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Journal of Human Growth and Development

versión impresa ISSN 0104-1282versión On-line ISSN 2175-3598

J. Hum. Growth Dev. vol.33 no.1 Santo André enero/abr. 2023  Epub 06-Dic-2024

https://doi.org/10.36311/jhgd.v33.13793 

ARTIGO ORIGINAL

Desafios no tratamento tardio da síndrome de Prune Belly: relato de caso

Rodrigo Alexandre Trivilatoa 

Gabriela Dadalta 

Deborah Lima Assençoa 

Débora Fernandes Barbalhoa 

Márcio Rodrigues Costaa 

Nadin Chatera 

Rodrigo Rosa Limaa 

Bernardo Monteiro Antunes Barreiraa 

João Paulo de Bessa Teixeiraa 

Fernando Cruvinela 

José Luiz Figueiredob 

aUniversidade Federal de Goiás – Departamento de Urologia

bUniversidade Federal de Pernambuco - Departamento de cirurgia.


Resumo

Introdução

A síndrome de Prune Belly é uma doença rara, com prevalência de 3,8 nascidos vivos a cada 100 mil nascimentos. Tem como principal caraterística a hipoplasia da musculatura abdominal gerando a origem do nome “síndrome da barriga de ameixa”. O tratamento padrão ouro é cirúrgico, idealmente com correção da criptorquidia e fimose entre 6 a 18 meses e a correção das malformações urinárias e abdominoplastia devem ser realizadas até os 4 anos. Aqui descreve-se um caso ainda menos comum, em que foi realizada abordagem cirúrgica de forma mais tardia que o habitual. Há pouca evidência na literatura acerca do tratamento tardio e suas implicações em relação ao prognóstico.

Palavras-Chave: Síndrome de Prune Belly; síndrome da barriga de ameixa; abdominoplastia a Monford; relato de caso

Abstract

Backgroung

Prune Belly syndrome, also known as Eagle-Barret syndrome, is a rare disease, with a prevalence of 3.8 live births per 100,000 births. Its main characteristic is the hypoplasia of the abdominal muscles, giving rise to the name “prune belly syndrome”. The gold standard treatment is surgery, ideally with correction of cryptorchidism and phimosis between 6 to 18 months of life. Correction of urinary malformations and abdominoplasty should be performed up to 4 years of age. Little evidence exists in the literature about late treatment and its implications for prognosis. The context mentioned above led us to present an uncommon case of a six years old child in which a surgical approach was performed later than usual.

Key words: Prune Belly Syndrome; eagle-barrett syndrome; Monford abdominoplasty; case report

Síntese dos autores

Por que este estudo foi feito?

Há pouca evidência publicada sobre os desafios do tratamento da síndrome de Prune Belly, especialmente neste caso que foi tratado tardiamente.

O que os pesquisadores fizeram e encontraram?

O paciente apresentava como alterações anatômicas: megaureter bilateral, megabexiga, persistência do úraco, criptorquidia, hipoplasia de reto abdominal e fimose. Foi realizada ureteroscopia onde foi evidenciado estreitamento importante em ureter a esquerda. Foi optado, portanto, a realização do reimplante ureteral a esquerda.

O que essas descobertas significam?

A obtenção de melhores resultados ocorre quanto mais precocemente as malformações são corrigidas.

INTRODUÇÃO

A síndrome de Prune Belly ou barriga de ameixa é uma doença rara. Acomete cerca de 3,8 nascidos vivos a cada 100 mil nascimentos, nos EUA. Foi descrita a primeira vez por Parker e Guthrie em 1895 e Osler em 1901. Porém o termo “síndrome da barriga de ameixa” foi dado por Eagle e Barret em 1950. É mais comum em meninos, sendo rara em meninas, apenas 3 a 5% dos casos1 , 2 .

É caracterizada pela tríade: defeito na parede abdominal, criptorquidia e malformações urinárias, como ureterohidronefrose, displasia renal, megabexiga1 - 3 . Não é conhecida a etiologia ao certo, sabe-se que há um defeito na diferenciação mesenquimal entre a 6ª e 10ª semana de idade gestacional1 - 3 .

A obtenção de melhores resultados ocorre quanto mais precocemente as malformações são corrigidas4 . Aqui trazemos um relato de uma correção tardia, devido a perda de seguimento do paciente, e as possíveis implicações negativas desse atraso5 .

