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Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. v.9 n.2 São Paulo dez. 2007

 

ARTIGOS ORIGINAIS

 

A enfermagem no Sistema Único de Saúde (SUS): repensando os princípios e conceitos de sustentação da atenção à saúde no Brasil

 

Nursing in the unified health system (SUS): retinking the principles and concepts underlying health care in Brazil

 

La enfermeria en el sistema unico de salud (SUS): repensando los principios y conceptos de sustentacion de la atencion a la salud en Brasil

 

 

Antonio Marcos Tosoli Gomes; Denize Cristina de Oliveira; Celso Pereira de Sá

Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo objetiva analisar a constituição e o estado da arte do Sistema Único de Saúde (SUS) a partir das representações dos enfermeiros, junto a instituições de saúde do Rio de Janeiro, buscando identificar e caracterizar as políticas de saúde efetivadas e as diferentes práticas desenvolvidas no município. Adotou-se a teoria de representações e de memória social, e o estudo foi desenvolvido em cinco instituições com 20 enfermeiros. Os dados foram coletados por meio de entrevistas e analisados pelo software ALCESTE 4.7. Os resultados se organizaram em dois blocos temáticos: a organização do sistema e sua constituição como representações, abarcando as classes “política de recursos humanos” e “o processo de ancoragem do SUS”. A organização do sistema no atendimento das demandas englobou as classes “o atendimento no contexto do SUS” e “a hierarquização das ações do sistema de saúde”. Destacam-se, concluindo, a importância dos enfermeiros para a implementação do SUS e a pertinência do referencial teórico utilizado.

Palavras-chave: Enfermagem, Sistema de saúde, Pesquisa qualitativa, Representações, Memória social.


ABSTRACT

This study examines the make-up and state-of-the-art of the Unified Health System on the basis of representations among nurses at health institutions in Rio de Janeiro, with a view to identifying and characterizing health policies as actually implemented and the various practices employed in the municipality. The theory of representations and social memory was applied to 20 nurses at 5 institutions. Data collected in interviews were analyzed using ALCESTE 4.7 software. The results were organized into two thematic blocks: how the system is organized and constituted in representations, in terms of the classes “human resource policy” and “the process of anchoring the SUS”. The system is organized to meet demand, comprising the classes “care in the context of the SUS” and “hierarchization of health system actions”. It concludes that nurses are of the utmost importance in implementing the SUS and that the theoretical frame of reference used is appropriate.

Keywords: Nursing, Health systems, Qualitative research, Representations, Social memory.


RESUMEN

Este estudio objetiva analizar la constitución y el estado de arte del Sistema Unificado de Salud a partir de las representaciones de los enfermeros, junto a instituciones de salud de Río de Janeiro, buscando identificar y caracterizar las políticas de salud efectivas y las diferentes prácticas desarrolladas en el municipio. Se adoptó la Teoría de las Representaciones y de Memoria Social. El proyecto fue desarrollado en 5 instituciones con 20 enfermeros. Los datos fueron colectados a través de entrevistas y analizados por el software ALCESTE 4.7. Los resultados se organizaron en dos blocos temáticos: la organización del sistema y su constitución como Representaciones, abarcando las clases “política de recursos humanos”, y “el proceso de ancoraje del SUS”. La organización del sistema en la atención de las demandas, englobó las clases “la atención en el contexto del SUS” y “la hierarquización de las acciones del sistema de salud”. Concluyendo se destaca la importancia de los enfermeros para la implementación del SUS y la pertinencia del referencial teórico que fue utilizado.

Palabras clave: Enfermería, Sistema de salud, Investigación cualitativa, Representaciones, Memoria social.


 

 

Introdução

O Sistema Único de Saúde (SUS) reveste-se de importância no quadro sanitário brasileiro não somente como estrutura de organização institucional da área da saúde e modelo de atendimento à clientela, mas especialmente pela mudança impressa nas formas de direcionar, conceber, pensar e fazer a assistência à saúde no país (BRASIL, 1990).

Simultaneamente, tomado como campo de produção intelectual, conforme proposto por Bourdieu (1989), o campo de saber da enfermagem vem se estruturando em função de um permanente refletir sobre as suas práticas e sobre a construção do seu objeto de atenção. Nesse sentido, concebida como prática social, a enfermagem tem procurado definir o seu processo de trabalho em consonância com os outros processos de trabalho do campo da saúde, e também das políticas nas quais se insere (OLIVEIRA, 2001; GONÇALVES, 1992).

No âmbito do SUS, o processo de trabalho dos enfermeiros caracteriza-se pelo desenvolvimento de ações que apresentam maior proximidade com os usuários e, normalmente, representam o maior quantitativo de profissionais dentro das instituições, o que tem trazido à inserção da profissão na atenção pública à saúde grande visibilidade importância social e política. Destaca-se ainda como característica do processo de trabalho dos enfermeiros no contexto nacional atual a freqüente assunção de cargos de direção e de gerência nas instituições de saúde, em diferentes níveis governamentais, imprimindo características próprias à gestão e ao desenvolvimento do sistema de saúde brasileiro.

