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Journal of Human Growth and Development
versión impresa ISSN 0104-1282
Rev. bras. crescimento desenvolv. hum. vol.21 no.2 São Paulo 2011
PESQUISA ORIGINAL ORIGINAL RESEARCH
Efeitos da shantala na interação entre mãe e criança com síndrome de down
Effects of shantala massage therapy on interaction between mother and child with down's syndrome
Karina Crepaldi BarbosaI; Simone Nomie SatoI; Elaine Gomes dos Reis AlvesII; Alexandre Luiz Affonso FonsecaIII; Fernando Luiz Affonso FonsecaIV; Virgínia Berlanga Campos JunqueiraIV; Alessandra MarquesV; Tatiana Dias de CarvalhoVI; Ligia Ajaime AzzalisVII
IUniversidade Anhembi Morumbi, São Paulo, SP, Brasil
IIDepartamento de Psicologia da Aprendizagem do Desenv. da Personalidade, Instituto de Psicologia, USP, SP, Brasil
IIICoordenadoria de Saúde Bucal de Itaquaquecetuba, SP, Brasil
IVDepartamento de Ciências Biológicas - UNIFESP, Diadema, SP, Brasil
VFaculdade de Medicina do ABC, Santo André, SP, Brasil
VIDepartamento de Medicina, Disciplina de Cardiologia - UNIFESP, São Paulo, SP, Brasil
VIIDepartamento de Ciências Exatas e da Terra - UNIFESP, Diadema, SP, Brasil
RESUMO
O objetivo é verificar os efeitos da Shantala na interação entre mãe e criança com síndrome de Down. Utilizou-se por 60 dias, uma vez por semana, a técnica de massagem Shantala em três crianças com síndrome de Down, da instituição APAE, localizada em Itaquaquecetuba, SP, Brasil. Para a obtenção dos resultados foram aplicados dois questionários, um ao início, para se obter maiores informações sobre as crianças e outro ao final, para se verificar os resultados da técnica utilizada. Foi possível concluir que a Shantala beneficiou as crianças com síndrome de Down, proporcionando uma qualidade de vida melhor. Para as mães, a técnica permitiu uma melhor aceitação da doença e houve melhora no relacionamento entre as mães e as crianças.
Palavras-chave: síndrome de down, shantala, criança.
ABSTRACT
This study aimed to verify the effects of Shantala massage therapy on the interaction between mother and child with Down's syndrome. The methodology consisted in applying the massage technique "Shantala" for 60 days, once a week, on three children from APAE Institution, located at Itaquaquecetuba, SP, Brazil. At the beginning of the treatment we applied a questionnaire to obtain more information about the patient. At the end, it was applied another questionnaire to verify the results of the treatment. It was observed that Shantala benefited the kids with Down's syndrome, providing to them a better quality of life. For the mothers, the technique provided a better acceptability of the disease and an improvement in the relationship between mothers and kids.
Key words: down's syndrome, shantala, child.
INTRODUÇÃO
A síndrome de Down (SD) tem registros antigos na história do homem, sendo os primeiros trabalhos científicos datados do século XIX. Entretanto, seu reconhecimento como uma manifestação clínica só ocorreu com o trabalho de Langdon Down, em 18661,2.
Cerca de 95% de todos os pacientes com SD possuem trissomia do cromossomo 21, resultado da não-disjunção meiótica do par de cromossomo 212,3. Esta síndrome pode ser diagnosticada logo após o nascimento devido à manifestação dos seus principais fenótipos, como: hipotonia muscular generalizada, occipital achatado, pescoço curto e grosso, prega única na palma das mãos e alteração no comprimento4,5.
Crianças com Síndrome de Down seguem uma curva de desenvolvimento motor própria4. É muito importante receberem estímulos desde pequenas para desenvolverem interesses e habilidades que são necessários para a realização de atividades físicas e recreacio-nais4-6. A alegria e satisfação pelo uso efetivo do corpo contribuirão para tornar suas atividades mais agradáveis e recompensadoras7,8, além de promover a interação com o meio2.
