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Journal of Human Growth and Development

versión impresa ISSN 0104-1282versión On-line ISSN 2175-3598

J. Hum. Growth Dev. vol.32 no.3 Santo André set./dic. 2022  Epub 20-Ene-2025

https://doi.org/10.36311/jhgd.v32.13329 

ARTIGO ORIGINAL

Adesão aos 10 passos para uma alimentação saudável em gestantes do Sudeste Brasileiro

Camila Bruneli do Pradoa 

Edson Theodoro dos Santos Netob 

Silvia das Dores Rissinoc 

Daiene Rosa Gomesd 

Luciane Bresciani Salarolie 

aPrograma de Pós-Graduação em Saúde Coletiva. Universidade Federal do Espírito Santo. Avenida Marechal Campos, 1468, Bonfim, Vitória, Espírito Santo, Brasil;

bPrograma de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Espírito Santo. Avenida Marechal Campos, 1468, Bonfim, Vitória, Espírito Santo, Brasil;

cDepartamento de Computação e Eletrônica, Universidade Federal do Espírito Santo, BR-101, km 60 - Litorâneo, 29932-540, São Mateus, Espírito Santo, Brasil;

dCentro das Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade Federal do Oeste da Bahia. Rua Professor José Seabra de Lemos, 316, Recanto dos Pássaros, CEP 47808-021, Barreiras, Bahia, Brasil;

ePrograma de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Avenida Marechal Campos, 1468, Bonfim, Vitória, Espírito Santo, Brasil;


Síntese dos autores

Por que este estudo foi feito?

O período gestacional é um momento peculiar da existência humana, e as escolhas alimentares das gestantes podem influenciar na saúde do binômio mãe-bebê. Existem poucas publicações que fornecem orientações sobre hábitos de alimentação saudáveis específicos para esta população. Por isso este estudo teve como objetivo investigar, por meio de uma proposta de orientação adaptada às gestantes, a adesão à alimentação saudável e os fatores socioeconômicos e maternos associados.

O que os pesquisadores fizeram e encontraram?

O questionário deste estudo foi desenvolvido com base nas recomendações do Ministério da Saúde Brasileiro e adaptado para gestantes. Os achados deste estudo sugerem necessidades de melhorias na assistência nutricional durante o pré-natal.

O que essas descobertas significam?

O acesso a atividades educativas no pré-natal e características socioeconômicas influenciam nos hábitos alimentares saudáveis das gestantes. Com esses achados, espera-se contribuir com os formuladores de políticas públicas e com os profissionais envolvidos na assistência às gestantes, no sentido de qualificar as orientações nutricionais na assistência à saúde do binômio mãe-bebê durante o pré-natal.

Palavras-Chave: gestantes; nutrição pré-natal; tecnologia; promoção da saúde

Resumo

Introdução

orientações nutricionais no pré-natal podem influenciar no comportamento alimentar da gestante e reduzir os riscos para o binômio mãe-bebê.

Objetivo

analisar a adesão aos 10 passos para alimentação saudável na gestação e sua associação com fatores maternos e socioeconômicos em gestantes do Espírito Santo, Brasil.

Método

os dados foram obtidos por meio de um questionário eletrônico amplamente divulgado em redes sociais. Foram coletados dados socioeconômicos, do pré-natal e do comportamento alimentar de 368 participantes. Utilizou-se como critério de avaliação os 10 Passos para Alimentação Saudável na gestação, adaptados do Ministério da Saúde do Brasil, com utilização do Sistema Elogiar-Orientar-Recomendar (EOR). O teste Qui-quadrado de Pearson e o exato de Fisher foram usados para analisar as diferenças entre as proporções. O modelo de regressão logística binária foi utilizado para investigar a associação entre as variáveis independentes e os passos para uma alimentação saudável. Adotou-se o nível de significância de 5% e o intervalo de confiança de 95%.

Resultados

a maioria das gestantes referiu adesão de 3 a 5 passos (78.5%), enquadrando-se na categoria O-Orientar. Observou-se que receber orientações nutricionais no pré-natal aumentou a adesão no passo 4 (Limitar o consumo de alimentos processados; OR: 1.99; IC95%: 1.26-3.15), no passo 5 (Evitar consumir alimentos ultraprocessados e lanches rápidos; OR: 2.02; IC95%: 1.26-3.24) e no passo 9 (Planejar as compras de alimentos, organize a despensa doméstica e defina com antecedência o cardápio da semana; OR: 1.66; IC95%: 1.66-2.58).

Conclusão

o acesso às orientações nutricionais durante a assistência pré-natal influenciou nos hábitos alimentares das gestantes. Os resultados sugerem a necessidade de fortalecimento das ações do pré-natal, principalmente relacionadas às orientações quanto ao incentivo aos hábitos alimentares saudáveis e adequados.

Palavras-Chave: gestantes; nutrição pré-natal; tecnologia; promoção da saúde

Authors summary

Why was this study done?

The gestational period is a peculiar moment of human existence, and the food choices of pregnant women can influence the health of the mother-baby binomial. There are few publications that provide guidance on healthy eating habits specific to this population. Therefore, this study aimed to investigate, through a proposal of guidance adapted to pregnant women, adherence to healthy eating and associated socioeconomic and maternal factors.