Nesse contexto, para que os objetivos do SUS sejam atingidos, exige-se o desenvolvimento de determinado processo de trabalho de enfermagem, que vem se diversificando em atividades assistenciais, de gerência, de ensino e de pesquisa. No que tange às ações assistenciais, ressalta-se a presença desse profissional em todas as unidades de internação, nos ambulatórios e postos de saúde, estando presente praticamente em todos os momentos de contato entre a população e os serviços e em todos os atendimentos realizados; na gerência, os enfermeiros atuam na concretização dos princípios do SUS, a partir das especificidades da própria profissão, com destaque para a humanização da assistência e para o trabalho multidisciplinar. No ensino, o processo de trabalho dos enfermeiros envolve tanto atividades acadêmicas em todos os níveis (da capacitação profissional ao doutorado), na formação de novos profissionais de enfermagem ou participando da formação de outros da área da saúde, quanto na implementação de ações de educação em saúde, com vistas à elevação dos índices de qualidade de vida e de saúde da população; e, por fim, no campo da pesquisa, o enfermeiro aí se insere objetivando responder a problemas oriundos do cotidiano profissional ou relativos à construção/aplicação de teorias que conformem uma profissão cada vez mais orientada a dar respostas aos problemas emanados da realidade de saúde observada (BARBOSA et al., 2005).

Além desses elementos, a existência e o desenvolvimento do processo de trabalho de enfermagem considerado profissional na rede de saúde do Brasil datam da última década do século XIX, o que tem permitido a construção de uma memória coletiva acerca das diversas dimensões presentes nos sistemas de saúde que o país, ao longo do tempo, elaborou e vivenciou. Essa memória se expressa a partir das representações sociais construídas e transformadas pelos profissionais acerca da saúde de um modo geral, do seu papel profissional e do próprio sistema de saúde.

Pelas considerações traçadas, definiu-se como objetivo desta pesquisa analisar a constituição e o estado da arte do Sistema Único de Saúde, a partir das representações sociais dos enfermeiros, junto a instituições hospitalares, ambulatoriais e centros de saúde do município do Rio de Janeiro, buscando identificar e caracterizar as políticas de saúde efetivadas e as diferentes práticas de saúde desenvolvidas em nível municipal.

A pertinência da associação do referencial teórico da memória social (SÁ, 2000) a este estudo se justifica pela importância política, econômica e estratégica da enfermagem dentro do sistema de saúde no Brasil, assim como pelo tempo decorrido desde a implantação do SUS e a municipalização da saúde no Rio de Janeiro, o que possibilita a análise desse processo a partir das memórias construídas pelos enfermeiros.

Associada a esse referencial, adotou-se a teoria das representações sociais no âmbito da psicologia social, que define que uma representação é constituída de um conjunto de crenças, informações, opiniões e atitudes a propósito de um dado objeto social. Esse conjunto de elementos se organiza, estrutura e constitui um sistema sociocognitivo de tipo específico (MOSCOVICI, 1976; JODELET, 1989).

 

Método

O desenho metodológico deste estudo envolveu cinco instituições de saúde localizadas na cidade do Rio de Janeiro constituídas em 2003 há, pelo menos, quinze anos, de modo que tivessem construído uma história dentro do sistema de saúde brasileiro.

A escolha das instituições obedeceu aos seguintes critérios de inclusão: um hospital público federal de grande porte; um hospital público estadual de grande porte; um hospital público municipal; um hospital privado de grande porte, conveniado com o SUS há pelo menos quinze anos em 2003; e um centro de saúde de grande porte, pertencente à rede municipal de saúde.

Foram entrevistados vinte profissionais que desenvolviam ações há pelo menos quinze anos no âmbito das instituições selecionadas, quatro de cada instituição. A coleta de dados foi realizada no primeiro semestre de 2003, por meio de entrevistas semi-estruturadas.

A análise das entrevistas foi realizada por meio da técnica de análise lexical mecanizada, com o uso do software ALCESTE, versão 4.7, que permite realizar análise do conteúdo presente no texto, por meio de técnicas quantitativas de tratamento de dados textuais. O ALCESTE recorre à análise das coocorrências das palavras nos enunciados, para organizar e sumariar informações consideradas relevantes, possuindo como referência em sua base metodológica a abordagem conceitual dos “mundos lexicais” (REINERT, 1990).