Os lactentes com SD podem se engajar com menos frequência em atividades de interação com o ambiente, seja por dificuldades em registrar estímulos cotidianos (como diferentes sons e pessoas), ou por dificuldades em explorar o meio utilizando habilidades motoras8,9. As intervenções motoras permitem avanços nas áreas da motricidade global, equilíbrio e organização espacial, justificando a relevância de programas de intervenção para essa população9,10.
A massagem terapêutica tem demonstrado efeitos positivos no comportamento motor de diversas crianças6,11. A Shantala é uma massagem originária do sul da Índia e é transmitida oralmente de geração para geração. Foi descoberta por Frederick Leboyer11, médico francês que, em uma de suas viagens ao sul da Índia, pôde observar uma mãe massageando seu filho; e batizou a sequência de movimentos com o mesmo nome da mãe que a realizava: Shantala6.
São muitos os benefícios da técnica Shantala, a começar pelo aperfeiçoamento da comunicação com a mãe ou com quem estiver fazendo a massagem, pois o processo beneficia tanto a criança quanto quem está interagindo com ela. Deve-se praticar a massagem nos quatro primeiros meses de vida, ou enquanto a criança não consegue movimentar-se. No entanto, quanto mais tempo a técnica for praticada, melhor será o seu benefício6.
Este estudo objetiva avaliar os efeitos da técnica Shantala em crianças com síndrome de Down.
MÉTODO
O estudo é descritivo, de natureza qualitativa e foi desenvolvido na APAE - Itaquaquecetuba, SP, Brasil. Após a aprovação do trabalho pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Anhembi Morumbi (protocolo 012/2009), foram realizadas duas palestras explicativas, uma para os profissionais da instituição APAE e outra para os responsáveis das crianças.
Três crianças com síndrome de Down foram incluídas no estudo. Os critérios de inclusão foram: crianças com síndrome de Down, entre um e três anos de idade. Foram excluídas crianças com doenças degenerativas.
A intervenção terapêutica foi a utilização da Shantala, em sessões de 20 minutos, uma vez por semana, por 60 dias. Os pais e/ou cuidadores se comprometeram a aplicar a massagem diariamente, de acordo com as orientações recebidas, por pelo menos 15 minutos.
Foram aplicados dois questionários, um ao início, para se obter maiores informações sobre as crianças, e outro ao final, para verificar os resultados da técnica utilizada.
RESULTADOS
As respostas iniciais obtidas foram: as três crianças atendidas moram com os pais; apenas uma criança possui irmãos (duas irmãs adolescentes); todas as crianças ficam a maior parte do dia com a mãe, em casa; apenas uma das mães conhecia a técnica Shantala; todas as mães costumam acariciar, embalar e conversar com as crianças diariamente, ao trocar a fralda ou durante o banho, por aproximadamente dez minutos.
Ao final do estudo, as respostas obtidas foram: as três crianças tiveram um sono mais tranquilo; uma delas conseguiu executar mais movimentos, como andar sem apoio; as outras duas aperfeiçoaram os movimentos que já realizavam anteriormente.
O quadro 1 apresenta os relatos das mães das crianças que participaram do estudo (criança 1, criança 2, criança 3), antes e após o tratamento.
DISCUSSÃO
O presente estudo descritivo, de natureza qualitativa, verificou os efeitos da Shantala em crianças de um a três anos de idade com síndrome de Down. Após 60 dias de aplicação dessa técnica, as três participantes tiveram um sono mais tranquilo e aperfeiçoaram seus movimentos.
Segundo a OMS, os procedimentos de intervenção para o desenvolvimento das crianças com SD são muito importantes porque proporcionam interação entre criança e o meio, juntamente com processos de superação e adaptação4,6,9,10.
O diagnóstico de síndrome de Down gera impacto nas mães. Em decorrência disso, elas apresentam dificuldade de construir expectativas em relação ao desenvolvimento e à escolarização de seus filhos12. Sabe-se que muitas famílias de portadores de necessidades especiais se retiram do convívio entre as demais pessoas da comunidade por vergonha ou preconceito7,12,13. Fortalecer a interação cuidador e criança com necessidades especiais poderia contribuir para aumentar a aceitação da criança entre seus familiares e a própria comunidade.