What did the researchers do and find?

The questionnaire of this study was developed based on the recommendations of the Brazilian Ministry of Health and adapted for pregnant women. The findings of this study suggest the need for improvements in nutritional assistance during prenatal care.

What do these findings mean?

Access to educational activities in prenatal care and socioeconomic characteristics influence the healthy eating habits of pregnant women. With these findings, it is expected to contribute to public policymakers and professionals involved in the care of pregnant women, in order to qualify nutritional guidelines in the health care of the mother-baby binomial during prenatal care.

Key words: pregnant women; prenatal nutrition; technology; health promotion

Abstract

Introduction

nutritional guidelines in prenatal care can influence the pregnant woman’s eating behavior, reducing the risks for the mother-baby binomial.

Objective

to analyze adherence to the 10 steps for healthy eating during pregnancy and its association with maternal and socioeconomic factors in pregnant women in Espírito Santo, Brazil.

Methods

data were obtained through an electronic questionnaire widely publicized on social networks. Socioeconomic, prenatal and eating behavior data were collected from 368 participants. The 10 Steps to Healthy Eating during pregnancy, adapted from the Brazilian Ministry of Health, using the Praise-Guide-Recommend System (EOR) were used as evaluation criteria. Pearson’s chi-square test and Fisher’s exact test were used to analyze differences between proportions. The binary logistic regression model was used to investigate the association between independent variables and steps towards healthy eating. A significance level of 5% and a confidence interval of 95% were adopted.

Results

most pregnant women reported adherence of 3 to 5 steps (78.5%), fitting into the O-Orientation category. It was observed that receiving nutritional guidance during prenatal care increased adherence in step 4 (Limit consumption of processed foods; OR: 1.99; 95%CI: 1.26-3.15), in step 5 (Avoid consuming ultra-processed foods and fast snacks; OR: 2.02; 95%CI: 1 .26-3.24) and step 9 (Plan food shopping, organize the domestic pantry and define the week’s menu in advance; OR: 1.66; 95%CI: 1.66-2.58).

Conclusion

access to nutritional guidelines during prenatal care influenced the eating habits of pregnant women. The results suggest the need to strengthen prenatal actions, mainly related to guidelines on encouraging healthy and adequate eating habits.

Key words: pregnant women; prenatal nutrition; technology; health promotion

INTRODUÇÃO

Hábitos alimentares inadequados estão fortemente associados a um aumento na prevalência e na mortalidade por doenças crônicas não transmissíveis, na população geral1, e podem resultar de influências sociais, culturais e econômicas, como acessibilidade, disponibilidade, publicidade e preço2,3. Assim, a alimentação saudável pode ser considerada de caráter multidimensional4.

Neste cenário, a alimentação pode influenciar nos desfechos da gestação, e desempenham um papel vital na saúde materno-infantil e na ocorrência de doenças na vida adulta5,6. Evidências indicam que o consumo alimentar inadequado na gestação pode implicar em consequências nutricionais prejudiciais, como ganho de peso gestacional acima do recomendado e adiposidade neonatal7,8. Tais consequências podem aumentar o risco de morbidade e mortalidade materna e prejuízos para a saúde e nutrição do feto e do recém-nascido9,10.

Com o intuito de orientar a alimentação saudável, o Ministério da Saúde brasileiro desenvolveu o novo Guia Alimentar para a População Brasileira, e a proposta dos dez passos para alimentação saudável. Conforme o guia11, a alimentação saudável baseia-se no consumo de alimentos variados em conformidade com as necessidades nutricionais individuais, com base na regra de ouro em dar preferência a alimentos in natura ou minimamente processados, e em harmonia com o meio cultural e social ao qual o indivíduo está inserido11.

No entanto, no Brasil, estudos identificaram na dieta das gestantes o baixo consumo de alimentos in natura ou minimamente processados12,13 e o aumento no consumo de alimentos ultraprocessados14, e isto sinaliza a necessidade de melhorias na qualidade da dieta. Nesse sentido, a incorporação de orientações nutricionais durante a assistência pré-natal torna-se essencial por ter o potencial de afetar o comportamento alimentar das gestantes15,10.

Dessa forma, considerando os riscos associados à alimentação inadequada para o binômio mãe-bebê e a necessidade de estudos nesta temática em mulheres grávidas, o presente trabalho teve por objetivo analisar a adesão aos 10 passos para alimentação saudável na gestação e sua associação com fatores maternos e socioeconômicos em gestantes do Espírito Santo, Brasil.

MÉTODO

Desenho e período do estudo

Trata-se de um estudo do tipo transversal, realizado com gestantes residentes no Estado do Espírito Santo, Brasil, no período de junho a setembro de 2021, por meio de um instrumento eletrônico autoaplicável.

População e critérios de elegibilidade

A amostra do estudo foi obtida considerando a fórmula de tamanho amostral para estimar a proporção de gestantes que utilizam redes sociais para participarem de grupo, considerando a população de nascidos vivos de 53.569 em 2020 no Espírito Santo, de acordo com o Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC)16. Foi estabelecida uma proporção esperada igual a 62% de adesão a 1 ou 2 passos dos 10 passos para alimentação saudável, oriunda de um estudo prévio17, com um intervalo de confiança de 95% e um erro amostral de 5%. Esses cálculos foram realizados no programa WinPepi©, versão 3.18, e resultaram num tamanho de amostra requerido de 360 gestantes respondentes.

