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Construção psicopedagógica
versão impressa ISSN 1415-6954
Constr. psicopedag. vol.20 no.21 São Paulo 2012
O psicopedagogo institucional na construção da solidariedade entre a escola a família e a comunidade
The institutional psycopedagogist in the construction of solidarity among school, family and community
Maria Cecília Castro Gasparian
Mestre e Doutora em Educação PUCSP, pedagoga, psicopedagoga, terapeuta de família. São Paulo, SP, Brasil. E-mail: mcgasparian@uol.com.br
RESUMO
O desenvolvimento da solidariedade entre a família, a escola e a comunidade em prol da Educação para a Paz é um tema complexo e amplo. O percurso é longo, árduo e ousado, mas gratificante, pois é um caminho talhado por experiências e desafios que muito auxiliam na transformação constante de visão de mundo, de pessoas e consequentemente de atitudes psicopedagógicas nas práticas escolares. Neste trabalho focarei um aspecto pouco explorado tanto por psicólogos quanto pelos psicopedagogos: a inclusão da prática de trabalho com famílias, comunidade e escola na condução de diálogos proativos na resolução de inúmeros tipos de violências sofridas tanto pela família, escola quanto pela comunidade. Todos sofrem, não existem vítimas e algozes, o que existe é uma série de atitudes inadequadas que geram dor e sofrimento para todos, principalmente para as crianças que formarão a próxima geração. Como falar com essas três instituições sem constranger seus elementos? Como colocá-las frente a frente para trabalhar em prol do bem comum? Muito tem se falado e escrito sobre essas três instituições, mas este trabalho não tem esta pretensão. Não é o objetivo relatar uma experiência, e nem citar autores e trechos de livros, mas é de apenas mostrar uma nova possibilidade de atuação do psicopedagogo institucional.
Palavras-chave: Educação, Família, Solidariedade
ABSTRACT
The development of solidarity among Family, school and a community is a great and complex matter. The path is long, hard and ambitious but equally gratifying as it is a path constructed through challenges and experiences that help in the constant transformation of world views, of people and consequently of psychopedagogical attitudes in school practices. In this paper I will focus on an aspect that hasn't been explored much by psychologists and psychopedagogist: the inclusion of the practice of family, school and community consultation in the conduction of proactive dialogues throughout the solution violence of many kinds suffered as much by family as by community. Everyone suffers, as there are no victims and executioners. What exists in fact is a series of inadequate attitudes that lead to pain and suffering for all those involved, especially to the children who will form our next generation. How do we dialogue with these three institutions without embarrassing their elements? How to put them face to face to work for their own well-being? Much has been said and written about these three institutions but this paper does not have that intention. The objective here is not to describe an experience or quote authors or books but only to show the a new possibility in which the psycopedagogist can labor.
Keywords: Education, Family, Solidarity
Introdução
"Se conhecemos as leis da mudança, podemos nos antecipar
a elas e a liberdade de ação se tornará possível". I CHING
Vivemos atualmente uma onda dos mais variados tipos de violência em todos os níveis sociais. Não se pretende solucionar essas questões tão complexas, mas apenas sugerir que a Psicopedagogia Institucional poderá auxiliar a resolução desse problema social através da intervenção nas questões das diferentes modalidades de dificuldade de aprendizagem que geram a violência, a incompreensão e a falta de solidariedade em toda a comunidade: escolar, familiar e social. Advirto que não existe um scriptdefinido, não existe roteiro pré-estabelecido, que os cenários são os mais variados e que os atores são complexos, com suas características pessoais e únicas, portanto a estória será escrita por todos no desenvolvimento do processo.
Para desenvolver um trabalho com a escola, com a família e com a comunidade para resolver as dificuldades de aprendizagem sob o tema solidariedade, onde está implícito a construção da paz, temos que ter não só em mente, mas principalmente em nossas atitudes, o espírito e a consciência de grupo. Não é fácil, mas temos que começar de alguma forma a nos mobilizarmos para isso. Sugiro que comecemos pela questão da inclusão que por falta de espaço não será desenvolvido neste artigo, mas aparece implicitamente no decorrer do projeto.
Está na hora de começarmos a pensar na possibilidade de desenvolvermos algumas habilidades para além das paredes escolares, mesmo porque iremos precisar, nos anos vindouros, de sabedoria, paciência e principalmente da compaixão e da solidariedade. Portanto, este texto é um convite a todos os leitores que possuam o espírito de inovação e curiosidade que reflitam sobre esta proposta: um trabalho psicopedagógico com toda a comunidade através do diálogo, do ensino e da aprendizagem formal escolar e do ensino e aprendizagem da convivência social através de projetos elaborados a partir de sugestões de todos. Não entraremos em nenhum outro campo profissional, mesmo porque este deve ser um trabalho multidisciplinar e interdisciplinar. O trabalho psicopedagógico visará desenvolver atitudes positivas frente ao contexto com atividade para promover o ensinar a ensinar; ensinar a compreender; ensinar a fazer e ensinar a conviver com os outros.
Sugestões de passos para uma intervenção
Os quatro primeiros passos para começarmos a refletir sobre a questão da violência na comunidade, na escola e na família, que utilizei foram:
1) Questionar nosso modo de ver o mundo e o como entendemos as três Instituições;
2) Questionar a escola com as suas tentativas de encontro com os pais e com a comunidade, e sobre os projetos já executados com eles, os projetos abortados, a elaboração de novos projetos e refletir sobre os "porquês" e os "para quês" dessas ocorrências.
3) Temos também que questionar a comunidade, enfim, sobre tudo o que envolve o ato de ensinar, aprender e conviver, não só do ponto de vista formal de ensino, mas, sobretudo, do ponto de vista existencial da vida humana;
4) Compreender a família da qual estamos falando, desenvolver valores, atos e atitudes de responsabilidade perante a criação e educação de nossos jovens.