No que se refere aos aspectos éticos da pesquisa, foram respeitados os princípios da Resolução nº 196/96 do Ministério da Saúde. O projeto recebeu um parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisas da UERJ sob o Protocolo nº 1.650-CEP/HUPE, e cada sujeito participante formalizou o seu aceite assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

 

Discussão dos resultados

Os resultados da estatística textual realizada pelo ALCESTE apontaram a existência de vinte unidades de contextos iniciais (UCI), sendo cada UCI correspondente a uma entrevista realizada, portanto o corpus de análise contém vinte entrevistas. O corpus foi dividido em 1.666 unidades de contextos elementares (UCE), ou seja, a menor unidade de análise constituída de três ou quatro linhas de texto, significando 100% do material submetido à análise, e o programa classificou para análise final 1.249 UCE, representando 75% de aproveitamento do material submetido à análise.

As 1.241 UCE foram agrupadas em quatro classes lexicais (categorias), que caracterizam o conteúdo essencial presente nas entrevistas analisadas. Buscando melhor compreender o processo de segmentação do conteúdo textual e a constituição das classes, o dendograma de classes (Figura 1) permite visualizar os sucessivos agrupamentos realizados e as temáticas deles decorrentes, com base na técnica de análise hierárquica descendente.

Observa-se que o software dividiu as UCE em dois grandes blocos temáticos e cada um deles foi submetido a uma segunda divisão. Assim, as classes 1 e 3 (bloco temático 1) são resultantes, primariamente, de um bloco textual comum, o que permite inferir que elas possuem significados complementares; bem como as classes 2 e 4 (bloco temático 2) são resultantes de um segundo bloco textual comum, permitindo afirmar também aí a existência de conteúdos comuns a elas. Internamente, entre os subconjuntos das classes 1/3 e 2/4, a relação existente é de oposição de conteúdos, já que o processo de separação das UCE busca identificar subgrupo, em razão do seu grau máximo de diferenciação.

 

 

Figura 1. Classificação hierárquica descendente (dendograma) e seu detalhamento resultante da análise de entrevistas de enfermeiros sobre o SUS. Rio de Janeiro, 2007.

Os blocos temáticos e as classes resultantes da análise foram nomeados, de forma a expressar o conteúdo presente neles, da seguinte forma: bloco temático 1 – A organização do sistema de saúde e sua constituição como representações dos enfermeiros, dentro do qual estão as classes 1 – “Política de recursos humanos: questões salariais e de capacitação”; e classe 3 – “O processo de ancoragem do SUS: a estratégia de saúde da família e os planos de saúde”; e bloco temático 2 – A organização do sistema de saúde no atendimento das demandas da população, que englobou a classe 2 – “O atendimento no contexto do SUS: dificuldades nas diversas ações e serviços de saúde”; e classe 4 – “A hierarquização das ações do sistema de saúde: atribuições e inter-relações dos diferentes níveis de complexidade.”

A organização do sistema de saúde e sua constituição como representações dos enfermeiros

Classe 1 “Política de recursos humanos: questões salariais e de capacitação”

A classe 1 representa 27,76% do total de UCE presentes na análise e retrata as posições de enfermeiros que desenvolvem funções administrativas nas suas instituições de atuação. A temática tratada nessa classe revela uma faceta gerencial inerente à enfermagem no contexto do SUS, traduzindo as preocupações de um grupo específico de sujeitos não inseridos em atividades assistenciais diretas com a clientela.

Essa classe traduz, de forma privilegiada, questões que geram inquietações entre os enfermeiros, quais sejam, a remuneração salarial e a educação permanente, presentes no cotidiano dos profissionais atuantes no SUS. Nesse contexto, os diferentes parâmetros salariais no âmbito das instituições participantes do SUS apresentam-se como uma questão importante, à medida que, por um lado, estão diretamente relacionados à qualidade de vida, representando as possibilidades de sobrevivência dos enfermeiros, e, por outro, expressam o reconhecimento profissional e social da profissão. O princípio da isonomia salarial entre os diferentes vínculos públicos ainda não se apresenta como uma realidade no interior do sistema de saúde, tornando esse tema central na constituição da representação social acerca do sistema único por parte dos enfermeiros. A UCE seguinte pode expressar a temática:

Era uma diferença brutal, porque um enfermeiro do Estado ganhava quinhentos reais, isso estava no seu vencimento base, sua insalubridade, seu triênio... Porque o vencimento do Estado, sua última categoria está duzentos reais.

Quando o governo Garotinho resolveu acabar com as cooperativas, foi feita uma pressão de que ele pagasse a mesma coisa que as cooperativas pagavam. Então, eu tenho um vencimento de duzentos reais e uma gratificação de R$ 1.200,00. Antigamente, se você entrasse de licença essa gratificação era retirada.

O grupo de profissionais é unânime em apontar a defasagem salarial presente no setor público, com o conseqüente sentimento de desvalorização da força de trabalho e a decorrente falta de reconhecimento do processo de trabalho em enfermagem, o que faz florescer sentimentos pessoais de desqualificação quanto ao desempenho e aos anos investidos na formação acadêmica e profissional (CORDEIRO, 2001).