A população deste estudo foi composta por gestantes que atenderam aos seguintes critérios de inclusão: (1) gestantes em qualquer período da gestação; (2) que possuíam acesso à internet; (3) e que responderam ao questionário completo. Durante o preenchimento do questionário, se os itens 1 e 2 fossem respondidos negativamente, o mesmo era encerrado automaticamente. Foram excluídas do estudo gestantes menores de 20 anos.

Coleta de dados

Os dados foram coletados por meio de questionário on-line, construído na plataforma Research Electronic Data Capture (REDCap) e hospedado em https://redcap.ufes.br/18,19. A pesquisa foi divulgada por meio de um convite com o link de acesso em redes sociais (Facebook e Instagram), incluindo aplicativo de conversação on-line (WhatsApp). Todas as informações foram autorreferidas pelas gestantes participantes do estudo.

Análise de dados

Variáveis

Foram investigadas as seguintes características socioeconômicas: idade (20 a 34 anos, 35 anos ou mais), escolaridade (≤8 anos, >8 anos), raça/cor (branca, preta, parda, amarela, indígena), situação conjugal (com companheiro, sem companheiro), mulher chefe da família (sim, não), ocupação humana domiciliar (até 2 pessoas, >2 pessoas) e renda familiar (menos de 1 até 3 salários mínimos, mais de 3 até 5 salários mínimos, mais de 5 salários mínimos). Também foram avaliados os seguintes fatores maternos: período gestacional (primeiro trimestre, segundo trimestre e terceiro trimestre), realização de acompanhamento (sim, não), dificuldade de acesso ao pré-natal durante pandemia de COVID-19 (sim, não) e orientações nutricionais (sim, não).

O desfecho investigado foi a adesão a cada passo para uma alimentação saudável, utilizando-se como referência os 10 Passos para Alimentação Saudável na gestação, que foram adaptados do Ministério da Saúde brasileiro11. Os passos adaptados incluem:

  1. Priorizar Consumo De Alimentos In Natura (como Frutas, Verduras, Legumes, Ovos E Carnes) Minimamente Processados (como Leite, Farinha, Frutas Secas, Castanhas) No Consumo Diário Ou Preparo Dos Alimentos;

  2. Realizar Refeições Com Frequência, Ou Seja, Pelo Menos Três Refeições (café Da Manhã, Almoço E Jantar) E Duas Refeições Menores Por Dia, Evitando Ficar Muitas Horas Sem Comer;

  3. Utilizar Óleo, Sal E Açúcar Com Moderação;

  4. Limitar O Consumo De Alimentos Processados;

  5. Evitar Consumir Alimentos Ultraprocessados E Lanches Rápidos;

  6. Procurar Fazer Compras De Alimentos Em Mercados, Feiras Livres E Feiras De Produtores E Outros Locais Que Comercializam Variedades De Alimentos In Natura Ou Minimamente Processados;

  7. Se Você Tem Habilidades Culinárias, Procurar Desenvolvê-las E Partilhá-las, Principalmente Com Crianças E Jovens, De Todas As Idades E Gêneros. Se Você Não Sabe Cozinhar, Procure Aprender;

  8. Consumir Diariamente Alimentos Ricos Em Ferro Para Evitar Anemia (falta De Ferro No Sangue), Tais Como Carnes Vermelhas, Miúdos, Feijões, Lentilha, Grão-de-bico, Soja, Folhas Verde-escuras Entre Outros;

  9. Planejar As Compras De Alimentos, Organize A Despensa Doméstica E Defina Com Antecedência O Cardápio Da Semana;

  10. Ser Crítico Com A Publicidade De Alimentos.

Além da adesão a cada passo, foi investigada a frequência de adesão aos 10 passos considerando o Sistema Elogiar-Orientar-Recomendar (EOR)20. Para isso, as questões foram estruturadas com opções de repostas e valores, conforme a seguir: segue a recomendação (valor=0) e não segue a recomendação (valor=1). O score EOR foi calculado considerando a soma de cada item, variando de 0 a 10 pontos.

O score EOR busca avaliar as diversas dimensões do indivíduo e serve para valorizar ou reforçar algum cuidado, sendo então direcionado à promoção de melhorias na prática clínica do profissional e maior autonomia da família no processo de cuidar20. Para este estudo, foi considerado E-Elogiar quando o score resultante era menor ou igual a 1; O-Orientar quando o score resultante entre 1 e 5; e R-Recomendar quando o resultante estava acima de 5, indicando baixa adesão aos passos.

Métodos estatísticos

Os dados coletados foram armazenados na plataforma do REDCap e exportados para o programa estatístico IBM SPSS Statistics for Windows, versão 22.0. Foi realizada estatística descritiva por meio de frequência e proporção, e as associações estatísticas por meio do teste do Qui-quadrado de Pearson e, quando os valores esperados nas células da tabela eram inferiores a cinco, foi utilizado o teste exato de Fisher. Todas as variáveis atenderam aos pressupostos de ausência de multicolinearidade. O modelo de regressão logística binária foi utilizado para testar associações entre a adesão aos passos e variáveis independentes (variáveis sociodemográficas e fatores maternos). As variáveis independentes que apresentaram a partir do teste do Qui-quadrado associação com o desfecho, com p-valor menor que 20%, foram incluídas no modelo de regressão logística binária. Considerou-se um nível de significância menor que 5% e intervalo de confiança (IC) de 95%, com cálculo da Odds Ratio (OR).