Informações do paciente e avaliação diagnóstica

Paciente masculino com 6 anos de idade. Acompanhado no serviço desde o nascimento. O diagnóstico foi realizado através de ultrassonografia gestacional onde foi evidenciado ureterohidronefrose bilateral, espessamento de parede vesical e hipoplasia de musculatura da parede abdominal, caracterizando a tríade da síndrome. Ao nascimento se observou a hipoplasia da musculatura abdominal e foi confirmada através de nova ultrassonografia de ureterohidronefrose bilateral associada a megabexiga.

Paciente acompanhado inicialmente pela equipe da nefrologia e urologia apresentava infecções urinárias de repetição, a maioria febril necessitando de internação hospitalar. Paciente estava em programação para tratamento cirúrgico, porém perdeu seguimento ambulatorial atrasando assim o tratamento definitivo.

As figuras 1 (A e B) mostram a condição físico abdominal do paciente no momento do retorno ao acompanhamento hospitalar, evidenciando a hipoplasia da musculatura abdominal.

Figura 1 (A e B): Hipoplasia da musculatura abdominal do paciente 

Abordagem terapêutica e cirúrgica

Após retorno do seguimento hospitalar, aos 6 anos de idade, foi proposto tratamento cirúrgico, padrão ouro para correção das alterações anatômicas urinárias e correção do defeito da parede abdominal.

O paciente apresentava como alterações anatômicas: megaureter bilateral, megabexiga, persistência do úraco, criptorquidia, hipoplasia de reto abdominal e fimose.

No intraoperatório foi realizada ureteroscopia onde foi evidenciado estreitamento importante em ureter a esquerda. Foi optado, portanto, a realização do reimplante ureteral a esquerda. Associado a exérese de úraco, orquidopexia bilateral, postectomia e abdominoplastia a Monford, conforme evidenciado nas figuras 2 (A e B) e 3 . A figura 4 mostra o aspecto pós-operatório imediato.

Figuras 2 : (A - figura a esquerda e B- figura a direita) intraoperatório evidenciado a marcação do retalho de pele a ser retirado para a reconstrução da parede abdominal do paciente 

Figura 3 : Incisões na aponeurose para acesso intra-abdominal e a realização da descida dos testículos para a bolsa escrotal 

Figura 4 : Pós-operatório imediato, evidenciando o aspecto após abdominoplastia a Monford, orquidopexia e postectomia 

Tratamento e acompanhamento pós-operatório

O paciente apresentou boa evolução clínica inicial com adequada diurese pós-operatória, função renal estável. Foi deixado dreno abdominal tipo penrose, retirado no 2º pós-operatório devido abaixo débito, retirada sonda vesical de demora após 5 dias.

Paciente apresentou boa cicatrização de ferida operatória inguinal e da postectomia, porém evoluiu com necrose de pele periumbilical e deiscência parcial de sutura, no 7º dia pós-operatório. No 40º PO foi submetido a enxerto de pele em região de ferida operatória, com região doadora a coxa a direita, procedimento realizado pela equipe da cirurgia plástica desta instituição.

No momento está em acompanhamento ambulatorial por ambas as esquipes, apresenta adequado fechamento de ferida operatória abdominal e boa cicatrização do enxerto, bem como função renal estável e ausência de infecção urinária no pós-operatório.

DISCUSSÃO

A síndrome de Prune Belly é uma doença complexa devido ao amplo espectro de manifestações clínicas. A síndrome pode se manifestar com sintomas do trato geniturinário, cardiopulmonar, musculoesquelético ou gastrointestinal4 . Portanto é necessário um manejo multidisciplinar, como no caso em questão além das diferentes subespecialidades médicas envolvidas (nefrologia, urologia, cirurgia pediátrica, cirurgia plástica) também foi acompanhado pela equipe da fisioterapia e assistência social.

A doença tem diferentes espectros de apresentação que variam do I ao III. O subtipo I apresenta alta morbidade perinatal devido a malformações cardiopulmonares, principalmente a hipoplasia pulmonar. A maioria das crianças são natimortos, e os RN que nascem vivos permanecem por poucos dias até o óbito. Pacientes com subtipo II apresentam o espectro completo da síndrome, com a tríade clássica. Esse grupo constitui os mais beneficiados em indicação de abordagens cirúrgicas para correção das malformações. O subtipo III apresentam fenótipo incompleto cursando com alterações renais menos graves4 , 5 .