Essas crianças requerem da família maior tempo e dedicação, especialmente se estiverem em fase de crescimento, período em que estímulos, atenção e cuidado são fundamentais13,14. Cabe ressaltar ainda que as interações estabelecidas na família são as que trazem implicações mais significativas para o desenvolvimento da criança14. A massagem, técnica comum no Oriente, favorece esse vínculo6,11.
No Brasil, a massagem mais utilizada é a Shantala6,11. Segundo Leboyer, o método se baseia no restabelecimento do equilíbrio de energias mediante o tato; estimula o desenvolvimento psicomotor da criança, além de favorecer seu relacionamento com a família, contribuindo para um melhor entendimento da síndrome15.
A Shantala, enquanto toque terapêutico, proporciona a estimulação cutânea e o desenvolvimento psicomotor. O toque estimula a pele, que, por sua vez, produz enzimas necessárias à síntese protéica. Ocorre também a produção de substâncias que ativam a diferenciação de linfócitos T, responsáveis pela imunidade celular16.
Também são observadas diminuição dos níveis de catecolaminas16,17 e produção ativa de neurotransmissores responsáveis pelas sensações de alegria e de bem estar. Como consequência, a criança relaxa, o sono fica mais calmo e mais resistente a barulhos externos, a amamentação é facilitada, a ocorrência de cólicas diminui e o vínculo mãe e filho é ampliado16.
Em lactentes, a aplicação dessa massagem está associada ao ganho de peso e melhora do comportamento. Fogaça et al17 observaram diminuição nos níveis de cortisol salivar em crianças de quatro a seis meses após a massagem Shantala. A diminuição nos níveis de cortisol poderia indicar que ficaram menos estressadas após a massagem. De fato, no presente estudo, as crianças apresentaram um sono mais tranquilo, sentiram-se mais dispostas para brincar durante o dia, executando movimentos melhores do que realizavam antes do tratamento.
Apesar de descrita em 1866, pouco se conhece sobre a relação entre cuidador e criança com síndrome de Down, principalmente quanto à contribuição do cuidador no desenvolvimento motor da criança. A aplicação da massagem promove o toque e carinho, estreitando o vínculo entre mãe e filho, contribuindo o desaparecimento de desconfortos comuns nos lactentes, como: cólicas e sono intranquilo16,18.
Em criança com SD, Carvalho e colaboradores19 verificaram melhora no tônus dos membros superiores, do controle cervical e na qualidade do sono. A aplicação da massagem Shantala resultou em melhora refletida pelo aumento de 36% para 60% de itens avaliados com padrão motor normal presente. A análise tanto dos resultados quanto do relato da mãe demonstra que a massagem Shantala contribuiu de forma positiva para o comportamento motor da criança estudada19.
Os resultados positivos da estimulação através da Shantala foram observados pela evolução em vários aspectos do comportamento motor, como desenvolvimento da linguagem, melhora da preensão manual e da transferência manual de objetos, melhora do controle cefálico, de tronco e de apoio para marcha, assim como da qualidade do sono19.
Ainda sobre os resultados da aplicação de massagem em crianças, Cruz e Caromano20 verificaram que a manipulação aumenta a saturação de oxigênio e com o decorrer do tempo, facilita o ganho de peso em crianças internadas em unidades de terapia intensiva. Uma massagem suave e firme, por 15 minutos, três vezes ao dia, em prematuros, resulta em ganho de peso, provavelmente em razão de um nível mais elevado de hormônios gastrintestinais; em melhor desempenho em testes de controle motor e de envolvimento com as pessoas, além de diminuição no tempo de internação20.
Neste trabalho foi possível verificar que a técnica Shantala fortaleceu o laço da mãe com a criança com SD, havendo um carinho maior, um contato mais afetivo e um melhor desenvolvimento psicomotor e, fundamentalmente um maior envolvimento do responsável com a criança, o que fortalece o vínculo parental. Assim, são necessários mais estudos com o mesmo objetivo, por se tratar de recurso de baixo custo e efetivamente positivo, tanto para o desempenho motor quanto para a interação entre mãe e filho.
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Recebido em: 08/ago./2010
Modificado em 26/nov./2010
Aceito em 16/mar./2011