Pode-se observar que o sistema de proventos adotado pelo Estado reveste-se de características que penalizam os seus servidores. Entre os mecanismos perversos adotados, está a garantia de proventos maiores a partir do pagamento de gratificações, ou seja, grandes parcelas dos proventos são provisórias e não incorporadas ao salário-base. Essas gratificações, por sua vez, são retiradas quando ocorre a aposentadoria, além de estarem sujeitas às modificações de cada governo instituído, gerando um quadro de instabilidade financeira e social que atinge diretamente o cotidiano familiar dos profissionais, incidindo na concretização de planos de gastos em médio e longo prazos.

O enfoque na capacitação dos enfermeiros demonstra o reconhecimento de que o aprofundamento teórico e prático é fundamental à realização do trabalho de enfermagem, especialmente em uma época de rápidas transformações epidemiológicas e tecnológicas (GOMES, 2002). Além disso, o processo de capacitação nas instituições públicas está sujeito à adoção de políticas específicas para esse fim, que variam segundo a perspectiva de gerenciamento assumida pelas instituições, como pode ser percebido pelo discurso a seguir:

Fiz concurso para o Ministério da Saúde e vim para este hospital, porque aqui, pelo menos, eu podia fazer do meu bolso, eu tinha horário e ninguém ia me impedir de fazer os cursos que eu queria. Até que chegou este diretor, o atual, que começou a usar a verba do PAC, que é a capacitação, porque antigamente esta verba ficava só entre a direção, só entre os chefes e os diretores.

Como muitas vezes nós tomamos conhecimento de que a verba foi devolvida porque o diretor não fez que nada acontecesse (na área de capacitação profissional).

Os enfermeiros se movimentam nessa cotidianidade com o apoio oficial ou apesar de sua ausência, implicando a adoção de comportamentos que possibilitem o alcance da capacitação desejada, mesmo à custa de sacrifícios pessoais. Esse sacrifício se consubstanciou, para alguns destes sujeitos, na cobertura financeira para a realização de cursos, com a contrapartida de liberação de carga horária por parte da instituição ou da utilização de horários externos àquele da vida profissional.

Outro destaque importante é a utilização política dos recursos disponíveis para esse tipo de ação, que ficava circunscrita à esfera gerencial e às relações de poder, sendo, portanto, excludente. Merece destaque, ainda, o reconhecimento de que as mudanças se devem a características gerenciais pessoais e não às inflexões das políticas e dos programas institucionais ou do sistema de saúde.

Os sujeitos identificaram, como memória social, um período como sendo prototípico da capacitação profissional dos servidores públicos, o início da década de 1980, no interior do Instituto Nacional de Assistência Médica e Previdência Social, conforme pode ser observado a seguir:

Nós vivemos um período de qualificação, tivemos uma escola aqui de auxiliares de enfermagem. Essa escola, no início dos anos oitenta, era aberta à clientela externa e interna, eram formados (profissionais) exclusivamente para a rede e aí houve a modificação.

Ao mesmo tempo, observam-se memórias indicando um período de retrocesso do investimento em capacitação profissional, que coincidiu com os primeiros anos de implantação do SUS:

Agora, tivemos um período de retrocesso, a década de 90 foi um período assim, que logo após a era Collor tivemos um momento que mal houve investimento na qualificação profissional como um todo.

Nas memórias construídas pelo grupo de sujeitos, a década de 1980 foi caracterizada pelo investimento na capacitação dos enfermeiros e da equipe de enfermagem, enquanto a de 1990 é rememorada pela ausência desse tipo de política. Pode-se compreender que o período de implantação do SUS tenha gerado um foco em questões essenciais à concretização desse sistema nas distintas unidades federadas do país, mas também se considera que a capacitação dos profissionais para a atuação em um novo modelo assistencial apresentava-se como uma questão axial para o sucesso dessa mesma implantação (PARKER, 1997).

As décadas de 1980 e 1990 foram conturbadas no que se refere aos aspectos políticos, econômicos e sociais, o que pode ter interferido nas decisões da alta esfera do Ministério da Saúde (PARKER, 1997). A movimentação pela implementação do Sistema, a consolidação das conquistas da Constituição de 1988 e a garantia de manutenção de um Estado democrático e inclusivo podem ter tido como efeito permitir que demandas presentes na micropolítica ficassem não contempladas, ao menos neste momento (OLIVEIRA et al., 2007).

Classe 3 “O processo de ancoragem do SUS: a estratégia de saúde da família e os planos de saúde”

Essa classe apresenta-se como a maior da análise, abarcando 32,24% do material analisado e apresenta no seu conjunto semântico a própria sigla SUS (X²45,28), e as seguintes formas reduzidas: comunidade (X² 23,99), discuss+ (X² 21,00), form+ (X² 43,77), gest+ (X² 24,46), implant+ (X² 22,29), particip+ (X² 22,20), popul+ (X² 37,20), saúde (X² 33,66) e soci+ (X² 36,41).