Aspectos éticos e legais da pesquisa

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Centro de Ciências da Saúde (CCS) da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), sob protocolo CAAE: 45314921.8.0000.5060 e parecer nº 4.692.710. Todas as participantes tiveram acesso ao TCLE eletrônico.

RESULTADOS

O link da pesquisa contou com 568 acessos (100%), no entanto, houve a exclusão de 200 (35,21%), conforme critérios de inclusão e exclusão pré-estabelecidos. Foram incluídas na pesquisa N=368 (64,78%) gestantes.

Tabela 1 : Dados socioeconômicos e fatores maternos de gestantes, Espírito Santo, 2021 

Variáveis n(%)
Idade
20 a 34 anos 292(79,3)
35 anos ou mais 76(20,7)
Raça/cor
Branca 181(49,2)
Preta 37(10,1)
Parda 142(38,6)
Amarela 6(1,6)
Indígena 2(0,5)
Ocupação Humana Domiciliar
Até 2 pessoas 288(78,3)
> 2 pessoas 80(21,7)
Situação conjugal
Não tem companheiro 11(3,0)
Tem companheiro 357(97,0)
Escolaridade
≤ 8 anos 28(7,6)
> 8 anos 340(92,4)
Mulher chefe da família
Sim 89(24,2)
Não 279(75,8)
Renda familiar
Menos de 1 até 3 salários mínimos 149(40,5)
Mais de 3 até 5 salários mínimos 110(29,9)
Mais de 5 salários mínimos 109(29,6)
Período Gestacional
Primeiro trimestre 74(20,1)
Segundo trimestre 173(47)
Terceiro trimestre 121(32,9)
Realização de acompanhamento pré-natal
Sim 364(98,9)
Não 4(1,1)
Dificuldade de acesso pré-natal durante a pandemia COVID-19
Sim 70(19,0)
Não 298(81,0)
Orientações nutricionais no pré-natal
Sim 229(62,2)
Não 139(37,8)

N=368

A maioria das gestantes estava na faixa etária de 20 a 34 anos (79,3%), tinha renda familiar de até 3 salários mínimos (40,5%), era de raça/cor branca (49,2%), possuía nível de escolaridade maior que oito anos de estudo (92,4%), não era considerada a principal fonte de renda da família (75,8%) e vivia com companheiro (89,1%).

Grande parte das gestantes participantes da pesquisa estava no segundo trimestre gestacional (47%) e realizava o acompanhamento pré-natal (98,9%). Quanto à oferta de orientações nutricionais, 229 (62,2%) gestantes relataram que receberam orientações, e que a pandemia de COVID-19 dificultou o acesso ao pré-natal de 19%.

Na tabela 2 pode-se observar a adesão a cada passo da alimentação saudável. Nota-se que apenas os passos 4 e 9 apresentam uma frequência de adesão menor do que 60%.

Tabela 2 : Adesão aos 10 Passos para uma Alimentação Saudável na Gestação e classificação do score EOR de gestantes, Espírito Santo, 2021 

Variáveis Adesão
Passos n(%)
(Passo 1) Priorizar o consumo de alimentos in natura 322(87,5)
(Passo 2) Realizar refeições com frequência e regularidade 322(87,5)
(Passo 3) Utilizar temperos com moderação 319(86,7)
(Passo 4) Evitar consumir com frequência alimentos processados 163(44,3)
(Passo 5) Evitar consumir com frequência alimentos ultraprocessados 227(61,7)
(Passo 6) Comprar alimentos em feira 222(60,3)
(Passo 7) Cozinhar as refeições 326(88,6)
(Passo 8) Consumir alimentos ricos em ferro 296(80,4)
(Passo 9) Planejar compras e preparo das refeições 205(55,7)
(Passo 10) Desconsiderar a publicidade de alimentos 256(69,6)
Score EOR
Elogiar (Adesão 9 a 10 passos) 45(12,2)
Orientar (Adesão 5 a 8 passos) 289(78,5)
Recomendar (Adesão de até 4 passos) 34(9,2)

N=368

Em relação ao score EOR, 78,5% das gestantes enquadraram-se no O-Orientar. Em relação à testagem binária do Sistema EOR, com as demais variáveis investigadas, diferenças significativas não foram observadas. Nesse caso, a adesão a cada passo da alimentação saudável foi analisada individualmente.

A frequência de adesão aos passos foi categorizada e analisada de acordo com as variáveis socioeconômicas e fatores maternos (tabela 3). Em relação ao passo 1, os resultados mostraram significância estatística nas variáveis escolaridade (p=0,004) e renda (p=0,026). Nos passos 3, 4 e 5 a idade (p=0,007; p=0,031; p=0,001 respectivamente) associou-se significativamente. Em relação ao passo 5 a maior adesão esteve associada à raça/cor (p=0,008) e renda familiar (p<0,001).