O manejo cirúrgico com correção da criptorquidia e fimose idealmente deve ocorrer entre 6 a 18 meses devido aos quadros de ITU de repetição e deterioração da função renal, aumentando assim a morbimortalidade desses pacientes4 , 5 . O período para realização da abdominoplastia e correção das malformações do trato urinária permanece incerto. Seidel et al., relatam indicar as correções em crianças com menos de 4 anos de idade, antes de entrarem na escola. Alguns relatos já mostraram ser viável a abordagem combinada com correção das malformações urinárias, orquidopexia e abdominoplastia sem aumentar a morbidade peri operatório6 .

Sabe-se que a correção tardia da criptorquidia pode contribuir para a infertilidade. Porém há outros mecanismos associados a infertilidade nesses pacientes como a ejaculação retrógrada e as malformações prostáticas, de vesículas seminais e deferentes7 .

A abdominoplastia é indicada com o objetivo de melhorar a estética bem como a pressão intra-abdominal melhorando o esvaziamento da bexiga. Diversas técnicas são descritas na literatura, sendo a técnica de Monford a mais utilizada com bons resultados8 . Fearon et al traz como resultado de sua revisão as altas taxas de necessidade de reoperação para aproximar os bordos da sutura da pele após a correção, chegando até 20%, como ocorreu no caso em questão9 .

O diagnóstico de doenças congênitas raras não é simples e muitas vezes ocorre de forma tardia, principalmente em países em desenvolvimento como no Brasil, e mesmo ocorrendo em tempo hábil muitas vezes o tratamento é atrasado por falta de acesso ao serviço de saúde, podendo comprometer os resultados. Sabe-se que mesmo quando a correção ocorre em tempo hábil cerca de 40 a 50% dos pacientes precisarão de terapia de substituição renal e 15% deles evoluirão para transplante renal devido a displasia renal10 .

CONCLUSÃO

A síndrome de Pune Belly é uma doença com amplo espectro de manifestações, portanto necessita de manejo individualizado. A literatura mostra que mesmo em centros de alto volume o número de atendimento é baixo, dificultando uma padronização do tratamento. Mesmo com tratamentos precoces é alta a taxa de disfunção renal com necessidade de terapia renal substitutiva e transplante renal. São necessários trabalhos com maior número de pacientes e maior tempo de seguimento para permitir uma melhor compreensão e manejo desses pacientes, visando melhorar a qualidade do atendimento prestado.

REFERENCES

1. Tonni, G. et al. Prune-Belly Syndrome: Case Series and Review of the Literature Regarding Early Prenatal Diagnosis, Epidemiology, Genetic Factors, Treatment, and Prognosis. Fetal and Pediatric Pathology, Guastalla, v. 31, n. 1, p. 13-24, 2012. [ Links ]

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5. Nogueira, PCK.; Paz, IP. Signs and symptoms of developmental abnormalities of the genitourinary tract. Jornal de pediatria, São Paulo, v. 92, n. 3, p S57-S63, 2016. [ Links ]

6. SEIDEL, N.E; ARLEN, A M; SMITH, E.A; KIRSCH, A. J. Clinical Manifestations and Management of Prune-belly Syndrome in a Large Contemporary Pediatric Population. Pediatric Urology, v.85, p.211-215, 01 de jan. de 2015. [ Links ]

7. Lopes, RI; Tavares, A; Denes, FT; Cocuzza, M. Gonadal function and reproductive system anatomy in post- pubertal prune-belly syndrome patients. Urology. v 145, p. 292-296, 1 de nov.de 2020. [ Links ]

8. Dénes, FT et al. Abdominoplasty in Prune Belly Syndrome. Journal of Pediatric Urology, v.11(5), p.291-292, 21 de jun. de 2015. [ Links ]

9. Fearon, JA.; Varkaraski, G. Dynamic abdominoplasty for the treatment of prune belly syndrome. Plastic and reconstructive surgery, Dallas, v. 130, n. 3, p 648-657, 2012. [ Links ]

10. Denes, FT; Arap, MA; Giron AM; Silva FAQ; Arap, S. Comprehensive surgical treatment of prune belly syndrome: 17 years' experience with 32 patients. Pediatric urology, v. 64, p. 789-794, mai. 2004. [ Links ]

Recebido: Maio de 2022; Aceito: Novembro de 2022; Publicado: Março de 2023

Autor correspondente rotrivelato@yahoo.com.br

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