A definição do SUS construída pelos enfermeiros nos seus cotidianos profissionais está intimamente relacionada à população, à saúde e à sociedade, bem como à discussão, gestão e ao processo de implementação do sistema. Destaca-se que essa forma de compreender e incorporar o SUS construída pelos profissionais não se ancora nos conteúdos reificados do sistema, mas traz elementos que abarcam o quadro multifacetado de vivências desenvolvidas no seu interior. Nesse contexto, a seguinte UCE explicita a primeira definição existente nos dados empíricos: “E o SUS, que veio com o propósito de viabilizar a toda a população, facilitar mesmo a assistência e com o objetivo de melhorar a qualidade da saúde”.

O campo representacional acerca do SUS comporta características como facilitador do atendimento e de responsável pela elevação da qualidade da assistência. O significado de facilitador parece conferir ao SUS um perfil que não abrange a totalidade de suas atribuições, uma vez que o princípio da universalidade não “facilita”, mas garante o direito à saúde como um direito básico do ser humano, sendo, por isso mesmo, inalienável por essência (CARDOSO; GOMES, 2000).

Observa-se, ainda, uma tensão entre o SUS real e o ideal, o que se concretiza, na prática, naquele SUS intermediário que atende parcialmente às demandas apresentadas. Esse SUS “parcial” aparece na formação discursiva dos sujeitos, pela facilitação do acesso e do atendimento, podendo dar margens a manipulações ideológicas e políticas, às vezes até mesmo partidárias (OLIVEIRA et al., 2007).

Essas manipulações se concretizam no transporte coletivo de pacientes para tratamentos nos grandes centros, sem um planejamento municipal para o atendimento das necessidades dos munícipes em um período determinado de tempo. Essas ações mantêm os sujeitos presos ao ofertante e criam um clientelismo eleitoral característico do país em décadas anteriores. As ações que podem gerar maior resolutividade e, conseqüentemente, maior responsabilização institucional e dos governos não são priorizadas. Nesse contexto, entende-se o uso do verbo “facilitar”, pois expressa com exatidão o que os profissionais vivenciam e assistem em seus cotidianos nas instituições de saúde de referência para todo o Estado. O facilitar ainda aparece, possivelmente, nas emergências lotadas, nas filas que se formam pela madrugada para o atendimento diário e nas dificuldades de infra-estrutura e de materiais que assolam as instituições de saúde do país.

Uma segunda definição apresentada pelos sujeitos do sistema de saúde é a seguinte, caracterizando uma segunda representação:

O SUS é um grande modelo de assistência, um grande, entre aspas, plano de saúde. É o melhor plano de saúde que existe. Só que ele ainda engatinha. A gente não pode cobrar ainda do SUS uma postura adulta porque ele ainda engatinha.

As imagens de grande modelo de assistência e, ao mesmo tempo, de plano de saúde associadas ao SUS parecem contraditórias, na medida em que expressam um conceito ligado a políticas públicas (modelo de assistência) e uma segunda acepção associada à prestação de serviços privados (plano de saúde). Essas duas imagens que compõem a representação do SUS para o grupo profissional estudado parecem estar ancoradas tanto na Estratégia de Saúde da Família (ESF), que possui como objetivo principal a reorientação do modelo assistencial, quanto nos planos de saúde, que são associados às noções de competência, organização e atendimento adequado.

Quanto às relações estabelecidas entre a ESF e o SUS, os sujeitos ainda complementam: “A ESF tem todos esses papéis de implementação do SUS, então você tem municípios que o ESF é bem fundamentado e o SUS também”.

A ESF é pensada como implementadora dos ideais organizativos e filosóficos do SUS, na medida em que tem suas ações desenvolvidas de forma próxima à realidade dos indivíduos. Já o SUS tem sua imagem atrelada à da estratégia, facilitando a sua apreensão por meio da compreensão das diretrizes de uma estratégia que melhor concretizou o acesso e o atendimento desejado pela Constituição de 1988 e pela Lei Orgânica da Saúde. Destaca-se, no entanto, a inversão ocorrida, pois é o SUS que abrange a ESF e, portanto, deveria comportar a sua ancoragem. No entanto, o processo psicossociológico de formação das representações alicerça-se em um continuum dinâmico que nem sempre respeita a cronologia dos fatos históricos ou a sistematização do conhecimento reificado.

A ancoragem do SUS nos planos de saúde parece ser tributária da grande mídia que bombardeia a coletividade com propagandas que atribuem as características de eficácia, rapidez, conforto e resolutividade ao pagamento sistemático de ações e serviços de saúde. O SUS, por sua vez, oferece ações e serviços universais à população, por meio do recolhimento de impostos de diversos setores e atividades da sociedade brasileira, existindo uma sobreposição de imagens, sentidos e finalidades (MISOCZKY, 1999).