Tabela 3 : Frequências de adesão aos 10 passos para uma alimentação saudável segundo fatores maternos e socioeconômicas, Espírito Santo, 2021 

P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7 P8 P9 P10
Socioeconômicas
Idade [p valor#] 0,846 0,846 0,007* 0,031* 0,001* 0,407 0,895 0,489 0,864 0,381
20 a 34 anos 87,3 87,7 84,2 41,4 57,2 59,2 88,7 81,2 55,5 68,5
35 anos ou mais 88,2 86,8 96,1 55,3 78,9 64,5 88,2 77,6 56,6 73,7
Raça/cor [p valor#] 0,124 0,378 0,431 0,438 0,008* 0,350 0,118 0,051 0,407 0,933
Branca 91,2 90,1 86,7 47,5 69,1 57,5 85,1 84,5 58,6 69,1
Preta 83,8 86,5 81,1 48,6 45,9 70,3 91,9 67,6 48,6 67,6
Parda 84,5 85,2 88,7 40,8 56,3 59,9 92,3 79,6 52,8 70,4
Ocupação Humana Domiciliar [p valor#] 0,252 0,445 0,539 0,690 0,056 0,006* 0,041* 0,138 0,157 0,650
Até 2 pessoas 86,5 88,2 86,1 43,8 64,2 56,6 86,8 78,8 57,6 70,1
> 2 pessoas 91,3 85,0 88,8 46,3 52,5 73,8 95,0 86,3 48,8 67,5
Situação conjugal [p valor#] 0,635 0,147 1 1 0,346 0,759 0,119 0,236 0,226 0,321
Não tem companheiro 81,8 72,7 90,9 45,5 45,5 54,5 72,7 63,6 36,4 54,5
Tem companheiro 87,7 88,0 86,6 44,3 62,2 60,5 89,1 81,0 56,3 70,0
Escolaridade [p valor#] 0,004* 0,066 0,399 0,579 0,084 0,040* 0,228 0,813 0,813 0,290
≤ 8 anos 67,9 75,0 82,1 39,3 46,4 78,6 96,4 82,1 53,6 60,7
> 8 anos 89,1 88,5 87,1 44,7 62,9 58,8 87,9 80,3 55,9 70,3
Mulher chefe da família [p valor#] 0,747 0,290 0,259 0,116 0,202 0,674 0,064 0,271 0,279 0,194
Sim 86,5 84,3 83,1 37,1 67,4 58,4 83,1 76,4 60,7 64
Não 87,8 88,5 87,8 46,6 59,9 60,9 90,3 81,7 54,1 71,3
Renda familiar [p valor#] 0,026* 0,729 0,082 0,104 <0,001* 0,657 0,003* 0,149 0,169 0,394
Menos de 1 até 3 salários mínimos 81,9 85,9 81,9 40,9 49,7 61,1 92,6 76,5 51,0 65,8
Mais de 3 até 5 salários mínimos 91,8 89,1 90,0 52,7 67,3 62,7 91,8 80,0 62,7 70,9
Mais de 5 salários mínimos 90,8 88,1 89,9 40,4 72,5 56,9 79,8 86,2 55,0 73,4
Fatores maternos
Período gestacional [valor p#] 0,115 0,695 0,118 0,829 0,535 0,188 0,815 0,462 0,633 0,427
1º trimestre 94,6 85,1 82,4 41,9 66,2 58,1 86,5 81,1 56,8 74,3
2º trimestre 86,1 87,3 85 43,9 59 56,6 89 82,7 53,2 66,5
3º trimestre 85,1 89,3 91,7 46,3 62,8 66,9 89,3 76,9 58,7 71,1
Realização de acompanhamento Pré-Natal [valor p#] 1 1 1 0,633 1 1 0,385 0,173 1 0,233
Não 100 100 100 25 75 75 75 50 50 100
Sim 87,4 87,4 86,5 44,5 61,5 60,2 88,7 80,8 55,8 69,2
Dificuldade de acesso pré-natal durante a pandemia COVID-19 [valor p#] 0,88 0,269 0,791 0,592 0,823 0,452 0,096 0,57 0,788 0,031*
Não 88,9 86,6 86,9 45 61,4 59,4 87,2 79,9 55,4 72,1
Sim 81,4 91,4 85,7 41,4 62,9 64,3 94,3 82,9 57,1 58,6
Orientações nutricionais no pré-natal [valor p#] 0,239 0,031* 0,040* 0,003* <0,001* 0,286 0,77 0,017* 0,013* 0,183
Não 84,9 82,7 82 34,5 48,9 56,8 89,2 74,1 47,5 65,5
Sim 89,1 90,4 89,5 50,2 69,4 62,4 88,2 84,3 60,7 72,1

#Qui-quadrado ou Exato de Fisher. *Valores estatisticamente significantes (p<0,05). Percentual descrito referente a adesão a cada passo. Legenda: P1: Passo 1, Priorizar o consumo de alimentos in natura; P2: Passo 2, Realizar refeições com frequência e regularidade; P3: Passo 3, Utilizar temperos com moderação. P4: Passo 4, Evitar consumir com frequência alimentos processados; P5: Passo 5, Evitar consumir com frequência alimentos ultraprocessados; P6: Passo 6, Comprar alimentos em feira; P7: Passo 7, Cozinhar as refeições; P8: Passo 8, Consumir alimentos ricos em ferro; P9: Passo 9, Planejar compras e preparo das refeições; P10: Passo 10, Desconsiderar a publicidade de alimentos.