Após o levantamento desses dados, elaborei um projeto com a ajuda e sugestões da comunidade escolar, familiar e social que pontuaram as suas maiores carências: evasão escolar, vandalismo e falta de respeito entre eles e os professores. Este projeto visava então a inclusão de alunos com vários tipos de dificuldades escolares e sociais no ambiente escolar, desenvolver sua autoestima, e sentirem-se úteis na e para a comunidade.
Este projeto promoveu encontros com os pais, professores e os próprios alunos para decidirmos o que fazer, como fazer e para quê fazer, assim como quem iria participar, como participaria e qual seria a colaboração de cada um de nós. Após estas reuniões decidiu-se pela reconstrução da quadra de esportes e área de lazer que estavam depredadas para desenvolverem atividades recreativas, competições de várias modalidades de esporte, encontros sociais, etc. Na área coberta da escola, montou-se um espaço para expressão plástica e artística (as meninas preferiram aulas de balé e teatro, no qual alguns meninos também se interessaram). Porém, só poderiam participar alunos que frequentassem as aulas e aqueles com dificuldades de aprendizagem tivessem acompanhamento psicopedagógico dentro da própria escola e com um programa desenvolvido especialmente para a sua dificuldade. A implantação e a implementação não foi fácil porque tivemos que criar a cultura do cuidado e da preservação dos bens comuns; da participação de todos os pais e da comunidade; desenvolvendo a solidariedade entre todos. Alguns comerciantes doaram tintas e materiais de construção e até alguns pais que estavam desempregados foram trabalhar nestes locais depois de participarem da "reconstrução" da escola. Muitas outras atividades foram desenvolvidas, mas infelizmente não teremos espaço para contar tantas atividades e relatos das experiências vividas e que foram enriquecedoras para todos.
Conclusão
Chegou o momento de não mais culparmos uns aos outros (escola, culpando a família e vice-versa; a escola culpando a comunidade e vice-versa; a família culpando a escola pela fraca educação das crianças e a escola culpando a família pela negligência com suas crianças, etc.), mas assumirmos a responsabilidade de desatarmos os laços viciosos que unem a comunidade, a família e a escola, provocando sintomas de sofrimento em todos, temos que transformá-los em laços virtuosos de crescimento para a construção da solidariedade. Precisamos ter uma atitude acima de tudo de cooperação e compreensão das dificuldades envolvidas. Precisaremos também examinar e refletir sobre as relações que foram estabelecidas ao longo da estória desta comunidade com a escola e com família assim como as estórias de cada uma delas em particular. É ver o que não se mostra e ouvir o que não se fala: isto é o olhar e a escuta psicopedagógica. É uma tarefa bem complexa e inovadora do fazer psicopedagógico institucional, mas garanto que é gratificante. É como um quebra-cabeça que teremos que montar e todas as partes (escola e família e comunidade) esconderam algumas peças, mas que aos poucos iremos desvelando ao desenvolvermos vínculos fortes de confiança e afetividade, mostrando que não somos "invasores", mas colaboradores para o crescimento de todos nós.
A prática psicopedagógica em todos os setores onde ela atua tem um olhar e uma escuta diferenciada de outros profissionais, portanto, deve estar apto a desenvolver e liderar essas atividades.
Olhar a prática psicopedagógica sob o prisma transformador significa obter uma visão multifacetada da escola, da família e da sociedade e que ao transformar os outros também nos transformamos. É intervir, sabendo que simultaneamente estamos sofrendo intervenções externas e sendo modificados pelos nossos atos. Esse ponto de vista nos permite desenvolver uma consciência grupo que, através da reflexão sincera e profunda individual e coletiva, poderá nos dar essa condição de agente transformador.
O psicopedagogo precisa auxiliar a escola, a família e a comunidade a desenvolver no cidadão os quatro pilares da educação para o século XXI (DELORS, 2006, p.89-101): aprender a aprender, aprender a ser, aprender a conhecer e aprender a conviver. Para isso precisamos criar condições para que esta aprendizagem se desenvolva. Uma das sugestões é montarmos projetos que atendam as demandas de cada uma delas.
Dentro da abordagem sistêmica, olhamos para todas as instituições como um sistema em constante interação entre si. Desse modo olhamos em vários níveis e perspectivas que tornam essas instituições um todo, um fenômeno vivo e, por isso mesmo, complexo. Fazemos parte de uma invisível e complexa rede social que consciente ou inconscientemente vamos tecendo. Essa rede social é um conjunto de caminhos, reais e ou fictícios que, de maneira informal e espontânea, vinculam as pessoas entre si.
Quando entramos no mundo pelo prisma do complexo, mergulhamos no mar das incertezas, do aproximado, do paradoxo, do ambíguo, do real construído com o outro, formando uma teia de relações. Temos uma relativa autonomia, mas ao mesmo tempo temos uma profunda dependência. Para podermos continuar existindo, precisamos estar em constante mudança, mas não de modo tranquilo, previsível, controlado, mas criativo, arriscado, ousado, perturbador, porque inevitavelmente estaremos saindo de nossa zona de conforto. A construção intra e interpessoal do psicopedagogo exigem o conhecimento do processo em processo, portanto complexa.
Todas as realizações humanas são o resultado da cooperação em todos os campos do esforço humano: na política, na educação, na comunicação, nas artes, na Ciência, na religião e nas finanças. Quanto maior nossa colaboração para que elas se desenvolvam dentro da harmonia e cooperação, maior será o nosso sucesso.
Referências
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Sugestão para leitura complementar
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