A organização do sistema de saúde no atendimento das demandas da população

Classe 2 “O atendimento no contexto do SUS: dificuldades nas diversas ações e serviços de saúde”

Essa classe possui 22,84% do material analisado e tem como variável associada o sexo feminino. Apresenta-se formada por radicais como atendid+ (X² 44,37), cheg+ (X² 26,29), consulta (X² 28,46), dia+(X² 46,12), medic+ (X² 28,00) e paciente+ (X² 43,10), explicitando o forte conteúdo assistencial presente em seu interior.

Os enfermeiros mostram-se preocupados com as dificuldades colocadas aos usuários no interior do sistema de saúde, gerando demoras que poderiam ser evitadas e, até mesmo, impossibilitando que o atendimento aconteça. Esse sentimento pode ser identificado na seguinte UCE: “E, às vezes, uma criancinha está esperando um resultado, um hemograma, uma coisa rápida, para poder ir embora rápido, mas fica horas no hospital, porque não temos essas coisas”.

A impossibilidade de atender a clientela segundo os padrões da dignidade humana e com base no conceito de resolutividade em saúde leva os profissionais a sobreviverem em meio ao estresse (BARBOSA et al., 2005). Os profissionais também reconhecem as dificuldades para concluir o processo de atendimento, quando o fluxo de ações e serviços não se concretiza segundo as etapas necessárias para a satisfação das demandas apresentadas, em decorrência de dificuldades de diversos tipos. Um dos enfermeiros pontua essa situação:

Vamos colocar neste paciente, três dias depois nós vamos ver como vai ficar o resultado. Nós não temos isso, mas deveríamos ter.

Então, você pode fazer um exame fora daqui, mas quando? Que dia? Tem que deslocar! Não é uma coisa tão rápida! E ainda tem a expectativa de fazer o exame.

O atendimento oferecido pelo sistema de saúde apresenta-se, a partir das representações e das memórias dos profissionais, com dificuldades na prestação dos cuidados exigidos pelo processo saúdedoença dos usuários. Os problemas apresentados impedem, inclusive, que um dos instrumentos básicos do cuidar de enfermagem, como a observação, seja implementado pelos profissionais, prejudicando a avaliação realizada e impedindo a implementação de determinadas ações no cotidiano institucional (ALMEIDA; ROCHA, 1997).

A atuação dos enfermeiros, nesse contexto, permite a vivência de situações desagradáveis que podem levar à morte do paciente, não apenas como histórias que são ouvidas de membros da equipe e facilmente propagadas pela mídia, mas como algo concreto e pontual que faz parte das memórias pessoal e profissional:

A coisa tem que ser marcada para o dia seguinte, ou ele ser assistido na hora. Na verdade, marca com dois ou três meses e quando ele chega já está desgastado, cansado e, muitas vezes, não dá nem tempo, já morre antes, eu já vi acontecer.

As inúmeras dificuldades vivenciadas no processo de atendimento à população foram incorporadas à representação do SUS e resgatadas pela memória do grupo analisado, em razão do tempo de espera para o acesso às ações e aos serviços de saúde que ofereçam resolutividade aos problemas apresentadas pela população. O ideal de tempo de espera para o atendimento, segundo os profissionais, encontra-se limitado a, no máximo, um dia, enquanto a prática das instituições revela esperas de dois ou três meses, descaracterizando a estrutura do sistema (MENDES, 1999).

Essa condição de vida e morte atinge a auto-estima profissional e faz que o término da vida faça parte do cotidiano profissional não somente como atributo do processo de desgaste orgânico ou de agressão fisiopatológica, mas como inerente ao funcionamento do sistema de saúde. Mesmo que se admita a morte como parte do processo de existir, é difícil reconhecer, para o ethos profissional, que o cenário de ação dos enfermeiros inclua a morte como conseqüência da organização do sistema, para a qual o profissional empresta sua força de trabalho (PITTA, 1995).

O desgaste psicológico sofrido pelos profissionais de enfermagem no processo de trabalho em um contexto de sofrimento e morte não é reconhecido como problema ou necessidade pela saúde do trabalhador, ficando esse setor limitado às questões físicas e patológicas dos indivíduos: “Mas saúde do trabalhador é você ir lá para ter exame de sangue, eletro, para ver como está. Não tem nenhum tipo de acompanhamento psicológico”.

Pode-se perceber como participante das representações dos enfermeiros sobre o SUS um ciclo de estresse e de desgaste com dupla faceta: por um lado, a população, que se vê privada de ações e serviços necessários à sua saúde e à continuidade de sua existência, e, por outro, os profissionais, que se sentem agredidos pela incapacidade de dar respostas que se traduzam em ações de proteção e de promoção da vida (BARBOSA et al., 2005).

Os sujeitos pontuam, ainda, outras dificuldades vivenciadas no sistema de saúde, como demonstrado pelas UCE a seguir:

Coloca no chão e fica ali sentado, esperando amanhecer o dia para ter a oportunidade de ser atendido e conseguir marcar aquela consulta, porque ele sabe que o hospital tem uma qualidade na assistência e por isso ele quer ser atendido aqui.