A variável “orientações nutricionais durante o acompanhamento pré-natal” esteve associada a seis dos dez passos. Assim, gestantes que receberam orientações apresentaram maior frequência de adesão ao passo 2 (p=0,031), passo 3 (p=0,040), passo 4 (p=0,003), passo 5 (p<0,001), passo 8 (p=0,17) e passo 9 (p=0,013).

Na tabela 4 estão as variáveis associadas na regressão logística binária, realizada com o intuito de identificar os fatores associados a adesão aos passos para alimentação saudável na gestação. Nenhuma variável independente permaneceu associada ao passo 1 e passo 2.

Tabela 4 : Regressão logística binária, considerando as variáveis associadas a adesão aos 10 passos para uma alimentação saudável em gestantes, Espírito Santo, 2021 

P1 P2 P3 P4 P5 P6 P7 P8 P9 P10
p valor p valor p valor p valor p valor p valor p valor p valor p valor p valor
OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%)
Idade
20 a 34 anos - - 1 1 1 - - - - -
35 anos ou mais - - 0,019 0,038 0,006 - - - - -
4,26 1,74 2,41
(1,27-14,30) (1,03-2,93) (1,29-4,52)
Raça/cor
Branca 1 - - - 1 - 1 1 - -
Preta 0,346 - - - 0,081 - 0,368 0,046 - -
0,59 0,5 1,85 0,42
(0,20-1,74) (0,23-1,08) (0,48-7,06) (0,18-0,98)
Parda 0,233 - - - 0,333 - 0,246 0,525 - -
0,64 0,78 1,58 0,82
(0,30-1,33) (0,47-1,28) (0,72-3,43) (0,45-1,50)
Ocupação Humana Domiciliar
Até 2 pessoas - - - - 1 1 1 1 1 -
> 2 pessoas - - - - 0,074 0,012 0,122 0,048 0,229 -
0,6 2,07 2,37 2,13 0,73
(0,34-1,05) (1,17-3,65) (0,79-7,08) (1,00-4,53) (0,44-1,21)
Renda familiar
Menos de 1 até 3 salários mínimos 1 - 1 1 1 - 1 1 1 1
p valor p valor p valor p valor p valor p valor p valor p valor p valor p valor
OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%) OR (IC95%)
Mais de 3 até 5 salários mínimos 0,11 - 0,204 0,251 0,116 - 0,917 0,762 0,158 0,651
2,06 1,66 1,35 1,58 1,05 1,1 1,44 1,13
(0,84-5,03) (0,76-3,62) (0,80-2,26) (0,89-2,79) (0,40-2,71) (0,58-2,10) (0,86-2,42) (0,65-1,96)
Mais de 5 salários mínimos 0,278 - 0,255 0,302 0,058 - 0,044 0,193 0,917 0,364
1,63 1,58 0,75 1,79 0,42 1,62 0,97 1,3
(0,67-3,97) (0,71-3,5) (0,44-1,28) (0,98-3,29) (0,18-0,97) (0,78-3,38) (0,57-1,63) (0,73-2,29)
Período gestacional
1º trimestre 1 - 1 - - 1 - - - -
2º trimestre 0,215 - 0,47 - - 0,772 - - - -
0,49 1,32 0,92
(0,16-1,51) (0,62-2,80) (0,52-1,61)
3º trimestre 0,098 - 0,039 - - 0,178 - - - -
0,38 2,58 1,52
(0,12-1,19) (1,04-6,38) (0,82-2,79)
Conclusão
Dificuldade de acesso ao pré-natal na pandemia COVID-19
Não - - - - - - 1 - - 1
Sim - - - - - - 0,186 - - 0,041
2,08 0,56
(0,70-6,21) (0,32-0,97)
Orientações nutricionais no pré-natal
Não - 1 1 1 1 - - 1 1 1
Sim - 0,64 0,186 0,003 0,003 - - 0,109 0,025 0,358
1,81 1,54 1,99 2,02 1,59 1,66 1,25
(0,96-3,41) (0,81-2,93) (1,26-3,15) (1,26-3,24) (0,90-2,80) (1,06-2,58) (0,77-2,01)

Regressão logística binária. Casos de significância estatística menor de 20% na análise univariada foram incluídos nas análises. Legenda: P1: Passo 1, Priorizar o consumo de alimentos in natura; P2: Passo 2, Realizar refeições com frequência e regularidade; P3: Passo 3, Utilizar temperos com moderação. P4: Passo 4, Evitar consumir com frequência alimentos processados; P5: Passo 5, Evitar consumir com frequência alimentos ultraprocessados; P6: Passo 6, Comprar alimentos em feira; P7: Passo 7, Cozinhar as refeições; P8: Passo 8, Consumir alimentos ricos em ferro; P9: Passo 9, Planejar compras e preparo das refeições; P10: Passo 10, Desconsiderar a publicidade de alimentos. IC: Intervalo de Confiança. OR: Odds ratio.