Ele vem dois ou três dias seguidos e não consegue, ele vem no outro dia mais cedo, chega aqui sete horas mais cedo no hospital e encontra o povo na fila para ser atendido no dia seguinte, todos os dias.

Percebe-se que os profissionais enfrentam dificuldades internas à unidade de saúde e aquelas relativas à organização da própria rede de assistência, gerando um círculo de dificuldades que tende a gerar desestímulo e queda do nível de qualidade do atendimento prestado ao paciente.

Classe 4 “A hierarquização das ações do sistema de saúde: atribuições e interrelações dos diferentes níveis de complexidade”

Essa classe representa 17,16% das UCE presentes na análise e está relacionada aos sujeitos mais novos, tanto no que tange à idade quanto em relação ao tempo de serviço. Possui, em seu interior, um sentido que aponta os níveis de complexidade do sistema, por meio dos léxicos complex+ (X² 56,57), primári+ (X² 71,38), secundar+ (X² 43,88) e terciári+ (X² 48,81). Possui, ainda, léxicos que indicam os problemas de saúde e as especialidades que levam o cliente a procurar os serviços, como câncer (X² 18,61), cardiolog+ (X² 19,40), diabet+ (X² 28,09), emergenc+ (X² 41,08), hipertens+ (X² 14,53), imunização (X² 19,40) e puericultura (X² 29,16).

O SUS foi organizado para que os seus usuários pudessem ser atendidos no nível de complexidade exigido pelas necessidades derivadas do processo saúde-doença. Como pontuado nas classes anteriores, essa diretriz do SUS não ocorre em sua plenitude, mas concretiza-se em maior ou menor grau nas distintas regiões do país, estando na dependência de diversos fatores, como a política, as condições econômicas, o aspecto cultural e a infra-estrutura local da área da saúde (MISOCZKY, 1999).

Como parte da representação do SUS, os enfermeiros incorporaram determinados conceitos derivados do conhecimento reificado, que passam por um processo de releitura para a sua incorporação à representação. O conceito de nível primário de atenção à saúde é um dos mais polêmicos, exigindo a definição de algumas ações que devem ser englobadas nesse nível de atenção:

Geralmente pré-natal a gente encaminha para o posto de saúde de origem e eles não têm voltado, só quando é um caso de urgência.

A gente tinha na unidade a vacinação, que a gente tinha com as crianças, não tinha puericultura. Logo tinha a questão da tuberculose, a questão da hanseníase, mais o pré-natal e o atendimento odontológico.

No nível primário, as unidades básicas de saúde desenvolvem atividades relativas à prevenção das doenças e ao restabelecimento da saúde, o que engloba a realização de pré-natal e o desenvolvimento dos principais programas de saúde. É compreensível que essas questões ocupem espaço prioritário nas representações dos profissionais, pois a enfermagem realiza essas atividades, nesses moldes, de forma rotineira e sistemática, desde a década de 1980 (ALMEIDA; ROCHA, 1989).

Os enfermeiros que desenvolvem as suas atividades nos níveis de maior complexidade têm, contudo, se ressentido da não-atuação adequada do nível primário, como pode ser inferido desta fala: “Ninguém encaminha para o posto de saúde, que também não tem capacidade de atender. Você recebe um paciente na emergência que está só com resfriado e febre e não tem para onde encaminhar”.

Percebe-se o grau de tensão vivido pelos profissionais, que conhecem o papel e o perfil das unidades básicas, mas, ao mesmo tempo, reconhecem a existência de estrangulamentos que impedem a continuidade do atendimento à população, segundo a complexidade requerida. Os enfermeiros que exercem as suas atividades dentro do complexo hospitalar sentem-se impedidos de referenciar os pacientes para a atenção menos complexa e, assim, sentem-se obrigados a aceitar aqueles que poderiam ser atendidos no nível primário (MELO; FAVERO; EVORA, 1998).

Os enfermeiros descrevem as suas unidades terciárias, apontando os casos mais atendidos nessas unidades:

No doente de cardiologia, em nossas unidades coronarianas, temos cirurgias cardíacas e hemodinâmicas, ficariam, então, pacientes com maior complexidade. Situações que normalmente ficam em nossas emergências.

Os doentes ficam 10, 15 ou 20 dias lotando a emergência. Os doentes de câncer ou de patologias crônicas ficam lá e chegam os enfartados...

A descrição dos profissionais vai ao encontro dos dados epidemiológicos que apontam serem o câncer, os distúrbios cardíacos, as cirurgias e as doenças crônicas os quadros mais importantes no cenário atual das instituições hospitalares. Os enfermeiros destacam o drama vivenciado à medida que as unidades de emergência, uma das principais portas de entrada das instituições hospitalares, possuem demandas que não são, necessariamente, emergências e impedem que outras situações – emergenciais por essência – tenham o atendimento necessário.