No passo 3, ter idade igual ou maior do que 35 anos (p valor: 0,019; OR: 4,26; IC95%: 1,27-14,30) e estar no 3º trimestre gestacional (p valor: 0,019; OR: 2,58; IC95%: 1,04-6,38), aumentaram a chance de a gestante aderir à recomendação.

Em relação ao passo 4, ter idade ≥35 anos (p valor: 0,038; OR: 1,74; IC95%: 1,03-2,93) e receber orientações nutricionais no pré-natal (p valor: 0,003; OR: 1,99; IC95%: 1,26-3,15) foram associados ao aumento na chance de as gestantes aderirem à recomendação, limitando o consumo de alimentos processados.

Quanto ao consumo de alimentos ultraprocessados (passo 5), a idade ≥35 anos (p valor: 0,006; OR: 2,41; IC95%: 1,29-4,52) e as orientações nutricionais no pré-natal (p valor: 0,003; OR: 2,02; IC95%: 1,26-3,24) aumentaram a chance de adesão às recomendações que indicam a redução no consumo deste tipo de alimento.

Ter mais de duas pessoas morando na mesma residência aumentou em duas vezes a chance de adesão ao passo 6 (p valor: 0,012; OR: 2,07; IC95%: 1,17-3,65) e ao passo 8 (p valor: 0,048; OR: 2,13; IC95%: 1-4,53). Gestantes de raça/cor preta apresentaram 58% menos chance de não consumir alimentos ricos em ferro (p valor: 0,046; OR: 0,42; IC95%: 0,18-0,98), conforme recomendações do passo 8. Em relação ao passo 7, ter renda maior 5 salários mínimos aumentou em 58% a probabilidade de a gestante não cozinhar as refeições (p valor: 0,044; OR: 0,42; IC95%: 0,18-0,97).

Gestantes que receberam orientações nutricionais apresentaram 66% mais chance de planejar as compras e o preparo das refeições (p valor: 0,025; OR: 1,66; IC95%: 1,66-2,58), ou seja, adesão ao passo 9. Já em relação ao passo 10, gestantes com dificuldade de acesso ao pré-natal durante a pandemia de COVID-19 tiveram 44% mais chance de não seguir as recomendações (p valor: 0,041; OR: 0,56; IC95%: 0,32-0,97).

DISCUSSÃO

No presente estudo foram identificadas associações entre adesão às recomendações e acesso ao pré-natal e características socioeconômicas, como idade ≥35 anos e o maior número de pessoas na mesma residência. Dentre nossos achados, as gestantes que receberam orientações nutricionais no pré-natal apresentaram menores chances de dar preferência ao consumo de alimentos processados e ultraprocessados.

A adesão aos passos diverge entre as faixas etárias, e foi identificada maior adesão às recomendações dos passos 3, 4 e 5 entre gestantes com idade igual ou maior do que 35 anos. Esse achado corrobora a literatura científica, visto que mulheres mais velhas tendem a ter um padrão mais saudável e consciente, em comparação com as mais jovens21.

Cabe ressaltar que ser gestante com 35 anos ou mais se caracteriza como idade materna avançada e assim pode revelar diferenças sociais, visto que as mulheres que postergam a gestação tendem a apresentar melhores características sociais e econômicas22. Assim sendo, por meio da maior escolaridade, melhor acesso à educação e informação, estas gestantes tendem a ter uma maior preocupação quantos aos desfechos obstétricos, podem ter maior cuidado com a própria saúde e a alimentação21,23.

Fatores socioeconômicos tendem a refletir nos hábitos alimentares das gestantes6. Neste estudo, gestantes de raça/cor preta referiram baixa adesão ao passo 8, e isso pode significar uma preocupação quanto as necessidades nutricionais da mãe e bebê neste período24. Um estudo realizado com gestantes de 3º trimestre encontrou que mulheres de raça/cor negra tendiam a alimentar-se de modo mais inadequado, quando comparadas com raça/cor branca25. Adicionalmente, um estudo de Victora et al.26 encontrou baixo número de consultas pré-natal em mulheres negras em comparação a mulheres brancas, emergindo problemas no acesso pré-natal e a necessidade de intervenções de promoção a saúde nutricional a este público24.

Outra questão levantada, relacionada a este achado, é que mulheres de raça/cor negra podem apresentar maior vulnerabilidade social, com baixo nível educacional e socioeconômico, que pode levar à insegurança alimentar e influenciar nos indicadores nutricionais ruins27,28.

Em relação às características socioeconômicas, o maior número de pessoas na mesma residência contribuiu com a chance de adesão ao passo 6, que indica a preferência por comprar alimentos em feira, e ao passo 8, que indica consumir alimentos ricos em ferro. Este achado sugere que o apoio familiar nas tarefas domésticas contribui para que a família tenha tempo de organizar as refeições e consequentemente comprar alimentos nas feiras, e corroborar com a hipótese de que a estrutura familiar pode influenciar no consumo alimentar das gestantes29.

Quanto ao hábito de cozinhar as próprias refeições (Passo 7), gestantes com maior renda indicaram a não adesão a esta recomendação. Dada a influência de fatores econômicos, o status social mais alto pode permitir que a gestante contrate alguém para preparar as refeições da família2. Outra possível explicação é o alto poder de compra, incluindo alimentos prontos para o consumo30.

Neste estudo, os dados revelam que receber orientações nutricionais no pré-natal influência diretamente nas escolhas e no comportamento alimentar das gestantes. Aquelas que receberam orientações sobre nutrição seguiram 3 das 10 recomendações para a alimentação saudável. As participantes que receberam informações sobre alimentação saudável durante o pré-natal tiveram maior chance de adesão aos passos 4 e 5, que correspondem à redução no consumo de processados e ultraprocessados, seguindo as recomendações de que a gestante deve buscar ter uma alimentação rica em alimentos naturais e pobres em alimentos processados, em prol do bem-estar materno e fetal11. Conforme recomendações do guia alimentar brasileiro os alimentos processados devem ser consumidos de forma moderada e os ultraprocessados evitados, visto que são nutricionalmente desbalanceados, induzem ao consumo excessivo e interferem nos hábitos culturais alimentares da população11. Nosso achado foi semelhante ao do estudo de Pereira et al.31 em que as gestantes que receberam orientações no pré-natal apresentaram maiores chances de consumir alimentos minimamente processados, e isto ressalta a importância de atividades educativas no pré-natal na mudança de comportamento, principalmente em relação aos conhecimentos e práticas alimentares32.

As gestantes que receberam orientações nutricionais no pré-natal também tinham mais chances de planejar as compras e as refeições (passo 9). Relacionado a este achado, podemos destacar que tais orientações no pré-natal contribuem para além das escolhas alimentares, na organização da alimentação da família, e evidencia a relevância da educação alimentar e nutricional no pré-natal realizada por uma equipe multiprofissional capacitada12.

Ressalta-se que este estudo foi conduzido durante a pandemia de COVID-19 no Brasil, e a dificuldade de acesso ao pré-natal, ocasionada pelo avanço da pandemia, emergiu a baixa adesão ao passo 10. A pandemia de COVID-19 ocasionou sobrecarga nos serviços de saúde levando a uma diminuição da cobertura pré-natal, como consultas e realização de exames33. Além do acesso, um estudo realizado com puérperas na região Sul no Brasil, no primeiro ano da pandemia de COVID-19, encontrou um percentual de 17,4% de assistência pré-natal inadequada34.

Com esses achados, verifica-se a importância da cobertura e da qualidade do serviço prestado no pré-natal, dado que o maior acesso permite uma melhor oportunidade do cuidado e transmissão de informações qualificadas à gestante35. No entanto, apesar da alta cobertura de assistência pré-natal no Brasil36, problemas relacionados à oferta de atividades educativas ainda são encontrados37-39, o que o torna inadequado em algumas de suas regiões geográficas40.

Ainda cabe destacar que o score EOR é considerado um direcionamento para possíveis condutas clínicas21. A utilização desse score pode ser considerada inovadora e de fácil aplicação nas ações educativas de orientação nutricional no pré-natal e realização de pesquisas.

As limitações deste estudo estão relacionadas à possibilidade de ocorrência de vieses de memória e do autorrelato, uma vez que a pesquisa foi autoaplicável. É importante observar que a amostra deste estudo foi composta por gestantes com acesso à internet e de maior nível socioeconômico. Embora a amostra possa não ser representativa da população brasileira, a compreensão de novos fatores para atender às diretrizes recomendadas para uma alimentação saudável pode ajudar a orientar futuras intervenções. Outra possível limitação foi relacionada a inclusão de gestantes de qualquer trimestre gestacional, no entanto, durante as ações pré-natal a gestante deve receber orientações nutricionais desde a primeira consulta. Além disso, nosso estudo baseou-se em dados transversais, e foi dispensado atribuições causais.

CONCLUSÃO

A maioria das gestantes aderiu de três a cinco passos enquadrando-se na categoria O-Orientar. O acesso às orientações nutricionais durante a assistência pré-natal influenciou nos hábitos alimentares das gestantes. No presente estudo, a idade ≥35 anos e o maior número de pessoas na mesma residência influenciaram na adesão aos passos para uma alimentação saudável e, assim como a raça/cor negra, renda maior do que 5 salários mínimos e a dificuldade de acesso às ações pré-natal na pandemia de COVID-19 associaram-se a não adesão.

Os dados indicaram que receber informações sobre alimentação saudável durante o pré-natal contribuem para a redução no consumo de alimentos processados e ultraprocessados, conferindo às gestantes uma alimentação mais saudável e reforçando a importância de intervenções nutricionais no pré-natal.

Destaca-se que a adaptação aos dez passos para alimentação saudável na gestação utilizada em conjunto com o Sistema EOR pode servir como uma ferramenta útil na orientação e avaliação alimentar de gestantes.

Finalmente, os resultados do presente estudo podem nortear pesquisas futuras sobre os hábitos alimentares de gestantes considerando as recomendações brasileiras e específicas para essa população.

Agradecimentos

Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de mestrado fornecida.

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Recebido: Junho de 2022; Aceito: Agosto de 2022; Publicado: Outubro de 2022

Autor correspondente: prado.camilab@gmail.com

Conflitos de interesse:

Os autores declaram não ter conflitos de interesse com relação à autoria e publicação deste artigo.

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