A mudança do perfil epidemiológico também é apontada, especialmente em se tratando de um grande centro urbano no qual a violência é tema recorrente:

Porque hoje o perfil de entrada do doente na emergência aqui na área é vítima de violência urbana em sua maioria ou enfartados. As emergências vermelhas têm muitos partos e urgências cardiológicas, bem como cirúrgicas.

A violência urbana tem transformado o perfil epidemiológico dos atendimentos terciários, gerando um quadro que requer maior atenção e demanda, bem como custos e estruturas específicas para o seu atendimento, sem prejudicar a atenção às demais entidades mórbidas presentes nos grandes centros. As denominadas causas externas têm exigido que políticas públicas sejam elaboradas e implementadas, para fazer frente à sua alta incidência e às suas nefastas conseqüências.

Os próprios sujeitos, no entanto, pontuam que a atribuição de cada esfera de complexidade não possui uma separação tão bem delimitada no dia-a-dia institucional, gerando sobreposição de atividades e desperdício de recursos financeiros e de recursos humanos.

A gente vê hospitais, por exemplo, de nível terciário realizando imunização.

Hospitais fazendo controle preventivo de câncer de colo de útero, de mama. Por que não aproveitar aquele espaço, aquele ginecologista que poderia estar fazendo outras coisas, como biopsiando uma mama, fazendo uma cirurgia ginecológica?

Assim como o nível primário de atenção exerce papéis confusos dentro do sistema hierarquizado, o terciário desenvolve ações e serviços que não deveriam estar no seu âmbito de competência, desgastando os enfermeiros em um cotidiano conturbado por superlotação, não-resolutividade e deficiências materiais e estruturais. Por causa dessa situação, os enfermeiros enfrentam unidades repletas de pacientes que poderiam estar sendo atendidos em outros níveis do sistema, de forma mais resolutiva e com maior conforto (TEIXEIRA, 2002).

Observa-se, portanto, que a hierarquização na prática cotidiana dos serviços gera um funcionamento anárquico do fluxo de pacientes dentro do sistema público de saúde, gerando um profundo desequilíbrio de demandas e de ofertas em uma cidade que possui o maior número de instituições hospitalares de diferentes graus de complexidade.

 

Considerações finais

Os dados apontam para duas dimensões principais das representações e das memórias dos enfermeiros com relação ao SUS: a sua organização, englobando as políticas de recursos humanos e os diferentes conceitos associados ao próprio sistema; e a ação assistencial, que promove a interface entre os profissionais e os usuários. Essas dimensões demonstram o conjunto de conteúdos que compõem o campo representacional dos enfermeiros acerca do sistema de saúde no qual estão inseridos.

As memórias demonstraram os cursos nem sempre cartesianos adotados pelos grupos ao entender a história do SUS, e isso coincide com o menor investimento na capacitação profissional e com uma das maiores crises políticas que o país já viveu. Por sua vez, a década de 1980 foi associada a esse tipo de ação, mas provavelmente voltada para o perfil técnico-hospitalar existente na época e para a ideologia de um sistema não-includente, o que justifica algumas das dificuldades encontradas no processo de implementação do SUS.

A principal imagem que permanece do SUS na representação dos profissionais é a de porta aberta, sendo a maior diferença apontada em relação ao INPS/Inamps. No entanto, torna-se curioso que profissionais com a formação política e a prática social do enfermeiro definam o Sistema como um “plano de saúde” ou reduzindo-o à Estratégia de Saúde da Família.

Observa-se, também, que o cotidiano de atendimento realizado pelos enfermeiros mostra-se cheio de contradições e dificuldades, possibilitando a formação de uma representação negativa acerca do sistema e a vivência de estresse e frustração no desempenho da profissão. Essa negatividade está relacionada, especialmente, à impossibilidade de concretizar uma prática assistencial dentro dos parâmetros éticos da profissão, ou ainda à impossibilidade de continuidade nas demais instâncias por meio do mecanismo de referência e contra-referência.

Destaca-se nesta conclusão a importância dos enfermeiros para o Sistema Único de Saúde na sua concretização como política de saúde, que responda aos anseios da sociedade e para a implementação de um atendimento humanizado e eficaz. Destaca-se, ainda, a importância da utilização do referencial teórico das representações e das memórias sociais, como forma de identificação dos elementos representacionais reconstruídos pelos sujeitos e pelo grupo social e da forma como o cotidiano foi recriado a partir das vivências práticas e das diversas ideologias difundidas no meio social.

 

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Endereço para correspondência
Antonio Marcos Tosoli Gomes
Rua José Vicente, 43/401 – Grajaú
Rio de Janeiro, RJ
CEP 20540-330
E-mail: mtosoli@gmail.com

Tramitação
Recebido em outubro de 2007
Aceito em novembro de 2007

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